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Produção de textos matemáticos: a comunicação entre professor e crianças
Production of mathematical texts: the communication between teacher and children
Educação Matemática Debate, vol. 2, núm. 6, pp. 229-241, 2018
Universidade Estadual de Montes Claros

Artigos


Recepción: 10 Junio 2018

Aprobación: 15 Agosto 2018

DOI: https://doi.org/10.24116/emd25266136v2n62018a01

Resumo: Durante o processo de alfabetização matemática, a comunicação entre professor e aluno se faz por meio da produção de textos matemáticos. Com o objetivo de analisar a comunicação entre professor e crianças do 1º ano do Ensino Fundamental na produção de textos matemáticos a partir de marcadores, apresentamos, neste trabalho, um recorte dos dados do núcleo de Vitória da Conquista. Esses dados constituem parte do projeto de pesquisa “A alfabetização matemática com o uso de um material didático e a produção de textos matemáticos legítimos por alunos do 1º ano do Ensino Fundamental no estado da Bahia”. Analisamos, sob as lentes bernsteinianas, a comunicação entre professor e aluno numa abordagem de pesquisa qualitativa em que foi utilizado o modelo metodológico da linguagem de descrição. Como resultado, constatamos a necessidade de oportunizar as crianças as produções de seus próprios textos, aproximando-se da aquisição do código, no caso da escrita numérica.

Palavras-chave: Marcadores, Textos Legítimos, Alfabetização Matemática.

Abstract: During the process of mathematical literacy, the communication between teacher and student is done through the production of mathematical texts. With the objective of analyzing the communication between teacher and children of the 1st year of elementary school in the production of mathematical texts from the markers we present, in this work, a data cut of the core of Vitória da Conquista. This data are part of the research project “Mathematical literacy with the use of didactic material and the production of legitimate mathematical texts by elementary school students in the state of Bahia”. We analyzed, under the Bernsteinian lens, the communication between teacher and student in a qualitative research approach in which the methodological model of the description language was used. As a result, we verified the need to give children the productions of their own texts, approaching the acquisition of the code, in the case of numerical writing.

Keywords: Markers, Legitimate Texts, Mathematical Literacy.

1 Introdução

No período de 2013 a 2016, quatro núcleos da Sociedade Brasileira de Educação Matemática da Regional Bahia (SBEM-BA) estabeleceram uma parceria em rede para desenvolver o projeto A alfabetização matemática com o uso de um material didático e a produção de textos matemáticos legítimos por alunos do 1º ano do Ensino Fundamental no Estado da Bahia (PAMAT), coordenado pelo Núcleo de Estudos em Educação Matemática de Feira de Santana (NEEMFS). O projeto foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB), com termo de outorga nº 0057/2013.

Sob a coordenação do NEEMFS, o objetivo geral da pesquisa foi o de compreender como o uso de um material didático pautado na ludicidade, na interação entre alunos e no registro matemático poderia criar oportunidades para a produção de textos matemáticos legítimos por alunos do 1º ano do Ensino Fundamental. O material didático em questão foi a Proposta Didática Alfabetização Matemática[1] (PDAM), organizado por Santana et al., (2013), produzida para o ensino de Alfabetização Matemática de crianças baianas no âmbito do Programa Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) com os municípios.

Ao longo do desenvolvimento da pesquisa, o NEEMFS propôs aos núcleos a produção, em conjunto, de marcadores para levantamento dos textos matemáticos legítimos. Entendemos texto como qualquer comunicação que pode ser falada, escrita, visual ou gestual. O texto é compreendido como legítimo quando é reconhecido por quem o comunica como específico daquela comunicação. Os marcadores foram utilizados como procedimento de análise de dados “para levantamento dos textos matemáticos que são reconhecidos e produzidos por alunos do 1º ano do Ensino Fundamental [...]” (LUNA, LIMA e BARBOSA, 2016, p. 888). Os autores citados identificaram oito marcadores que apresentaremos posteriormente.

Com o objetivo de analisar a comunicação entre professor e crianças do 1º ano do Ensino Fundamental na produção de textos matemáticos a partir dos marcadores apresentaremos, neste trabalho, um recorte dos dados do núcleo de Vitória da Conquista.

A análise, por meio dos marcadores, nos possibilitou observar como os alunos se apropriaram ou não da produção do texto legítimo da alfabetização matemática, bem como refletir sobre o papel do professor nessa apropriação. Entendemos por texto legítimo o texto que se adequa ao contexto (BERNSTEIN, 2003).

2 O papel da comunicação na produção de textos matemáticos

Quando se comunica, a criança estabelece uma conexão entre suas noções informais e intuitivas e a linguagem abstrata e simbólica da Matemática que os professores e seus colegas já possuem (PEROVANO, 2011). Assim, conectam seus pensamentos a novos conhecimentos o que possibilita a produção de textos matemáticos legítimos.

A produção de textos matemáticos, no processo de alfabetização matemática, diz respeito a comunicação matemática entre professor e aluno em uma determinada prática pedagógica(BERSNTEIN, 2000). Entendemos prática pedagógica como um dispositivo singularmente humano, tanto para a reprodução, quanto para a produção cultural, com um conjunto de princípios que a regulam, denominado de discurso pedagógico(BERNSTEIN, 2003).

O discurso pedagógico é um princípio recontextualizador da comunicação constituído pelo discurso instrucional e pelo discurso regulativo. Pelas lentes bernsteinianas, a produção dos textos dos professores e alunos se desenvolve por meio do discurso instrucional e regulativo. O discurso instrucional se refere ao que comunicar, ou seja, compreende o que é legítimo falar. Em nosso caso, legitima a produção de textos matemáticos. Já o discurso regulativo se refere ao como acontece a comunicação, ou seja, como produzir os textos. Este discurso legitima como acontece a produção dos textos, no caso, dos textos matemáticos. Os discursos instrucional e regulativo vão validar ou não a produção de textos matemáticos legítimos.

Os marcadores nos ajudaram a analisar como os textos foram produzidos pelos professores e alunos bem como o que comunicaram sobre o discurso da alfabetização matemática.

Os marcadores nos indicaram a aproximação ou distanciamento do texto legítimo, conforme o discurso da alfabetização matemática. Além disso, nos indicaram como o Discurso Pedagógico está modelando essa aproximação ou distanciamento, por meio do Discurso Regulativo e do Discurso Instrucional.

Neste trabalho, nosso foco está nessa relação entre esses discursos, pois no Discurso Regulativo (normas, atitudes, valores), está embutido o Discurso Instrucional, que neste estudo se referem aos textos da alfabetização matemática produzidos com o uso do PDAM, para o qual

a proposta conta com a turma de Supermatemáticos que refere-se a personagens infantis que remetem, de forma lúdica e fictícia, um grupo de crianças que exploram variadas situações que envolvem o campo do conhecimento matemático convidando às crianças a participar da aventura que é estudar Matemática.

A PDAM para o 1º ano compreende a Matemática para os anos iniciais do Ensino Fundamental com características multiformes, com nuances na arte, na música, nas ciências naturais e humanas, contemplando jogos e brincadeiras por todo o seu caminhar. (TAXA, SANTANA e PEROVANO, 2017, p. 128)

Como frequentemente professores seguem o livro didático quando organizam suas aulas (ZABALA, 1998), consideramos na pesquisa a proposta didática, pois era utilizada, na época de realização do projeto, pelas escolas baianas como material didático. Dessa forma, ponderamos que há na referida proposta um discurso instrucional cuja intenção das autoras será interpretada pelo professor.

Nessa interpretação, ao implementar as sugestões apresentadas pelo material didático, os professores podem reproduzir (propõem a seus alunos uma atividade conforme apresentada nos materiais curriculares), adaptar (modificam as atividades a partir de suas experiências em sala de aula; de seus conhecimentos, objetivos e crenças; e das necessidades de aprendizagem de seus alunos) e improvisar (fazem alterações nas atividades durante o desenvolvimento da aula para atender às ações espontâneas dos alunos, sem planejamento prévio) ao utilizar os materiais curriculares nas situações reais de sala de aula, mobilizando seus conhecimentos, como destaca Brown (2009).

O referido autor ressalta que nenhuma destas ações – reprodução, adaptação e improvisação – é superior ou inferior à outra. As mesmas não dependem da experiência do professor, tratam-se de escolhas que não caracterizam a qualidade do ensino, evidenciam as formas que os materiais curriculares contribuem para a prática do professor. Em nosso caso, expõe as formas que a PDAM contribui para a comunicação na produção de textos matemáticos.

3 Caminhos metodológicos

A abordagem da pesquisa adotada foi a qualitativa que, de acordo com Lüdke e André (1986), preocupa-se com o processo em lugar do produto, que se torna importante na produção de dados de determinado grupo investigado, verificando como ele se manifesta nas interações cotidianas numa tentativa de capturar a perspectiva dos participantes.

Fizemos uso do modelo metodológico da linguagem de descrição (BERNSTEIN, 2000) que possibilita uma relação dialética entre teoria e empiria por meio da linguagem interna e externa. A linguagem interna diz respeito à teoria, enquanto que a linguagem externa são modelos ou proposições oriundas da linguagem interna de descrição (LUNA, LIMA e BARBOSA, 2016;LUNA, SANTANA e MENDUNI-BORTOLOTI, 2018).

Conforme Luna, Santana e Menduni-Bortoloti (2018, p. 219), "a teoria oferece lentes para que o pesquisador produza o que está identificando na empiria, por meio da teoria, de modo que um alimente o outro". Em nosso caso, foi o que ocorreu ao usarmos os marcadores para analisar a comunicação entre professores e crianças na produção dos textos matemáticos legítimos.

Os marcadores foram produzidos colaborativamente e depurados pelos núcleos numa relação dialética entre a teoria de Bernstein (2000) e a empiria (material didático). Luna, Lima e Barbosa (2016) produziram oito marcadores: contexto de referência, relação pedagógica, uso da linguagem matemática, sequenciamento das aulas, orientação pedagógica, avaliação, distribuição e práticas de sala de aula. Para evitar repetições iremos apresentar cada um deles na seção de resultados e discussões.

Nesta pesquisa fez parte também da empiria a filmagem, que proporciona inúmeras possibilidades de observação do discurso dos indivíduos. Com o uso da filmagem, é possível “[...] registrar não só momentos de contra-argumentações, mas diversos momentos de adesão que podem ser notados pelo silêncio ou por expressões, quando o outro fala ou quando um sujeito reconstrói seu discurso com base na hipótese do outro” (POWELL e SILVA, 2016, p. 28).

Foram filmadas dez aulas, neste texto apresentaremos um recorte da aula que se refere a 2ª etapa, 7ª semana, 2º dia da PDAM, do 1º ano do Ensino Fundamental. O 2º dia de todas as etapas tiveram como foco a formalização da leitura e escrita numérica, por isso foi selecionado. O material didático possui a seguinte estrutura:

• Manual do Professor;

• Caderno do Professor – Jogos, Fichas e Montagem;

• Cartazes Didáticos do Professor;

• Caderno de Atividades do Aluno;

• Caderno do Aluno – Jogos, Fichas e Montagem.

A Figura 1 ilustra parte do material que compõe a Proposta Didática Alfabetização Matemática (PDAM), referente ao 1º ano do Ensino Fundamental.


Figura 1
Alfabetização Matemática 1º ano, Proposta Didática para o Professor e Caderno de Atividades do Aluno, respectivamente
(SANTANA et al., 2013)

Participaram da pesquisa 27 alunos do 1º ano do Ensino Fundamental de uma escola municipal, que no período da coleta de dados possuíam entre 6 e 7 anos de idade, uma professora e uma monitora da turma.

A seguir, apresentamos parte das tarefas do 2º dia, 7ª semana e a análise da produção dos textos matemáticos por meio dos marcadores.

4 Um olhar para o estudo realizado

Conforme já anunciamos anteriormente, a análise da comunicação entre professor e alunos na produção de textos matemáticos, a partir dos marcadores em sala de aula, considerou a PDAM. A principal característica desta proposta é a ludicidade, ela possui também orientações que buscam estruturar o processo educativo e as práticas trabalhadas nas aulas de Matemática a partir da ótica da mediação do professor, constituindo-se em um material curricular inovador. Todas as aulas da PDAM são divididas em três momentos, conforme ilustrado na Figura 2.

A análise é feita observando os oito marcados em cada momento, mas como o espaço para a escrita é limitado, vamos discutir alguns dos marcadores em cada momento, de forma que os oito sejam explanados ao longo desta seção.


Figura 2
Extrato da Proposta Didática Alfabetização Matemática
(SANTANA et al., 2013, p. 95-96)

O momentomatematizar com jogos e desafios prioriza o fazer matemático em grupos (duplas, trios, quartetos) e tem como princípio desafios e situações-problema. A dinâmica desse momento prioriza o primeiro contato com o conceito ou conteúdo matemático que se planeja abordar no respectivo dia. O segundo momento matematizar na roda de conversa prioriza o fazer matemático por meio da socialização e registros coletivos dos saberes das crianças. É um momento que também implica mudança conceitual em razão da mediação do próprio grupo que interage e propõe novas argumentações diante do que foi realizado no momento anterior (matematizar com jogos e desafios). O último momento, matematizar com registros, prioriza o fazer matemático por meio do registro individual da criança no seu próprio Caderno de Atividades e, a partir de sua produção, realizar a interface entre as notações pessoais e a formalização matemática. Objetiva avaliar a produção do texto escrito pelas crianças.

O primeiro marcador tem a Matemática como contexto de referência, pois as tarefas contempladas nos três momentos da 2ª etapa, 7ª semana, 2º dia da PDAM, utilizam elementos que pertencem à comunicação matemática, como por exemplo, produzir um número de três algarismos ou dado um número, escrever outro maior.

O segundo marcador, práticas da sala de aula, prevê a prática pedagógica como cenário investigativo ou como paradigma do exercício. A natureza das atividades propostas pela PDAM fez com que os autores Luna, Lima e Barbosa (2016, p. 897) descartassem o paradigma do exercício, uma vez que "[...] a sequência de tarefas pensadas, só pode ser encaixada na perspectiva de cenários para investigação, pois os alunos se envolvem no processo de exploração [...]". Afirmamos que neste tipo de cenário o aluno socializa suas explicações e argumentações, além de serem convidados a ouvir seus colegas. Podemos observar que na proposta de atividade da PDAM, no primeiro momento os alunos são convidados a escrever três números em que aparecesse o numeral 8 em sua formação; no segundo momento, quando os alunos precisavam analisar os números e a posição do numeral 8 na formação dos números, o que justifica a perspectiva de investigação.

Contudo, a comunicação da professora e monitora, em sala de aula, na produção do texto se caracterizou pelo paradigma do exercício (SKOVSMOSE, 2000), cujo modo de ensinar Matemática não se faz com a participação dos alunos, o professor diz como o aluno deve fazer (LUNA, LIMA e BARBOSA, 2016). Observemos o discurso regulativo (como) da professora e monitora no excerto 1 (da filmagem) esclarecendo a afirmação feita acima. A professora e monitora dividem a sala em trios, coloca uma mesa à frente dos alunos com as fichas e chama algumas crianças:

Monitora: Agora eu vou pegar o trio de V. com os alunos G. e K. [as letras maiúsculas referem-se aos nomes dos alunos]

Professora: G. já tem o número 8.

Monitora: G. vai ser o número 8. [a monitora entrega a ficha com o número 8 para o aluno]

Monitora: Você escolhe um número e V., outro.

V. K. primeiro.

Professora: Que número é esse K? [o aluno responde outro número, a monitora diz que não e a professora volta a indagar]. Que número é esse K?

G. Nove.

Monitora: Você vai por na frente ou atrás do oito?

K. Do lado [a monitora pega a ficha e coloca do “lado” do oito sem indagar se aquele era o lado que o aluno queria]

Professora: V. vai escolher um número. Que número é esse V.?

Monitora: Cinco [respondeu automaticamente] quantos algarismos tem esses números? [os alunos respondem três e a monitora fala para os alunos como eles devem escrever os números na lousa].

(Excerto 1 – Matematizar com Jogos e Desafios, Filmagem em 15 set. 2015)

O texto produzido pela professora e monitora se distanciou do cenário de investigação. A professora e a monitora adaptaram a atividade indicada pela PDAM e por regularem a escolha dos números pelos alunos, conforme pode ser percebido no excerto 1, podemos inferir que o isolamento foi mais forte na Relação Pedagógica. A Relação Pedagógica, terceiro marcador, se refere à comunicação estabelecida entre professor e aluno, cujo controle varia do isolamento forte ao fraco (LUNA, LIMA e BARBOSA, 2016). Caracterizamos a comunicação entre professora, monitora e crianças, conforme excerto 1, com isolamento forte, porque a professora e monitora regularam a comunicação.

A orientação na PDAM é para que os alunos façam suas escolhas pelos algarismos e formem seus números socializando suas escritas no quadro, ou seja, seus textos matemáticos. Isso significa, pelas lentes bernstenianas dos marcadores, que o controle da comunicação seja enfraquecido na relação pedagógica, para que os alunos comuniquem seus próprios textos matemáticos. Assim sendo, o isolamento é semiforte. Entretanto, a condução da professora e monitora (discurso regulativo) se mostrou diferente do que foi proposto pela PDAM, coadunando com o paradigma do exercício.

Neste mesmo sentido as tarefas 1 e 2 do momento matematizar com jogos e desafios, Figura 2, se caracterizaria com Rigor Fraco no que se refere ao Uso da Linguagem Matemática, quarto marcador, pois, há possibilidades de produção de diferentes textos por parte dos alunos. O Rigor Fraco acontece quando "a tarefa apresenta um menor controle do professor, levando o aluno a produzir um maior número de textos diferentes, aumentando as possibilidades de o texto produzido não ser legítimo" (LUNA, LIMA e BARBOSA, 2016, p. 894). Entretanto, a prática da sala de aula pautada no paradigma do exercício, mostrou um maior controle por parte da professora e da monitora na busca pelo texto legítimo, o que caracterizou o uso da linguagem matemática com rigor forte. Como a atividade foi adaptada, voltando-se para o rigor forte, ponderamos que houve limitação das possibilidades de produção do texto legítimo por parte das crianças.

Com o propósito de analisar a comunicação entre professor e crianças na produção dos textos matemáticos produzidos em sala de aula a partir dos marcadores, apresentamos o excerto 2, quando a professora e monitora fazem a leitura de alguns números escritos na lousa, em conjunto com os alunos.

Monitora: Turminha… Oh, presta atenção! Desses números que vocês escolheram aqui na mesa, qual foi o menor? Deixa eu ver quem vai acertar.

Os alunos falam 23, 28, 6, 24

Monitora: 23? [...] Não. Vem G. [a aluna move-se até a lousa].

Professora: Qual é o menor número?

Os alunos continuam falando 23.

Monitora: Calma, mas aqui dentro destes números [a professora aponta, para a aluna, os números escritos no quadro]. Não tá 23. É só entre esses que eles escolheram. É só circular esse número que o amigo tá falando: 28 é só passar um círculo no 28 [indica o local em que o 28 está escrito].

Professora: Vamos deixar ela procurar, onde está o 28 [a aluna circula].

Monitora: G. identificou! Esse é o menor [escreve a palavra menor]. Agora vamos identificar o maior [um aluno grita 895, ela chama o aluno].

Professora: Vai circular o maior número com três algarismos [o aluno circula o número e ela escreve a palavra maior].

Monitora: agora vocês vão registrar estes números no livro.

(Excerto 2 – Matematizar na Roda da Conversa, Filmagem em 15 set. 2015)

O quinto marcador, Sequenciamento da Aula, refere-se à forma com que a tarefa é proposta aos alunos. A professora e a monitora produziram um discurso regulativo de forma diretiva, ou seja, mostraram os procedimentos que os alunos precisavam utilizar para a solução, como: "É só circular esse número que o amigo tá falando: 28 é só passar um círculo no 28 [indica o local em que o 28 está escrito]". Além disso, a monitora escreve a palavra menor ao circular o número menor (discurso instrucional).

A Distribuição, sexto marcador, diz respeito ao conteúdo do currículo que está sendo ensinado e se a distribuição deste nas tarefas, são ou não oportunidades para aprendizagem. Uma das perguntas indicadas na tarefa do excerto 2 é indagar aos alunos como sabem, dentre 4 números, qual é o maior deles. Esta distribuição, na proposta didática, classifica-se com nível alto, pois requer investigações por parte dos alunos, além da produção de um texto matemático legítimo. Entretanto, a professora e monitora limitaram às investigações. Com isso, a distribuição apresentou-se em nível baixo, pois limitou-se a fazer o que a professora ou monitora disseram para fazer (discurso regulativo), como por exemplo, um círculo em um determinado número, sem explorar porque a resposta era aquele número.

O último excerto mostra como a professora direciona para a produção do texto matemático legítimo: "Professora: o que vocês vão fazer aqui? (fazendo referência para a atividade 2, matematizar com registro, Figura 3) [...] um número maior que 25 [discurso instrucional – explica a criança o que fazer]. E maior que 42, você vai colocar nessa linhazinha. [...]" – mostra a criança como fazer – discurso regulativo.

Figura 3
Produção do texto matemático legítimo por parte dos alunos

(Dados da Pesquisa

O Sequenciamento, sétimo marcador, é Diretivo, pois a tarefa é estruturada e explicita de modo claro o que precisa ser feito. Identificamos a produção do texto matemático de forma legítima na Figura 3. As três atividades que compõem o momento Matematizar com Registros apresentam o sequenciamento diretivo, como ilustrado na Figura 3, em que professora reproduziu, ou seja, conduziu sua prática, neste momento da atividade, conforme foi apresentada pela PDAM.

Nas atividades não há indicação explícita de como o professor poderá avaliar as produções dos textos matemáticos das crianças. Segundo Luna, Lima e Barbosa (2016) quando isso ocorre temos uma avaliação implícita. O último marcador, a Avaliação, que neste caso se mostrou implícita. Contudo, isso não representa que a professora não poderia utilizar do discurso da criança para aproximá-las da produção do texto matemático legítimo, mesmo não havendo por parte da PDAM orientações de como fazer isso no momento do Matematizar com Registro.

Ao utilizarmos os marcadores para analisar a comunicação entre professor e crianças na produção de textos matemáticos no processo de alfabetização constatamos, assim como Luna, Lima e Barbosa (2016), a necessidade de oportunizar às crianças as produções de seus próprios textos, aproximando-se da aquisição do código, no caso da escrita numérica.

Além disso, identificamos a imprescindibilidade do trabalho de formação continuada com professores dos anos iniciais, pois, pode contribuir para o (re)pensar da prática e a partir dessa reflexão modificar e transformar as suas crenças e seu fazer pedagógico (PEROVANO, 2011).

Entendemos que, com a formação continuada, os professores se sintam amparados quando resolvem mudar as práticas em sala de aula, pois o caso aqui apresentado mostra que mesmo com o uso de um material que permite a participação das crianças, ou seja, uma relação pedagógica, cujo isolamento é mais fraco, na relação pedagógica o isolamento é mais forte, a prática ocorre na perspectiva do paradigma do exercício, com a professora conduzindo a discussão.

5 Para finalizar

Buscamos analisar a comunicação entre professor e crianças do 1º ano do Ensino Fundamental na produção de textos matemáticos, a partir dos marcadores utilizando um material didático pautado na ludicidade, na interação entre alunos e no registro matemático.

A análise dessa comunicação nos mostra que in loco alguns marcadores não foram identificados como se previa. Para ilustrar trouxemos o marcador práticas da sala de aula, cuja prática pedagógica proposta na PDAM deveria se dar no cenário investigativo, porém o discurso instrucional da professora e monitora fez com que a atividade se desse no paradigma do exercício, o que limitou a produção de textos matemáticos legítimo por parte dos alunos.

O modelo da linguagem de descrição nos ajudou a identificar por meio da teoria o que aconteceu na empiria. Os discursos regulativo e instrucional podem demarcar uma forma de produzir textos matemáticos independentemente da proposta didática adotada pela escola. Por isso, identificamos ser indispensável o trabalho de formação continuada com professores dos anos iniciais, pois entendemos que por meio da formação continuada os professores possam mudar seus discursos e, consequentemente, a produção dos textos matemáticos. Espera-se com isso, aproximar os textos matemáticos dos alunos dos textos considerados como legítimos.

Referências

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POWELL, Arthur Belford; SILVA, Wellerson Quintaneiro da. O vídeo na pesquisa qualitativa em Educação Matemática: investigando pensamentos matemáticos de alunos. In.: POWELL, Arthur Belford. Métodos de pesquisa em Educação Matemática: usando escrita, vídeo e internet. Campinas: Mercado das Letras, 2015.

SANTANA, Eurivalda Ribeiro dos Santos; AMARO, Fernanda de Oliveira Soares Taxa; LUNA, Ana Virgínia Almeida; MENDUNI-BORTOLOTI, Roberta D’Angela. Alfabetização matemática. Proposta didática para o professor 1° ano. Manual do Professor. Salvador: Secretaria da Educação do Estado da Bahia / Instituto Anísio Teixeira, 2013.

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ZABALA, Antoni. A prática educativa: como ensinar. Tradução de Ernani Ferreira da Fonseca Rosa. Porto Alegre: Artmed, 1998.

Notas

[1] O material está disponível no link http://www.alfabetizacao.mat.br.

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