ARTIGO ORIGINAL

ESCALADA ESPORTIVA NO BRASIL, PERSPECTIVAS PARA OS ATLETAS DE COMPETIÇÃO

SPORT CLIMBING IN BRAZIL, PROSPECTS FOR COMPETITION ATHLETES

 

Dimitri Wuo Pereira¹, Diogo Henrique Lima Prado2

 

Data de Submissão: 25/05/2019 Data de Publicação: 26/08/2019

Como Citar: PEREIRA, Dimitri Wuo; PRADO, Diogo Henrique Lima. Escalada esportiva no Brasil, perspectivas para os atletas de competiçãoRENEF, [S.l.], v. 9, n. 13, ago. 2019. ISSN 2526-8007.

Disponível em: http://www.renef.unimontes.br/index.php/renef/article/view/238/352. Acesso em:

dói: https://doi.org/10.35258/rn2019091300029

 

RESUMO

A escalada é um esporte que se expandiu muito no Brasil na última década e tende a continuar crescendo, agora que a modalidade será incluída nos Jogos Olímpicos do Tóquio, em 2020. A busca por resultados pelos atletas justifica esta pesquisa que visa conhecer o perfil dos escaladores brasileiros. A pesquisa com abordagem qualitativa foi desenvolvida com 81 sujeitos, homens e mulheres que competiram no Campeonato Brasileiro de Boulder em 2018. A análise de conteúdo permitiu revelar que os atletas brasileiros são experientes, porém sua idade é bem maior do que de atletas de competições internacionais. Muitos participantes preferem praticar em rocha, o que diferencia da especificidade da escalada indoor, que é competitiva. Não há apoio para a maioria dos escaladores, nem tampouco, uma massificação da prática nas regiões mais carentes do Brasil. O treinamento dos atletas nem sempre é acompanhado por um especialista e há uma distância entre os professores de Educação Física e a escalada esportiva.

 

Palavras chave: Escalada esportiva. Competição. Educação Física.

 

ABSTRACT

Climbing is a sport that has expanded in Brazil in the last decade and tends to continue growing especially now that modality will be included in Tokyo Olympics Games in 2020. The search for results by the athletes justifies this research that aims to know the profile of Brazilian climbers. The search with a qualitative approach was developed with 81 subjects, men and women who competed in Brazilian Boulder Championship in 2018. Content analysis revealed that Brazilians athletes are experienced, but their age is much higher than internationals competitors. Many participants prefer to practice in rock, which differs from the specificity of indoor sport climbing who is competitive. There is no support for many sport climbers, nor is there a massification of practice in the poorer places in Brazil. The training of athletes is not always accompanied by a specialist and there is a distance between the Physical Education teachers and the sport climbing.

 

Key words: Sport climbing. Competition. Physical Education.´

 

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¹Universidade Nove de Julho, Departamento de Educação - Educação Física

2Universidade de São Paulo. Departamento de Educação - Educação Física

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INTRODUÇÃO

            Escalar é uma habilidade motora que envolve subir em algo, que pode ser desde uma escada, uma cadeira, uma montanha, uma rocha, ou qualquer local íngreme que exija do ser humano o uso do corpo para se locomover verticalmente no ambiente. A partir do século XVIII ela foi se configurando como uma cultura, com hábitos e costumes próprios europeus. No século XX a escalada se firmou no mundo com a conquista das maiores montanhas do planeta e a transformação da prática numa atividade de lazer que engloba riscos potenciais e muita determinação dos escaladores (PEREIRA, 2010).

O aparecimento na Europa, de paredes artificiais remonta a metade do século passado, mas no Brasil essa atividade é mais recente, tendo surgido no início dos anos 1990. No século XXI as paredes ampliaram-se a modernizaram-se, tornando-se mais populares e atingindo não somente escaladores que se aventuram nas montanhas, mas também todo tipo de pessoa interessada em se divertir e treinar seu corpo no desafiante mundo vertical (PEREIRA; NISTA-PICCOLO, 2010). Em Tóquio nos Jogos Olímpicos de 2020, ela será apresentada como demonstração, tal a amplitude que o esporte tomou no mundo. Conforme surgiram mais adeptos no esporte, também cresceu a procura por profissionais para atuarem desde a iniciação ao alto rendimento.

A escalada esportiva é considerada como a atividade na qual o praticante deve ascender usando suas habilidades corporais tendo nos equipamentos a proteção para as quedas, isto é, não é permitido pendurar-se ou segurar-se nos materiais para subir e o objetivo é não necessariamente atingir o cume de uma montanha, mas escalar vias (caminhos) cada vez mais difíceis de uma superfície que pode ser na rocha ou em paredes artificiais (MONTEIRO; BONONE, 2014).

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A escalada indoor é um esporte no qual prevalece o uso do corpo para ascender paredes artificiais que imitam a natureza. Há prevalência do uso de força de membros superiores, de equilíbrio e de técnicas corporais para atingir as vias que são criadas para que os atletas testem seus potenciais e a escalada competitiva se divide em boulder que é a escalada de blocos com altura não superior a 5 metros, velocidade na qual o escalador deve atingir o topo no menor tempo possível e dificuldade em que se escalada paredes com inclinação negativa e uso de equipamentos de proteção devido a alturas superiores ao boulder  (BERTUZZI; LIMA-SILVA, 2013).

No Brasil o Campeonato Brasileiro de Escalada é organizado pela ABEE (Associação Brasileira de Escalada Esportiva), entidade filiada à IFSC (International Federation of Sport Climbing) que é a gestora máxima do esporte no mundo. Segundo a ABEE (2019), o Campeonato Brasileiro é disputado nas modalidades de dificuldade (escalada em que o praticante leva a corda para o topo e faz pontos quanto mais alto ele sobe), velocidade (na qual a corda já está presa ao topo e vence quem chegar primeiro) e boulder (prática que usa apenas colchões como segurança e o atleta soma pontos ao atingir os pontos mais elevados de paredes com cerca de 5 metros de altura).

Em 21 de Abril de 2018 ocorreu a primeira etapa do Campeonato Brasileiro de Boulder, no Ginásio Casa de Pedra em São Paulo, desta forma, este foi um momento excelente para conhecer o perfil dos atletas brasileiros desta modalidade de escalada e a partir de então, refletir e discutir sobre as perspectivas que os atletas brasileiros terão em relação a sua futura participação nos Jogos Olímpicos, afinal a escalada não é uma das modalidades nas quais os brasileiros conseguem resultados proeminentes em nível internacional.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Amostra

A pesquisa foi aprovada no comitê de ética da UNINOVE e contou com a participação de 81 atletas, sendo 51 homens e 30 mulheres, tendo como critério de inclusão estar regularmente inscrito no campeonato, sendo que todos os participantes assinaram o TCLE. Os sujeitos foram divididos em grupos, sendo o grupo PRO formado por 47 atletas da categoria profissional (32 homens e 15 mulheres) e o grupo AMA formado por 34 atletas da categoria amadora (19 homens e 15 mulheres).

Procedimentos

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Foi realizada uma pesquisa descritiva exploratória com abordagem qualitativa/quantitativa (GIL, 2009; BARDIN, 2016), para levantamento de informações que permitam traçar o perfil dos escaladores brasileiros e definir algumas características do seu treinamento. Aplicou-se um questionário em atletas participantes do Campeonato Brasileiro, modalidade boulder, em 2018. A amostra foi intencional e não probabilística.

 

Instrumento

O instrumento utilizado foi um questionário com questões fechadas e abertas, baseado em estudo de Pereira e Manoel (2008), que pesquisaram escaladores competitivos participantes do Campeonato Paulista de 2008. O questionário foi respondido na área de isolamento (na qual os escaladores preparam-se para competir), cerca de uma hora antes da competição, de forma a não comprometer o desempenho dos atletas, nem tirar sua concentração na prova. As questões abordaram os dados individuais dos atletas: idade, Estado onde reside, sexo, peso, altura. E as informações a respeito da prática da escalada: tempo de prática, períodos de treinamento, atividades extras à prática da escalada, o acompanhamento profissional dos atletas e sua condição social.

 

Análise de dados

Segundo Bardin (2016) a análise de conteúdo é um tipo de pesquisa que permite descrever, inferir e interpretar dados qualitativos e quantitativos obtidos dos sujeitos pesquisados com fim de compreender questões sociais, comportamentais, econômicas e políticas, mostrando-se adequada para essa pesquisa.

Para os dados quantitativos foram usados média e desvio padrão através do programa Excel for Windows 2010. Para os dados qualitativos foi utilizada a regra de inclusão/exclusão proporcionando a identificação de conteúdos que não se sobreporiam em mais de uma categoria e que fossem homogêneos, então as respostas sobre o tipo de treinamento não interferem na condição financeira do sujeito e a escolha de um treinador não altera a preferência pelo local de prática (BARDIN, 2016; CARLOMAGNO; ROCHA, 2016).  

Em relação à exaustividade, foi necessário criar uma categoria que separasse as respostas sobre a forma do treinamento e o treinador, essa distinção foi necessária porque apesar da legislação garantir que o profissional graduado tem a prerrogativa de desenvolver o treinamento esportivo, isso não especifica a forma como irá trabalhar, além disso, nem todos os sujeitos da pesquisa tem um treinador, fazendo jus ao surgimento de uma categoria exclusiva para esse intento.

Sendo assim ficaram definidas as seguintes categorias: Experiência do atleta; Preferência de prática; Condição socioeconômica; Tipo de treinamento; Presença do treinador.

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RESULTADOS

Experiência do atleta

Os atletas PRO apresentaram média de idade maior do que os AMA, estes valores eram esperados, porque os amadores são aspirantes ao esporte de alto nível e considera-se que um atleta de elite deve ter experiências que o credenciem ao melhor desempenho (BERTUZZI e col. 2001). Entre os homens a idade média ficou em 29,6 anos para os PRO e 23,0 para os AMA, já entre as mulheres a idade média ficou em 28,7 na PRO e 24,0 na AMA.

Apesar da tendência de idade maior aos atletas PRO, evidencia-se que os brasileiros em comparação com os principais atletas participantes da Copa do Mundo de Escalada, realizada em Wujiang na China, em 2018, estão envelhecidos, porque a média dos homens no mundial ficou em 22,7 anos e a média das mulheres foi de 21,8 anos (IFSC, 2018), menores inclusive dos que dos atletas AMA do Brasil.

78,1% dos PRO masculino e 86,6% dos PRO feminino tem mais de 5 anos de prática de escalada, isso demonstra a necessidade de ter um longo período na escalada para obter resultados expressivos em campeonatos, pois como afirmam Mermier e col. (1997) a escalada exige força de membros superiores e das mãos em níveis elevados, porque o corpo fica boa parte do tempo suspenso por esses segmentos e muitos anos de treino devem gerar a adaptação à força necessária neste esporte.

Pereira e Manoel (2008) também observaram que escaladores precisam de um longo tempo de adaptação ao ato de agarrar-se, para que as estruturas articulares das mãos estejam preparadas aos níveis de exigência de pendurar-se por períodos longos, evitando lesões, que podem impedir um atleta de treinar por meses. Na avaliação deste grupo, percebe-se que os atletas de elite treinam a bastante tempo, o que é fator positivo, mas quando se compara a idade dos brasileiros com a dos estrangeiros, verifica-se que nossos atletas são mais velhos, o que demonstra que os atletas estrangeiros devem ter começado antes na modalidade, sendo jovens e experientes.

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Evidencia-se que os estrangeiros iniciam cedo nas competições, Peres e Lovisolo (2006) afirmam que a idade sensível para o desenvolvimento esportivo se dá por volta de 12 anos, porque neste período o jovem consegue melhor adaptar sua condição neuromotora, espacial e cognitiva aprendendo a reagir socialmente e fisicamente às imposições do esporte.

Mesmo que a maioria dos atletas tenha longo tempo de prática no Brasil, nos parece que a exposição ao esporte começou demasiadamente tarde e se perdeu a oportunidade de aprimorar as capacidades coordenativas, pois como apontam Quaine e col. (1997), a relação entre o equilíbrio e a aplicação de força dos membros inferiores nas agarras é decisiva na escalada e o ideal é começar esse trabalho com escaladores jovens que estão numa fase de prontidão para esse aprendizado, para a combinação dos movimentos de membros inferiores e superiores e para a descoberta de habilidades.

A escalada é incentivada nas escolas em países mais desenvolvidos como nos EUA, França, Alemanha, entre outros, o que não ocorre no Brasil e a escola é sempre uma rica experiência de movimento para o surgimento de atletas (PEREIRA, 2010).

 

Preferência de prática

Verifica-se que a maioria dos atletas PRO não expressam uma preferência pela escalada em boulder (40,6% masculino e 33,4% feminino), mesmo em se tratando de um campeonato desta modalidade. Por outro lado, os AMA já demonstram maior interesse pelo boulder do que pela Escalada Esportiva com cordas em prova de dificuldade (68,4% masculino e 46,7% feminino). Reforça-se esse dado apontando que 56,3% dos PRO masculino e 73,4% dos PRO feminino preferem escalar em rocha, ao invés de paredes de escalada, cuja textura de agarras e superfícies dos muros são muito diferentes das condições encontradas na natureza.

O desejo por outros estilos e locais de prática foi verificado também por Cunha (2005) mostrando uma tendência de não especialização, o que parece demonstrar que muitos participantes do Campeonato Brasileiro de Boulder não tem no resultado da competição seu principal foco, pois, o treinamento não direcionado às paredes artificiais e sem sistematização dificilmente vai gerar um desempenho elevado.

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Honorato, Teixeira e Xavier-Filho (2018) entendem que a escalada é vivenciada como uma atividade lúdica por essência e que a prática em rocha, na qual não existem campeonatos, reforça nos dados encontrados nesta pesquisa, que os atletas mais experientes assumem essa postura de preferência por este ambiente. Entende-se que os escaladores não querem desvincular a prática do momento de lazer e diversão, mesmo com a necessidade de se treinar para obter resultados competitivos, eles tentam ajustar o prazer com o desempenho. Verifica-se, entretanto, nas respostas dos menos experientes que há uma tendência de maior especialização para a prática da modalidade competitiva que era o foco deste evento esportivo, o que pode indicar uma mudança deste quadro no futuro e um direcionamento para o esporte competitivo com maior ênfase.

 

Condição socioeconômica

A maior parte dos atletas provém do Sudeste com 75%, ficando a região Sul com 22,5% e a Centro Oeste com 2,5%, isso demonstra uma concentração de participantes das regiões mais desenvolvidas do país e alerta para elitização do esporte, fator que dificulta o descobrimento de atletas, pois uma parcela pequena da população conhece a prática da escalada. Honorato, Teixeira e Xavier-Filho (2018) apontam para a escalada como uma atividade destinada a pessoas com maior poder aquisitivo, devido aos custos de equipamentos, pagamentos dos locais de escalada indoor e deslocamentos para os espaços de natureza com escarpas e montanhas próprias para a prática, assim a prática segue elitizada.

Agregado ao fator social da pouca popularização da modalidade, ainda foi encontrado um dado que amplifica a dificuldade de se tornar escalador competitivo no país. A maioria dos atletas em ambas as categorias PRO não tem patrocinador (68,8% masculino e 53,3% feminino). Sem o aporte financeiro fica ainda mais difícil de empenhar o tempo no treinamento específico que a modalidade requer, ainda mais quando se pretende chegar às Olimpíadas e aos Campeonatos Mundiais.

Os dados referentes às atividades profissionais e ao estudo dos atletas PRO deixam mais claro que falta tempo para se dedicar ao esporte competitivo como ele merece na busca de desempenho realmente profissional. 84,4% dos homens e 80% das mulheres trabalham ou trabalham e estudam, tendo que dividir seu tempo com muitas tarefas que normalmente um atleta de elite não tem que fazer.

O estudo de Monteiro e Bonone (2014) demonstrou que um dos fatores preponderantes para a participação na escalada esportiva competitiva está na motivação dos atletas pelo esporte, talvez aqui esteja a resposta para a superação das dificuldades que os atletas encontram pela falta de patrocínio e de tempo para se dedicar.

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Ressalta-se que o programa Bolsa Atleta do Governo Federal que fomenta a prática esportiva competitiva no Brasil distribuiu 9 bolsas para os escaladores brasileiros em 2018, com vigência para o ano de 2019, isto significa que há algum investimento em para atletas evoluírem no país, mas isto representa menos de 10% do total de atletas que estão participando de Campeonatos Brasileiros de Escalada (ABEE, 2019).

 

Como treinam

Os atletas apresentaram os seguintes dados de peso: PRO masculino 66,5 kg (s= 8,04), PRO feminino 54,8 kg (s= 5,08), AMA masculino 67,4 kg (s= 7,32) e AMA feminino 54,93 kg (s= 7,30). Quanto à altura foram obtidos os seguintes dados: PRO masculino 177 cm (s= 7,08), PRO feminino 165 cm (s= 4,89), AMA masculino 177 cm (s= 7,34) e AMA feminino 162 cm (s= 8,36). Esses dados indicam uma homogeneidade entre peso e altura em relação aos atletas PRO e AMA, tanto na categoria masculina quanto na feminina.

Um dos aspectos fundamentais para o bom desempenho do escalador é o baixo peso corporal e neste quesito atletas PRO e AMA tem dados muito próximos. No masculino o IMC dos PRO ficou em 21,16 (s= 1,49) e do AMA ficou em 23,35 (s= 2,03) os números das mulheres também é similar com 20,14 (s= 1,70) atletas PRO e 20,72 (s= 1,80) atletas AMA. Os dados de IMC dos atletas brasileiros correspondem aos encontrados em estudo de Watts, Martin e Durstchi (1993) com atletas de elite internacional.

Os dados apresentados demonstram que há preocupação na manutenção do baixo peso corporal, provavelmente com baixo índice de gordura, sendo fator seletivo de pessoas que decidem competir na escalada, Bertuzzi e col. (2001) verificaram que aqueles considerados de elite contém menores valores de percentual de gordura do que escaladores intermediários (menos experientes), o que confirma a preocupação com o peso corporal na obtenção de desempenhos superiores.

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Provavelmente, pessoas com IMC e percentual de gordura elevados não se inscrevam em competições por sentir que terão poucas chances de obter um desempenho satisfatório, afinal vencer a gravidade movimentando-se na vertical exige uma boa relação entre o peso corporal total e a força muscular dos membros superiores que serão decisivos na progressão sobre a parede (OZIMEK e col., 2016).

O IMC mais elevado dos atletas AMA masculino do que das mulheres, também foram encontrados por Cunha (2005), em praticantes portugueses. Demonstra-se a necessidade de adequação à exigência do esporte como possibilidade de ascender à categoria PRO em relação ao peso corporal, pois como informam Santos e Cesar (2009) a especificidade da escalada exige baixo IMC, força elevada de preensão manual e uma boa relação entre o peso corporal e a força de membros superiores.

O estudo analisou o volume de treino dos atletas na categoria PRO como se observa no quadro a seguir

Quadro 1-  Treino diário e semanal.

 

Dias de treino

por semana

%

Horas de treino por dia

%

Masculino

1 ou 2

9,4

1 ou 2

21,9

3, 4, 5 ou 6

84,4

3, 4 ou 5

78,1

7

6,2

 

 

Feminino

1 ou 2

26,7

1 ou 2

26,7

3, 4, 5 ou 6

53,4

3, 4 ou 5

73,3

7

19,9

 

 

      Fonte: próprio autor

Observa-se entre os homens um número expressivo treinando entre 3 a 6 vezes por semana, com 3 a 5 horas por dia. Esse volume está em acordo com a maioria das modalidades esportiva competitivas. No caso das mulheres, aproximadamente ¼ das atletas treinam apenas 1 ou 2 vezes por semana, com 1 a 2 horas de treinamento por dia, o que demonstra que a atividade, para estas mulheres, é uma prática de lazer, que melhora o condicionamento físico e gera diversão, afinal um melhor desempenho é encontrado em escaladores com 3 ou mais treinos por semana (CUNHA, 2005). Porém, quando se trata de competição e do interesse em participar de eventos internacionais verifica-se que é um volume incipiente.

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Jalás e col. (2014) demonstraram que há necessidade de um treinamento que melhore a capacidade aeróbia do atleta, pois isso efetiva a economia de energia na escalada e com um volume baixo de treino, dificilmente um atleta atingirá esses níveis desejados de desempenho.

Outro dado importante em relação às mulheres é que quase 20% treinam todos os dias da semana, o que se explica, provavelmente, pela participação em outras atividades complementares ao treino como pilates, alongamento, treino funcional, musculação etc., mas que demonstra um possível falta de descanso que pode levar ao overtraining e à queda de rendimento, principalmente se não houver um preparador físico competente ao lado periodizando a carga de exercício.

Desde a década de 1980, que a organização do treinamento de escaladores utilizando de outras práticas de exercício, de trabalho cardiovascular, de flexibilidade, de treinamento com pesos, de treinamento funcional e de práticas com pranchas suspensas para o fortalecimento especifico das mãos e dedos é recomendado para a melhora do desempenho, tendo na periodicidade dos estímulos, nas variações de cargas e no descanso, pontos fundamentais (LONG, 1993).

Realizar apenas a escalada sem nenhum complemento é o que fazem 8,5% dos sujeitos da pesquisa. Os demais utilizam como complemento atividades, como: alongamento, treinamento aeróbio, treinamento funcional, musculação, yoga e relaxamento. Há também pessoas que optaram por exercícios como: pilates, skate, lutas, cross fit, ginástica, entre outros.

Então, observa-se que ainda há escaladores que não seguem a maiorias das recomendações empíricas e científicas que a história da escalada produziu com o decorrer de sua evolução. Phillips, Sassaman e Smoliga (2012) demonstram que os atletas de boulder são muito exigidos em relação ao sistema ATP-CP e glicolítico devido ao curto tempo de esforço em suas tentativas na competição com alta sobrecarga e que precisam de um bom sistema aeróbio para favorecer sua recuperação de esforço, motivo pelo qual exercícios complementares podem melhorar o desempenho destes atletas.

Presença do treinador

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Verificou-se que 37,2% dos homens e 46,6% das mulheres possuem um treinador, o que representa um baixo percentual para atletas de competição, afinal acredita-se que treinar com o acompanhamento profissional melhore o desempenho dos atletas. Observou-se também que 84,7% dos treinadores do masculino e 78,5% do feminino são praticantes de escalada, revelando que a principal característica do treinador é ser um escalador.

Porém, entre estes, somente 47,3% entre os homens e 57,1% entre as mulheres são formados em Educação Física, revelando que mesmo com a Lei da regulamentação da profissão de Educação Física nº 9696/98, ainda assim, esse requisito não é o mais importante para os atletas, o que demonstra ainda a fragilidade da profissão frente ao mercado de trabalho.

Egerland, Nascimento e Both (2009) em pesquisa com 213 treinadores de diversas modalidades esportivas de Santa Catarina apontaram que destes, 69,2% tem pós graduação, além da formação em Educação Física, os autores também apontam diversos estudos que mostram que o conhecimento de fisiologia, biomecânica, anatomia, medicina esportiva, matemática, física, computação e psicologia são decisivos para o trabalho de um treinador esportivo.

Em estudo com treinadores de surfe verificou-se que a maioria deles não tem formação em Educação Física e na intenção de entender como esses treinadores se prepararam para sua atuação profissional, descobriu-se que a prática do surfe, a interação entre os pares no contexto social do surfe e a observação do trabalho de outros treinadores são os principais elementos da aprendizagem profissional, isto é, um processo informal de desenvolvimento (RAMOS; BRASIL; GODA, 2012). A proximidade entre a modalidade do surfe com a escalada, ambas sendo incluídas em 2020 nas Olimpíadas, indica que na escalada o desenvolvimento dos treinadores deve seguir o mesmo modelo.

Aconselha-se que os atletas que pretendam competir seriamente busquem acompanhamento de treinador, pois a periodização do treinamento e a prevenção de lesões pode ser adquirida com esse profissional, afinal lesões em membros superiores e especialmente nas polias e tendões dos dedos das mãos são frequentes em escaladores e precisam ser evitadas em atletas profissionais desta modalidade (LOGAN e col., 2004).

Concorda-se que a prática da escalada por esse profissional é importante, mas além disso, os conhecimentos em treinamento desportivo devem ser levados em conta na escolha deste profissional. Borin, Prestes e Moura (2007) apontam que conhecimento do modelo competitivo, controle de carga de treinamento e avaliação em conjunto das cargas de treinamento são essenciais do desenrolar da prática do treinamento esportivo, devendo o treinador estar preparado para esse desafio.

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 Treinadores qualificados e que tenham bom relacionamento com os atletas são considerados peças chave no desenvolvimento para o alto rendimento em diversas modalidades, além disso, o treinador é aquele que reúne características fundamentais na evolução esportiva, que são: conhecimento técnico, liderança e planejamento de desafios (PERES; LOVISOLO, 2006).

Costa e Samulski (2005) valorizam a importância do treinador na busca de desempenho mostrando que este é responsável por avaliar a parte física e psicológica dos atletas minimizando o estresse excessivo que pode desencadear o super treinamento e consequente queda de rendimento, dando tempo certo para o descanso e recuperação do atleta. Os autores também recomendam a observação dos conhecimentos da psicologia para lidar com questões de viagens, recursos financeiros, personalidade e a origem social do atleta que influenciam indiretamente no desempenho.

Observa-se que muitos atletas não têm quem os acompanhe porque este é um custo extra e como a maioria não dispõe de patrocínio isso dificulta a manutenção do acompanhamento profissional porém como observa Horst (2003) o treinamento na escalada deve ser feito com a determinação da metas de curto, médio e longo prazo e um treinador especializado pode ajudar efetivamente neste aspecto, pois toda a teoria do treinamento segue por esses parâmetros.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Agora com a Escalada Esportiva como categoria Olímpica há uma maior necessidade de estudos para que possamos entender mais sobre os atletas e sua modalidade, para que se possa aperfeiçoar o treinamento e elevar o desempenho dos escaladores em competição.  

Os dados obtidos nos permitem afirmar que apesar da larga experiência com a atividade de escalada, nossos atletas estão com idade bastante elevada em relação aos estrangeiros, que estão nas melhores posições internacionais, isto demonstra que a prática deve iniciar cedo, para que nossos jovens escaladores possam ter experiência elevada na escalada esportiva indoor o quanto antes, como ocorre com os atletas dos países mais desenvolvidos no esporte. Aqui verificamos a grande necessidade de uma renovação em nossos atletas, é preciso que se possuam estratégias para que a escalada chegue mais cedo aos jovens brasileiros caso, queiramos disputar competições internacionais com chances iguais.

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A preferência de parte dos atletas brasileiros se mostra em descompasso com a modalidade competitiva. Mesmo estando em uma competição de boulder, grande parte de atletas tem por preferência a escalada em rochas, mostrando um distanciamento da especificidade necessária para o melhor desempenho.

Dois problemas surgiram neste perfil, o primeiro refere-se à inexistência de atletas das regiões Norte e Nordeste do Brasil e a grande concentração de competidores do Sul e Sudeste. Reconhece-se que a maior força econômica dessas regiões influencia nestes dados, mas oportunizar o surgimento de escaladores de outras regiões pode trazer a surpresa de descobrirmos grandes atletas no futuro. E o outro problema se encontra no fato de grande parcela de atletas não terem patrocínio para competir e treinar, conciliando treinos, estudos e trabalho, o que limita a dedicação do escalador às necessidades de tempo destinado ao esporte.

Sobre o treinamento no que tange à duração das sessões de treino os atletas estão em alinhamento com o que encontramos em literatura específicas sobre treinamento. O que há um desacordo na categoria PRO seria sobre os dias de treinamento referente aos períodos de 1 a 2 dias e 7 dias, que corresponde a 15,6% do masculino e 46,6% dos atletas do grupo feminino, que não há acordo com a literatura que esses períodos de treinamento gerem benefício para o desempenho do atleta.

Por fim, acredita-se que a utilização de metodologias de treinamento já descritas na literatura sejam essenciais para a obtenção de resultados, o treino pela tentativa e erro, pode gerar lesões, super treinamento e baixo desempenho, pois a quantificação, de carga e descanso e a distribuição do treino em função das competições é fator importante em qualquer modalidade esportiva. Acredita-se que o profissional de Educação Física, que legalmente é aquele que deve atuar nessa área, deve buscar conhecimentos teóricos e práticos para contribuir positivamente com a escalada esportiva nacional e que cabe aos cursos de graduação, extensão universitária e pós-graduação reconhecerem essa modalidade como parte integrante da formação profissional para que a modalidade esteja devidamente alcançada por este profissional.

Outras pesquisas devem ser feitas pra que a escalada competitiva possa se desenvolver mais no Brasil e alcançar os resultados esperados pela comunidade escaladora.

REFERÊNCIAS

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Agradecimentos

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Agradecemos à Associação Brasileira de Escalada Esportiva (ABEE) e o Ginásio Casa de Pedra por permitir que esta pesquisa fosse realizada durante o Campeonato Brasileiro de Boulder.