REVISTA NORTE MINEIRA DE ENFERMAGEM

ISSN: 2317-3092

 

 

Recebido em:

19/06/2020

Aprovado em:

03/02/2021

Como citar este artigo

 

Oliveira RFS, Santos RS, Santos GKBB, Farre AGMC, Santana ITS, Cavalcante RCM. Contaminação por staphylococcus aureus  em celulares de profissionais da saúde em unidade de terapia intensiva. 2020; 9(2):98-105.

Autor correspondente

 

Rone Felipe Santos de Oliveira

Universidade Federal de Sergipe, Lagarto, SE, BR Correio eletrônico: rone_r1@hotmail.com

 

 

 

ARTIGO ORIGINAL

CONTAMINAÇÃO POR STAPHYLOCOCCUS AUREUS  EM CELULARES DE PROFISSIONAIS DA SAÚDE EM UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA

 

Contamination by staphylococcus aureus on health professionals’ cell phones in a unit of intensive therapy

Rone Felipe Santos de Oliveira 1, Rafaela Silva Santos 2, Gleyce Kelly de Brito Brasileiro Santos 3, Anny Giselly Milhome da Costa Farre 4, Ingrede Tatiane Serafim Santana 5, Rafael Ciro Marques Cavalcante 6.

 

1 Enfermeiro, Especialista em Urgência e Emergência pela Faculdade de Venda Nova do Imigrante, Universidade Federal de Sergipe, Lagarto, SE, BR. rone_r1@hotmail.com, ORCID iD: https://orcid.org/0000-0001-8347-3011.

2 Enfermeira. Especialista em Cuidados Paliativos pelo Instituto de Ciências Biológicas, Hospital Universitário Oswaldo Cruz, Recife, PE, BR. rafaela.ss.rock@hotmail.com, ORCID iD: https://orcid.org/0000-0001-8541-5122.

3 Enfermeira, Mestranda em Enfermagem pela Universidade Federal de Sergipe, Departamento de Enfermagem de Lagarto da Universidade Federal de Sergipe, Lagarto, SE, BR, gkbsantos@hotmail.com, ORCID iD: https://orcid.org/0000-0003-4578-5799.

4 Enfermeira, Doutora em Enfermagem pela Universidade Federal do Ceará, Departamento de Enfermagem de Lagarto da Universidade Federal de Sergipe, Lagarto, SE, BR. annygiselly.enfermagem@gmail.com, ORCID iD: https://orcid.org/0000-0002-0676-4090.

5 Enfermeira, Doutoranda em Ciências Fisiológicas pela Universidade Federal de Sergipe, Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, SE, BR. ingredetatiane@hotmail.com, ORCID iD: https://orcid.org/0000-0002-2980-6302.

6 Farmacêutico, Doutor em Ciências: Biologia da relação patógeno-hospedeiro pela Universidade de São Paulo, Departamento de Farmácia de Lagarto da Universidade Federal de Sergipe, Lagarto, SE, BR. rafaelciro@gmail.com, ORCID iD: https://orcid.org/0000-0002-3704-2883.

 

 

DOI: https://doi.org/10.46551/rnm23173092202090210

 

 

Objetivo: isolar e traçar o perfil de resistência de cepas de Staphylococcus isoladas de smartphones de profissionais de saúde da Unidade de Terapia Intensiva em Hospital Universitário. Métodos: estudo experimental, laboratorial e quantitativo. Coletaram-se 27 amostras com swab nas superfícies dos smartphones com tecnologia touchscreen. Colônias típicas de S. aureus em ágar manitol salgado foram submetidas à coloração de Gram, provas da catalase, DNAse e coagulase; após comprovação fenotípica de S. aureus, realizaram-se testes de sensibilidade a antimicrobianos por técnica de difusão em discos. Utilizou-se análise estatística descritiva. Resultados: identificou-se o crescimento em 21 amostras semeadas em ágar manitol salgado. Destas, 100% pertenciam ao gênero Staphylococcus, 28% apresentavam correspondência ao S. aureus a partir de análise fenotípica e 71,5% (15) a estafilococos coagulase-negativa. As principais resistências microbianas detectadas foram à azitromicinna e à eritromicina. Conclusão: smartphones encontram-se colonizados por Staphylococcus sp resistentes, sendo necessárias medidas de controle para esse micro-organismo.

 

Palavras chave: Staphylococcus Aureus; Smartphone; Resistência a Medicamentos; Unidade de Terapia Intensiva.

 

Objective: To isolate and determine the resistance profile of Staphylococcus strains isolated from health professionals’ smartphones of the Intensive Care Unit in a University Hospital. Methods: Experimental, laboratory and quantitative study. 27 swab samples were collected from smartphones with touchscreen technology. Typical colonies of S. aureus on salted mannitol agar were subjected to Gram stain, catalase tests, and DNAse echoagulase. After phenotypic confirmation of S. aureus, sensitivity tests to antimicrobials were carried out using the disk diffusion technique. Descriptive statistical analysis was used. Results: Growth was identified in 21 swab samples cultivated on salted mannitol agar. 100% belonged to the genus Staphylococcus, 28% presented correspondence to S. aureus from phenotypic analysis and 71.5% (15) to coagulase-negative staphylococci. The main microbial resistance detected was azithromycin and erythromycin. Conclusion: Smartphones are colonized by resistant Staphylococcus sp, requiring control measures for this microorganism.

 

Descriptors: Staphylococcus aureus; Smartphone; Drug resistance; Intensive care unit.

INTRODUÇÃO

 

O uso de telefones vem sendo incorporado à sociedade desde sua invenção em 1876 por Alexander Graham Bell, sendo progressivamente engajado à vida cotidiana das pessoas como objeto de uso indispensável nos âmbitos profissional e pessoal(1). No entanto, o uso constante desses aparelhos em ambientes hospitalares, como Unidades de Terapia Intensiva (UTI) e outras dependências do hospital, pode atuar como veículo para transmissão de patógenos aos pacientes e aos profissionais de saúde(2).

 

Com todas as realizações e benefícios do uso do telefone móvel, é fácil ignorar o perigo que este pode representar para a saúde dos seus muitos usuários, como também para pacientes de instituições hospitalares(3). Esses aparelhos vêm sendo usados de forma excessiva em ambiente hospitalar, independentemente da limpeza das mãos com água e sabão ou soluções antissépticas e com rara higienização dos smartphones, podendo, consequentemente, abrigar diferentes micro-organismos causadores de doenças, como bactérias patogênicas(4).

 

Estudos investigaram a contaminação dos telefones celulares de médicos em países desenvolvidos e relataram nível elevado de contaminação geral do telefone móvel por organismos patogênicos e não patogênicos(4-6). Dentre as bactérias mais comumente isoladas nesses dispositivos, destacam-se: Bacillus sp., Corynebacterium sp., Escherichia coli Staphylococcus epidermidis e, principalmente, o Staphylococcus aureus(7).

 

O S. aureus é uma bactéria frequentemente associada às infecções adquiridas tanto na comunidade quanto em hospitais. É considerado um dos principais patógenos humanos, destacando-se por sua elevada frequência e patogenicidade que o capacitam a produzir doenças. A fácil disseminação no ambiente hospitalar permite que o patógeno seja encontrado em mãos, boca e cavidade nasal de profissionais da saúde. Além disso, muitas cepas isoladas desse micro-organismo apresentam resistência múltipla a fármacos, tornando o tratamento das infecções causadas por elas mais perigoso e mais oneroso para os serviços de saúde(2).

 

O S. aureus coloniza cerca de 20% a 80% da população, o que representa uma fonte de infecção para o próprio indivíduo e para outras pessoas, principalmente por veiculação nasal(8). S. aureus pode causar desde infecções simples na pele, como furúnculos, até infecções de caráter mais grave, como a endocardite fatal(9).

 

Pacientes internados em UTIs estão entre os mais suscetíveis a adquirir esse tipo de infecção, principalmente devido à gravidade clínica, uso de procedimentos invasivos, como cateter venoso central, sonda vesical de demora e ventilação mecânica, imunossupressores, internação prolongada, colonização por micro-organismos resistentes e prescrição de antimicrobianos. Além disso, o próprio ambiente da UTI favorece a seleção natural de micro-organismos resistentes a antimicrobianos(10).

 

A resistência a antibióticos apresentada pelo S. aureus gera grande preocupação na abordagem terapêutica desde a década de 1960, emergindo imediatamente após a introdução da penicilina(11). Em adição, o início da década de 1970 foi marcado pelo surgimento de cepas de S. aureus resistentes à meticilina identificadas pela sigla MRSA (Methicillin Resistant Staphylococcus aureus)(9).

 

Considera-se que o aumento significativo da manipulação de celulares por profissionais da área da saúde dentro dos estabelecimentos de saúde ao longo do dia e o contato íntimo com o aparelho possibilitam a transferência da microbiota residente e transitória da pele para os aparelhos celulares, podendo elevar o risco da transmissão de bactérias patogênicas responsáveis por infecções, como o S. aureus, para pacientes internados(12).

 

Ademais, evidencia-se que o uso desses equipamentos em UTIs pode trazer riscos adicionais para infecções relacionadas à assistência, uma vez que frequentemente os pacientes desse setor encontram-se em estados de imunodepressão, debilitados e, eventualmente, com a integridade das barreiras primárias comprometidas(10).

 

Estudo desenvolvido para investigar a presença de microrganismos por meio da vigilância microbiológica de telefones pessoais e teclados de computadores em uma uti conseguiu realizar o isolamento de cepas de Staphylococcus em telefones, como o MSRA. No entanto, ainda são limitadas as evidências de que micro-organismos presentes em telefones celulares possam representar danos significativos aos pacientes, bem como sobre quais são os principais microrganismos isolados nesses aparelhos, trazendo a necessidade da realização de estudos que ampliem o conhecimento, por exemplo, acerca da colonização de micro-organismos em telefones celulares(13).

 

Diante desse cenário, o presente estudo teve por objetivo isolar e traçar o perfil de resistência de cepas de Staphylococcus aureus isoladas de smartphones de profissionais de saúde da unidade de terapia intensiva (UTI) de um hospital universitário (HU). Esta pesquisa visa contribuir para ampliar esse conhecimento e incentivar a tomada de medidas de precaução para segurança do paciente e dos profissionais na assistência à saúde.

 

METODOLOGIA

 

Trata-se de um estudo experimental, laboratorial e quantitativo. As amostras para análise microbiológica foram coletadas da tela dos telefones celulares do tipo smartphones de 27 profissionais da saúde (médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e fisioterapeutas), durante turnos de trabalho em uma UTI do tipo adulto, com 10 leitos, em Hospital Universitário localizado no estado de Sergipe, Brasil.

 

Os smartphones de todos os profissionais da saúde lotados nas escalas regulares e extras de trabalho na UTI foram incluídos na pesquisa, no período de coleta (setembro de 2017 a março de 2018), mediante disponibilidade voluntária dos participantes. Destaca-se que o hospital não possuía protocolo específico de higienização dos telefones celulares dos profissionais, incluindo-os na categoria de fômites hospitalares.

 

As amostras biológicas foram coletadas utilizando-se swabs estéreis umedecidos em solução de NaCl 0,9% por meio de fricção na superfície da tela. Após a coleta, o material foi inoculado em caldo Brain Heart Infusion (BHI), adicionado de 7,5% de NaCl e transportado de imediato ao Laboratório de Microbiologia da Universidade Federal de Sergipe (UFS); em seguida, as amostras foram incubadas a 37ºC, sob constante agitação, por 18-24 horas(14).

 

Posteriormente, fora inoculado o crescimento bacteriano em ágar manitol salgado usando a técnica de esgotamento; em seguida, as placas foram incubadas em estufa bacteriológica por 24 horas a 37ºC. A partir das amostras manitol positivas, isolaram-se quatro colônias características de S. aureus de cada amostra, que foram novamente semeadas em placa de manitol para garantir a clonalidade das cepas.

 

As colônias isoladas foram submetidas às provas bioquímicas para confirmação de S. aureus: coloração de Gram, catalase, DNAse e coagulase. Após a realização dos testes bioquímicos e a comprovação fenotípica da presença do S. aureus, verificou-se o perfil de sensibilidade a antimicrobianos.

 

Para isso, um inóculo com suspensão direta de colônias em caldo BHI foi preparado e padronizado para absorbância de 0,1 a 600 nm, equivalente a 0,5 na escala de McFarland.  A suspensão foi semeada uniformemente em placa de Petri contendo ágar Mueller Hinton; em seguida, adicionaram-se discos de antibiótico e incubou-se a placa a 37°C por 18-24h. Decorrido esse período, os halos de inibição foram medidos e comparados segundo o Clinical and Laboratory Standards Institute (CLSI), versão 2016(15).

 

Os antibióticos testados foram: Tetraciclina (TET), Eritromicina (ERI), Azitromicina (AZI), Amoxicilina + Ácido clavulânico (AMC), Ciprofloxacino (CIP), Penicilina (PEN), Linezolida (LNZ) e Lincomicina (LIN).

 

Os dados foram compilados no programa Microsoft Office Excel 2016, analisados mediante estatística descritiva e organizados em tabelas. A pesquisa foi aprovada pela instituição hospitalar, que incentivou a coleta das amostras com o objetivo de fortalecer as ações futuras de redução das infecções hospitalares. Os testes não envolveram dados nem amostras colhidas de seres humanos.

 

RESULTADOS

 

Das 27 amostras coletadas, 23 (85,1%) apresentaram crescimento bacteriano em ágar manitol salgado e, destas, 21 foram classificadas como manitol positivas mediante alteração da cor do meio para o amarelo vivo e 2 não alteraram a coloração, sendo classificadas como manitol negativas.

 

As 21 (100%) amostras que cresceram em manitol salgado foram submetidas à coloração de Gram e a observação microscópica demonstrou que todas apresentaram morfologia de cocos Gram positivos arranjados em cachos. Todas essas cepas foram também positivas para prova da catalase, confirmando pertencerem fenotipicamente ao gênero Staphylococcus. As provas da DNAse e coagulase mostraram que 6 (28,5%) amostras pertenciam à espécie S. aureus, provas positivas. As 15 (71,5%) amostras restantes foram classificadas como estafilococos coagulase negativa (Tabela 1).

 

 

Tabela 1 – Distribuição de espécies do gênero Staphylococcus com base na prova da coagulase. Sergipe, Brasil, 2020.

Microrganismos

Staphylococcus aureus

Estafilococos coagulase negativa

Total

N° de cepas

6

15

21

% de cepas

28,5%

71,5%

100,0%

 

O perfil de sensibilidade perante os antimicrobianos foi testado nas 21 cepas de Staphylococcus. Nas 6 cepas de S. aureus, observou-se que 100% apresentaram resistência à Azitromicina e Eritromicina; 83% à Amoxilina, Penicilina e Ciprofloxacino; 66% à Tetraciclina; 50% à Linezolida; e 33% à Lincomicina (Tabela 2).

 

Tabela 2 - Perfil de sensibilidade dos Staphylococcus aureus aos antimicrobianos segundo o CLSI, versão 2016.Sergipe, Brasil, 2020.

Antibióticos

 

Amoxilina

Tetraciclina

Azitromicina

Lincomicina

Eritromicina

Penicilina

Linezolida

Ciprofloxacino

Total: 6 amostras

Resistente

5

4

6

2

6

5

3

5

Sensível

1

2

-

4

-

1

3

1

 

Para os estafilococos coagulase negativa, verificou-se que 100% apresentaram resistência à Eritromicina; 93% à Azitromicina; 86% a Ciprofloxacino; 80% à Penicilina; 73% à Amoxilina; 66% à Tetraciclina; 20% à Linezolida e 13% à Lincomicina (Tabela 3).

 

Tabela 3 – Perfil de sensibilidade dos estafilococos coagulase negativa aos antimicrobianos segundo o CLSI, versão 2016. Sergipe, Brasil, 2020.

Antibióticos

 

Amoxilina

Tetraciclina

Azitromicina

Lincomicina

Eritromicina

Penicilina

Linezolida

Ciprofloxacino

Total: 15 amostras

Resistente

11

10

14

2

15

12

3

13

Sensível

4

5

1

13

-

3

12

2

 

Destaca-se que todas as amostras (100%) de Staphylococcus aureus e 12 (80%) de Estafilococos coagulase negativa apresentaram resistência no mínimo a três e no máximo a sete antibióticos. Apenas uma amostra entre os Estafilococos coagulase negativa apresentou resistência a um único fármaco ou dois.

 

 

 

DISCUSSÃO

 

No presente estudo, 28,5% das amostras analisadas foram de S. aureus, semelhante à pesquisa brasileira que identificou 28% de contaminação dos telefones celulares dos profissionais da UTI por S. aureus (2). Por sua vez, estudo realizado na Turquia apresentou taxa muito maior, 94,5% ao combinar os ambientes de trabalho UTI e centro cirúrgico(16).

 

As diferentes taxas observadas podem estar relacionadas à variação da colonização do S. aureus na população, de acordo com a literatura.  A taxa de colonização é tida entre 20 e 40% em estudantes e profissionais da saúde(14). Por outro lado, estima-se que 30 a 60% da população apresenta colonização transitória pelo S. aureus(17). Ademais, em outro estudo, identificou-se que taxa de colonização pelo S. aureus está entre 20 e 80%(8).

 

Todas as amostras que apresentaram crescimento bacteriano (n=21) foram classificadas como Gram-positivas. Esses cocos são responsáveis por aproximadamente 30% dos micro-organismos encontrados em rotinas bacteriológicas, devendo-se apresentar maior atenção a atuação do Staphylococcus aureus como patógeno causador de infecções. Além disso, a presença de outros cocos Gram-positivos e catalase positiva (Estafilococos coagulase negativa e estafilococoides: Alloicoccus, Macrococcus, Micrococcus e Stomatococcus) vêm sendo associados gradativamente a diferentes patologias(2).

 

Estafilococos coagulase negativa foram encontrados em 71,5% das amostras do presente estudo. Espécies coagulase-positivas são historicamente consideradas como patógenos oportunistas, enquanto as espécies coagulase-negativas são geralmente consideradas como não patogênicas(2). No entanto, evidências de que algumas das espécies coagulase-negativas podem ser responsáveis pela produção de fatores de virulência, como enterotoxinas, tornando-as potencialmente perigosas para seres humanos, principalmente como agentes etiológicos de infecções nosocomiais, têm mudado essa visão(2, 18).

 

Além disso, apesar de normalmente serem não patogênicas, espécies coagulase-negativas podem atuar como fontes de genes de resistência para outras bactérias patogênicas, tais como Klebsiella Pneumoniae produtora de carbapemase (KPC), Streptococcus pyogenes e S. aureus, diante do fato de que determinados micro-organismos podem receber material genético de outros e passar a expressar características contidas no gene adquirido, processo denominado de resistência transferível(19).

 

Estudo realizado para verificação da prevalência de colonização pelo S. aureus entre profissionais de enfermagem de um hospital universitário em Pernambuco revelou uma resistência de 100% dos isolados à penicilina G(20), representando uma taxa de prevalência maior que a observada no presente estudo de 83%. A maior taxa de prevalência de colonização pelo S. aureus observada no hospital universitário em Pernambuco pode estar relacionada às diferenças estruturais, organizacionais e assistenciais em relação ao hospital em que foi realizado o presente estudo, permitindo uma maior identificação de cepas multirresistentes.

 

Cepas MRSA são resistentes a diferentes drogas, como penicilinas, cefalosporinas, tetraciclinas, sulfonamidas e rifampicina, representando um importante problema para o tratamento clínico devido à possibilidade de falhas terapêuticas e dificuldade em encontrar a antibioticoterapia ideal(21). No presente estudo, a resistência das amostras de S. aureus à Tetraciclina e à Linezolida foi de 66,6% e 50%, respectivamente, fato que pode inviabilizar a utilização desses fármacos no tratamento de infecções estafilocócicas.

 

A resistência do S. aureus à tetraciclina é conhecida, no entanto a linezolida é um dos medicamentos de escolha no tratamento de cepas MRSA, estando relacionada à maior taxa de sobrevida e de cura(21). Dados encontrados nesta pesquisa divergem de estudo realizado na China, com cepas de S. aureus isoladas entre 2008 e 2014, em que não foi observada resistência à linezolida(22). A presença de cepas de S. aureus resistentes à linezolida entre as amostras avaliadas é um dado a ser explorado em novos estudos, visto que a resistência à linezolida pode limitar os medicamentos para antibioticoterapia, bem como pode ser associada à ocorrência de infecções mais graves.

 

Os telefones celulares são reconhecidamente veículos de contaminação bacteriana em ambientes hospitalares. Estudo realizado com telefones de 250 funcionários hospitalares revelou que Unidades Formadoras de Colônias (UFC) bacterianas foram significativamente maiores que dos 191 controles; MRSA e Enterococcus resistentes à Vancomicina (VRE) somente foram encontrados em telefones dos profissionais hospitalares(23).

 

É urgente reduzir a contaminação dos telefones celulares dos profissionais da saúde, sendo necessária uma abordagem mais específica, além de promover somente a higienização das mãos(1,4). Atualmente, existem poucas orientações quanto ao uso seguro de telefones celulares dentro de ambientes de saúde(19). Essas orientações devem incluir, por exemplo, a higienização das mãos antes e após o uso, desinfecção do aparelho com álcool 70% e atividades de educação continuada para os profissionais(12).

 

Pesquisa recente realizada nos Estados Unidos da América (EUA) revelou que cerca de 91,6% dos profissionais utilizam telefone celular durante o turno de trabalho no hospital. Menos de 10% realizam higiene diária do seu aparelho, 28,4% a fazem semanalmente e 62% nunca higienizaram seu celular(23).

 

Técnicas de higienização das mãos fazem parte do cotidiano dos profissionais em saúde e representam uma importante barreira para prevenção da contaminação nos serviços de saúde. Além disso, a importância da higienização das mãos, de aparelhos celulares e superfícies e da educação em saúde tem se mostrado cada vez mais eficaz na prevenção de doenças, sejam estas causadas por contaminação bacteriana ou por outros patógenos.

 

A pandemia global da COVID-19, causada pelo novo coronavírus, o SARS-CoV-2, tem levantado, por exemplo, a importância do cuidado com aparelhos celulares para não transmissão viral, identificando que esses dispositivos também podem representar fontes de infecção e um elo perdido no combate à doença, reforçando a importância da conscientização para “higienização” de telefones celulares e das medidas de precaução perante o atendimento de pacientes(24).

 

Diante disso, a importância da higienização de celulares como barreira para transmissão de doenças traz consigo a necessidade da criação de protocolos de higienização específicos pelas instituições em saúde, a serem seguidos pelos profissionais, que devem basear-se em recomendações do Centers for Disease Control and Prevention e estarem de acordo com as recomendações dos fabricantes dos aparelhos celulares.

 

CONCLUSÃO

 

O presente estudo evidenciou a contaminação bacteriana por S. aureus em 28,5% dos aparelhos celulares da equipe de saúde da UTI, demonstrando que smartphones podem veicular agentes infecciosos e atuar na disseminação desses micro-organismos multirresistentes para pacientes que podem apresentar imunossupressão. Além disso, identificou-se a resistência a múltiplos antibióticos em todas as amostras de S. aureus.

 

Nesse contexto, salienta-se a importância da adoção de medidas que reduzam e/ou eliminem a veiculação de micro-organismos que favoreçam infecções hospitalares, tais como a correta e frequente higienização das mãos e de objetos de uso pessoal e a educação em saúde; e levanta-se a necessidade da elaboração de protocolos de higienização de smartphones por instituições de saúde que possam ser seguidos pelos profissionais. A adoção dessas medidas pode contribuir diretamente para a redução de gastos com tratamento e hospitalização prolongada e prevenção de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde (IRAS).

Os autores do presente estudo declaram a inexistência de conflitos de interesse.

 

 

REFERÊNCIAS

 

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