Mapeamento da área de preservação permanente do rio Passa-Três: uma contribuição para a gestão territorial e preservação do manancial
Mapping of the permanent preservation area of Passa-Três river: a contribution to territorial management and preservation of the water source
Mapeo de la zona de preservación permanente del río Passa-Três: una contribución para la gestión territorial y la preservación de la fuente
Wellington Ribeiro Martins wellmartins38@gmail.com
Universidade Estadual de Goiás – UEG, Anápolis (GO), Brasil, Brasil
Adriana Aparecida Silva ueg.adriana@gmail.com
Universidade Estadual de Goiás – UEG, Anápolis (GO), Brasil, Brasil
Joana D’arc Bardella Castro joanabardellacastro@gmail.com
Universidade Estadual de Goiás – UEG, Anápolis (GO), Brasil, Brasil
Recepción: 06 Julio 2023
Aprobación: 16 Octubre 2023
Publicación: 01 Noviembre 2023
DOI: https://doi.org/10.46551/rc24482692202328
Resumo: Nas Áreas de Preservação Permanente (APPs) ao longo dos cursos d'água, o objetivo primordial é garantir a qualidade e a proteção dos recursos hídricos. Entretanto, em Uruaçu, no norte de Goiás, especialmente nas proximidades do rio Passa-Três, enfrenta-se um dilema entre a utilização e a conservação dessas áreas, devido à negligência no cumprimento das leis ambientais. Nesse sentido, o objetivo do estudo foi realizar uma análise da conservação da APP marginal do rio Passa-Três, visando contribuir para a gestão do território e a preservação do manancial. Para isso, utilizou-se o software QGIS 3.22, respeitando os critérios do Código Florestal (Lei nº 12.561/2012) para a delimitação da APP, e a subsequente avaliação da qualidade ambiental mediante a conformidade da APP, baseando-se no mapeamento desenvolvido pelo Projeto MapBiomas, ano 2021. Os resultados mostraram que somente 12,66% da APP estão preservados, enquanto 87,34% estão em condições inadequadas, sendo principalmente ocupados por pastagens (36,41%), áreas com pouca vegetação nativa ou solo exposto (29,58%), construções (18,59%) e atividades agrícolas (2,75%). A falta de vegetação nas margens da APP aumenta o risco de erosão e acúmulo de sedimentos, prejudicando o fornecimento de água. Portanto, ações de restauração são essenciais para o planejamento e a gestão adequada dessas áreas destinadas à preservação.
Palavras-chave: Cerrado, Conservação ambiental, Geoprocessamento, Mata ciliar, Sustentabilidade.
Abstract: In Permanent Preservation Areas (PPAs) along watercourses, the primary objective is to ensure the quality and protection of water resources. However, in Uruaçu, in northern Goiás, especially near the Passa-Três River, there is a dilemma between the use and conservation of these areas due to negligence in complying with environmental laws. In this context, the study aimed to conduct an analysis of the conservation of the PPA along the Passa-Três River, aiming to contribute to territorial management and the preservation of the water source. To achieve this, the QGIS 3.22 software was used, respecting the criteria of the Forest Code (Law No. 12,561/2012) for the delimitation of the PPA, and the subsequent evaluation of environmental quality based on the mapping developed by the MapBiomas Project, year 2021. The results showed that only 12.66% of the PPA is preserved, while 87.34% are in inadequate conditions, mainly occupied by pastures (36.41%), areas with little native vegetation or exposed soil (29.58%), constructions (18.59%), and agricultural activities (2.75%). The lack of vegetation along the PPA's margins increases the risk of erosion and sediment accumulation, impairing water supply. Therefore, restoration actions are essential for the proper planning and management of these areas designated for preservation.
Keywords: Cerrado, Environmental conservation, Geoprocessing, Riparian forest, Sustainability.
Resumen: En las Áreas de Preservación Permanente (APP) a lo largo de los cursos de agua, el objetivo principal es garantizar la calidad y protección de los recursos hídricos. Sin embargo, en Uruaçu, en el norte de Goiás, especialmente cerca del río Passa-Três, se enfrenta a un dilema entre la utilización y la conservación de estas áreas debido a la negligencia en el cumplimiento de las leyes ambientales. En este contexto, el objetivo del estudio fue realizar un análisis de la conservación de la APP a lo largo del río Passa-Três, con el fin de contribuir a la gestión del territorio y la preservación de la fuente de agua. Para lograrlo, se utilizó el software QGIS 3.22, respetando los criterios del Código Forestal (Ley Nº 12,561/2012) para la delimitación de la APP, y la posterior evaluación de la calidad ambiental basada en la cartografía desarrollada por el Proyecto MapBiomas, año 2021. Los resultados mostraron que solo el 12,66% de la APP está preservada, mientras que el 87,34% se encuentra en condiciones inadecuadas, ocupadas principalmente por pastizales (36,41%), áreas con poca vegetación nativa o suelo expuesto (29,58%), construcciones (18,59%) y actividades agrícolas (2,75%). La falta de vegetación en las márgenes de la APP aumenta el riesgo de erosión y acumulación de sedimentos, lo que perjudica el suministro de agua. Por lo tanto, las acciones de restauración son esenciales para la planificación y gestión adecuada de estas áreas designadas para la preservación.
Palabras clave: Cerrado, Conservación ambiental, Geoprocesamiento, Bosque ribereño, Sostenibilidad.
Introdução
Nesse sentido, realizar o mapeamento das APPs ao longo dos canais de água representa um importante passo para o planejamento territorial (CAMARGOS, 2020). A geotecnologia desempenha um papel essencial no mapeamento e na gestão das APPs, utiliza tecnologias de informações geográficas (SIG), sensoriamento remoto e sistemas de posicionamento global (GPS) para coletar, armazenar, analisar e visualizar dados espaciais (BARÃO et al. 2021). Na aplicação ao mapeamento de APPs, o geoprocessamento é fundamental na coleta de informações topográficas, hidrog
O crescimento industrial e agrícola, associado ao aumento populacional global, tem gerado um notável impacto no desenvolvimento socioeconômico. No entanto, essa expansão tem resultado em uma crescente demanda por recursos naturais que excede consideravelmente sua capacidade de regeneração (SILVA et al., 2018).
O Código Florestal e o surgimento das Áreas de Preservação Ambiental representam esforços significativos do Brasil para conciliar o desenvolvimento econômico com a conservação do meio ambiente, garantindo a proteção de ecossistemas importantes para a saúde do planeta e o bem-estar das gerações presentes e futuras (METZGER et al., 2019).
A principal legislação que regula as Áreas de Preservação Permanente (APPs) é o Código Florestal Brasileiro, especificamente a Lei Federal nº 12.651/2012. Essa lei define as áreas consideradas APPs, estabelecendo larguras mínimas e critérios para sua delimitação, com o objetivo de proteger encostas, topos de morros, restingas, manguezais, entre outros. Para os recursos hídricos, a função principal das Áreas de Preservação Permanente ao longo dos mananciais é garantir sua proteção e preservação da qualidade da água (BRASIL, 2012a; CALADO et al., 2020).
No município de Uruaçu, Goiás, no rio Passa-Três, principal fonte de abastecimento de água para a população, observa-se um impasse entre a utilização dos recursos hídricos e sua preservação. As atividades agropecuárias desenvolvidas em sua área são as principais responsáveis pela degradação dos afluentes hídricos, resultante principalmente do desmatamento e remoção das APPs (GANDARA, 2017). Essa alteração, decorrente da falta de proteção dos rios, promove a ocorrência de processos erosivos, assoreamento e contaminação dos canais, além de afetar a disponibilidade de água para o abastecimento urbano.
Nesse sentido, realizar o mapeamento das APPs ao longo dos canais de água representa um importante passo para o planejamento territorial (CAMARGOS, 2020). A geotecnologia desempenha um papel essencial no mapeamento e na gestão das APPs, utiliza tecnologias de informações geográficas (SIG), sensoriamento remoto e sistemas de posicionamento global (GPS) para coletar, armazenar, analisar e visualizar dados espaciais (BARÃO et al. 2021). Na aplicação ao mapeamento de APPs, o geoprocessamento é fundamental na coleta de informações topográficas, hidrográficas, climáticas e de uso da terra. Esses dados são obtidos por meio de levantamentos de campo, imagens de satélite, dados aerofotogramétricos e sensores terrestres (MATIELLO et al., 2017).
Dessa forma, o geoprocessamento possibilita a análise espacial desses dados, identificando as áreas que se enquadram como APPs de acordo com a legislação ambiental vigente, o que envolve a delimitação de margens de rios, topos de morros, encostas íngremes e outros critérios estabelecidos pela lei (DE MEDEIROS; ALBUQUERQUE, 2019). Assim, permite o monitoramento através do acompanhamento de forma contínua das APPs por meio da análise de imagens de satélite e dados coletados por sensores remotos, contribuindo significativamente para a preservação dessas áreas críticas para o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável (PESSI et al. 2018).
Assim, o presente estudo tem como objetivo delimitar e quantificar o estado de preservação da Área de Preservação Permanente ao longo do rio Passa-Três, com a intenção de contribuir com a geração de dados para a gestão territorial da área, visando garantir a preservação dos recursos hídricos do manancial Passa-Três. Portanto, o estudo busca desempenhar um papel essencial pela restauração dos recursos naturais, com ênfase na conservação e proteção dos recursos hídricos, a fim de preservar e proteger os recursos naturais e garantir um ambiente saudável e sustentável para as gerações futuras.
Área de estudo
O rio Passa-Três está localizado na região centro-sul do município de Uruaçu, em Goiás, na região norte do estado. Tem uma extensão de 61,40 km e está dentro das coordenadas UTM zone 22 Sul N 8399586.70, E 712992.16, S 8386448.76 e W 667024,45 (Figura 1). A região na qual a área de estudo se insere é caracterizada por um clima distintamente marcado por duas estações bem definidas: uma estação seca, que abrange o período de maio a setembro, e uma estação chuvosa, que se estende de outubro a abril. A média anual das temperaturas na região varia entre 22°C e 28°C. Durante a estação chuvosa, a região recebe uma quantidade significativa de precipitação, com médias anuais variando entre 1.200 e 1.800 mm (EMBRAPA, 2003).
A geologia da área de estudo é caracterizada pela predominância de unidades geológicas específicas, notadamente a presença da Serra da Mesa, representada pela Unidade Xisto-Quartzítica, e a Unidade Hidrolina, composta pelo batólito granito-gnáissico com formato ovoide. Estas unidades geológicas predominam na região norte de Goiás, englobando os municípios de Hidrolina, Uruaçu e Luzelândia. As rochas granito-gnáissicas presentes nessas unidades geológicas são consideradas como as mais antigas da região oeste de Goiás e fazem parte do conjunto de rochas do Complexo Hidrolina (MOREIRA et al., 2008).
Em relação às características pedológicas, a área que compreende a bacia hidrográfica do rio Passa-Três apresenta dois perfis distintos. Na região Oeste, observa-se a presença de solos do tipo Argissolo vermelho, os quais são associados a um relevo acidentado que impõe desafios à acessibilidade de maquinaria, incentivando, consequentemente, a preservação da vegetação nativa do Cerrado. Por outro lado, na região Leste da bacia hidrográfica, predomina o Cambissolo, cujo relevo se caracteriza por uma topografia que varia de plano a ondulado (EMBRAPA, 2018).
Procedimentos operacionais
Para delimitar a Área de Preservação Permanente (APP) ao longo do curso do rio Passa-Três, foram seguidas as determinações estabelecidas pela Lei nº 12.651/2012, que define uma faixa marginal em metros de acordo com a largura dos cursos d'água.
A delimitação das APPs começa no ponto exato da borda da calha do leito regular e estende-se por uma largura mínima de “30 metros, para cursos d'água com menos de 10 metros de largura”, ou “50 metros, para cursos d'água com largura entre 10 e 50 metros”, ou “100 metros, para cursos d'água com largura entre 50 e 200 metros”, ou “500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros”, conforme determinado pelo Código Florestal Brasileiro (BRASIL, 2012a).
Dessa forma, realizou-se a delimitação e classificação das Áreas de Preservação Permanente ao longo do rio Passa-Três, levando em consideração a largura variável de todo o curso d'água, para posterior classificação e levantamento da condição atual de qualidade ambiental do rio Passa-Três. Para isso, utilizaram-se imagens de satélite do Google Earth, do ano de 2021, e a ferramenta buffer no software livre QGIS 3.22 para criar virtualmente os limites da APP ao longo do canal de água do rio Passa-Três, como demonstrado na Figura 2.
A partir da delimitação da APP, foi realizada a avaliação das condições de uso e ocupação da área, através do mapa de uso da terra da bacia e seu respectivo cruzamento com as áreas de APP marginal do rio Passa-Três. Para isso, foi usado a base de mapeamento (imagens Landsat 5 e 8, com resolução espacial de 30 metros e escala de 1:80.000) da Coleção 7 da plataforma MapBiomas (2021), com a reclassificação das áreas de interesse da área de estudo e, posteriormente, feita a elaboração de uma classificação do seu estado atual e sua posterior quantificação.
Assim, procedeu-se a classificação das áreas de APP com o agrupamento das classes de acordo com suas similaridades de origem, resultando nos seguintes grupos de representação: Cerrado (Formação Savânica, Formação Florestal e Formação Campestre), Agricultura (Cana, Soja, Outras Lavouras Temporárias), Pouca vegetação nativa e solo exposto (Mosaico de Usos e Outras Áreas não Vegetadas), Rio, Lago e Represa (Campo Alagado e Área Pantanosa, Rio, Lago e Oceano), Pastagens e áreas ocupadas pelas construções.
Desse modo, a análise da condição ambiental da APP ocorreu de acordo com seu estado atual, onde o estado de APP adequado é aquele ocupado pela vegetação do Cerrado, enquanto as demais classificações caracterizadas como áreas de APP em estado inadequado. Portanto, foi estabelecido cinco critérios de classificação, os quais nortearam o desenvolvimento do estudo: 1) Área da APP em estado de preservação adequada; 2) Área da APP ocupada por pastagens; 3) Área da APP ocupada por construções; 4) Área da APP ocupada pela agricultura, e 5) Área da APP com pouca vegetação nativa ou solo exposto.
Após a efetuação da classificação da APP, foi realizado um levantamento abrangente das condições atuais que envolvem a APP marginal do rio Passa-Três. Esse levantamento envolveu a quantificação, em planilha eletrônica, de cada uma das categorias relacionadas ao estado atual da APP, expressas em quilômetros quadrados e em percentagem, a fim de observar a predominância de áreas de APP em estado de qualidade adequado ou inadequado e indicar seu atual estado de conservação.
Resultados e Discussão
Os resultados foram obtidos a partir do mapeamento da plataforma MapBiomas (2021), o que envolveu a análise do mapa de uso da terra da bacia e sua correlação com as áreas de APP ao longo do rio Passa-Três. Os tipos de uso e ocupação da terra da bacia e a subsequente reclassificação das classes para o estudo focado nas Área de Preservação Permanente marginal do rio Passa-Três é demonstrado nos mapas da Figura 3.
A área total da APP ao longo do canal de água do rio Passa-Três, delimitada conforme determina a legislação, é de 17,61 km², conforme apresentado na Tabela 1. A área de APP com vegetação nativa em estado adequado, conforme determinação legal, é de 2,23 km², correspondente a apenas 12,66% da área.
Quanto à quantificação das áreas de APP em estado inadequado de qualidade ambiental, a pastagem é o principal tipo de uso e ocupação, abrangendo uma área de 6,41 km² (36,40%). A área de APP com vegetação nativa, porém exposta de forma degradada, com risco de erosão ou já afetada por processos erosivos, corresponde a 5,21 km² (29,59%).
A área ocupada por construções residenciais e rurais da APP totaliza 3,27 km² (18,57%). Também foi identificada uma área de APP ocupada por agricultura, especificamente para produção de hortaliças ou cultivo de grãos de pequeno porte. O uso agrícola da APP abrange uma área de 0,48 km², correspondente a 2,73% da APP.
Dessa forma, o uso e ocupação predominante da APP é pela pastagem, que abrange 36,40% da área, seguida pelas áreas com pouca vegetação nativa e solo exposto, com 29,59% da área. As construções representam 18,57% do uso da terra na APP, enquanto a agricultura é o tipo de uso menos extensivo, abrangendo 2,73% da área. No entanto, em relação a APP em estado adequado, somente 12,66% da área encontra-se preservada, contrariando e desrespeitando as determinações legais.
A análise por meio do mapeamento espacial permitiu delimitar e classificar a condição da Área de Preservação Permanente marginal do rio Passa-Três, o que possibilita identificar os danos causados pela invasão da APP e os impactos negativos para o manancial Passa-Três.
A Figura 4 representa as irregularidades encontradas na APP do rio Passa-Três, que incluem o uso da terra pela pastagem, construções residenciais e rurais, agricultura de pequeno e grande porte, além de áreas com baixa densidade de vegetação nativa e solo exposto. É possível observar, por meio da análise espacial das imagens de satélite, trechos do manancial sem vegetação marginal. Isso indica um intenso uso da terra na área próxima ao rio e um estado de qualidade ambiental inadequado.
Pela análise das imagens da Figura 4, o uso da área para pastagens (36,40%) indica a presença de animais domésticos de grande porte, como bovinos, equídeos e bubalinos. A marca de trieiros formado pelo pisoteio dos animais demonstra que o manancial também é utilizado como bebedouro, o que aumenta os fatores para a ocorrência de erosão devido à exposição da terra sem vegetação.
O uso da terra para construções (18,57%) concentra-se principalmente nas áreas próximas ao lago Serra da Mesa, devido ao potencial turístico da região, além de pontos específicos da APP usados para a coleta de água para abastecimento da população, moradias e construções rurais. Da mesma forma, o uso da terra para agricultura (2,73%) também está presente nas áreas com maior concentração de construções, especialmente entre os pequenos produtores.
No entanto, áreas com reduzida cobertura de vegetação nativa, correspondentes a 29,59% da extensão da APP, manifestam-se de forma significativa em regiões caracterizadas pela frequente diminuição do nível de água no lago Serra da Mesa. Esse fenômeno se reflete de maneira evidente na geração de processos erosivos. Tal situação é diretamente relacionada à ausência de vegetação com capacidade de retenção dos sedimentos do solo, o que por sua vez impede a entrada desses sedimentos no corpo hídrico.
Nessas regiões da APP, ocorrem conflitos entre o uso da terra e a preservação das APPs. Segundo Calado et al. (2020), esses conflitos são causados pelo desrespeito e por ações ilegais da sociedade em relação ao Código Florestal Brasileiro, favorecidos pela falta de fiscalização dos órgãos ambientais em relação ao cumprimento da legislação pela população e, principalmente, devido às dificuldades e à falta de incentivo para a recuperação dessas áreas.
Portanto, os danos identificados estão relacionados ao uso indevido e à ocupação proibida da terra nas áreas das APPs. Do total, apenas uma área muito pequena, correspondente a 2,23 km² ou 12,66% de toda a área, está em estado de qualidade ambiental adequado, com vegetação nativa que exerce sua função de proteção ao curso d'água, conforme mostrado na Tabela 2.
Enquanto isso, 87,34% da área da APP, correspondente a 15,38 km², encontra-se sem a presença de vegetação marginal que garanta os benefícios de qualidade da água e preservação do manancial Passa-Três, indicando um estado de qualidade ambiental inadequado, conforme determinado pela legislação.
Esses dados mostram um descaso e falta de comprometimento com a preservação das áreas de preservação permanente, associados à remoção da vegetação para implementação de pastagens, o que apresenta um grande potencial para a ocorrência de processos erosivos, tornando o rio Passa-Três vulnerável a vários problemas em seu regime de regularização.
No entanto, essa realidade de áreas degradadas nas APPs também foi observada em outros estudos. Na região central de Goiás, os autores Santos e Brito (2018) realizaram a delimitação das APPs na bacia hidrográfica do Rio dos Patos e identificaram que 57% das áreas estão ocupadas ilegalmente por atividades humanas, como pastagem e agricultura.
Em Campinaçu, município da região norte de Goiás, as APPs do córrego Mina d'água também apresentam conflitos e ocupações irregulares. Moreira e Souza (2018) identificaram áreas onde houve retirada da vegetação ciliar para a introdução de pastagem e construções de áreas de lazer, além de pontos com processos erosivos, compactação do solo e assoreamento, influenciados pelo pisoteio dos animais.
Silva e Almeida (2021) caracterizaram a APP do rio Meia Ponte no município de Goiânia, Goiás, e observaram que 42,4% da área estão ocupadas por pastagens, cultivos agrícolas e ocupações urbanas, evidenciando ocupações irregulares e ilegais em diversos pontos da área.
Assim, há muitos estudos que demonstram que as Áreas de Preservação Permanente não estão sendo respeitadas conforme determina a legislação e estão em estado de degradação ou em processo de degradação, o que indica a necessidade urgente de um planejamento territorial para avaliar e restaurar essas áreas, além de uma fiscalização efetiva para garantir o cumprimento da lei.
Os dados encontrados sobre a condição atual de estado inadequado de qualidade ambiental da Área de Preservação Permanente do manancial Passa-Três, com uma grande área de 87,34% de APP sem vegetação marginal, indicam a necessidade de ações emergenciais para a restauração e recuperação da área. Esses resultados são fundamentais para direcionar e implementar ações específicas voltadas para a restauração desses recursos no bioma Cerrado, garantindo a sua preservação a longo prazo (ROSENFIELD; MÜLLER, 2020).
Com base nessas informações, é possível desenvolver estratégias eficazes para a conservação dos recursos hídricos, promovendo a sustentabilidade ambiental e a qualidade de vida das comunidades que dependem desses mananciais (SILVA et al, 2021). Para garantir a conservação das APPs marginais dos rios, é essencial adotar estratégias eficazes que considerem tanto a proteção dessas áreas como a recuperação das áreas degradadas.
Uma das estratégias-chave é promover a recuperação de áreas degradadas dentro das APPs. Isso pode envolver ações como o reflorestamento com espécies nativas, a restauração de ecossistemas ripários, a adoção de práticas agroflorestais e a recuperação de nascentes. A recuperação dessas áreas degradadas contribui para a restauração dos processos ecológicos, a melhoria da qualidade da água e a promoção da biodiversidade (RODRIGUES; GIULIATTI; JÚNIOR, 2020).
Outra estratégia importante é a restrição de atividades humanas nas Áreas de Preservação Permanente (APPs). Isso implica em proibir ou controlar o desmatamento, a exploração inadequada de recursos naturais, a construção de edificações e a ocupação irregular nessas áreas. A implementação de políticas públicas e uma fiscalização adequada são fundamentais para assegurar o cumprimento das regulamentações e a preservação das APPs (MACHADO et al., 2018).
É importante ressaltar que a conservação das APPs marginais dos rios não deve ser tratada isoladamente, mas sim integrada a uma abordagem mais ampla de gestão dos recursos hídricos (FERNANDEZ; PIETRAFESA, 2021). Isso envolve a participação ativa de diferentes atores, incluindo governos, comunidades locais, setor privado e organizações não governamentais, para promover a conscientização, a educação ambiental, a implementação de práticas sustentáveis e o monitoramento contínuo das áreas.
Considerações finais
As extensas áreas de preservação permanente no rio Passa-Três, desprovidas de vegetação e predominantemente utilizadas para pastagem, têm potencial para causar impactos significativos, incluindo processos erosivos e assoreamento. Esses impactos são agravados pela atividade de pisoteio do gado, que intensifica a remoção do solo exposto e contribui para o transporte de sedimentos para o leito do rio, comprometendo sua qualidade.
Diante desse cenário, verifica-se que o estado atual de qualidade ambiental da Área de Preservação Permanente (APP) marginal do rio Passa-Três é inadequado, evidenciando o processo de degradação pelo qual o rio está passando. A ausência de vegetação ao longo de todo o curso compromete os benefícios associados à proteção e preservação desse importante manancial.
Para garantir efetivamente a proteção dos recursos hídricos, é imprescindível integrar a conservação das Áreas de Preservação Permanente (APPs) marginais dos rios a uma abordagem abrangente de gestão dos recursos hídricos. Isso requer a implementação de estratégias eficazes, como a recuperação das áreas degradadas, a restrição das atividades humanas nessas áreas e o cumprimento das regulamentações por meio de políticas públicas e fiscalização adequada.
Agradecimentos
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001, por meio de uma bolsa de estudo para o primeiro autor.
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Notas
Endereço: Av. Juscelino Kubitschek, nº 146 - Bairro Jundiaí. Caixa Postal 459 Anápolis – GO. CEP: 75.110-390. Bloco II - 3º Andar.
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