REVISTA NORTE MINEIRA
DE ENFERMAGEM
ISSN: 2317-3092
Recebido em:
21/12/2020
Aprovado em:
15/06/2021
Como citar este artigo
Souza, JB, Tomasi YT, Madureira VSF. É possível
transformar o ensino na enfermagem? Uso de
metodologias ativas na formação profissional.
Rev Norte Mineira de enferm. 2021; 10(1):44-
51.
Autor correspondente
Yaná Tamara Tomasi
Universidade do Estado de Santa Catarina
Correio eletrônico: yanaatomasi@gmail.com
RELATO DE EXPERIÊNCIA
É POSSÍVEL TRANSFORMAR O ENSINO NA ENFERMAGEM? USO
DE METODOLOGIAS ATIVAS NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL
Is it possible to transform nursing education? Use of active
methodologies in professional training
Jeane Barros de Souza
1
, Yaná Tamara Tomasi
2
, Valéria Silvana Faganello Madureira
3
.
1 Doutora em Ciências, Pós-doutora em Enfermagem pela Universidade Federal de Santa Catarina -
UFSC, Professora do Curso Graduação em Enfermagem da Universidade Federal da Fronteira Sul,
SC, BR, jeanebarros18@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0512-9765.
2 Mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC, Professora do
Curso Graduação em Enfermagem da Universidade do Estado de Santa Catarina, SC, BR,
yanaatomasi@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6034-1497.
3 Doutora em Enfermagem, Pós-doutora em Enfermagem pela Universidade Federal de Santa
Catarina - UFSC, Professora do Curso Graduação em Enfermagem da Universidade Federal da
Fronteira Sul, SC, BR, valeriamadureira2005@hotmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0001-
7990-3613.
DOI: https://doi.org/10.46551/rnm23173092202100105
Objetivo: compartilhar experiências sobre a utilização de metodologias ativas
na graduação em Enfermagem, como forma de qualificar o processo ensino e
aprendizagem. Descrição da experiência: no primeiro semestre de 2019,
docentes de dois componentes curriculares da primeira e da quinta fase do
curso de graduação em Enfermagem de uma Universidade Federal do Sul do
Brasil, organizaram dinâmicas interativas e lúdicas para abordagem de
conteúdos programáticos das disciplinas. Discussão: as atividades despertaram
nos estudantes criatividade, ampliação do conhecimento, diálogo, reflexão e
desenvolvimento do trabalho em equipe, pois se colocaram como
protagonistas no processo ensino-aprendizagem, proporcionando maior
satisfação para todos os envolvidos, bem como estímulo à continuidade do uso
de metodologias ativas no ensino da Enfermagem. Conclusão: a incorporação
de metodologias ativas na formação em Enfermagem fomenta o protagonismo
do estudante e a formação de enfermeiros condizentes com as demandas da
sociedade e do Sistema Único de Saúde.
DESCRITORES: Educação em Enfermagem; Ensino; Aprendizagem Ativa;
Enfermagem; Enfermeiro.
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Objective: to share experiences on the use of active methodologies in
undergraduate nursing training, as a way to enhance the teaching-learning
process. Description of the experience: in the first half of 2019, lecturers of
two curricular components from the first and fifth phase of the undergraduate
nursing course at a Federal University of Southern Brazil organized interactive
and playful dynamics to approach the syllabus of the academic subjects.
Discussion: the activities aroused in students creativity, expansion of
knowledge, dialogue, reflection and development of teamwork, as they became
protagonists in the teaching-learning process, providing greater satisfaction to
all involved, as well as encouraging the continued use of active methodologies
in nursing education. Conclusion: the incorporation of active methodologies in
nursing education fosters the protagonism of the student and the training of
nurses in line with the demands of society and of the Brazilian Unified Health
System.
DESCRIPTORS: Nursing Education; Teaching; Active Learning; Nursing; Nurse.
INTRODUÇÃO
A formação de enfermeiros, bem como de outros profissionais de saúde, vem sendo discutida algum tempo, refletindo a
busca por possibilidades e caminhos que permitam aos estudantes aproximarem-se da realidade de vida e de saúde dos
brasileiros, não apenas para compreendê-la e criticá-la, mas principalmente para vislumbrar alternativas de transformação
(1)
.
Nesse sentido, os modelos mais tradicionais de formação têm sido criticados por múltiplas razões: o foco essencialmente
conteudista, a passividade dos estudantes, a centralidade da figura do docente, o distanciamento da prática da atenção em
saúde, dentre outras. O resultado muitas vezes se traduz em profissionais que privilegiam os aspectos biológicos no continuum
saúde e doença, em detrimento de outros determinantes e perpetuando o modelo biomédico de atenção, hoje tão
amplamente criticado
(2)
.
Com vistas a provocar mudanças na formação, as diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para o curso de graduação em
Enfermagem valorizam, desde sua edição em 2001, os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), bem como a
necessidade de formação em íntima relação com os campos de prática e a valorização dos determinantes sociais de saúde em
todas as frentes de atuação
1
. De acordo com as DCN
(3)
, o estímulo e o fomento à autonomia do estudante é essencial no
processo de formação, sendo necessário refletir nas maneiras de ensinar e de aprender
(4)
.
Neste contexto, metodologias ativas de ensino aprendizagem são importantes para estimular a participação dos estudantes
com reflexões e problematizações sobre o conhecimento, possibilitando-lhes protagonismo em sua própria formação
(5)
. Tais
metodologias são úteis na integração de conteúdos teóricos e práticos relacionados à saúde, à doença, seus determinantes e
condicionantes e sua produção social, aprofundando a percepção crítica do estudante e ampliando suas possibilidades de
atuação na promoção da saúde e no cuidado de Enfermagem em todas as frentes
(4)
.
Entretanto, não que se pensar que o uso das metodologias ativas implica em transferir responsabilidades e iniciativas de
ensino e aprendizagem para os estudantes. Ao contrário, representam grande desafio para os educadores no sentido de,
muitas vezes, renunciar a metodologias longamente praticadas, bem como na apreensão dos fundamentos teórico
metodológicos das metodologias ativas, sem renunciar a sua posição no processo de formação
(5,6)
. As reflexões aqui
apresentadas motivaram a escrita deste artigo, pois acredita-se que o uso de tais metodologias, além de auxiliar na
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qualificação do processo ensino aprendizagem, também contribui para a formação de enfermeiros crítico-reflexivos, sensíveis
às demandas e necessidades de saúde da população, bem como para atuação no SUS
(3)
.
Entende-se também que o compartilhamento de experiências que obtiveram resultados promissores
(6)
poderá incentivar a
reinvenção, criação e (re)criação de dinâmicas interativas e lúdicas nas temáticas abordadas na formação em Enfermagem,
tendo o cuidado de também proporcionar momentos de discussão teórica para ampliação do conhecimento dos estudantes.
Assim, este relato objetiva compartilhar experiências sobre a utilização de metodologias ativas na graduação em Enfermagem,
como forma de qualificar o processo de ensino e aprendizagem.
DESCRIÇÃO DA EXPERIÊNCIA
Trata-se de um relato de experiência envolvendo o uso de metodologias ativas no ensino superior em Enfermagem. Ao atuar
em um Curso de Graduação em Enfermagem de uma Universidade Federal do Sul do Brasil, três docentes evidenciaram a
necessidade de inovar suas ações em sala de aula, com o intuito de aprimorar o processo de ensino e aprendizagem, tornando
as aulas mais atrativas.
Para tanto, no início do primeiro semestre de 2019, as docentes realizaram reuniões para organizar o plano de ensino dos dois
componentes curriculares pelos quais eram responsáveis. Participaram os estudantes e docentes envolvidos nos componentes
curriculares do Curso de Graduação em Enfermagem, sendo: Contexto Social e Profissional da Enfermagem I, na primeira fase
do curso; Cuidados de Enfermagem na Atenção Básica de Saúde, da quinta fase.
Tendo em vista a característica de relato de experiência e não identificação dos participantes, tal estudo dispensa apreciação
do Comitê de Ética em Pesquisa. De toda forma, todos os preceitos éticos da Resolução 466/2012 foram respeitados.
Optou-se por compartilhar quatro das várias metodologias desenvolvidas com a participação ativa dos estudantes (Tabela 1).
Cabe ressaltar que as metodologias utilizadas foram criadas pelas autoras, instigando a criatividade, o trabalho em equipe, o
compromisso e a ludicidade como fundamentos.
Tabela 01: Metodologias ativas e temáticas desenvolvidas no ensino da Enfermagem
Temática abordada
Fase do curso
Teorias de Enfermagem
Primeira
História da Enfermagem
Primeira
Visita Domiciliar
Quinta
Gênero e Violência
Quinta
Para abordar a temática ‘Teorias de Enfermagem’, as docentes organizaram os estudantes em seis grupos e, para isso, cada um
recebeu um bilhete com um número, variando de um a seis. Em seguida, todos os que tinham recebido números iguais se
reuniram formando os grupos. Solicitou-se a cada grupo que escolhesse uma cor de identificação e um nome que os
representasse.
Feito isso, as tarefas que deveriam ser apresentadas em dia pré-agendado para a realização da Gincana Teórica foram
apresentadas, discutidas e as dúvidas iniciais esclarecidas. Foi disponibilizado tempo hábil para cada grupo preparar suas
ações, com orientação e acompanhamento das docentes durante o semestre letivo. As atividades desenvolvidas foram: 1)
apresentação de uma paródia musical sobre uma das Teorias de Enfermagem, com a participação de todos os estudantes de
cada grupo; 2) elaboração de um vídeo sobre uma das Teorias de Enfermagem, com o envolvimento de todos os integrantes do
grupo; 3) perguntas interativas, projetadas por aparelho multimídia no dia da gincana; em cada rodada de perguntas, uma
tarefa lúdica era realizada para verificar o grupo vencedor que, como prêmio, recebia imunidade em uma das questões da
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rodada e assim sucessivamente até a conclusão da gincana. À participação e ao envolvimento na atividade foram atribuídos
pontos que foram acrescentados na avaliação final dos estudantes. Como adicional, todos os grupos deveriam identificar-se
com as cores escolhidas, seja nas roupas ou em acessórios.
Para o Jogo da Trilha, cuja finalidade foi abordar a ‘História da Enfermagem’, os estudantes foram divididos em 10 grupos para
os quais foi entregue um tabuleiro de trilha e 40 questões relativas à temática. Em cada rodada, cada integrante do grupo
sorteava uma das questões a serem respondidas. Com a resposta correta, o estudante poderia evoluir para a próxima casa da
trilha e, frente à resposta errada, ele permanecia na mesma casa. Assim, o vencedor em cada grupo seria aquele que atingisse
primeiro o final da trilha. No decorrer da atividade foi possível perceber o estudo prévio e o envolvimento de todos nas
respostas às questões, auxiliando os colegas nas dúvidas e questionamentos que surgiam. Todas as dúvidas que emergiram
foram discutidas com o grande grupo, com as docentes assumindo a tarefa de mediar debates, inserindo elementos novos
trazidos pelas leituras recomendadas e resgatando outros aspectos importantes que haviam sido abordados previamente
em aula, mas que não foram ressaltados, o que possibilitou aproximação mais intensa dos estudantes com o conteúdo.
O Jogo das Placas foi desenvolvido para discussão sobre Visita Domiciliar’. Nesse jogo utilizou-se um vídeo de simulação,
criado pelas docentes, abordando uma visita domiciliar na Atenção Primária à Saúde (APS), realizado pelo enfermeiro a uma
mulher no puerpério. Antes de iniciar o vídeo, os estudantes receberam uma placa com um lado na cor vermelha (sinalizando
errado) e o outro lado na cor verde (sinalizado certo). Foram também orientados a erguer a placa nos momentos indicados do
vídeo. Durante a exibição, o vídeo era pausado em momentos que representavam uma situação problematizadora e os
estudantes deveriam apontar se a conduta apresentada estava certa ou errada, elevando a placa. Deveriam também justificar
suas respostas. No decorrer do vídeo surgiram diferentes problematizações que subsidiaram discussões e o resgate do
conteúdo abordado sobre o tema. Além disso, a atividade estimulou a busca por práticas inovadoras na Visita Domiciliar
realizada pelo enfermeiro em diferentes contextos de atuação.
Para abordar a temática ‘Gênero e Violência’, as docentes elegeram a dinâmica do relógio para primeiramente refletir e
discutir com os estudantes sobre as suas vivências diante da temática proposta. Assim, todos receberam uma folha de papel
com um relógio impresso e com uma escala de seis horários a serem agendados com os colegas. Para cada horário havia uma
pergunta que deveria ser debatida com o colega agendado: O que você entende por gênero? Você presenciou alguma
situação de discriminação relacionada ao gênero? Meninas vestem rosa e meninos vestem azul? Qual tipo de violência você
mais visualiza na sociedade? Que maneiras existem para enfrentar a violência na sociedade brasileira? Como a Enfermagem
pode abordar as situações de gênero e violência nos serviços?
A partir de então, ao sinal das docentes, os estudantes foram convidados a agendar encontros com os colegas em cada horário
estabelecido, sem repetir nomes. Após o agendamento, ao som de uma música de fundo, os estudantes se direcionaram ao
primeiro encontro com o colega e debateram a primeira questão. Quando a música foi interrompida, foram para o segundo
encontro e assim sucessivamente até o término dos encontros agendados. Ao final, todos os estudantes se reuniram em
círculo e debateram diversas situações relacionadas a gênero e violência trazidas à tona pela dinâmica, que durou
aproximadamente uma hora e meia. Finda a discussão, houve aula expositiva dialogada, buscando correlacionar a teoria com
as suas experiências práticas compartilhadas, mantendo a atenção e a participação dos estudantes.
Cabe esclarecer que as três primeiras dinâmicas foram precedidas por aula expositiva dialogada, leituras prévias e atividades
grupais, como forma de introduzir a temática, ampliar informações sobre ela e trabalhar em equipe para organizar e
aprofundar os conhecimentos. A dinâmica do relógio seguiu lógica diferente, pois partiu de questionamentos relativos ao tema
a serem debatidos com base no viver de cada um. A isso seguiu-se aula sobre gênero e violência, complementada com
atividade grupal.
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Uma roda de conversa com os estudantes foi realizada ao final do semestre letivo para avaliar as atividades realizadas e
verificar a possibilidade de continuidade no uso de metodologias ativas em sala de aula. Os resultados dessa avaliação foram
utilizados para planejamento do próximo semestre.
DISCUSSÃO
Os processos pedagógicos, no ensino sofre impacto na prática profissional da Enfermagem
(2)
. Neste sentido, diante dos
desafios da prática profissional para atuação no SUS, a Enfermagem tem se apropriado dos pressupostos teórico filosóficos de
Paulo Freire, em busca de modelos de ensino que possam subsidiar os anseios da profissão e que possibilitem a qualificação na
formação acadêmica
(7)
.
Nesta perspectiva, as três docentes elaboraram diversas dinâmicas interativas e integrativas durante o semestre, com
utilização de metodologias ativas e lúdicas, o que proporcionou conhecimento teórico sobre as temáticas abordadas e
resultados satisfatórios no desempenho dos estudantes nas avaliações propostas. A utilização de metodologias ativas,
especificamente no ensino da Enfermagem, contribui com a formação dos futuros enfermeiros, proporcionando
aprimoramento da qualificação técnica e humanizada dos estudantes. Com isso, poderão se tornar profissionais
suficientemente comprometidos com o bem-estar da sociedade, com competências para gerir, implementar e liderar situações
que envolvem problemas de saúde e com aptidão para propor ações conforme a realidade de cada local
(8)
.
No desenvolvimento das aulas ficou evidente a importância do lúdico propiciado pelas atividades de Gincana Teórica, Jogo da
Trilha e Jogo das Placas, pois possibilitou aos estudantes a participação ativa na construção do seu conhecimento com
aprofundamento dos conteúdos, da reflexão e da interação com os colegas da turma. Tais atividades colocaram os estudantes
no centro do processo ensino e aprendizagem, fomentando o desenvolvimento da autonomia e da capacidade de expressar e
(re)criar ideias e, nessa perspectiva, contribuindo para a formação de profissionais críticos
(9)
, criativos e proativos para atuação
no SUS, conforme as necessidades de cada território e serviço.
A utilização de jogos desperta o aprendizado para além dos conteúdos propostos em uma disciplina, proporcionando uma
realidade lúdica de ensino, descontração e cooperação, abrindo a oportunidade de desenvolver habilidades essenciais como o
trabalho em equipe, a interação ativa do grupo, a criatividade, o pensamento crítico
(10)
, bem como o saber falar e o momento
de se calar.
O pensamento crítico é competência que deve ser desenvolvida e aprimorada durante a formação do estudante. Na
experiência relatada, a utilização de metodologias ativas estimulou os estudantes de Enfermagem a pesquisarem sobre os
conteúdos abordados, assumindo seu protagonismo nesse processo. Assim, ao alicerçar-se em Paulo Freire, que incentiva o
estudante a gerenciar sua formação, o ensinar necessita respeitar a autonomia de cada indivíduo, por meio de uma educação
que leva em consideração o estudante como um ser que constrói a sua própria história
(11)
.
A problematização é uma ação emancipatória da educação, que possibilita o desenvolvimento da autonomia dos sujeitos
(12)
.
Neste cenário, os contextos de vida, as histórias, as experiências e os saberes de cada um, docentes e estudantes, se colocam
em diálogo em um esforço que reúne reflexão e ação, retroalimentando-se no pensar a realidade. O diálogo compartilhador de
saberes e experiências é central nesse processo
(12)
, assim como ocorreu nas atividades realizadas durante o semestre letivo no
desenvolvimento dos dois componentes curriculares, com destaque para a Dinâmica do Relógio, em que todos os estudantes
discutiram profundamente sobre o conhecimento prévio envolvendo ‘Gênero e Violência’ e juntos puderam ressignificar a sua
realidade e ampliar o aprendizado.
O diálogo sobre um conteúdo demanda horizontalidade nas relações que se estabelecem entre todos os envolvidos, no caso
docentes e estudantes que abandonam suas posições clássicas de ‘quem ensina’ e ‘quem aprende’ para assumirem-se como
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educadores-educandos e educandos-educadores. Essa reconfiguração de relações permite o compartilhamento de saberes e
de experiências necessário para a construção de um novo saber, que possa ser apropriado, apreendido por todos os que
ensinam-aprendem
(13)
.
Vale destacar que, por meio das dinâmicas realizadas, foi possível proporcionar troca de experiências, permitindo o
desenvolvimento do trabalho em grupo. A dinâmica de grupo é um instrumento educacional relevante no processo ensino e
aprendizagem quando se considera a concepção de educação que coloca teoria e prática em patamares iguais, envolvendo
todos os participantes como protagonistas. Assim, a aprendizagem acontece em processo coletivo, em encontro de indivíduos
para construção conjunta do saber, estimulando a capacidade criadora, a desenvoltura dos participantes, a produtividade, as
relações interpessoais e intrapessoais, o que promove transformação e estímulo ao trabalho em equipe como oportunidade
para modificar a realidade
(14)
.
A capacidade de interagir cooperativamente com os colegas possibilita a troca de experiências e de informações, incentivando
a solução de problemas e o pensamento criativo
(10)
. Além disso, o trabalho em grupo é essencial na atuação da Enfermagem.
Trabalhar em equipe demanda elementos como confiança, comunicação, respeito mútuo, reconhecimento do trabalho do
outro e colaboração
(15)
, o que foi possível incitar nas vivências dos estudantes no decorrer das atividades realizadas. No
entanto, também surgiram alguns conflitos decorrentes de divergências de condutas e de opiniões, os quais também foram
fonte de aprendizagem para todos gerirem tais situações que, se não forem bem administradas, poderão impor barreiras ao
trabalho em equipe colaborativo
(15)
, na atuação do futuro enfermeiro.
O uso de metodologias ativas demandou intenso trabalho, envolvimento e despertar da criatividade por parte de estudantes e
docentes na elaboração e execução das atividades. Mas, em contrapartida, proporcionou maior satisfação para educadores-
educandos e educandos-educadores, bem como estímulo para continuidade do uso de tais ferramentas na formação
profissional. Também ficou evidente para as docentes, a necessidade de manter um planejamento adequado na elaboração
das aulas, relacionando teoria e prática na Enfermagem, considerando o conhecimento prévio dos estudantes sobre as
temáticas propostas.
A adoção de uma atitude favorável para a aprendizagem requer postura do docente, a fim de permitir associações contrárias à
aprendizagem mecânica, em que não se estabelece relações entre o novo e o anteriormente aprendido
(11,16)
, sem relacionar a
prática com a teoria. Pensando nisso, as docentes buscaram realizar as atividades integrativas e lúdicas, que permitiram
reflexão dos estudantes, valorizando o seu conhecimento prévio sobre as temáticas estudadas, com correlação entre teoria e
prática na Enfermagem. As docentes, mesmo após o uso das metodologias ativas em todas as aulas propostas no decorrer do
semestre, não excluíram a aula expositiva dialógica, que não pode por si ser considerada como estratégia da educação
bancária, pois, se por um lado há aulas nas quais o docente tenta transferir conhecimentos, por outro há aquelas aulas em que
os estudantes são desafiados a compreenderem um tema, estudar e criticar sobre ele
(12)
.
É fato que ousar e optar pela utilização de metodologias ativas demanda maior tempo de preparo para elaborar as atividades e
provoca certa insegurança, pois a sequência de eventos de uma aula não é controlada pelo docente, mas segue os caminhos
das leituras prévias e do pensamento dos estudantes. Tal situação impõe desafios ao docente, mas se transforma em algo
prazeroso e divertido
(9)
. Vale destacar que as autoras, no decorrer da formação docente, buscaram estratégias criativas para o
emprego de metodologias ativas no processo ensino-aprendizagem, mesmo sem incentivo e educação continuada específica a
respeito no espaço universitário.
Cabe a ressalva que, ao término dos dois componentes curriculares, as docentes realizaram uma roda de conversa para
verificar a opinião dos estudantes sobre a utilização das metodologias ativas no decorrer do semestre, sendo avaliado de
maneira satisfatória e positiva, com incentivo para continuidade de novas práticas na formação do enfermeiro. Essa avaliação
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demonstra que a experiência foi eficaz, desafiadora e divertida para estudantes e docentes, bem como que é possível
transformar o ensino em algo prazeroso para todos os envolvidos no processo ensino aprendizagem.
Acredita-se que este relato de experiência possa contribuir para o desenvolvimento do ensino na Enfermagem, pois o
envolvimento de docentes e estudantes em atividades que demandam compromisso e participação ativa de todos amplia a
percepção da responsabilidade de cada um na (re)construção e na apreensão do conhecimento. O uso de metodologias tais
como as aqui relatadas promove a aproximação de estudantes e docentes, dos estudantes entre si e de todos com o
conhecimento e com a Enfermagem.
CONCLUSÃO
A experiência contribuiu para ressaltar a necessidade de incorporação dos princípios das DCN no ensino superior da
Enfermagem, pois com metodologias ativas foi possível promover o protagonismo do estudante em seu processo de ensino
aprendizagem e, consequentemente, contribuir para a formação de enfermeiros condizentes com as demandas da sociedade
brasileira, preparados para atuar conforme as diretrizes do SUS e enfrentar os desafios que emergem na prática profissional.
As dinâmicas utilizadas com criatividade e ludicidade proporcionaram prazer e entusiasmo aos sujeitos envolvidos no ensinar e
aprender, incentivando o pensamento crítico-reflexivo. É também importante considerar que o uso de metodologias ativas na
formação do enfermeiro exige disposição do docente, pois demanda tempo de planejamento e preparo das atividades, bem
como consistência teórico prática, posto que se verá frente a situações e questionamentos novos, oriundos do processo de
troca de saberes e das interrogações estimuladas em aula. também que considerar a humildade como condição essencial
ao docente para que ele possa manejar suas inseguranças e seu próprio desconhecimento.
Neste contexto, sugere-se a implementação de estratégias de ensino no espaço universitário que transcendam os métodos
tradicionais, bem como a continuidade e divulgação destas ações com vistas a contribuir e aprimorar as práticas pedagógicas
em Enfermagem. Portanto, cabem ainda discussões e debates sobre a temática aqui proposta e incentivo a tais práticas
inovadoras na vivência docente, que possui papel fundamental na formação dos futuros enfermeiros.
Os autores declaram não haver conflitos de interesse.
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