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Abordagem de algoritmos da divisão em livros didáticos de Matemática para os anos iniciais
Algorithm approach of division in Mathematics didadic books for the initial Years
Educação Matemática Debate, vol. 2, núm. 4, pp. 57-80, 2018
Universidade Estadual de Montes Claros

Artigos


Recepción: 09 Enero 2018

Aprobación: 04 Marzo 2018

Publicación: 01 Abril 2018

DOI: https://doi.org/10.24116/emd25266136v2n42018a03

Resumo: Investigamos como os algoritmos da divisão de números naturais são abordados em livros didáticos de Matemática dos anos iniciais do Ensino Fundamental; mapeamos atividades nas quais são abordados; e analisamos o uso dos algoritmos da divisão em situações de partição e quotição. Foram analisadas 104 atividades de divisão propostas em seis coleções, escolhidas aleatoriamente, aprovadas pelo PNLD de 2016. Com uma abordagem quantitativa-qualitativa, usamos como método analítico das atividades os procedimentos da análise temática. Os dados mostram que mais de 84% das atividades exploram o processo do algoritmo convencional. Identificamos ausência de atividades que abordem os algoritmos nos 1º e 2º anos. Os algoritmos da divisão começam a ser explorados a partir do 3º ano, geralmente, por meio de divisão exata, e processos longos que envolvem a estimativa e subtração sucessiva. Algumas coleções apresentam atividades que estimulam a construção de argumentos e reflexão sobre as estratégias utilizadas com o uso de algoritmos alternativos pelos estudantes, assim como reflexão sobre o sistema de numeração decimal.

Palavras-chave: Divisão, Estruturas Multiplicativas, Algoritmo Convencional, Divisão, Estruturas Multiplicativas, Algoritmo Convencional.

Resumo: Investigamos como os algoritmos da divisão de números naturais são abordados em livros didáticos de Matemática dos anos iniciais do Ensino Fundamental; mapeamos atividades nas quais são abordados; e analisamos o uso dos algoritmos da divisão em situações de partição e quotição. Foram analisadas 104 atividades de divisão propostas em seis coleções, escolhidas aleatoriamente, aprovadas pelo PNLD de 2016. Com uma abordagem quantitativa-qualitativa, usamos como método analítico das atividades os procedimentos da análise temática. Os dados mostram que mais de 84% das atividades exploram o processo do algoritmo convencional. Identificamos ausência de atividades que abordem os algoritmos nos 1º e 2º anos. Os algoritmos da divisão começam a ser explorados a partir do 3º ano, geralmente, por meio de divisão exata, e processos longos que envolvem a estimativa e subtração sucessiva. Algumas coleções apresentam atividades que estimulam a construção de argumentos e reflexão sobre as estratégias utilizadas com o uso de algoritmos alternativos pelos estudantes, assim como reflexão sobre o sistema de numeração decimal.

Palavras-chave: Divisão, Estruturas Multiplicativas, Algoritmo Convencional, Divisão, Estruturas Multiplicativas, Algoritmo Convencional.

Abstract: We investigate how the algorithms of the division of natural numbers are approached in didactic books of Mathematics of the initial years of elementary school, we mapped activities in which they are approached; and we analyze the use of division algorithms in partition and quotation situations. Were analyzed a total of 104 proposed division activities in six collections, randomly chosen, approved by the PNLD of 2016. With a quantitative-qualitative approach, we use as the analytical method of activities the thematic analysis procedures. The data show that more than 84% of the activities explores the process of the conventional algorithm. We identify the absence of activities that address the algorithms in the 1st and 2nd years. The algorithms of the division begin to be explored from the 3rd, usually by means of exact division, and long processes involving successive estimation and subtraction. Some collections present activities that stimulate the construction of arguments and reflection on the strategies used with the use of alternative algorithms by the students, as well as reflection on the decimal numbering system.

Keywords: Division, Multiplicative Structures, Conventional Algorithm, Division, Multiplicative Structures, Conventional Algorithm.

Abstract: We investigate how the algorithms of the division of natural numbers are approached in didactic books of Mathematics of the initial years of elementary school, we mapped activities in which they are approached; and we analyze the use of division algorithms in partition and quotation situations. Were analyzed a total of 104 proposed division activities in six collections, randomly chosen, approved by the PNLD of 2016. With a quantitative-qualitative approach, we use as the analytical method of activities the thematic analysis procedures. The data show that more than 84% of the activities explores the process of the conventional algorithm. We identify the absence of activities that address the algorithms in the 1st and 2nd years. The algorithms of the division begin to be explored from the 3rd, usually by means of exact division, and long processes involving successive estimation and subtraction. Some collections present activities that stimulate the construction of arguments and reflection on the strategies used with the use of alternative algorithms by the students, as well as reflection on the decimal numbering system.

Keywords: Division, Multiplicative Structures, Conventional Algorithm, Division, Multiplicative Structures, Conventional Algorithm.

1 Introdução

Atualmente, os resultados de avaliações oficiais em larga escala, a exemplo do Programme for International Student Assessment (PISA), do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e do Sistema de Avaliação da Educação Básica de Pernambuco (SAEPE), confirmam que a aprendizagem da Matemática no Brasil e em Pernambuco está aquém dos patamares considerados satisfatórios em todas as etapas de escolarização da Educação Básica, fato que pode ser constatado tanto no âmbito internacional quanto no nacional e no estadual. Embora estas avaliações possam não ser a melhor forma de refletir o desenvolvimento em Matemática de estudantes, vários educadores matemáticos, no país e no exterior, têm dedicado, sistematicamente, a desenvolver estudos que buscam compreender os reais fatores geradores de obstáculos à aprendizagem dos estudantes do ensino básico. Apesar de não haver consenso em relação às interpretações acerca das avaliações em larga escola, destacamos a discussão de Minhoto (2016) ao considerar que testes padronizados tende a pressionar, enrijecer e induzir a redução da amplitude e variedade dos currículos escolares e a produzir, entre as escolas, estratégias que não proporcionam elevação no nível de qualidade do processo educacional, mas encobrem os resultados por meio da omissão (ou mesmo exclusão) de alunos que apresentam baixa proficiência.

Embora defendamos que as operações numéricas não se resumem aos algoritmos e que muitos outros aspectos devem ser considerados ao discuti-las, neste artigo, para fins de análise, focamos mais especificamente nos algoritmos. Em estudos desenvolvidos por pesquisadores brasileiros e internacionais entre as décadas de 1980 e 1990 destacam-se as dificuldades de alunos e de professores em lidar com o algoritmo da divisão e com a lógica de sua notação (KIEREN, 1988; NUNES e BRYANT, 1997; CORREA, 1996; SAIZ, 1996). Em uma revisão bibliográfica desenvolvida no período de 1999 a 2010, Fávero e Neves (2012) identificaram que as pesquisas no campo da Educação Matemática destacavam que os algoritmos alternativos foram os mais utilizados, sendo vistos pelos alunos como mais eficazes do que o algoritmo formal. Ao mesmo tempo, revelaram que tais alunos não compreendem a lógica do algoritmo formal. Assim, estes pesquisadores apontaram que os alunos utilizaram três tipos de registros: os grafismos irregulares, sem relação com a operação; o uso de sinais gráficos relacionados com as quantidades envolvidas na operação; e o uso de símbolos convencionais.

Em uma pesquisa desenvolvida por Wallauer (2006) com dois grupos de crianças, a pesquisadora identificou que o grupo de alunos que utilizou estratégias inventadas, antes ou ao mesmo tempo em que os algoritmos convencionais foram apresentados, mostrou mais compreensão do que o grupo de alunos que começou usando apenas os algoritmos. Assim, ela conclui que “ao aprender os algoritmos, os alunos deixam de refletir sobre as relações entre as variáveis envolvidas, preocupando-se apenas com o registro automático, quando poderiam estar desenvolvendo a habilidade que envolve estimativa, distribuição, proporção” (WALLAUER, 2006, p. 196). Esse estudo indica que habilidades procedimentais e instrumentais como algoritmo convencional, quando abordados de forma precoce[1], podem dificultar a construção de relações e conceitos referentes à divisão.

Contudo, a interferência do outro que, segundo Vygotsky (1998), pode se apresentar por meio de objetos — do nosso ponto de vista inclusive o livro didático —, ou do professor ou do colega, a valorização dos conhecimentos informais do aluno pode contribuir para que a compreensão conceitual seja eficiente e consolidada. Em estudos como o desenvolvido por Campos (2007) destaca-se que os livros didáticos são utilizados como recurso exclusivo no processo de ensino da divisão.

Em seu estudo, Salvador (2012) identificou no livro Aritmética elementar ilustrado, de Antônio Trajano[2], “5ª Lição de dividir”, que ele “a divisão tem duas aplicações, são: primeira, achar quantas vezes um número contém outro; segunda, dividir um número em partes iguais” (TRAJANO, 1956 apudSALVADOR, 2012, p. 32). Tais aplicações são denominadas por Gerard Vergnaud (1996) como situações de partição e quotas.

Diante dessas pesquisas, e da curiosidade para ter um retrato atualizado deste tema, indagamos: Como o algoritmo da divisão é abordado em livros didáticos de Matemática dos anos iniciais do Ensino Fundamental? Quais são as atividades em que os algoritmos são mais utilizados? Qual o uso dos algoritmos da divisão em situações de partição e quotição nesses livros didáticos?

Consideramos relevante o questionamento sobre como o algoritmo é tratado nos livros didáticos, pois estes são recursos muito presentes em sala de aula, principalmente, devido ao Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), orientando, assim, o trabalho do professor em sala de aula. Em um levantamento de pesquisa realizado por Almeida, Martinez e Wielewski (2010), foram encontrados poucos estudos referentes ao conteúdo de divisão em livros didáticos de Matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental.

Desta forma, nesse estudo temos como objetivos: Investigar como os algoritmos da divisão são abordados em livros didáticos de Matemática dos anos iniciais do Ensino Fundamental; mapear atividades em que os algoritmos são abordados nos livros didáticos; e analisar o uso dos algoritmos da divisão em situações de partição e quotição em livros didáticos.

2 Campo conceitual das estruturas multiplicativas e os algoritmos da divisão

Uma das possibilidades de fundamentação do processo de desenvolvimento e uso significativo dos conceitos da divisão de números inteiros é a Teoria dos Campos Conceptuais, desenvolvida pelo psicólogo francês Gerard Vergnaud, mais especificamente, no campo conceitual das estruturas multiplicativas. A teoria considera o conceito como um conjunto de invariantes utilizáveis na ação. Assim, Vergnaud (1996) destaca que o estudo do desenvolvimento e uso de um conceito devem ser vistos pelos investigadores como um conjunto de três elementos:

C = (S, I, R), em que:

• S representa o conjunto de situações que tornam o conceito significativo;

• I representa o conjunto de invariantes operacionais (conceitos-em-ação, teoremas-em-ação e argumentos); e

• R representa o conjunto de representações simbólicas, pertencentes ou não à linguagem (por exemplo, linguagem, gráficos, diagramas, sentenças formais) que permitem representar simbolicamente os invariantes.

A divisão é um dos conteúdos mais difíceis para a criança na aprendizagem da Matemática nos anos iniciais e, ao mesmo tempo, ela é crucial para a construção de conceitos que são construídos posteriormente, como o de fração. Para Vergnaud (1996), a divisão é uma das operações mais complexas entre as quatro operações, pelas seguintes razões conceituais:

  1. a) o quociente nem sempre é o resultado da aplicação do operador ao operado;

    b) a divisão está atrelada a duas ideias diferentes (partição e cotição);

    c) pode haver restos diferentes de zero;

    d) a divisão nem sempre é exata;

    e) a divisão como regra operatória não é sempre o inverso da multiplicação.

Tais aspectos atrelados ao uso de seu algoritmo de forma equivocada, sem contextualização de situações de divisão, as situações-problema, tornam o ensino e a aprendizagem da divisão demasiadamente complexos. Por ser uma operação multiplicativa, requer a coordenação dos fatores envolvidos — dividendo, divisor e quociente — por meio do entendimento das relações que estes termos podem estabelecer entre si. As operações de divisão, segundo Carvalho e Gonçalves (2003),

revestem-se de uma grande complexidade a nível cognitivo, quando são encaradas em termos de modelação de situações e não apenas do ponto de vista do cálculo dado que envolve novos significados para os números e novos tipos de relações entre eles que devem ser exploradas (p. 24).

A divisão requer o estabelecimento de relações como considerar o tamanho do todo, o número de partes, o tamanho das partes que deve ser o mesmo, a relação direta entre o total de elementos e o tamanho das partes, a relação inversa entre o tamanho das partes e o número de partes. Além disso, entender que não existe divisão por zero. Assim como, zero dividido por qualquer número é sempre zero.

Neste estudo, como já dissemos, teremos o enfoque no algoritmo da divisão. Para Vergnaud (1996), os algoritmos são esquemas, então, quando introduzimos um algoritmo, estamos conduzindo o aluno a criar um determinado esquema. Vergnaud (1996, p. 156) retoma o conceito de esquema de Piaget, como “uma organização invariante da conduta para determinada classe de situações”. Usiskin (1998) compartilha da mesma compreensão ao definir o algoritmo como um processo ou sequência de procedimentos, com um número finito de passos, destinados para executar uma tarefa que se deseja realizar.

Contudo, Vergnaud (1996) destaca que os algoritmos são esquemas, mas não são todos os esquemas que são matemáticos e afirma que se vamos automatizar alguns procedimentos, criar esquemas, é importante que eles sejam os mais eficientes possíveis. Na busca por esquemas que facilitassem o cálculo, o homem desenvolveu ao longo do tempo diversos tipos de algoritmos de divisão, que apresentaremos a seguir.

3 Tipos de algoritmos da divisão

Os esquemas do tipo algoritmo são comuns na história da Matemática, desde os tempos mais remotos dos antigos babilônicos. Salvador (2012) afirma que a palavra algoritmo procede do nome do matemático árabe do primeiro século al-Khowarizmi. No Quadro 1, ilustramos como a operação divisão era realizada no antigo Egito.

Quadro 1
Operação divisão no Egito

Salvador (2012, p. 8)

Percebemos na exposição acima que a operação da divisão no antigo Egito era efetuada por sucessivas “duplicações”, com base no fato de que todo número pode ser representado por uma soma de potência de 2. O divisor é dobrado sucessivamente.

No Renascimento, identificamos registros como o algoritmo de Moya (1572), o dividendo é separado do divisor que se encontra à esquerda, o quociente abaixo do dividendo e o resto é composto pelos algarismos que estão no início superior de cada coluna. O produto entre o divisor e o quociente encontra-se implícito e a subtração é iniciada pela esquerda.

Esse algoritmo é o método do Galeão apresentado por Boyer (1974): o dividendo é colocado entre as barras, o divisor à esquerda e o quociente à direita; o produto entre o divisor e o quociente é colocado abaixo do dividendo, não necessariamente na mesma linha, e a subtração é iniciada pela esquerda; o resto é composto pelos algarismos que estão no início superior de cada coluna, conforme ilustra a Figura 1.


Figura 1
Divisão em Galeão, século XVI
(BOYER, 1974, p. 149)

Na atualidade, identificamos que o algoritmo utilizado no Brasil para realizar a divisão é conhecido como “algoritmo euclidiano”. Para realizar a divisão por meio desse algoritmo, deveram dispor os elementos da seguinte maneira.




O quociente será um número que, multiplicado pelo divisor, terá como resultado o dividendo, isto é, q·d = D.

Caso essa divisão tenha resto, escreve-se: r + q·d = D.

Portanto, para realizar uma divisão pelo algoritmo euclidiano é necessário saber multiplicar, subtrair e adicionar. O Quadro 2 ilustra a divisão utilizada atualmente, realizada por diferentes processos.

Quadro 2
Divisão por diferentes processos

Elaboração do Autores

Nos anos iniciais do Ensino Fundamental, observamos que professores discutem qual algoritmo devem usar para introduzir o ensino de divisão. Enquanto uns argumentam em favor do método breve ou curto (TOLEDO e TOLEDO, 1997), outros defendem, o processo longo.

No Quadro 2, apresentamos alguns processos de divisão como o processo euclidiano da divisão ou processo longo, tendo como característica a subtração, que aparece o produto do quociente pelo divisor. No processo breve ou curto, a subtração não está explícita, porque somente o resultado da subtração entre o dividendo e o produto do quociente é registrado (TOLEDO; TOLEDO, 1997).

O algoritmo de divisão por subtrações sucessivas ou estimativas também é conhecido por algoritmo americano (TOLEDO e TOLEDO, 1997) e está relacionado à ideia de “repartir igualmente”, em que, além de estimar, o aluno precisa multiplicar, em seguida, subtrair e, finalmente, efetuar a adição.

Observamos que ao longo da história da humanidade as civilizações criaram os seus algoritmos com procedimentos muito singulares, cuja função primordial era resolver situaçõesproblema do cotidiano. Na atualidade, os algoritmos têm praticamente a mesma função – solucionar problemas cotidianos –, sendo assim, o nosso desafio consiste em ensinar o que nos foi deixado de legado pelo ser humano de maneira eficiente.

4 O ensino de divisão

O ensino de divisão, durante muito tempo, foi centrado na prática de “decorar” a tabuada e trabalhar diretamente com os algoritmos (PONTE e SERRAZINA, 2000). No imaginário das pessoas a tabuada está associada ao ensino tradicional. Esta forma de pensar se relaciona ao modo mecânico de seu ensino, no qual os fatos fundamentais não são construídos com compreensão. Pires (2012) corrobora com esse argumento ao afirmar que

nas décadas de 1950 e 1960, o ensino da multiplicação e da divisão centrava-se no “decorar” resultados. As tabuadas de multiplicação e de divisão eram muito importantes e os professores passavam grande tempo fazendo com que os alunos decorassem esses resultados, sem a necessária compreensão. Muitas vezes, usavam métodos voltados à memorização e alguns deles, ainda hoje, estão na lembrança de muitas pessoas, que sofreram diferentes castigos pelo fato de não conseguirem decorar as tabuadas (PIRES, 2012, p. 130).

A memorização mecânica está presente no ensino do algoritmo da divisão que geralmente ocorre após as crianças terem aprendido adição e subtração (NUNES e BRYANT, 1997). Para muitos professores de Matemática dos anos iniciais, o ensino da divisão restringe-se ao aprendizado do algoritmo, acreditando-se que aprendendo a efetuar corretamente os algoritmos das operações fundamentais, as crianças aprenderão qualquer conteúdo matemático. Por isso, planejam exercícios que têm enfoque no cálculo e no algoritmo.

Essa prática gera um problema, segundo Silva (2014), pois quando os alunos se deparam com atividades com resolução de situações-problema, apresentam dificuldade em estabelecer conexões entre o algoritmo efetuado e a pergunta do problema, ou seja, o que se deseja descobrir no problema. Correa e Spinillo (2004) consideram que limitar a aritmética ao ensino do algoritmo

reduz a matemática a calculo ou execução de algoritmos, ignorando que a matemática fornece modelos para a representação e compreensão do mundo em que vivemos. Em segundo lugar [...] porque o algoritmo se refere a um conjunto de procedimentos que leva à execução de uma dada operação, enquanto a operação implica em transformações realizadas sobre números, quantidades, grandezas e medidas (p.105).

Assim como as autoras, compreendemos que o ensino da divisão deve possibilitar a percepção das relações desta operação com as demais operações, o que permite ao aluno desenvolver estratégias mais flexíveis de cálculo. Assim, cabe ao professor assegurar que o ensino de Matemática na sala de aula incentive os alunos a “buscarem diferentes formas de resolver problemas”, e que o professor as considere como “válidas e importantes etapas do desenvolvimento do pensamento” (CAVALCANTI, 2001, p. 122).

Todavia, não abominamos (e nem defendemos que seja abolido) o uso dos algoritmos na sala de aula, uma vez que o método possibilita cálculos mais rápidos e econômicos. Também precisamos considerar o tempo que os algoritmos estão no currículo, além de constituírem uma produção humana historicamente construída.

Miguel e Miorim (1986) enfatizam a importância do trabalho com diferentes atividades introdutórias, que podem detonar a organização de variadas formas de operar, antes da abordagem do algoritmo tradicional das operações aritméticas elementares. O algoritmo, então, deveria ser iniciado após muitas outras elaborações e, ainda assim, de forma não compulsória, mas como uma opção.

Salvador (2012), em seu estudo sobre o algoritmo da divisão, indica que os autores de livros didáticos apresentam diferentes técnicas de cálculo e interrogam o aluno sobre os métodos utilizados. Ao tomarem como exemplo o livro de Matemática do 6º ano publicado por Marcio Imenes e Marcelo Lellis, identificaram as seguintes questões: “Você acha que todas as pessoas precisam dividir usando o mesmo método? Que método você prefere?” (IMENES e LELLIS, 2009 apudSALVADOR, 2012, p. 17). Isso indica que o autor deixa o aluno livre para escolher o esquema que deseja utilizar para realizar as divisões.

Essa autora observa que em alguns livros o método curto é apresentado antes do método longo, contudo, o método longo é o melhor caminho, visto que o curto é uma abreviação do longo, “logo, o aluno precisa compreender as etapas envolvidas no processo longo para depois ter condições de abreviá-lo” (SALVADOR, 2012, p. 17).

Também destaca que os livros buscam discutir e valorizar diferentes encaminhamentos, bem como formas de resolução que os alunos apresentam e, mais ainda, fazê-los exercitar a habilidade de expor e defender seus argumentos. Assim, identificou atividades que têm como objetivo desenvolver a capacidade de investigar a produção dos alunos e intervir sobre ela. Destaca, ainda, a importância das situações que envolvam ideias diferentes da operação de divisão, mas que também reflitam sobre a solução que dará a cada um dos problemas, porque sabemos que nem sempre a resposta de uma questão cuja resolução empregue uma divisão será o quociente encontrado.

Organizar o trabalho com o conteúdo de divisão nos anos iniciais do Ensino Fundamental auxilia o aluno a reconhecer que não há uma estratégia única para realizar o cálculo. Além disso, desenvolve nele a capacidade de escolher a estratégia mais eficiente para diferentes situações.

Compreendemos que a discussão deste tema é vasta e profícua. Conforme as pesquisas citadas anteriormente, o ensino, a aprendizagem, o papel dos livros didáticos e tantos outros aspectos poderiam ser aprofundados em pesquisas no campo da Educação Matemática. Para fins de aprofundamento, escolhemos um foco para desenvolvimento deste estudo, no qual nos deteremos, apresentando os procedimentos metodológicos e os resultados obtidos.

5 Procedimentos metodológicos

Este estudo foi desenvolvido com o objetivo de identificar como o algoritmo da divisão é abordado em livros didáticos de Matemática dos anos iniciais do Ensino Fundamental. Para a coleta dos dados, analisamos seis coleções de livros didáticos dos anos iniciais aprovados pelo PNLD de 2016, totalizando 30 obras. As coleções foram escolhidas aleatoriamente.

Na análise, buscou-se identificar atividades que discutem termos da divisão; divisão com material; algoritmo convencional e algoritmo por processo das subtrações sucessivas ou processo das estimativas.

Com uma abordagem qualitativa-quantitativa, utilizamos como método analítico das atividades os procedimentos da análise temática. Segundo Bardin (2009, p. 105), “o tema é a unidade de significação que se liberta naturalmente de um texto analisado segundo critérios relativos à teoria que serve de guia à leitura”.

Segundo Minayo (2000), o “tema” pode constituir-se em uma afirmação ou uma alusão, que pode ser representada graficamente através de palavras, frases ou outras unidades de significação maiores. Nesse sentido,

tradicionalmente, a análise temática se encaminha para a contagem de freqüência das unidades de significação como definitórias do caráter do discurso. Ou, ao contrário, qualitativamente a presença de determinados temas denota os valores de referência e os modelos de comportamento presentes no discurso (MINAYO, 2000, p. 209).

Desta forma, a nossa análise foi operacionalizada a partir de quatro operações básicas: (1) a pré-análise; (2) a exploração do material; (3) o tratamento dos resultados obtidos; (4) e a interpretação dos resultados, a partir da inferência. Assim, a análise temática foi uma técnica para verificarmos tantos os conteúdos expressos superficialmente nos dados coletados como os conteúdos intrínsecos a esses dados (conteúdo dinâmico, estrutural e histórico).

No próximo tópico, apresentaremos os dados encontrados a partir da realização do percurso metodológico que acabamos de explicitar. Esses resultados são fruto tanto da análise dos conteúdos manifestos como da análise dos conteúdos latentes, encontrados nas unidades de contexto, conforme poderá ser verificado, a seguir.

6 Análise dos dados

Como já dissemos, foram analisadas seis coleções, compostas por cinco volumes cada, totalizando trinta livros didáticos destinados às crianças que cursam os anos iniciais do Ensino Fundamental. As coleções foram identificadas neste estudo pelas letras A, B, C, D, E, e F. Todas as coleções fornecem materiais de apoio para o desenvolvimento das atividades propostas, como jogos, materiais manipuláveis (em papel, destacável), material dourado, baralho, calculadora, dinheiro, palito de picolé e cartazes. Em todas elas há manual para o professor em forma impressa.

6.1 Frequência das atividades com algoritmos por volume

Tendo como um dos objetivos desta pesquisa identificar como (e quais) os algoritmos da divisão são abordados em livros didáticos de Matemática dos anos iniciais, discutiremos nesta sessão os dados obtidos e algumas análises referentes às atividades identificadas nas coleções.

Observamos nas seis coleções que todas discutiam o algoritmo da divisão (algoritmo por subtrações sucessivas e algoritmo convencional). Percebemos diferenças em relação à quantidade de atividades apresentadas entre as coleções. Na Coleção A, encontramos 21 atividades, seguida pela Coleção B, com 14 atividades, Coleção C, tem 10 atividades, Coleção D tem 27, Coleção E com 19 e 10 atividades na Coleção F. Na Tabela 1, apresentamos a frequência destas atividades por volume.

Ao observar a Tabela 1, verificamos que não há atividades com algoritmo da divisão nos volumes 1 e 2 de todas as coleções analisadas. Podemos perceber que existe uma frequência maior no volume 4, com 45% das atividades, seguindo pelo volume 3 (30%) e do volume 5 (25%).

Tabela 1
Frequência de atividades com algoritmo da divisão por volume

Elaboração dos Autores

Identificamos que o algoritmo é apresentado a partir do volume 3, mas há uma concentração da representação no volume 4 e diminuição no volume 5. A coleção com maior frequência é a D, com 26% das atividades; a com menor frequência identificada são as coleções C e F, com 9,6% cada.

A partir dos resultados, levantamos duas hipóteses: a primeira é em relação à ausência de atividades que abordam algoritmo nos volumes 1 e 2 que pode ser atribuída à escolha dos autores de livros didáticos em priorizarem as ideias da divisão (cotição e partição) apenas nos 3º, 4º e 5º anos. A segunda hipótese é em relação à escolha de introduzir discussão por algoritmos informais como apontam os estudos de Wallauer (2006, p. 196), ao concluir que “ao aprender os algoritmos convencionais alunos deixam de refletir sobre as relações entre as variáveis envolvidas, preocupando-se apenas com o registro automático”.

Quanto à frequência dos tipos de algoritmos, identificamos, a partir do volume 3 de todas as coleções, dois tipos de procedimento para resolução do algoritmo da divisão: o algoritmo por subtração sucessiva (As) em 18 atividades (17,3%) e 85 atividades com algoritmo método curto (Mc) (82,7%), como observa-se na Tabela 2.

Entre as atividades analisadas, observamos que predomina o processo do algoritmo método curto em detrimento do algoritmo por subtração sucessiva. Supomos que esta frequência reflete a compreensão de muitos professores que o ensino da divisão se restringe ao aprendizado do algoritmo e que aprendendo a efetuar corretamente os algoritmos das operações fundamentais, os estudantes aprenderão qualquer conteúdo matemático. Já nos demais processos, identificaram-se outros tipos de esquemas ou que apresentam passo a passo como a criança poderia realizar a atividade.




(Legenda: As — Algoritmo por subtrações sucessivas/estimativas; Mc — Algoritmo método curto)

Elaboração dos Autores

Os resultados revelam que, embora os livros didáticos apresentem algoritmos por subtrações sucessivas explicitando de forma mais clara as etapas da divisão, há uma primazia pelos algoritmos convencionais (métodos curtos) que não detalham as etapas do algoritmo. Tal aspecto pode ser um problema se o livro didático fizer a opção de trabalhá-lo antes do método por subtrações/estimativas sucessivas (método longo), posto que o algoritmo convencional é uma abreviação do método longo. Sendo assim, concordamos com Salvador (2012) ao recomendar que o melhor caminho é explorar primeiro o método longo e depois o método curto, posto que esse é uma “abreviação”. Desta forma, analisaremos a seguir os tipos de atividades em que os algoritmos são utilizados.

Em relação às situações que dão significado ao conceito de divisão, observamos que os algoritmos são propostos para resolver situações que dão significado ao conceito de divisão. Identificamos que 20 atividades exploram a ideia de quotição, 32 atividades são de partição e 52 atividades, denominadas como outros, apresentam o algoritmo em outros contextos (cálculo de sentenças, comparação de algoritmos corretos com os errados, identificação de erros nos algoritmos, completar termos), como se observa no gráfico a seguir.

Gráfico 1
Situações que dão significado ao conceito de divisão

Elaboração dos Autores

Observamos que, do total das atividades identificadas, 50% abordam o algoritmo em tarefas que não envolvem as ideias de partição e quotição. Enquanto 31% são situações de partição em que o sujeito deve encontrar o tamanho das partes, e 19% são situações de quotição nas quais se busca encontrar o número em que o todo foi dividido. Embora os problemas de partição e quotição sejam de divisão, eles requerem uma forma de raciocínio diferente que está imbricado na situação, reforçando a ideia de que existem diferentes situações que envolvem um mesmo conceito (VERGNAUD, 1996).

Contudo, os resultados mostram que o algoritmo da divisão é abordado por meio de diferentes atividades nos livros didáticos, as quais categorizamos da seguinte maneira:

• algoritmo subtração/estimativa antes do algoritmo convencional;

• algoritmo euclidiano;

• apresentação de diferentes esquemas para o aluno escolher;

• atividades com ideias de divisão;

• atividades que estimulam argumentos e reflexões sobre esquemas utilizados por alunos;

• outros contextos.

A seguir, fazemos uma análise da abordagem do algoritmo nas coleções a partir das categorias apresentadas.

6.2 Abordagem do algoritmo da divisão nos livros didáticos dos anos iniciais

O algoritmo da divisão por subtrações sucessivas é trabalhado nas coleções analisadas geralmente por meio de situações-problema, nas quais o estudante é solicitado a apresentar outra estratégia de resolução do problema proposto, mas também em atividades que não apresentam situações-problema, como ilustrado na Figura 2.

Observamos que a atividade realiza a abordagem do algoritmo por subtração sucessiva/estimativa, este também é conhecido por algoritmo americano (TOLEDO e TOLEDO, 1997). Observamos que este tipo de algoritmo é apresentado nos livros didáticos antes do algoritmo convencional, como um pré-requisito para a abordagem do mesmo. Esta escolha didática acontece porque neste procedimento está mais explícita a ideia de “repartir igualmente”, além de estimar, o aluno precisa multiplicar, em seguida, subtrair e, finalmente, efetuar a adição.

Este tipo de escolha é visto como algo positivo por Salvador (2012), por explicitar as etapas, logo, o aluno precisa compreender as etapas envolvidas no processo para depois ter condições de abreviá-lo. Souza (2008) apresenta a mesma compreensão ao afirmar que o algoritmo americano é bastante interessante para ser ensinado às crianças no início da escolarização justamente por representar esse pensamento inicial que as crianças têm quando repartem igualmente objetos.


Figura 2
Algoritmo subtração/estimativa apresentado pelo livro didático para trabalhar divisão
(Coleção A, v. 3, p. 217)

O algoritmo convencional (Euclidiano) é apresentado nas coleções, em sua maioria, por demonstrações, situações-problema, nas quais são fornecidas dicas para facilitar a identificação dos termos e os procedimentos são desenvolvidos passo a passo, como nos exemplos ilustrados na Figura 3.

Observamos que a atividade aborda o algoritmo euclidiano, expõe princípios e formas de organização do Sistema de Numeração Decimal (SND), como a ordem de classe; decomposição de centenas em dezenas; valor posicional; explica o porquê escreve o zero no quociente. Observamos nessa condução do algoritmo que os livros didáticos apoiam-se nas regras do SND e na existência de propriedades e regularidades presentes nas operações.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática (BRASIL, 1997) orientam que erros cometidos pelos alunos são provenientes da não disponibilidade desses conhecimentos ou o não reconhecimento de sua presença no cálculo. Esse documento de orientação curricular destaca que se deve explorar os registros pessoais dos alunos que são formas intermediárias para se chegar ao registro das técnicas usuais.


Figura 3
Algoritmo convencional apresentado pelo livro didático para trabalhar divisão
(Coleção A, v. 5, p. 81)

Observamos nas coleções a apresentação do algoritmo por subtrações sucessivas e do algoritmo convencional, sugerindo que os alunos são livres para escolher o algoritmo que achar mais adequado para resolver o problema, como pode ser observado na Figura 4.


Figura 4
Diferentes procedimentos de divisão apresentados pelo livro didático
(Coleção E, v. 5, p. 96)

Verificamos na atividade acima, que o primeiro procedimento valoriza a habilidade de estimar, deixando mais evidente os processos de multiplicação, subtração e adição. Enquanto, o segundo procedimento, realiza o cálculo por meio do algoritmo euclidiano, utilizando a representação das ordens e classes do SND. Esse procedimento, diferente do primeiro, evidencia o zero no quociente e as mudanças de base. Percebemos nos esquemas que o resultado é o mesmo, mas o caminho é bem diferente, tal como os conhecimentos que são mobilizados durante o procedimento. Enquanto divisão por estimativa estimula o cálculo mental e multiplicação, o algoritmo euclidiano desenvolve reflexão sobre o SND.


Figura 5
Tipo de problema partição apresentado em livro didático
(Coleção D, v. 4, p. 68)

Nas atividades com ideias da divisão, observamos que os algoritmos são apresentados por meio de situações que envolvem as ideias de partição ou quotição que tornam o conceito significativo nas atividades, como pode ser observado nas Figuras 5 e 6.

Observamos na primeira situação a ideia de distribuir, enquanto na segunda atividade identifica-se a ideia de quotas. Tal aspecto confirma o que Salvador (2012) identificou no seu estudo em livros didáticos, no qual verificou atividades que exploravam ideias de divisão por partição e por quotição.

Outro aspecto diz respeito às representações simbólicas, observamos nas atividades tipos de representação como: os enunciados, as sentenças formais e tabelas, os quais permitem representar simbolicamente os invariantes (VERGNAUD, 1991).


Figura 6
Tipo de problema quotição apresentado em livro didático
(Coleção D, v. 4, p. 69)

Sobre atividades que estimulam argumento e reflexões sobre esquemas utilizados por alunos, deparamo-nos com situações que buscam exercitar a habilidade de expor e defender seus argumentos, assim as atividades apresentam erros para que as crianças argumentem, como na atividade ilustrada na Figura 7.


Figura 7
Atividades de divisão apresentadas em livro didático que estimulam argumento e reflexões
(Coleção E, v. 4, p. 151)

Observamos na atividade que, embora o livro didático chame de diferentes cálculos, na verdade são iguais: cálculo escrito. O que muda são os procedimentos: um é feito pelo método longo e outro, pelo curto. Contudo, concordamos com Salvador (2012) que é importante discutir e valorizar diferentes encaminhamentos, bem como formas de resolução que os alunos apresentam e, mais ainda, fazê-los exercitar a habilidade de expor e defender seus argumentos. É preciso olhar para a produção do aluno discutindo seus erros e acertos.

Consideramos importante que o livro didático possa incentivar diversas estratégias de resolução de problemas e de algoritmos para que o estudante possa considerar um arcabouço de possibilidades e possa enriquecer o seu cabedal de conhecimentos. Além disso, é enriquecedor que o livro estimule os estudantes a refletir sobre diferentes resoluções e a argumentar sobre elas.

As atividades referentes ao cálculo sem contexto matemático, ou seja, apenas operações numéricas, sem solução da situação associada, estão presentes em praticamente todos os volumes das coleções. Este tipo de atividade é mais frequente que outras, por exemplo, o que ilustra a Figura 8.


Figura 8
Cálculo sem situação
(Coleção C, v. 4, p. 192)

Observamos na atividade que a obra didática solicita à criança para efetuar a operação. Esse tipo de atividade seria um problema se o volume não fosse composto por outras situações-problema, jogos e recursos como material dourado que contextualizam o conteúdo da divisão. Vergnaud (1996) ressalta que um conceito deve ser apresentado por meio de um conjunto de situações que o tornam significativo. Além disso, entendemos que restringir o ensino e o aprendizado da divisão a efetuar corretamente os algoritmos, pode promover obstáculos na aprendizagem, pois ao depararem-se com atividades com resolução de situações-problema, os estudantes poderão apresentar dificuldade em estabelecer conexões entre o algoritmo efetuado e a pergunta do problema, ou seja, o que se deseja descobrir no problema (SILVA, 2014).

Observamos que as coleções de livros didáticos analisadas apresentam uma boa variedade de situações que exploram o conceito de divisão, todavia, algumas apresentam maior ênfase em alguns procedimentos do que em outros. Tal fato pode gerar dificuldades à aprendizagem dos estudantes nos anos iniciais. Dessa forma, o papel do professor é essencial ao verificar tais dificuldades, além de promover intervenções pedagógicas para superá-las.

7 Considerações

Os dados da pesquisa mostram que o algoritmo da divisão com números naturais é explorado a partir do 3º ano do Ensino Fundamental, que corresponde ao final do Ciclo de Alfabetização[3], quando os alunos dos anos iniciais estudam a divisão por meio de agrupamentos e por partes iguais, sem restos. Dessa forma, o algoritmo é introduzido, geralmente, quando a divisão é exata, ou seja, quando apresenta resto igual a zero. A partir do 4º e 5º anos, identificamos nas coleções analisadas o trabalho com algoritmos em que o resto é maior que zero.

O algoritmo é explorado por meio de diferentes representações, isto é, por meio de subtrações sucessivas, de forma convencional, ou pelo uso de algoritmos pessoais. Essas representações são utilizadas como esquema para resolver situações que dão significado ao conceito.

Diante dos resultados observados, retomamos as conclusões do estudo de Wallauer (2006), ao defender que o uso de estratégias pessoais (ou inventadas pelos alunos) favorece a aprendizagem da divisão, em detrimento do ensino que apresenta precocemente os algoritmos formais.

Nas representações observadas nos livros analisados, o algoritmo é trabalhado, especialmente, em situações-problema relacionadas ao cotidiano, nas quais, de forma autônoma, os alunos também devem apresentar outra estratégia de resolução. Tais situações envolvem as noções de partição ou de quotição. Isso é importante, pois várias pesquisas educacionais reforçam a necessidade de explorar situações do cotidiano do aluno, assim, ele dará significado ao conceito vivenciado, como preconiza Vergnaud (1996) ao discutir sobre a resolução de problemas e a construção do conceito.

Ainda, algumas coleções apresentam atividades que possibilitam a construção de argumentos e reflexões sobre as estratégias apresentadas, estimulando o uso de algoritmos alternativos e da argumentação pelos estudantes, conforme Salvador (2012) defende em seu estudo.

Consideramos que os achados dessa pesquisa apontam para uma perspectiva positiva em relação à abordagem dos algoritmos da divisão nos livros didáticos. Isso porque identificamos que não se trata apenas do ensino mecânico dos algoritmos, ao contrário as coleções analisadas fazem abordagem por meio das diferentes ideias da divisão e de atividades contextualizadas.

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Notas

[1] Wallauer (2006) compreende como precoce o ensino do algoritmo convencional antes da exploração dos algoritmos alternativos e das ideias da divisão.
[2] TRAJANO, Antonio. Aritmética elementar ilustrada. 134. ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1956.
[3] De acordo com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), em sua terceira versão (BRASIL, 2018), o final do Ciclo Alfabetização é no 2º ano no Ensino Fundamental. Isso provavelmente acarretará mudanças nos livros didáticos.

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