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Entre diferenciação e desigualdades socioespaciais: a percepção dos moradores da Zona Sul de Poços de Caldas (MG)
Between differentiation and socio-spatial inequalities: the perception of residents of the South Zone of Poços de Caldas (MG)
Entre diferenciación y desigualdades socioespaciales: la percepción de los habitantes de la Zona Sur de Poços de Caldas (MG)
Revista Cerrados (Unimontes), vol. 21, núm. 02, pp. 112-133, 2023
Universidade Estadual de Montes Claros



Recepción: 09 Mayo 2023

Aprobación: 31 Agosto 2023

Publicación: 10 Septiembre 2023

DOI: https://doi.org/10.46551/rc24482692202321

Resumo: A estrutura espacial urbana brasileira é marcada por expressivas diferenciações e desigualdades socioespaciais. As diferenças e injustiças espaciais podem ser vistas na maioria das cidades do território nacional, sendo, em algumas localizações desigualdades expressivas, em outras, mais sutis. Nosso objetivo com este estudo foi analisar a percepção das diferenças e desigualdades de Poços de Caldas (MG), por meio de relatos dos moradores da Zona Sul da cidade. Para tanto, utilizou-se dos seguintes procedimentos metodológicos: (i) levantamento bibliográfico do tema “diferenciação e desigualdades socioespaciais”, a partir de textos de Geografia urbana; (ii) revisão bibliográfica acerca da (re)produção do espaço urbano da Zona Sul de Poços de Caldas; (iii) trabalhos de campo com registro de fotografias e descrições; (iv) entrevistas semiestruturadas com moradores da Zona Sul. Por meio das entrevistas, os citadinos relataram que há diversos fatores que impactam a vida urbana local, como: a distância entre o setor urbano sul e o restante do tecido urbano; a ineficiência do sistema de transporte coletivo; certa insegurança urbana; a ausência de algumas infraestruturas; a falta de conservação de determinados espaços públicos. Em suma, observou-se que a percepção dos próprios moradores traz importantíssimos elementos para entender o espaço urbano local e, com efeito, os respondentes percebem as diferenças e desigualdades socioespaciais da/na cidade.

Palavras-chave: Espaço Urbano Contemporâneo, Diferenciação Socioespacial, Desigualdade Socioespacial, Agentes Produtores do Espaço Urbano, Entrevistas com Citadinos.

Abstract: The Brazilian urban spatial structure is marked by significant socio-spatial differentiations and inequalities. Spatial differences and injustices can be seen in most cities across the country, with significant inequalities in some locations, and more subtle in others. Our objective with this study was to analyze the perception of differences and inequalities in Poços de Caldas (MG), through reports from residents of the city's South Zone. To this end, the following methodological procedures were used: (i) bibliographical survey of the topic “socio-spatial differentiation and inequalities”, based on urban geography texts; (ii) bibliographic review about the (re)production of urban space in the South Zone of Poços de Caldas; (iii) fieldwork recording photographs and descriptions; (iv) semi-structured interviews with residents of the South Zone. Through the interviews, city dwellers reported that there are several factors that impact local urban life, such as: the distance between the southern urban sector and the rest of the urban fabric; the inefficiency of the public transport system; certain urban insecurity; the absence of some infrastructure; the lack of conservation of certain public spaces. In short, it was observed that the perception of the residents themselves brings extremely important elements to understand the local urban space and, in effect, the respondents perceive the socio-spatial differences and inequalities of/in the city.

Keywords: Contemporary Urban Space, Socio-spatial Differentiation, Socio-spatial Inequality, Urban Space Producer Agents, Interviews with City dwellers.

Resumen: La estructura espacial urbana brasileña está marcada por importantes diferenciaciones y desigualdades socioespaciales. Se pueden observar diferencias espaciales e injusticias en la mayoría de las ciudades del país, con desigualdades significativas en algunos lugares y más sutiles en otros. Nuestro objetivo con este estudio fue analizar la percepción de las diferencias y desigualdades en Poços de Caldas (MG), a través de relatos de residentes de la Zona Sur de la ciudad. Para ello se utilizaron los siguientes procedimientos metodológicos: (i) levantamiento bibliográfico del tema “diferenciación socioespacial y desigualdades”, a partir de textos de geografía urbana; (ii) revisión bibliográfica sobre la (re)producción del espacio urbano en la Zona Sur de Poços de Caldas; (iii) trabajo de campo registrando fotografías y descripciones; (iv) entrevistas semiestructuradas a residentes de la Zona Sur. A través de las entrevistas, los citadinos informaron que existen varios factores que impactan la vida urbana local, tales como: la distancia entre el sector urbano sur y el resto del tejido urbano; la ineficiencia del sistema de transporte público; cierta inseguridad urbana; la ausencia de alguna infraestructura; la falta de conservación de determinados espacios públicos. En definitiva, se observó que la percepción de los propios residentes aporta elementos sumamente importantes para comprender el espacio urbano local y, en efecto, los encuestados perciben las diferencias y desigualdades socioespaciales de/en la ciudad.

Palabras clave: Espacio Urbano Contemporáneo, Diferenciación Socioespacial, Desigualdad socio-espacial, Agentes Productores del Espacio Urbano, Entrevistas con habitantes de la ciudad.

Introdução

.

Evidentemente, a estrutura espacial urbana brasileira é marcada por expressivas diferenciações e desigualdades socioespaciais. As diferenças e injustiças espaciais podem ser vistas na maioria das cidades do território nacional, sendo, em algumas localizações desigualdades expressivas, em outras, mais sutis.

No mundo contemporâneo, segundo Carlos (2020), o espaço urbano é tratado como uma mercadoria, não fugindo às lógicas do capitalismo. Assim, as terras urbanas melhores localizadas e com mais amenidades apresentam elevados preços no mercado imobiliário, sendo vendidas a quem pode pagar. Já as terras que estão fora dos circuitos de valorização imobiliária, por terem menores preços no mercado fundiário, são, a princípio, destinadas às camadas populares da sociedade. Essa diferença nos preços da terra impacta tanto na divisão social do espaço quanto no aumento das desigualdades socioespaciais.

Tendo como norte as contribuições críticas supracitadas, o objetivo central deste estudo foi analisar a percepção das diferenças e desigualdades de Poços de Caldas (cidade localizada no sul do estado de Minas Gerais) (FIGURA 1), por meio de relatos dos moradores da Zona Sul da cidade. Justificamos a escolha dos relatos de moradores dessa zona urbana, pois, trabalhos anteriores que estudaram o espaço urbano de Poços de Caldas (SILVA; ANDRADE, 2019; SILVA, 2021) evidenciaram que, historicamente, processos de segregação socioespacial impactam a Zona Sul.

Poços de Caldas teve sua fundação atrelada às atividades turísticas das águas termais, jogos de azar e luxos em 1872. O turismo impulsionou o desenvolvimento da cidade, principalmente até meados do século XX, que gerou um centro principal paisagisticamente vultoso, dotado de praças, parques e edifícios históricos (ANDRADE, 2005). Até nos dias atuais a cidade ainda é reconhecida como uma estância turística de relevância no sul do estado de Minas Gerais.

A cidade passou por mutações nas atividades econômicas desde os anos 1950, quando foram implantadas indústrias de médio e grande porte na localidade. Tal industrialização somada ao êxodo rural ocorrido no Brasil durante o mesmo período influenciou no aumento demográfico e expansão urbana da cidade em direção a áreas periféricas que até então estavam sem ocupação (OLIVEIRA, 2012).

As áreas que surgiram desse acelerado processo de urbanização (impulsionado pela industrialização) foram a Zona Sul e as áreas ao extremo leste e oeste do território urbano. Evidentemente os setores periféricos estão distantes do centro principal, tendo em vista que a Zona Sul se localiza cerca de 10 km e as áreas mais periféricas da Zona Leste estão a cerca de 9,5 km do centro (SILVA, 2021).

Atualmente Poços de Caldas apresenta 163,7 mil habitantes (IBGE, 2023). A cidade concentra uma oferta de bens e serviços variados, dessa maneira, exerce influência numa quantidade considerável de cidades de pequenos e médios portes no Sul de Minas e em algumas cidades locais do interior do estado de São Paulo. De acordo com o estudo Regiões de Influência das Cidades – REGIC de 2018 (IBGE, 2020), Poços de Caldas é uma capital regional C, estando hierarquicamente superior a 26 municípios na rede urbana.


Figura 1
Mapa: localização de Poços de Caldas, Minas Gerais, Brasil
Elaboração e organização: o primeiro autor, 2023

Para a realização do presente trabalho, utilizou-se dos seguintes procedimentos metodológicos: (i) levantamento bibliográfico do tema “diferenciação e desigualdades socioespaciais”, a partir de textos de Geografia urbana; (ii) revisão bibliográfica acerca da (re)produção do espaço urbano de Poços de Caldas e, sobretudo, da Zona Sul da cidade; (iii) trabalhos de campo com registro de fotografias e descrições nos bairros da Zona Sul, observando os fixos e fluxos do setor urbano; e (iv) entrevistas semiestruturadas. Foram realizadas seis entrevistas com o intuito de coletar e analisar a percepção dos moradores da Zona Sul de Poços de Caldas (MG), sobre as diferenciações e/ou desigualdades socioespaciais da/na cidade e do/no setor urbano que vivem. Os perfis definidos foram: duas pessoas do perfil jovem adulto (18-30 anos); duas pessoas do perfil adulto (31-59 anos), e duas pessoas do perfil idoso (60 anos ou mais).

Estudos acadêmicos anteriores (OLIVEIRA, 2012; SILVA e ANDRADE, 2019; SILVA, 2021) revelaram que a expansão urbana na Zona Sul acarretou, em menor ou maior grau, no aumento da diferenciação socioespacial na/da cidade. De acordo com Silva (2021), mais de 4,4 mil lotes e/ou moradias de programas de habitação de interesse social foram implantados no setor sul da cidade (76,55% do total de lotes/moradias implantados em todo o município).

Atualmente, a Zona Sul de Poços de Caldas comporta boa parte do contingente populacional do município, correspondendo aproximadamente 27,8 mil habitantes (18,28%) conforme os dados do último Censo Demográfico oficial[1] (IBGE, 2010). Diante disso, a estrutura espacial urbana Poços de Caldas se mostra marcadamente diferenciada se comparada a Zona Sul aos demais setores urbanos.

Cabe indagar se as diferenças e desigualdades da/na cidade afetam a vida da população da Zona Sul. Ademais, como os moradores da Zona Sul percebem (se percebem) as desigualdades e diferenciações socioespaciais na cidade e/ou no setor urbano em que vivem?

Antes de tudo, julga-se necessário apontar a pertinência das abordagens que aprofundam na vida cotidiana, rompendo com a perspectiva da “visão de sobrevoo” (SOUZA, 2007). Souza (2007) critica a limitação no olhar de pesquisadores de diferentes áreas que estudam o espaço, que se preocupam apenas em observá-lo superficialmente, sem se ater aos processos e aos agentes envolvidos na produção do espaço. Segundo o autor, os geógrafos muitas vezes adotam uma perspectiva escalar, na qual privilegiam uma visão generalista do espaço e da sociedade, evitando se aprofundar nos pormenores da vida cotidiana e em questões sociais. Essa visão tecnicista também é adotada predominantemente pelo Estado.

Tal perspectiva é chamada por Souza (2007) de “visão de sobrevoo”. Ela, por muito tempo, foi privilegiada na Geografia, gerando diversas lacunas na representação da realidade sócio-espacial brasileira, ofuscando os problemas sociais que se manifestam na realidade urbana. Conforme o autor, o desinteresse no estudo do espaço a partir dos movimentos sociais está atrelado a essa visão “do alto”, que negligencia a perspectiva dos grupos excluídos que compõem as cidades.

Em suma, o presente trabalho é composto, além de introdução e considerações finais, por três partes de desenvolvimento. A primeira parte, denominada de “Diferenciação e desigualdades socioespaciais: distinções e semelhanças”, busca contextualizar teoricamente, dentro do arcabouço geográfico, os temas diferenciação e desigualdades socioespaciais.

A segunda parte denomina-se “A formação da Zona Sul de Poços De Caldas”. Ela traz, a partir da revisão bibliográfica acerca da (re)produção do espaço urbano de Poços de Caldas e da Zona Sul da cidade, como se configurou o setor urbano sul da cidade. Por fim, a terceira parte, “As diferenças e desigualdades na percepção dos moradores da Zona Sul de Poços de Caldas”, traz a percepção dos moradores entrevistados sobre o espaço em que estão inseridos, relatando suas realidades vivenciadas e suas percepções acerca da cidade e dos seus bairros.

Diferenciação e desigualdades socioespaciais: distinções e semelhanças

No mundo contemporâneo, o espaço urbano é produzido de modo diferenciado e desigual tendo como base a lógica capitalista. A Geografia, com seu arcabouço teórico-analítico e metodológico, busca explicar como a diferenciação espacial e as desigualdades socioespaciais se materializam no espaço.

Para a discussão proposta são trazidos autores críticos do espaço, isto é, autores que concebem a relação dialética e complementar entre espaço e sociedade. Isso nos permite dizer que, embora os adjetivos “espacial” e “socioespacial” não sejam sinônimos para alguns estudiosos, boa parte dos geógrafos aqui expostos segue a perspectiva da relação dialética e imbricada entre espaço e sociedade, do espaço geográfico produzido pelo trabalho social.

Ademais, na Geografia crítica, parte-se do pressuposto que os espaços são dinâmicos e estão em constante produção e transformação. Entende-se que a produção e reprodução desigual do espaço são realizadas por agentes sociais, econômicos e políticos diversos, em grande parte, por aqueles com maiores condições de atuação (CORRÊA, 1989).

No mundo contemporâneo, o Estado moderno tem papel fundamental na produção e organização do espaço, pois age de diversas maneiras e escalas no território, de modo que, ao mesmo tempo, é campo de atuação dos agentes sociais, além de ser um dos agentes produtores do espaço. Ele regulamenta as ações dos demais agentes sobre o território, efetuando o planejamento e construindo as infraestruturas básicas para manutenção da reprodução ampliada do capital e da vida cotidiana (CORRÊA, 1989).

No que tange aos proprietários dos meios de produção, proprietários fundiários e promotores imobiliários, esses atuam em consonância com os interesses capitalistas, reproduzindo as relações que perpetuam o controle social e espacial, e mantendo seus privilégios sobre as classes sociais que não possuem nem propriedade privada nem meios de produção (CORRÊA, 1989).

Por outro lado, os grupos sociais excluídos são compostos por sujeitos que não possuem as condições necessárias para usufruir plenamente do espaço, que, excluídos e quase sem opções, ocupam áreas precárias e, por vezes, segregadas. Esses grupos modelam o espaço de acordo com suas práticas cotidianas, diferenciando-o do restante do tecido urbano produzido pelos agentes hegemônicos (CORRÊA, 1989).

De acordo com Santos (1993), no Brasil, o processo de urbanização revela uma crescente associação com a pobreza. As cidades brasileiras, sobretudo, as metrópoles, são marcadas por severas desigualdades socioespaciais. Essas desigualdades são expressas nas diferenças na qualidade das infraestruturas, no acesso a serviços, na qualidade ambiental, dentre outros. Desse modo, a diferenciação socioespacial torna-se um grave problema no mundo contemporâneo, devido às diferenças (entre classes sociais ou grupos étnico-raciais, por exemplo) estarem cada vez mais subordinadas à lógica capitalista, essa última controlada e mantida pelas classes dominantes.

Levando em consideração que os diferentes grupos/classes sociais não têm as mesmas condições de consumo no âmbito do capitalismo, e que a lógica capitalista torna-se cada vez mais abrangente no mundo, a diferenciação apresenta-se como um agravante da desigualdade socioespacial, assim como a desigualdade reforça as diferenças (SPOSITO, 2011). Isso nos revela que diferença e desigualdade são processos/conceitos relacionados. Todavia, estes não devem ser vistos como sinônimos.

Sposito (2019, p. 1) destaca a importância da separação epistemológica entre os conceitos de desigualdade e diferença para análise do espaço. Para a autora,

[...] as desigualdades socioespaciais revelam-se como novas formas de diferenciação socioespacial, cujo conteúdo deixa de ser positivo, ou seja, associado à ideia de respeito à diferença, para ser negativo, visto que a condição espacial dos citadinos passa a ser base de suas impossibilidades ou possibilidades limitadas de viver e se apropriar da cidade, uma vez que condiciona suas práticas socioespaciais.

Dessa maneira, pode-se dizer que “diferença” está mais ligada às qualidades dos objetos, coisas ou sujeitos, enquanto “desigualdade” está ligada ao desnivelamento das diferenças. É importante ressaltar que a distinção entre tais noções/conceitos é tênue, já que são evidentemente relacionados (SPOSITO, 2019).

Para Corrêa (2022), a diferenciação espacial é

[...] o resultado de um longo e complexo processo que combinadamente reúne a ação da natureza e a ação humana, produzindo diferentes formas espaciais, a paisagem, os diversos usos da terra, os fluxos e, em breve, a organização do espaço, manifestação dos processos da natureza e da ação humana.

Sposito (2011; 2019) afirma que a diferenciação socioespacial acompanha a história das cidades e da urbanização, desde os primórdios. As cidades se diferenciam entre si, há também diferenciação entre os espaços urbano e rural. A diferenciação do espaço da sociedade está relacionada à divisão social do trabalho, que por sua vez, é expressa na divisão territorial do trabalho.

No mesmo sentido, Corrêa (2022, p.8) coloca que

A diferenciação espacial é parte integrante da vida humana, de sua diversidade. Efetiva os diferentes modos de ver, sentir, pensar, conhecer, comunicar e agir, mas também de sofrer, lutar e vencer. Não deve ser eliminada, pois isso seria a negação da natureza do ser humano. É a desigualdade espacial, o lado perverso da diferenciação espacial, que deve ser eliminada.

Vasconcelos (2013) aponta a distinção entre as noções de diferenciação socioespacial e desigualdades socioespaciais. Para o referido autor, a diferenciação socioespacial pode ser vista nas diferenças das estruturas espaciais. Ela aparece em diversos contextos e é o resultado de múltiplos processos, podendo se manifestar de diferentes formas no espaço. Por vezes, as diferenças entre determinadas áreas são notórias, e em outros casos, mais sutis.

Por outro lado, Vasconcelos (2013) afirma que a desigualdade socioespacial pode ser menos visível a olho nu do que a diferenciação, uma vez que as desigualdades sociais podem estar ocultas no espaço, por meio de um mesmo padrão urbanístico, ou pela ausência de padrões.

Por sua vez, Rodrigues (2007. p. 78) afirma que “A desigualdade socioespacial e a precariedade para a reprodução da vida são produtos do modo de produção e, ao mesmo tempo, são condição de permanência nas mesmas condições precárias”. Prevalecendo, desse modo, o valor de troca sobre o valor de uso”.

Levando em consideração os autores supracitados, entende-se que diferenciação e desigualdades socioespaciais são processos que se entrecruzam no movimento de (re)produção do espaço. Autores como Corrêa (1989), Rodrigues (2007), Carlos (2007), Vasconcelos (2013) e Sposito (2011, 2019) propõem, por intermédio de diferentes perspectivas, diversas abordagens que contribuem para a compreensão desses conceitos/noções.

A formação da Zona Sul de Poços de Caldas

Poços de Caldas (MG) teve sua fundação em 1872, baseada nas atividades turísticas atreladas às águas sulfurosas, posteriormente, aos jogos de azar e luxos. Em função desse histórico, consolidou-se um centro paisagístico vultoso, dotado de praças, parques e grandes edifícios históricos (ANDRADE, 2005).

Os “anos dourados” do turismo poços-caldense permaneceram até meados do século XX. Com a lei 9.215/46, sobre a proibição dos jogos de azar no país, houve uma diminuição do fluxo de turistas para a localidade, desse modo, a cidade passou por mutações em suas atividades econômicas. Como destaca Oliveira (2012), foram implantadas indústrias na cidade, que influenciaram no aumento demográfico e expansão urbana em direção às áreas periféricas, acarretando a expansão das zonas Sul e Leste, consideravelmente distantes do centro principal, aproximadamente 10 km e 9,5 km, respectivamente.

O desenvolvimento urbano da Zona Sul se procedeu, inicialmente, a partir da instalação do aeroporto local, que foi inaugurado nos anos finais da década de 1930. Entre os anos finais da década de 1960 e início da década de 1970, começaram a se formar os primeiros bairros residenciais. A Zona Sul se conecta com o restante da cidade somente por dois eixos rodoviários: BR-146 e Av. Geraldo Martins Costa (SILVA; ANDRADE, 2019).

Na Figura 2 é possível observar que na atualidade o aeroporto está rodeado por bairros residenciais e pelo Parque Ecológico da Zona Sul. A norte do aeroporto se encontram os bairros Jardim Kennedy I e Conj. Hab. Jardim Kennedy II, que são bairros ocupados por populações de menores rendimentos. Ademais, no Jardim Kennedy I é recorrente a ocorrência de enchentes nos períodos chuvosos, situação que prejudica a população local[2]. A sul, estão os bairros Jardim Aeroporto, São Bento, Conj. Hab. Pedro Affonso Junqueira e Parque das Nações. Nestes bairros se encontram populações de segmentos sociais distintos, contudo há maior quantidade de indivíduos com menores rendimentos.


Figura 2
Mapa: Zona Sul de Poços de Caldas
SILVA, 2021.

Em 1981 foi inaugurado o maior projeto de habitação de interesse social de Poços de Caldas, na Zona Sul da cidade, o Conjunto Habitacional Pedro Affonso Junqueira - COHAB (FIGURA 2) (SILVA e ANDRADE, 2019; SILVA, 2021). Atualmente o COHAB é um bairro com um conteúdo social diversificado, dotado de diversos conteúdos sociais, culturais e econômicos. A centralidade exercida pelo bairro, nos dias atuais, pode ser evidenciada a partir dos elevados fluxos ocorridos diariamente no mesmo, em função dos estabelecimentos comerciais e de serviços em suas principais vias. Contudo, o “subcentro sul” dispõe de uma variedade de ofertas de produtos e serviços ainda limitados, se comparado ao centro principal da cidade.

O desenvolvimento da área adjacente foi orientado pela implantação do COHAB, que já consolidado, possibilitou a criação de loteamentos próximos e em torno da BR-146, como o Parque das Nações e Jardim Aeroporto, nas décadas seguintes. Apesar desses loteamentos não serem implantações diretamente estatais, seguem a mesma dinâmica direcionada a população de baixa renda, com a exploração do espaço por parte dos promotores imobiliários.


Figura 3
Vista Parcial da Zona Sul de Poços de Caldas
arquivo pessoal do segundo autor.

A figura 3, fotografia capturada a partir de um ponto mais alto da porção sul, revela parcialmente a morfologia urbana da Zona Sul. É visto que esta porção da cidade está em crescente adensamento, com a construção de novos prédios residenciais e equipamentos públicos para o atendimento das demandas da população local. Observa-se que o sítio urbano local é composto por áreas declivosas e áreas de fundo de vale. Embora tenha acelerado o processo de ocupação nesta zona, ainda são encontrados vazios urbanos, como é visto em no restante da cidade.

Ao longo dos anos, com o crescimento e desenvolvimento dos bairros da Zona Sul, a área despertou interesse ao mercado imobiliário, com isso, novas áreas foram surgindo nas adjacências. Listam-se os bairros: Jardim Paraíso, Jardim Contorno e Jardim Daniele, essas apesar de não serem provenientes do Estado, foram ocupadas pelas camadas populares. Desse modo, áreas próximas aos bairros existentes foram incorporadas, ao mesmo tempo em que novas áreas foram se desenvolvendo ao longo da Av. Geraldo Martins Costa, que até então não era explorada para fins residenciais (FIGURA 3).

Atualmente, os bairros mais recentes apresentam elevado adensamento de construções e verticalização, tendo em vista a vasta quantidade de prédios de poucos andares, fator que evidencia o máximo aproveitamento do solo por parte dos promotores imobiliários, a fim de conseguir o maior lucro possível. Não é difícil de encontrar a presença de diversos pequenos condomínios fechados. Ressalta-se que a população local adquiriu maior preocupação com a segurança urbana, tendo em vista a fortificação das novas residências por meio de muros, grades e sistemas de vigilância particular.

A partir da segunda década dos anos 2000, foi implantado o Residencial Tiradentes, bairro que, apesar da expressiva distância em relação ao centro principal, apresenta edificações com padrão mais elevado do que outros bairros da Zona Sul. E, atualmente, está em construção um grande empreendimento realizado pela empresa BRZ, o “Portal Encantos de Bolonha”, localizado no bairro. O empreendimento será um condomínio fechado com sistema de segurança e espaço de lazer interno, composto por 23 torres de 4 andares com 4 apartamentos de 2 quartos com suíte, em cada andar.

Esse empreendimento revela as transformações ocorridas na Zona Sul de Poços de Caldas. As estratégias mercadológicas são vistas nas propagandas utilizadas pela construtora responsável:

O condomínio é fechado com lazer de clube, entregue mobiliado, equipado e decorado. Tudo isso na melhor localização do Bairro Tiradentes, perto de tudo o que você precisa para viver bem e com qualidade de vida; equipado com lazer de clube e segurança de condomínio fechado, tudo isso na localização que mais cresce e valoriza na cidade (CONSTRUTORA BRZ, online, 2022).

Em suma, a Zona Sul de Poços de Caldas, desde sua criação, foi direcionada aos segmentos sociais de menores rendimentos. Todavia, com o passar do tempo, o setor se desenvolveu, e atualmente apresenta uma diversidade de paisagens urbanas, cada qual com suas formas e funções.

Dando prosseguimento à pesquisa proposta, no próximo tópico, são trazidas as falas dos próprios residentes da Zona Sul. O intuito é desvendar como os citadinos residentes da Zona Sul concebem seu espaço cotidiano, assim como as desigualdades socioespaciais de Poços de Caldas.

As diferenças e desigualdades na percepção dos moradores da Zona Sul de Poços de Caldas

A primeira entrevistada, Lara[3], perfil “jovem adulto”, tatuadora, 25 anos, mora no bairro Parque das Nações, e sua vida inteira reside na Zona Sul. Ela mora na residência do seu pai (o proprietário da casa), com outras 4 pessoas (pai, mãe e seus dois irmãos). Lara percebe problemas sociais e urbanos no bairro onde ela mora, segundo suas palavras: “[...] sim, porque aqui concentra um número de pessoas mais carentes, com uma renda mais baixa, é um conjunto habitacional, então é um projeto social” (Resposta de Lara, 2022). Conforme a fala da entrevistada, pode haver relação entre os problemas no bairro e a concentração de uma população mais carente. Além disso, ela destaca os problemas de infraestrutura, como ruas esburacadas.

Apesar de Lara se locomover de veículo particular (motocicleta), ela tem a percepção da má qualidade do serviço de transporte coletivo do seu bairro, segundo ela:

Eu acho que não é eficiente, porque muitas vezes eu uso a moto, mas já usei também o transporte público e de manhã os ônibus estão lotados, ele passa reto e as pessoas ficam para trás, sem tirar que em alguns bairros aqui da Zona Sul ele [o transporte coletivo] demora horas para passar, então eu não acho eficaz não, ele é bem ruim (Resposta de Lara, 2022).

No que se refere a sua percepção de desigualdade na cidade, da relação entre Zona Sul e outras áreas da cidade, Lara comenta que para os outros bairros parece ser mais fácil acessar ao centro, enquanto a Zona Sul é mais distante, o que gera alguns empecilhos.

Lara percebe as dificuldades na mobilidade e acessibilidade dos moradores da Zona Sul para outros setores da cidade. Ela vê que a Zona Sul só se conecta com as outras partes da cidade por apenas dois eixos rodoviários, os já mencionados BR-146 e Av. Geraldo Martins Costa. E os empecilhos que a moradora observa se relacionam mais com a questão do transporte coletivo deficitário.

O segundo entrevistado, Moisés, 83 anos, compõe o perfil “idosos”, morador do bairro Jardim Esperança. Ele mora a aproximadamente 75 anos em Poços de Caldas, desses, os últimos 30 na Zona Sul. O mesmo comenta que a vida toda trabalhou como padeiro e cozinheiro, mas hoje é aposentado.

Moisés é proprietário do imóvel em que reside, e aponta que adquiriu o terreno pagando parceladamente, e que construiu o imóvel com muita dificuldade, através de iniciativa própria com ajuda de familiares, de acordo com as palavras dele: “Adquiri com muito sacrifício, muito esforço, carreguei muito material nas costas pra poder conseguir o que a gente tem hoje, e depois ajuda, né? Tive meus filhos, que me ajudaram, tudo direitinho, pra hoje a gente ter alguma coisa” (Resposta de Moisés, 2022).

Atualmente Moisés mora com sua esposa, filha e neta, em uma casa de uso exclusivamente residencial, com os mesmos padrões arquitetônicos das casas ao redor. Quando questionado a respeito de problemas urbanos encontrados no seu bairro, ele comenta das ruas esburacadas no seu bairro e da Zona Sul em geral.

Moisés destaca que gosta muito de viver na Zona Sul, considerando seu bairro ótimo, assim como a cidade de Poços de Caldas, porém, segundo ele, a área em que reside sofre com baixa oferta de serviços e ineficácia do sistema de transporte coletivo.

O entrevistado compara seu bairro com o COHAB (Zona Sul): “Precisava ter um posto policial aqui, como tem no Conjunto [COHAB]” (Resposta de Moisés, 2022). Ele acrescenta:

Tem muito bairro aqui, que a gente não conhece ainda, porque aumentou muito, os que a gente conhece, a gente vai poucas vezes se a gente foi, que a gente conhece, né? Que é o Conjunto, que é um lugar que tem de tudo, e a gente tá sempre lá, que lá tem dois hospitais agora, muita coisa boa (Resposta de Moisés, 2022).

Nota-se em sua resposta que, com o passar do tempo e consequente expansão das áreas urbanizadas do setor sul, o COHAB passou a exercer certa centralidade na Zona Sul, sendo responsável por ofertar serviços e produtos localmente. Quando questionado se percebe alguma desigualdade na cidade, Moisés não comentou sobre a Zona Sul, mas disse em relação a moradores de outras áreas da cidade, afirmando que percebe uma expressiva diferença no modo de vida dos moradores de outras áreas urbanas.

O terceiro entrevistado, Josué, 69 anos, zelador em uma escola na Zona Leste, atualmente morador do Conjunto Habitacional Pedro Affonso Junqueira, conta que migrou para Poços de Caldas em 1970, mas há 42 anos é domiciliado na porção sul da cidade. Josué relata que é dono do imóvel em que mora com a esposa, e que seu filho também reside no mesmo endereço, porém em uma casa aos fundos. Relatou como adquiriu sua casa: “Adquiri, por financiamento, né (sic)? Na época foi feito financiamento, pela COHAB, aí a gente aproveitou e fez esse financiamento aí” (Resposta de Josué, 2022).

Vale mencionar que, na década de 1980, o COHAB foi um dos primeiros bairros construídos na Zona Sul. Atualmente, as casas foram alteradas de sua configuração original, por meio de reformas e melhorias feitas pelos moradores. Também foram observados, assim como nas respostas de Moisés, que os problemas atrelados à insegurança, como a falta de policiamento.

Josué está presente no bairro desde a fundação, portanto acompanhou as transformações espaciais locais, e nota melhorias em relação aos problemas enfrentados pelos moradores que ali estavam nas duas últimas décadas do século passado, segundo ele:

Antes, antigamente, era muito difícil, não tinha muito ônibus, o bairro não tinha muito saneamento básico, não tinha asfalto, não tinha nada, certo? Era terra, então no começo foi muito difícil, pelo que nós já passamos melhorou bastante, pode melhorar mais, mas é um bairro que não é tão ruim (Resposta de Josué, 2022).

Assim como Moisés, Josué pôde observar diretamente as mudanças ocorridas na Zona Sul, e talvez por isso expresse percepções positivas sobre o presente, em relação às transformações ocorridas, já que, segundo ele, as condições no passado eram mais precárias.

A quarta entrevistada é Isabel, 48 anos, servidora pública municipal, atuando em uma unidade de ensino na zona rural de Poços de Caldas. É residente de Poços de Caldas desde seu nascimento, e do Jardim São Bento (Zona Sul) desde 2010, ano em que conseguiu sua casa própria. Atualmente mora com seu marido e três filhos.

O seu bairro é mais recente, em relação aos outros bairros da Zona Sul, apresentando construções em andamento e casas esteticamente diferentes. Isabel considera seu trabalho muito distante de sua casa. Para chegar até o trabalho, ela utiliza o serviço de transporte coletivo público até o centro, e faz baldeação para um veículo fornecido pela prefeitura até a escola em que trabalha, localizada na região norte (rural) da cidade.

A entrevistada percebe a existência de desigualdades em Poços de Caldas, segundo suas palavras:

Aqui a qualidade de vida é pior por conta desse deslocamento, porque tempo é essencial, e a gente não tendo tempo, a gente perdendo muito tempo no transporte coletivo, não tendo os produtos e bens que a gente precisa, a gente tem que se deslocar, e fora também a estrutura, é em termos de paisagismo mesmo, é bem deficiente, falta muita estrutura aqui (Resposta de Isabel, 2022).

Nota-se, na fala de Isabel, que ela não está satisfeita com seu bairro e setor, acreditando que outros bairros e o centro da cidade recebam mais atenção e investimentos públicos em detrimento de outras áreas mais distantes e periféricas. Ela comenta: “esse fato da gente tá (sic) distante, já gera, dentro do nosso interior, uma sensação de inferioridade, porque parece que a ‘beleza’ fica centrada no centro, nos bairros nobres” (Resposta de Isabel, 2022).

Liza, 20 anos, perfil “jovem adulto”, é recepcionista em um estabelecimento no Centro de Poços de Caldas. Ela reside há apenas cinco anos na cidade, tempo esse que morou em 3 diferentes localizações da Zona Sul, atualmente, residindo em uma casa geminada, cedida pelo seu avô, com mais cinco pessoas (mãe, avô, irmão, cunhada e sobrinho). A casa fica localizada no Conjunto Habitacional Pedro Affonso Junqueira (COHAB), mesmo bairro do entrevistado Moisés, e apresenta os mesmos padrões das casas do entorno.

Liza cita problemas urbanos relacionados à insegurança, percebidos por ela na COHAB, que ocorrem principalmente de noite, como a presença de pontos de comércio de drogas e falta iluminação em algumas vias próximas à sua casa.

Ainda, sobre os problemas urbanos no setor urbano sul, como os demais entrevistados, critica o transporte público: “Na Zona Sul é péssimo [o transporte público]”, vale ressaltar, que Liza utiliza apenas o transporte público oferecido pelo município para se locomover pela cidade e para chegar até o seu trabalho, que considera distante de sua casa, há aproximadamente 40 minutos de ônibus, a percepção sobre a extensa distância também é compartilhada por ela.

Acerca de sua percepção sobre Poços de Caldas, Liza considera que é uma cidade muito desigual, principalmente relacionada a rendas dos moradores, em suas palavras:

É uma cidade onde a qualidade de vida é muito boa, só que eles esperam que você tenha uma renda onde você não tem, então a maioria das pessoas tão (sic) tudo lá na Zona Sul e não tem tanta renda assim, mas tem que viver o que o pessoal do centro vive, o que o pessoal da zona mais rica vive, então isso que eu acho um pouco mais complicado (Resposta de Liza, 2022).

O sexto entrevistado, Tim, 36 anos, professor de ensino básico, vive na Zona Sul há 13 anos, porém, residente em Poços de Caldas sua vida toda. É dono da casa em que mora, no Jardim Kennedy I, com mais duas pessoas, e trabalha em uma escola pública localizada em seu bairro. Ele relata que adquiriu sua casa em um programa habitacional de financiamento, para imóveis usados.

Tim percebe certa ausência de atividades e infraestruturas atreladas à cultura e ao lazer, ausência esta que, muitas vezes, é suprida pela escola, conforme sua fala:

São sempre aqueles modelos de praça ou de parque muito padronizados, que basicamente tem em todos os lugares, vêm e faz a inauguração, e depois, a manutenção é muito deficitária, e com o passar do tempo, o local depreda e fica em condições ruins de uso, e a gente praticamente não tem um espaço cultural pra teatro ou biblioteca que seja mais próximo, as referências são sempre a escola ou a biblioteca pública ali no Conjunto, que, de certa forma, pelo porte da Zona Sul, é uma biblioteca considerável pequena e que é pouco fomentada para uso (Resposta de Tim, 2022).

O entrevistado considera existir desigualdades na cidade, percebendo as zonas Sul e Leste como os setores urbanos com menores qualidades urbanísticas. Inclusive, aponta diferenças internas na Zona Sul. Em suas palavras:

Dentro mesmo da Zona Sul você vai ter discrepâncias, né? Então, se você pegar algumas áreas do Kennedy I em relação ao Kennedy II, elas já são muito díspares, né? Se comparar o Conjunto Habitacional com o Parque das Nações, você também já nota diferença no cuidado com as vias, no próprio acabamento das casas, a própria arquitetura já mostra uma certa disparidade (Resposta de Tim, 2022).

Isto é, Tim percebe as desigualdades na cidade, atribuindo os problemas ao poder público, que, segundo ele, não age em razão da qualidade de vida da população sul, principalmente no que diz respeito à cultura e lazer.

Durante a análise das respostas dos entrevistados, evidencia-se certa semelhança. Todos os entrevistados criticaram negativamente a qualidade do sistema de transporte coletivo oferecido nos diferentes bairros da Zona Sul. Observa-se a insatisfação através das falas dos entrevistados que utilizam o transporte público por diversas razões. Alguns bairros da Zona Sul ficam localizados a cerca de dez quilômetros do centro principal.

O deslocamento constante para o centro também se mostra necessário para quase todos os entrevistados. As respostas sinalizam que a Zona Sul, apesar de possuir um subcentro e áreas que ofertam serviços e produtos, não atende todas as demandas e necessidades da população.

Considerações finais

Segundo as respostas obtidas com as entrevistas, existem diversos fatores que impactam a vida urbana da Zona Sul, sendo: a distância entre o setor urbano sul e o restante do tecido urbano; o sistema de transporte coletivo; a insegurança urbana; a ausência de algumas infraestruturas; a falta de conservação dos espaços públicos locais.

De fato, existem diversas lacunas para melhor compreensão da geografia da Zona Sul de Poços de Caldas (MG). Este trabalho pretendeu realizar uma breve discussão sobre as diferenciações e desigualdades socioespaciais da cidade pela ótica da população que vive em setores urbanos periféricos, entretanto, é possível combinar outros olhares, bem como analisar por meio de outras escalas, podendo, assim, entender com maior clareza as práticas espaciais e o cotidiano urbano.

Em suma, observa-se que a percepção dos próprios moradores da Zona Sul traz importantíssimos elementos para entender o espaço urbano local. Evidentemente, os respondentes percebem as diferenças e desigualdades socioespaciais da/na cidade.

Agradecimentos

O primeiro autor agradece o apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP por meio da bolsa concedida pelo processo n° 2022/05362-7.

Referências

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VASCONCELOS, Pedro de Almeida; CORRÊA, Roberto Lobato; PINTAUDI, Silvana Maria. A cidade contemporânea: Segregação espacial. Editora Contexto: São Paulo, 2013.

Notas

[1] Nos últimos anos houve atrasos relacionados a entrega dos resultados finais do censo demográfico. Sabe-se que tal situação ocorre não por culpa do IBGE, mas pelo contexto enfrentado que soma a pandemia, dificuldades logísticas e questões orçamentárias. Em função disso, trouxemos os resultados de 2010 que, embora estejam defasados, tiveram notável precisão em mostrar a realidade populacional do país no período. No caso deste trecho, analisamos um conjunto de setores censitários que correspondem a área onde está localizada a Zona Sul de Poços de Caldas, somando os valores populacionais dos setores e realizando as operações matemáticas para ver quanto correspondia no total populacional do ano de referência no mesmo censo. Acreditamos que com a disponibilidade dos resultados do universo do Censo Demográfico de 2022, será possível realizar a atualização deste número.
[2] O Jardim Kennedy I teve o início da ocupação nos anos 60, e desde sempre parte deste bairro apresentou problemas com enchentes locais. Nas últimas décadas, o poder público municipal criou alguns mecanismos para reduzir os problemas da localidade, como: realizar a drenagem urbana e fazer com que os proprietários ficassem impedidos de construir e comercializar os terrenos assentados nas áreas com alto risco de inundação. Os proprietários dos terrenos podem manifestar o interesse na desapropriação junto à Prefeitura, esta última realiza a aquisição dos lotes com os recursos disponíveis em caixa. Esse processo de desocupação ocorre por décadas e, como é de conhecimento geral, nem sempre a desapropriação é interessante para o proprietário, uma vez que há o pertencimento do morador com a localidade.
[3] Todos os nomes utilizados nesta pesquisa são fictícios, para preservar a identidade dos respondentes.
Eduardo de Araujo da Silva É Graduado em Geografia pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS) e mestre em Geografia pela Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL). Atualmente cursa Doutorado no Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP).

Endereço: Rua Roberto Símonsen, 305, Centro Educacional, Presidente Prudente, SP, Brasil, CEP:19.060-900.

Pedro Gabriel de Paiva Francisco É Graduado em Geografia pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS).

Endereço: Av. Dirce Pereira Rosa, 300 - Jardim Esperanca, Poços de Caldas, MG, Brasil, CEP: 37.713-100.



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