REVISTA NORTE MINEIRA DE ENFERMAGEM
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INTRODUÇÃO
As doenças cardiovasculares representam a principal
causa de óbito no mundo. Dados de 2015, mostram que aproximadamente 40 milhões
de mortes ocorreram devido a doenças não transmissíveis (DNT), representando
70% do total de 56 milhões mortes, e as doenças cardiovasculares representaram
45% de todos estes eventos1. Dois terços de mortes súbitas ocorrem em ambientes
extra hospitalares, o que representa uma parada cardiorrespiratória (PCR) a
cada 1000 pessoas no ambiente comunitário a cada ano2.
A PCR, intercorrência inesperada que constitui
grande ameaça à vida3, permanece como um problema mundial de saúde pública
e caracteriza-se pela interrupção da atividade mecânica cardíaca, pulmonar e
cerebral que em conjunto promovem perda da responsividade
e ausência de batimentos cardíacos e respiração4.
No Brasil, os avanços se estendem à legislação sobre
acesso público à desfibrilação e obrigatoriedade de disponibilização de
desfibriladores externos automáticos (DEAs), bem como
no treinamento em
ressuscitação cardiopulmonar (RCP), podendo-se estimar cerca de 200.000 PCRs ao
ano, das quais metade ocorre em ambientes como
residências, shopping centers,
aeroportos, estádios5. Em 2011 foi lançado o Plano Nacional de ações
estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis
(DCNT) 2011-2022 e para a prevenção da morbimortalidade das doenças do coração,
foram organizadas e implementadas, dentre outras, ações para a melhora no
diagnóstico, prevenção e tratamento da hipertensão arterial sistêmica e o
diabetes, bem como o controle e orientação sobre o tabagismo, o consumo de
álcool, a alimentação inadequada, o sedentarismo e a obesidade6.
Apesar destes esforços, muitas vidas ainda são
perdidas todos os anos no Brasil, relacionadas às doenças cardíacas que evoluem
em paradas cardiorrespiratórias5. Assim, o reconhecimento e
identificação pelo leigo na comunidade é imperativo visto que a chance de
sobreviver está diretamente relacionada ao atendimento rápido, seguro e eficaz7.
A assistência prestada no atendimento pré-hospitalar é
de suma importância sendo estimado que o índice de sobrevivência do indivíduo seja
reduzido entre 7 a 10% para cada minuto de espera sem assistência2. Porém, quando há intervenção, a taxa de sobrevida é
de 75% nos primeiros quatro minutos, 15% entre quatro e 12 minutos e apenas 5%
após 15 minutos8.
Com base no exposto, a Sociedade Brasileira de
Cardiologia ressalta a importância da educação, implementação e treinamento da
população para que o início da cadeia de sobrevivência seja precoce, conforme enfatizado
na I Diretriz de Ressuscitação Cardiopulmonar e Cuidados Cardiovasculares de
Emergência5. Neste mesmo documento, destaca-se
que infelizmente, as habilidades adquiridas após um treinamento em RCP podem
ser perdidas em tempo muito curto (3 a 6 meses), caso não
utilizadas ou praticadas, o que reforça a
necessidade da simplificação do treinamento para leigos com o
intuito de que
aspectos importantes e
de impacto nos
desfechos tenham maior
chance de ser
retidos por maiores intervalos de tempos5.
Desta maneira é primordial o
conhecimento e habilidade técnica-científica visando a rápida recuperação,
diminuição do sofrimento e ocorrência mínima de
sequelas para o paciente3. Entretanto, um problema muito comum na
comunidade é a dificuldade em reconhecer os sintomas
correspondentes a um evento trágico como a PCR, levando à demora nas ações em reanimação cardiopulmonar e
desta maneira promovendo
sequelas neurológicas graves e antecipando o fim da vida4,9. O desfecho das vítimas de PCR na
comunidade somente será favorável se a RCP for iniciada precocemente por pessoas da
própria comunidade e posteriormente por profissionais
capacitados e receber um suporte avançado de vida no
pré-hospitalar e em centros de referências7.
Embora a literatura apresente
estudos realizados em cidades brasileiras que demonstraram que o público leigo
avaliado apresentou conhecimento incompleto ou incorreto sobre o atendimento à pessoas desacordadas e/ou em
parada cardiorrespiratória10-11, ainda são escassos os estudos recentes sobre
o tema realizados em outras
regiões do Brasil. Adicionalmente, nenhum destes estudos considerou o conhecimento do
leigo de acordo com o mais recente protocolo da American Heart Association (AHA)12, o que direcionou a realização do presente estudo. Neste
contexto, o objetivo do presente estudo foi avaliar o conhecimento e condutas teóricas relatados por leigos frente a uma situação de parada cardiorrespiratória (PCR) em
vítima adulta, considerando as vigentes diretrizes da American
Heart Association, publicadas em 2015.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo quantitativo,
transversal, de caráter descritivo. A coleta de dados foi realizada em março de
2017, em município de médio porte localizado na região centro-oeste do país
(Mato Grosso), que, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
apresentava, em 2019, uma população estimada de 94.376 habitantes, IDH
considerado médio (0,708) e 97,8% de taxa de escolarização de 6 a 14 anos.
A amostra deste estudo foi probabilística.
Para o cálculo amostral foi considerada a população do município, que conforme
dados do IBGE apresentava, em 2017 uma população de 60.764 pessoas com mais de 18
anos. Estabeleceu-se a prevalência de 50%, já que este valor possibilita o maior
grau de variância, correspondendo ao tamanho mínimo aceito para a amostra ser
representativa da população, com nível de confiança de 95%, precisão de 5%
resultando em um tamanho amostral mínimo de 382 transeuntes.
Os transeuntes foram aleatoriamente abordados
no perímetro urbano em locais de grande circulação, como praças, pronto
atendimento médico, feira livre e nas imediações de uma universidade pública da
cidade e participaram do estudo após aceite e confirmação da adequação aos critérios
de inclusão pré-estabelecidos: idade superior a 18 anos, não fossem estudantes
da área da saúde, profissionais de saúde e militares11,13. Excluiu-se os
participantes que não responderam à todas as perguntas.
A equipe de pesquisa foi
constituída por seis pesquisadoras que foram calibradas em duas reuniões
previamente agendadas quanto às condutas para a realização da abordagem dos
transeuntes e comportamento durante a coleta de dados. A abordagem ao
transeunte respeitou as seguintes etapas: apresentação, execução e conclusão,
seguindo as orientações que constam no Plano de Ações de Serviços de Saúde para
pesquisa de usuários do Sistema Único de Saude (SUS)14.
A apresentação se deu em
abordar, cumprimentar, se apresentar, e expor o conteúdo incluindo os principais
benefícios para o transeunte e a solicitação da sua colaboração no estudo.
Todos os que decidiram participar foram convidados para assinar o Termo de
Conhecimento Livre e Esclarecido. O participante foi informado de que poderia
interromper a sua participação a qualquer momento e tirar dúvidas sobre a
formulação das questões a serem respondidas antes de qualquer apontamento no
questionário.
A etapa da execução ocorreu por meio do
fornecimento de informações sobre o questionário e o número de perguntas. O
instrumento de coleta de dados foi baseado no utilizado em estudo anterior13 e atualizado
segundo a mais recente diretriz em reanimação da American Heart Association12, que contemplou,
para leigos, a eliminação de avaliação de presença de respiração bem como da manobra
de ventilação; incluiu-se a verificação simultânea da responsividade e respiração
ausente ou apenas agônica (gasping), devendo-se nestes casos presumir
PCR e tomar três atitudes: acionar o serviço médico de emergência, pedir o
desfibrilador e iniciar compressões sem interrupções em ritmo de 100 a 120 por
minuto. Após estas adaptações no instrumento original, o novo instrumento passou
por um pré-teste para que as perguntas fossem avaliadas quanto a pertinência,
objetividade e qualidade por dois médicos especialistas emergencistas, dois profissionais
do Corpo de Bombeiros e quatro leigos.
O instrumento de avaliação de conhecimento e
de condutas teóricas diante de uma parada cardiorrespiratória contemplou dois eixos:
no primeiro buscou-se identificar o perfil sócio demográfico do participante
(idade, sexo, escolaridade e ocupação). O segundo contemplou a investigação téorica
do conhecimento e das condutas que seriam adotadas sobre o suporte básico de vida
na vítima adulta, em sete questões de múltipla escolha, organizadas em 3 blocos
relacionados ao conhecimento sobre a identificação de uma PCR no adulto; as
condutas que seriam adotadas após a identificação de uma PCR em vítima adulta
na comunidade, envolvendo a decisão em realizar ou não compressões no tórax e o
consequente conhecimento relacionado à esta conduta além
do entendimento sobre o desfibrilador externo automático e sobre qual serviço acionar
para solicitar socorro.
Cada pergunta continha quatro
opções de respostas sendo que apenas uma era a correta segundo a AHA12 e em todas as questões incluiu-se a opção “não sei responder”. O entrevistado
pontuava com um X a opção adequada ao seu entendimento.
Finalizava-se com um
agradecimento e entrega de um folder ilustrativo com orientações gerais sobre
as principais recomendações para RCP no adulto.
Os dados foram analisados e tabulados utilizando
ferramentas do Microsoft Office Excel 2010, utilizando a estatística descritiva
por meio de média, desvio padrão, frequências absoluta e relativa. Este estudo
foi aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade São Leopoldo Mandic
(Campinas, São Paulo), sob parecer número 2.019.448 e CAAE
62972216.8.0000.5374.
RESULTADOS
Foram abordadas 412 pessoas sendo que 11 delas não
quiseram participar do estudo em função do desinteresse com o tema e/ou
ausência de disponibilidade de tempo no momento da abordagem, e 04
questionários foram excluídos por não terem respondidos todas as questões, resultando
então em uma amostra de 397 transeuntes respondentes. Na tabela 1 verifica-se o
perfil dos transeuntes abordados, envolvendo adultos jovens, em sua maioria estudantes com ensino médio completo e/ou
ensino superior incompleto.
Tabela 1 - Perfil dos
respondentes do questionário sobre reanimação cardiopulmonar (Cáceres – MT, Brasil,
2017).
Características |
Média
(± DP*) Idade em anos |
Frequência absoluta |
Frequência relativa |
|
Sexo |
|
|
|
|
Feminino |
28,3±11,8 |
221 |
55,7 |
|
Masculino |
33,7±12,0 |
176 |
44,3 |
|
Escolaridade |
|
|
|
|
Médio completo ou superior incompleto |
|
285 |
71,8 |
|
Fundamental completo ou médio incompleto |
|
41 |
10,3 |
|
Superior completo |
|
37 |
9,3 |
|
Sem instrução ou fundamental incompleto |
|
34 |
8,6 |
|
Ocupação |
|
|
|
|
Estudantes (ensino médio completo e/ou ensino
superior incompleto. |
|
174 |
43,8 |
|
Serviços Domésticos |
|
30 |
7,6 |
|
Vendedores |
|
28 |
7,1 |
|
Professores |
|
10 |
2,5 |
|
Outras ocupações |
|
155 |
39,0 |
|
* DP - desvio padrão
Os resultados referentes aos conhecimentos e
condutas em casos de PCR estão apresentados nas tabelas a seguir e as respostas
adequadas à evidência atualmente disponível estão marcadas em itálico. A tabela
2 aponta que a maioria das respostas foi a correta para as questões relacionadas
à identificação da parada cardiorrespiratória (51,6%, 205) e tipo de socorro
prestado por transeuntes (41,8%, 166), embora chame atenção a soma das frequências
das opções incorretas e “não sei”.
Tabela 2 - Respostas dos transeuntes a respeito da
identificação, tipo de socorro em uma parada cardiorrespiratória na comunidade
na vítima adulta (Cáceres – MT, Brasil, 2017).
Características |
Frequência absoluta |
Frequência relativa |
Identificação
da parada cardiorrespiratória |
|
|
Na ausência de movimentos no tórax e sem resposta
aos chamados e/ou estímulos dolorosos |
205 |
51,6 |
Não sei responder |
82 |
20,7 |
Quando a vítima não apresenta movimentos, somente gemidos aos estímulos
dolorosos |
76 |
19,1 |
Fechando o nariz e boca para identificar se a vítima tem alguma reação |
34 |
8,6 |
Tipo
de socorro prestado por transeuntes |
|
|
Chama ajuda e faz compressões (fortes e rápidas)
no tórax até a chegada do socorro especializado |
166 |
41,8 |
Não faço nenhuma manobra, mas encaminho-o para o pronto atendimento
mais perto |
118 |
29,7 |
Liga para o socorro, faz-se boca-a-boca e algumas compressões no tórax
até a chegada do socorro especializado |
99 |
24,9 |
Não sei responder |
14 |
3,5 |
Total |
397 |
100,0 |
A tabela 3 apresenta a descrição das respostas
relacionadas às ações e/ou conhecimentos fundamentais em casos de uma parada
cardiorrespiratória no adulto. Embora a maioria das pessoas tenha marcado a
correta localização da compressão no tórax (72,8%, 289), a minoria soube
indicar a profundidade (11,3%, 45) e o número de compressões (9,8%, 39) corretos.
Sobre o desfibrilador externo automático (DEA), a minoria dos respondentes
(9,3%, 37) soube apontar a resposta correta.
Tabela 3 - Decisão do
transeunte quanto a profundidade e quantidade da compressão torácica, a
localização das mãos no tórax durante e o uso do Desfibrilador Externo
Automático (DEA) na reanimação cardiopulmonar no adulto (Cáceres – MT, Brasil, 2017).
Características |
Frequência absoluta |
Frequência relativa |
Localização da
compressão no tórax |
|
|
No meio do
peito (sobre o osso do centro do tórax) |
289 |
72,8 |
Do lado esquerdo do peito |
52 |
13,1 |
Não sei responder |
46 |
11,6 |
Em qualquer local do peito, o importante é comprimir
o tórax |
10 |
2,5 |
Profundidade da compressão
do tórax |
|
|
Não sei responder |
186 |
46,9 |
03 a 04 centímetros |
118 |
29,7 |
02 centímetros |
48 |
12,1 |
05 a 06
centímetros |
45 |
11,3 |
Quantidade de
compressões por minuto no tórax |
|
|
Aproximadamente 30 vezes |
208 |
52,4 |
Não sei responder |
118 |
29,7 |
De 100 a
120 vezes |
39 |
9,8 |
De 80 a 100 vezes |
32 |
8,1 |
Conhecimento sobre o
Desfibrilador Externo Automático |
|
|
É um aparelho de uso exclusivo hospitalar para dar
choques em vítimas de parada cardiorrespiratória |
173 |
43,6 |
É um aparelho que comprime e dispara choque em tórax
de vítimas de parada cardiorrespiratória |
104 |
26,2 |
Não sei responder |
83 |
20,9 |
Aparelho
que verifica ritmo cardíaco de vítimas em parada cardiorrespiratória e quando
indicado dispara choque |
37 |
9,3 |
Total |
397 |
100,0 |
Na tabela 4 pode-se notar que a maioria dos
respondentes (93,2%, 370) soube responder corretamente o serviço a ser acionado
em caso de PCR.
Tabela 4 - Onde as
pessoas leigas solicitam socorro diante de uma reanimação cardiopulmonar
(Cáceres – MT, Brasil, 2017).
Opção
de solicitar socorro do transeunte |
Frequência absoluta |
Frequência relativa |
192 Serviço de Atendimento Móvel de Urgência
(SAMU) ou 193 Corpo de Bombeiros |
370 |
93,2 |
Para o hospital
mais próximo |
17 |
4,3 |
190 Polícia
militar |
6 |
1,5 |
Não sei responder |
4 |
1,0 |
Total |
397 |
100,0 |
DISCUSSÃO
Identificou-se na presente investigação que embora
os leigos tenham demonstrado conhecer conceitualmente alguns aspectos do
atendimento da PCR e manobras de RCP, as respostas relacionadas às condutas
relatadas para a ressuscitação, apontam que estas seriam realizadas de forma
incorreta, levando inevitavelmente ao prognóstico indesejável e com risco de
sequelas neurológicas permanentes e/ou a morte. A parada cardiorrespiratória
súbita coloca o socorrista leigo frente a decisões e condutas desafiadoras, já
que ele deve ser capaz de identificar se a vítima está responsiva, e não
confundir a PCR com outros eventos como desmaios ou convulsão e, acima de tudo,
iniciar a RCP imediata e corretamente além de chamar socorro especializado.
Segundo a
Sociedade Brasileira de Cardiologia, estudos revelam que o treinamento de indivíduos
leigos pode elevar substancialmente a probabilidade de um espectador realizar a
RCP e aumentar a sobrevida de uma vítima que sofreu parada cardíaca, além
disso, leigos devem ser treinados para desempenhar as instruções dadas pelo
serviço médico de emergência por telefone5.
Dentro deste contexto, verificou-se que pouco mais
da metade dos leigos abordados demonstraram reconhecer os sinais de uma PCR,
frequência esta menor e maior do que a verificada em estudos anteriores: 83,1%
e 27,3% respectivamente11,13, que pautaram-se em recomendações anteriores à vigente
utilizada no presente estudo12. Tais diferenças podem estar associadas ao grau de
instrução da amostra avaliada, visto que 34% participantes de um destes estudos13 possuía
cursos e/ou orientações em SBV enquanto que no outro11 19,9% possuía. Embora no presente estudo não tenha
sido verificada a qualificação dos respondentes quanto ao SBV, os resultados obtidos
podem ter sido influenciados pelo cenário atual, no qual jovens, grupo etário
predominante no estudo, obtêm informações com elevada rapidez, principalmente
por meio das mídias eletrônicas e redes sociais que facilitam a comunicação em
decorrência de compartilhamentos de mensagens, fotos e vídeos. Este fenômeno
potencializa diretamente a aprendizagem formal e informal15.
As respostas citadas sobre o que fariam diante de
uma PCR resultaram com 41,8% (166) respondendo adequadamente a opção chamam ajuda e fazem compressões (fortes e
rápidas) no tórax até a chegada do socorro especializado, atitude esperada de
quem assiste a parada ocorrer fora de ambiente hospitalar12, frequência maior do que a encontrada na literatura
- 18,7%13. Ressalta-se que há relato de que 75,5% dos
respondentes11 corretamente ligariam para o serviço especializado.
Todavia 72,5% e 94,2% respectivamente da população em geral dos dois estudos já
citados afirmaram não se sentir preparada para socorrer emergências na
comunidade.
Nesta linha, 54,7% dos respondentes do presente estudo
apontaram respostas incorretas sobre as ações iniciais diante de uma PCR, porém
é necessário exaltar que, como na afirmativa liga para o socorro, faz-se boca-a-boca e algumas compressões no tórax
até a chegada do socorro especializado, o trecho liga para o socorro e faz-se compressões no tórax até a chegada do
socorro especializado, são condutas corretas após a identificação de uma
PCR na comunidade5,12, porém as demais afirmativas compostas por estes
trechos foram consideradas incorretas, por ser avaliada no seu contexto geral,
e conter intervalos com erros básicos,
boca-a-boca – conduta retirada do protocolo de RCP em adultos para leigos5,12. A atual orientação é para que seja dada ênfase às
compressões no tórax, buscando facilitar a execução pelo socorrista não
treinado e assim obter maior iniciativa por parte deste público.
Se o SBV for iniciado imediatamente a chance de uma
vítima de PCR sobreviver pode duplicar ou até mesmo triplicar16, e iniciado nos primeiros 4 minutos a taxa de
sobrevida poderá chegar a 75% e após 15 minutos, ela cai para média de 5%8. Em contraponto, sendo o diagnóstico inadequado e
demorado, além da adoção de condutas incorretas e ineficientes, as sequelas
neurológicas serão graves e o fim da vida antecipado2,4.
A maioria dos respondentes demonstrou conhecer o
local das compressões torácicas, com o posicionamento das mãos no meio do peito
sobre a região esternal entre os mamilos12. No entanto, tanto a força de compressão e
consequente profundidade, quanto a frequência de realização foram respondidas
de maneira incorreta fato também observado em estudos anteriores11,17, mesmo após treinamento em manequins de alta
precisão, os resultados mostram-se insatisfatórios no quesito profundidade17. Neste contexto, quanto maior a frequência (superior
à 120/minuto) menor é a profundidade torácica, a exemplo quando o reanimador
implementa frequências acima de 140/minuto há um déficit de até 70% na
profundidade.
Desta forma, frequências menores que 100 ou maiores
que 120/minuto, ou ainda profundidades menores que 5 ou maiores que 6
centímetros geram fluxos sanguíneos inadequados12. O início
das compressões fortes e rápidas deve ser imediato12,18 visto que estas ações são fundamentais para o
fornecimento de fluxo sanguíneo, oxigênio e energia para órgãos críticos, como
coração e cérebro e, quando realizada corretamente aumenta a taxa de sobrevida5,12.
O cenário encontrado sobre a percepção do
desfibrilador externo automático neste estudo representa a realidade de como a
população é carente de informações visto que 9,3% dos respondentes referiram
conhecer o que é o desfibrilador. Embora preocupante é necessário enfatizar que
na região avaliada no presente estudo, não é conhecido nenhum local com a
disponibilização de um DEA e, portanto, talvez seja um dos motivos deste
resultado. Este equipamento verifica o ritmo cardíaco e condiciona a
desfibrilação em casos de fibrilação ventricular (FV) ou taquicardia ventricular
sem pulso (TVSP) e, portanto, pode interromper a PCR e reorganizar o ritmo
cardíaco12.
O DEA está inserido no terceiro elo da cadeia de
sobrevivência, ou seja, o leigo ao iniciar uma reanimação, deverá solicitar que
alguém chame o socorro especializado e busque um DEA, iniciar compressões no
tórax e ao chegar o DEA, desfibrilar imediatamente. Este procedimento pode ser realizado
por profissional de saúde ou pelo leigo12 e
quando usado precoce e corretamente, melhora o prognóstico das vítimas no
pré-hospitalar9,12,19. Estudos realizados no Japão20 e nos Estados Unidos19 evidenciam estes resultados com índices de
sobrevivência sem sequelas neurológicas aparentes de 46,6% de uma amostra de 43.762
vítimas de PCR por fibrilação ventricular e 46,3% de uma amostra de 203
acometidos, respectivamente. Em ambos os estudos, as vítimas foram atendidas
por leigos no ambiente extra hospitalar e receberam terapia elétrica com o DEA.
Em contraponto, no Brasil, estudos apontam que as
pessoas da comunidade apresentam conhecimentos limitados sobre o SBV9,13, especialmente quanto ao uso dos desfibriladores, o
que pode ser contornado mediante a participação em cursos e atualizações em SBV9,12,21.
A maioria dos respondentes demonstrou conhecer o
serviço a ser acionado em casos de urgência e emergência na comunidade na cidade
de Cáceres-MT, assim como verificado em estudos anteriores11,13, o que é bastante relevante já que esta conduta faz parte do primeiro elo da
cadeia de sobrevivência no SBV12, sendo que todos estes estudos consideraram os dois
serviços principais de solicitação de socorro (192 e 193). Porém, quando considerado
apenas o 192, estudo
prévio5 apontou que dentre as 814 pessoas avaliadas em
quatro cidades brasileiras, somente 35% reconheciam o 192 como número telefônico nacional de
emergência médica.
Considerando os resultados desta pesquisa torna-se
evidente que os leigos possuem dificuldades para apresentar um conhecimento
teórico e iniciativas eficientes frente a uma PCR no adulto na comunidade. Neste
sentido, evidencia-se que a assistência e iniciativas prestadas por pessoas da
comunidade são fracas e inadequadas, em função da insegurança, da demora na
identificação da PCR e nas ações básicas de socorro16. Desta forma, a American Heart Association12 e outros autores11,13,16 reforçam a necessidade de planejamentos em saúde coletiva
com amplo investimento e abordagem reflexiva sobre este assunto ao público em
geral por meio de materiais ilustrativos, divulgação nas mídias, escolas,
universidades e disposição de desfibriladores para acesso ao público, a fim de
treinar e capacitar estas pessoas - para
melhorar o conhecimento, as iniciativas e ações dos transeuntes com a intenção
de aprimorar o cenário atual e diminuir a morbimortalidade nestas emergências
na comunidade.
Sugere-se, portanto, que sejam realizadas ações
sociais com vistas a orientações e treinamentos para este público como
implementação de projetos que ensinem condutas de reanimação em PCR nas escolas
em parcerias com as faculdades da área da saúde, e promova-se ações de
certificação com os participantes durante os testes para condutores ou ainda
quando do registro da Carteira de Trabalho. E ainda que novas pesquisas sejam
realizadas para investigar como os socorristas sem instrução promovem suporte
básico de vida na comunidade de forma prática, visto que no presente estudo não
foram contemplados conhecimentos baseados em prática, o que se constitui a
limitação do estudo.
CONCLUSÃO
Aproximadamente metade dos leigos avaliados sabem
identificar a PCR e proceder condutas adequadas como chamar o socorro
especializado bem como o local em que se deve fazer as compressões no tórax.
Entretanto apresentam saberes limitados que podem comprometer o prognóstico das
vítimas, especialmente quanto as iniciativas, a profundidade e quantidade de
compressões no tórax e sobre o uso desfibrilador externo automático. Embora o
presente estudo tenha se pautado apenas na avaliação teórica dos conhecimentos
e condutas que seriam adotadas por um leigo e não em simulações realísticas, os
resultados obtidos colaboram com a possibilidade de simplificação do treinamento para leigos, por ter possibilitado a
identificação dos aspectos de maior
confusão e erros, que devem ser enfatizados nesse tipo de treinamento, sugerindo-se
como oportunidades para sua realização a oferta de
cursos de certificação para a população em geral quando da habilitação ou ainda
como requisito para o registro da Carteira de Trabalho.
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