ARTIGO DE REVISÃO     

 

EFEITOS DA PRÁTICA DO CICLISMO DE ESTRADA NO METABOLISMO ÓSSEO: REVISÃO INTEGRATIVA

EFFECTS OF ROAD-CYCLING ON BONE METABOLISM: INTEGRATIVE REVIEW

Matheus Silveira Gois1

 

Data de Submissão: 14/12/2018 Data de Publicação: 23/05/2019

Como Citar: GÓIS, Matheus Silveira. Efeitos da prática do ciclismo de estrada no metabolismo ósseo: revisão integrativa. RENEF, [S.l.], v. 9, n. 13, p. 13 -, maio 2019. ISSN 2526-8007. Disponível em: http://www.renef.unimontes.br/index.php/renef/article/view/197. Acesso em:

doi:https://doi.org/10.35258/rn2019091300027

 

RESUMO

Estudo realizado através de revisão integrativa da literatura.  A questão norteadora elaborada para a seleção dos artigos foi: a prática do ciclismo de estrada em nível profissional ou amador pode comprometer a saúde óssea? Foram analisados os artigos publicados no período de 06 de junho de 2006 a 31 de dezembro de 2017, disponíveis na íntegra, em português e inglês, nas seguintes bases de dados: PUBMED e Portal de Periódicos CAPES/MEC. Grande parte dos autores apresentaram valores de densidade mineral óssea muito baixos nos ciclistas, alguns atletas apresentaram valores de densidade mineral óssea total regional (membros superiores e membros inferiores) e local (colo femoral, trocânter, L1-L4) significativamente baixa em relação à grupo controle. Devido o suporte de peso, algumas áreas como: coluna lombar, colo femoral e quadril, parecem estar mais vulneráveis à valores de densidade e conteúdo mineral ósseo ainda menores. De fato, ciclistas devem permanecer mais atentos à saúde óssea.

Palavras-chave: Ciclismo de estrada. Saúde óssea. Densidade mineral óssea. Conteúdo mineral ósseo.

 

ABSTRACT

Study carried out through an integrative literature review. The leading question for the selection of articles was: can cycling on the professional or amateur level compromise bone health? The articles published during the period of February 6, 2006 to December 31, 2017 were analyzed, available in full, in Portuguese and English, in the following databases: PUBMED e CAPES/MEC journals. Most of the authors had abnormally low bone mineral density values in cyclists, some cyclists presented values of regional (MMSS e MMII) and local (femoral neck, trochanter, L1-L4) total bone mineral density significantly lower in relation to the control group. Due to the weight support, some areas such as the lumbar spine, femoral neck, and hip appear to be more vulnerable to even lower bone mineral density and density. In fact, cyclists should remain more attentive to bone health.

Keywords: Road-cycling. Bone health. Bone mineral density. Bone mineral content.

________________________________________

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1 - Bacharel em Educação Física pela Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes, MG;

 

INTRODUÇÃO

            O ciclismo não para de atrair novos praticantes, sendo a bicicleta um dos veículos mais utilizados no mundo, podendo ser usada com diferentes finalidades: lazer, treinamento físico, competição e reabilitação (MARTINS et al. 2007).

            Foram produzidas no Polo Industrial de Manaus, 89.609 bicicletas em outubro de 2018, contra 69.761 unidades produzidas no mesmo período de 2017, representando uma alta de 28,5%, o balanço feito ao final do ano de 2017 mostra que a frota nacional de bicicletas tem mais de 70 milhões de unidades, sendo que 2,5 milhões de unidades foram produzidas no referido ano. Esses números desconsideram as bicicletas infantis, pois entram na categoria brinquedo. Este cenário coloca o Brasil como o 4º maior fabricante mundial de bicicletas, dados da ABRACICLO (Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares).

        Para Cyro Gazola, vice-presidente do Segmento de Bicicletas da entidade, o desempenho registrado mostra que o setor vem se fortalecendo e “a bicicleta tem se tornado item de alta demanda nas cidades devido ao seu uso crescente para mobilidade e práticas esportivas”. Dessa maneira, o ciclismo tende a aumentar ainda mais o número de adeptos, contudo, devemos ficar atentos aos impactos da sua prática na saúde.

            No que diz respeito à saúde óssea, estudos como o de Olmedillas et al. (2012) demonstraram que o ciclismo de estrada não tem contribuído de forma relevante para o aumento da massa óssea, sendo que a prática em nível profissional poderia ser mais prejudicial à massa óssea do que sua prática recreativa, ou menos benéfica que o ciclismo cross-country ou combinações de ciclismo com corrida. 

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            A baixa ingestão de cálcio e vitamina D estão associados com a prevalência de osteopenia e osteoporose, a suplementação destes poderia diminuir o risco de fraturas totais e do quadril em 15 e 30%, respectivamente. (WEAVER et al. 2016). Abrahin et al. (2016) indicam que atividades como natação e ciclismo não oferecem efeitos positivos na saúde óssea. Porém, o baixo nível de estímulos piezoelétricos através da atividade física, pode ser um fator impactante no metabolismo ósseo, para Bergman et al. (2011) a detecção e transdução da sobrecarga mecânica nos ossos, são importante regulador da massa e da geometria óssea e essenciais para sua manutenção.

            O efeito piezoelétrico é uma resposta biológica ao estímulo mecânico, onde as tensões mecânicas geram potenciais de respostas, o potencial pode ser positivo ou negativo, assim, a célula óssea identifica e responde com maior ou menor ativação; a intensidade e frequência regulam essa ativação, a resposta negativa está ligada à osteogênese e a positiva com a reabsorção óssea. (GUSMÃO; BELLAGERO, 2009)

            Atividades que geram maior impacto como saltar e correr induzem cargas que são múltiplos de peso corporal, enquanto os esportes como natação e ciclismo, onde a massa corporal é parcialmente suportada podem apresentar cargas muito menores no esqueleto (MEDELLI et al. 2009). Vários fatores podem influenciar a saúde óssea, exemplo: perda excessiva de cálcio dérmico (BARRY;  KOHRT, 2009), interrupção da homeostase do cálcio (BARRY; HANSEN 2011), ausência do efeito piezoelétrico e prolongado tempo de recuperação pós-treinos (OLMEDILLAS, 2012).

            No que tange aos efeitos fisiológicos do ciclismo, aspectos como o tempo e nível de prática, idade, sexo e a associação com outras modalidades são fatores que isoladamente ou de maneira combinada, podem gerar resultados as vezes conflitantes, dificultado desta maneira a sistematização de informações que possam fundamentar a prática do ciclismo aliada à promoção da saúde. É importante ressaltar, que não só o ciclismo, mas qualquer desporto praticado em alto nível, em muitos aspectos caminha no sentido contrário ao da saúde.

            Sendo assim é importante compilar informações relevantes sobre a temática levantada, de modo a contribuir com a preservação da saúde óssea dos praticantes do ciclismo, particularmente o de estrada e adicionalmente disponibilizar subsídios para a indicação ou contra-indicação desta modalidade para indivíduos com diferentes perfis.

            Diante disto o presente estudo questionou se a prática do ciclismo de estrada em nível profissional e/ou amador pode comprometer a saúde óssea, identificando os efeitos na densidade mineral óssea e conteúdo mineral ósseo em determinadas regiões do corpo.

 

DESENVOLVIMENTO

 

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            Estudo realizado através da revisão integrativa da literatura segundo as etapas apresentadas por MENDES et al. (2008) e SOUZA et al. (2010) . A questão norteadora elaborada para a seleção dos artigos foi: a prática do ciclismo de estrada em nível profissional e ou amador pode comprometer a saúde óssea?

            Após consulta no DeCS (Descritores em Ciências da saúde), os seguintes descritores foram encontrados: Bicycling, Bone Density, Bone Diseases. Os sinônimos cycling, road cycling e cyclists, bone mineral density, bone health, osteopenia e osteoporosis foram usados combinadamente durante a fase de busca dos artigos. Foi usado o operador boleano “and” e os descritores e/ou sinônimos deveriam aparecer no título e/ou resumo.

            Como critérios de inclusão definimos a disponibilidade dos artigos na íntegra e gratuitamente, a caracterização dos ciclistas nos perfis profissional, amador envolvido em competição ou praticante por no mínimo dois anos, e o uso do DEXA (absorciometria de raios-x de dupla energia) para avaliar a condição óssea dos ciclistas. Os critérios de exclusão foram artigos repetidos e ser ciclista do sexo feminino, este último pela questão da interferência do ciclo menstrual no metabolismo do cálcio. Foram analisados os artigos publicados no período de 06 de junho de 2006 a 31 de dezembro de 2017, em português e inglês, nas seguintes bases de dados: PUBMED e Portal de Periódicos CAPES/MEC.

            A triagem dos artigos deu-se pela leitura do resumo, os selecionados foram lidos na íntegra com vistas a responder à questão norteadora. Dados referentes às buscas e amostragem final, estão no fluxograma a seguir:

 

Descritores e sinônimos pesquisados                               Estudos identificados com filtros e analisados (Título e Resumo)

Bases de dados e datas das pesquisas                                         Estudos selecionados para análise (Texto completo)

Estudos identificados sem filtros                                                  Amostragem Final

      

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            Na literatura as comparações entre ciclistas e indivíduos sedentários, sugerem que o ciclismo talvez não seja tão benéfico à saúde óssea. A DMO (densidade mineral óssea) e o CMO (conteúdo mineral ósseo) podem ser influenciados por diferentes fatores, nem todos os autores tiveram estas variáveis como objetos diretos de estudo, fatores como marcadores de formação e reabsorção óssea estão ligados ao conteúdo e densidade mineral óssea, fatores hormonais também foram analisados.

            No Pub Med 13 dos 16 artigos foram excluídos por não analisar a relação direta entre ciclismo de estrada e metabolismo ósseo (DMO, CMO e biomarcadores), por fazer referência a outras modalidades de ciclismo ou analisar os efeitos do ciclismo em doenças específicas. No Portal CAPES dos 09 artigos, 04 foram excluídos por não utilizarem absorciometria radiológica de dupla energia (DEXA) como método de análise da DMO e CMO, ou analisarem os efeitos de outras atividades, e não o ciclismo isoladamente. Desta maneira a amostra final foi composta por oito artigos que estão apresentados nos Tabelas 1 e 2.

Tabela 1: Objetivos, delineamentos e áreas analisadas nos estudos.

Autor (Ano)

Objetivo principal

Delineamentos

Área de análise

Barry et al. (2009)

Determinar se há reduções na DMO relacionadas ao treinamento durante uma temporada de ciclismo competitivo.

Experimental, longitudinal prospectivo, analítico

Fêmur proximal, quadril, colo femoral, trocânter, e            coluna lombar.

 

Medelli et al. (2009)

Avaliar o CMO e a DMO de todo o corpo e regiões de interesse em ciclistas profissionais

Observacional,

transversal,

analítico

MMII, MMSS, coluna vertebral e pelve.

 

Campion et al. (2010)

Investigar a DMO em ciclistas profissionais, fornecer dados adicionais.

Quase experimental, transversal, analítico.

Corpo como um todo descrito separadamente

Hinton et al. (2010)

Determinar os efeitos da participação no Tour of Southland em marcadores séricos de formação e ruptura óssea.

Observacional, transversal, analítico.

Sangue, corpo todo.

Nichols et al. (2011)

Examinar as mudanças na DMO total e regional ao longo de 7 anos.

Longitudinal observacional, analítico.

Coluna lombar, fêmur proximal, corpo todo.

Olmedillas et al. (2011)

Descrever o estado ósseo e analisar a massa óssea.

Quase-experimental, transversal, analítico.

Corpo todo, quadril, colo femoral e pernas.

Guillaume et al. (2012)

Avaliar o estado ósseo em ciclistas profissionais.

Observacional, analítico transversal.

Coluna lombar, colo femoral, quadril, rádio distal, antebraço proximal.

Mathis et al. (2013)

Determinar se uma elevação do cortisol antes e/ou após a prova estava relacionada à DMO.

Observacional, transversal, analítico.

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Quadril total, coluna lombar, colo do fêmur, trocânter.

Fonte: Próprio autor

            Entre os artigos selecionados três tiveram características descritivas Hinton (2010); Guillaume (2012); Mathis (2013), outros cinco estudos tiveram características analíticas (comparativos) Barry (2009); Medelli (2009); Campion (2010); Nichols (2011); Olmedillas (2011). Apenas Barry (2009) e Nichols (2011) apresentaram dados longitudinais prospectivos, 1 e 7 anos de exposição, respectivamente, os demais autores fizeram análises transversais. Barry (2009) realizou um estudo experimental. Campion (2010) e Olmedillas (2011) apresentaram delineamento quase-experimental, ambos tentaram estabelecer relação entre VO2 e a DMO mas não apresentaram valores de significância. Medelli (2009), Hinton (2010), Nichols (2011), Guillaume (2012) e Mathis (2013) realizaram estudo observacional.

Para analisar os efeitos do ciclismo no metabolismo ósseo, os autores em sua maioria analisaram áreas que são de interesse ao ciclista, locais que são fundamentais e que são afetados pelas características específicas do esporte.  87,5% analisaram a DMO da coluna lombar, 62,5% verificaram a DMO do corpo todo, e separadamente quadril e colo femoral, 50% trocânter e coluna total, braços e radio foram analisados por 37,5% dos estudos, além de outras áreas como fêmur proximal, fêmur total, e cabeça também foram analisados, todos os estudos analisaram de forma separada mais de um local do corpo.

As áreas analisadas são de extremo interesse aos ciclistas, pois tem relação direta com a biomecânica do esporte, recebem diferentes tipos de cargas e ações musculares e são mais susceptíveis às lesões. Na tabela 2 apresentamos os resultados dos estudos selecionados. 

 

Tabela 2: Dados das amostras, variáveis e efeitos encontrados.

Autor/ano

Amostra

 

Tempo de prática ou participação no ciclismo

Variáveis analisadas

Efeitos

Barry et al. (2009)

n=14, M, idade: 27 a 44 anos.

Ciclistas amadores, competindo em nível regional e estadual.

DMO

DMO Pré → Pós

Femoral ↓

Trocânter ↓

Eixo ↓

Quadril total ↓

Lombar ↔

 

Medelli et al. (2009)

n=23, M, idade: 28,5 (3,9)

10 anos, 2 anos na categoria profissional da UCI.

DMO, CMO, IMC, MLG.

Ciclistas / Controle

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DMO ↓/ ↑

CMO ↓/ ↑

IMC ↔

MLG ↑/ ↓

 

Campion et al. (2010)

n=30, M, idade: 29,1 (3,4)

30 a 35 mil km/ano,

participar de

uma das 3

grandes corridas

da Europa

DMO, consumo de nutrientes.

Profissionais/Controle

DMO ↓ / ↑

Consumo alimentar

 

Hinton et al. (2010)

n=5, M, idade: 18 a 24 anos.

Ciclistas de elite da Nova Zelândia inscritos no Tour of Southland.

DMO, OC, FAO,

CTX-I

Ciclistas / Controle

DMO ↔

Pré → Pós Corrida

OC ↑

FAO ↔

CTX ↑ dia 3, ↓dia 5

 

Nichols et al. (2011)

n=19, M, idade: 40 a 60 anos.

10h/sem, 10 anos competindo

Ingestão de cálcio, DMO

Ciclistas / Controle

DMO ↓ / ↑

Ingesta Ca++ ↑ / ↓

 

Olmedillas et al. (2011)

n=22, M, idade: < de 21 anos.

2 a 7 anos, 10h/semana.

DMO e CMO

DMO / CMO

Corpo todo ↓ / ↓

Quadril ↓ / ↓

Colo Femoral ↓ / ↓

Pernas ↓ / ↓

 

Guillaume et al. (2012)

n=29, M, idade: 26,5 (± 5,3)

Ciclistas profissionais.

DMO, iCa, creatinina, FAO, OC, 25(OH)D, testosterona, IGF-1 e TSH.

DMO ↓

OC ↔

FAO ↔

25(OH) D↓

TSH ↔

IGF-I ↔

Creatinina ↔

 

Mathis et al. (2013)

n=21, M, idade: > 30 anos.

2 anos.

DMO, cortisol, nível de estresse e ansiedade estado.

Pré → Pós

Cortisol ↑

Cortisol não apresentou correlação com a DMO

Legenda: Termos e abreviações – Conteúdo mineral ósseo (CMO), Densidade mineral óssea (DMO), Absorciometria de raio-x de dupla energia (DEXA), Massa livre de gordura (MLG), Cálcio sérico (iCa), Hormônio paratireoide intacto (iPTH), 25-hidroxivitamina D (25[OH]D), 1,25 di-hidroxivitamina D (1,25[OH]2 D), Osteocalcina (OC), Fosfatase alcalina óssea (FAO), Telopeptídeo do colágeno tipo I (CTX-I), Hormônio estimulante da tireoide (TSH), Fator de crescimento semelhante a insulina (IGF-I).

Indicadores –  = Aumentou ou foi maior.  ↓ = Diminuiu ou foi menor.  ↔ = Não alterou ou não apresentou diferenças significativas.

Fonte: Próprio autor

 

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            O ciclismo de estrada praticado em nível profissional ou competidor amador, requer certo nível de treinamento, seja dado em anos, horas, ou quilômetros acumulados. Os estudos selecionados apresentaram diferentes tempos de prática ou método de avaliação do nível dos ciclistas.

            Na amostragem dos estudos selecionados faixa etária entre 20 e 40 anos foi mais pesquisada, 6/8 dos artigos, apenas Nichols et al.(2011) analisou especificamente ciclistas másters, 40 a 60 anos. Olmedillas et al. (2011) analisou comparativamente jovens G1 (< 17 anos) e G2 (17 a 21 anos).

            Como é de interesse comum, todos os autores analisaram a DMO e (ou) CMO Outras variáveis de interesse como índice de massa corporal (IMC), massa livre de gordura (MLG), osteocalcina (OC), fosfatase alcalina óssea (FAO), telopeptídeo do colágeno tipo-I (CTX-I), cálcio sérico (iCA), 25 hidróxi-vitamina D [25(OH)D], fator de crescimento semelhante a insulina tipo-I (IGF-I), hormônio estimulante da tireoide (TSH), creatinina, cortisol, e outros fatores específicos de cada estudo, foram analisados e correlacionados diretamente com a saúde óssea, uma vez que estes marcadores tem seus papéis específicos na formação e reabsorção óssea.

            Barry et al. (2009) randomizou ciclistas para receber doses diárias 1500mg ou 250mg de citrato de cálcio. A perda média de cálcio pela derme durante 2h de corrida foi correlacionada negativamente com a DMO no quadril, colo femoral e eixo femoral, eles identificaram mudanças na DMO em todos os locais demonstrando que esta diminuiu significativamente ao longo da temporada de ciclismo competitivo. Algo interessante foi que, durante a baixa temporada houve tendência não significativa para a recuperação da DMO em algumas regiões (colo femoral) e perda contínua em outros (coluna lombar e trocânter).

            Nichols (2011) analisou e comparou dados no intervalo de sete anos, os testes indicaram que os valores obtidos de DMO dos ciclistas foi significativamente menores que a dos controles em todos os locais, uma porcentagem maior de ciclistas tendeu para osteopenia ou osteoporose, de 84,2 para 89,5% e controles de 50 para 61,1%. Ciclistas que relataram se envolver em atividades com peso e/ou impacto perderam significativamente menos DMO na coluna e colo do fêmur em comparação aos que permaneceram somente com o ciclismo.

20

 
            Apesar de não estar claro, parece que o ciclismo combinado com outras atividades de maior impacto como corrida podem preservar a saúde óssea ou amenizar tais efeitos, em comparação entre ciclistas e corredores Rector  et al. (2008) relatam que os ciclistas adultos do sexo masculino tiveram DMO significativamente menor de todo o corpo, especialmente da coluna lombar, em comparação com os corredores.

            Medelli (2009) e Campion (2010) investigaram a DMO e saúde óssea em ciclistas profissionais. Medelli et al. analisou sua amostra de acordo as especialidades: especialistas em terreno plano, provas contra-relógio, subidas e sprint, os ciclistas contra-relógio apresentaram valores mais altos para DMO, os valores mais baixos de DMO foram encontrados nos especialistas em subidas (montanhas). Ambos os autores identificaram valores menores de DMO para os ciclistas em comparação com controles, dois terços da equipe profissional apresentaram valores muito baixos de DMO em Medelli (2009); em Campion et al. os ciclistas apresentaram valores de DMO total, braços, pernas e local (colo femoral, trocânter, L1-L4) significativamente inferiores aos controles, sendo a DMO total 9,1% menor, DMO regional e local cerca de 16% menor nos profissionais.

            Hinton et al. (2010) realizaram análises relacionadas à DMO e marcadores do metabolismo ósseo. Eles observaram que os valores dos marcadores sofreram alterações, a osteocalcina e o CTX aumentaram significativamente durante a corrida com diferentes padrões temporais e de magnitude, para eles a participação em uma corrida de vários estágios pode não ter efeitos deletérios sobre marcadores do metabolismo ósseo se a ingestão de energia for suficientemente igual ao gasto.

            Lombardi et al. (2012) acompanhou ciclistas durante o Giro D’Italia analisando marcadores e o gasto energético, seus dados apontam para um desequilíbrio do metabolismo ósseo em direção da reabsorção óssea, sugerindo uma possível relação entre o metabolismo ósseo e energético, dadas algumas correlações.

            Os marcadores analisados por Guillaume et al. (2012) estavam dentro da faixa de normalidade, porém, afirmam que os ciclismo não tem efeito positivo na DMO, uma vez que em alguns locais como coluna lombar, os valores dos ciclistas foram menores que os controles de mesma idade.

            O nível de intensidade de treinamento parece influenciar os marcadores bioquímicos da atividade óssea, Maïmoun et al. (2006) analisou respostas do metabolismo ósseo em diferentes intensidade de ciclismo, seus resultados indicam que maiores intensidades induzem distúrbios na homeostase óssea, sugerindo um provável limiar de estimulação óssea. As diferenças dos achados nos estudos relacionados aos marcadores podem ter se dado pelo desenho amostral e de coleta de dados, sendo métodos semelhantes, mas em momentos e estímulos diferentes.

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            Omedillas et al. (2011) compararam ciclistas jovens com controles ativos, observou-se menores valores de CMO, DMO e área óssea nos ciclistas; outra comparação realizada com base nas idades G1<17 anos e G2 – 17 a 21 anos, demonstrou que os ciclistas G1 apresentaram CMO 10% mais baixo nas pernas e área do quadril 8% superior aos controles com mesma idade, ciclistas G2 tiveram CMO inferior a dos controles, além dos menores valores de DMO estarem presentes neste grupo, estas diferenças aumentam quando comparados os grupos G1 e G2; demonstrando que o ciclismo pode afetar negativamente a saúde óssea, o que nos faz questionar se esta prática esportiva pode ser interessante ou não para os adolescentes, uma vez que pode comprometer aquisição óssea.

            Mathis et al. (2013) buscaram determinar uma relação entre cortisol e à densidade mineral óssea, 50% da amostra foi classificada como osteopênica na coluna lombar ou quadril. O nível de cortisol aumentou significativamente de pré para pós-competição, porém, não houve nenhuma correlação significativa com a DMO, um dado relevante foi o aumento da ingestão diária de cálcio estar associado à maior DMO na coluna lombar e colo femoral neste estudo.

            O nível de treinamento do ciclismo parece ser importante quando falamos de saúde óssea, a maior parte dos ciclistas que participaram das amostras dos estudos selecionados apresentaram níveis médios a altos de treinamento, se levar em consideração que a maior parte dos achados mostrou uma diminuição da DMO e CMO nos ciclistas, é notável que entre o volume de treino e a saúde óssea possa existir uma relação inversa (dose/resposta), mas ainda não está claro tal fato. Para Barry (2009) o efeito do ciclismo é provavelmente determinado pelo equilíbrio entre os fatores de formação e reabsorção óssea, e por estarem constantemente em exercício vigoroso, mas com suporte de peso, os ciclistas podem estar mais susceptíveis a perda óssea, considerando que as tensões musculoesqueléticas podem não ser satisfatórias.

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            Regiões como coluna lombar, colo femoral e trocânter, parecem estar sujeitas a menores cargas de impacto, devido ao suporte de peso corporal. Nagle et al. (2011) coloca que a biomecânica do ciclismo pode não estimular adequadamente a formação óssea, especialmente na coluna e quadril, sendo que neste esporte nem coluna, nem colo femoral são expostos às cargas gravitacionais do impacto no solo, para ele o ciclismo pode não ser tão benéfico quanto a corrida ou atividades com pesos; um estilo de vida sedentário pode não ser tão prejudicial quanto o ciclismo, se tratando de saúde óssea.

            Dentro da amostra de Nichols (2011) os indivíduos que relataram participar de treinamento com pesos ou impacto perderam significativamente menos massa óssea na coluna e no colo do fêmur, as diferenças neste estudo podem ter se dado pelos longos anos de treinamento cíclico e pouco tempo com atividade com impacto ou com pesos.

            O metabolismo ósseo (estado hormonal) nos ciclistas parece estar dentro dos intervalos de normalidade, por este fato o metabolismo ósseo parece não ser o principal fator de baixa DMO e CMO, condições mecânicas como a falta de impactos podem ter influência.

            Para tais efeitos deletérios, Guillaume et al. (2012) colocam as condições biomecânicas da posição dos ciclistas, a sustentação de peso e forças musculares mais regulares exercidas em eixo horizontal como fatores influenciadores da saúde óssea.

            Para Olmedillas et al. (2012) o ciclismo de estrada à nível profissional pode ser mais prejudicial à massa óssea, do que sua prática de forma recreativa, sua prática única e exclusivamente não é recomendada para pessoas que correm o risco de desenvolver osteoporose.

            Em consonância Medelli et al. (2009) conclui que ciclistas com pontuações baixas de escores T devem receber orientação nutricional em relação ao cálcio, e realizar exercícios resistidos específicos para o ciclismo, atividades que poderiam promover maior CMO, DMO e melhor microarquitetura.

            Dentro das análises realizadas por Mathis et al. (2013) foi percebido uma correlação entre o aumento na ingestão diária de cálcio e uma maior DMO da coluna lombar e colo femoral, porém seus dados relacionados ao cortisol e a DMO não apresentou correlação significativa, em concordância Maïmoun et al. (2006) demonstrou que a concentração de cortisol sérico diminuiu, mas não foi estatisticamente significativo. O ciclismo induziu nestes grupos variações na homeostase do cálcio e na atividade das células ósseas, as cepas mecânicas geradas pelo ciclismo, a duração, a intensidade parecem ser parâmetros importantes do processo de adaptação óssea.

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            Segundo Bergmann et al. (2011) o carregamento mecânico e a detecção são importantes em todas as idades, construir ossos fortes na infância e adolescência, manter a massa óssea na vida adulta e minimizar a perda na menopausa e envelhecimento. No grupo de adolescentes pesquisados por Olmedillas  et al. (2011) houve interação entre a massa óssea, idade e treinamento nos jovens, uma correlação negativa entre idade, altura, massa muscular, anos de prática e a DMO e o CMO em todas as áreas analisadas pelos autores, demonstrando que o ciclismo possa afetar negativamente a massa óssea durante a adolescência.

 

CONCLUSÃO

            A partir das análises dos dados presentes na literatura investigada, podemos concluir que o ciclismo de estrada não favorece a manutenção da saúde óssea. Devido o suporte de peso, algumas áreas como coluna lombar, colo femoral e quadril, parecem estar mais vulneráveis à valores de densidade e conteúdo mineral ósseo ainda menores. De fato, ciclistas devem permanecer mais atentos à saúde óssea. A ausência ou baixo nível de impacto seja talvez o principal fator ligado a saúde óssea, outros fatores como marcadores de formação ou reabsorção podem auxiliar no monitoramento do equilíbrio entre a reabsorção e formação óssea.

            Atenção ainda maior deve ser dada aos atletas de alto nível, pois estudos que investigaram ciclistas profissionais apresentaram dados de DMO e CMO consideravelmente mais baixos nesta população. Este cenário nos leva a refletir sobre a necessidade de conciliação do ciclismo com outras práticas que favoreçam mais diretamente a preservação da saúde óssea.

 

REFERÊNCIAS

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