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Indicadores morfométricos e uso da terra na bacia do riacho Cana Brava, norte de Minas Gerais
Morphometric indicators and land use in the Cana Brava Basin, north of Minas Gerais
Indicadores morfométricos y uso de la tierra en la cuenca del riacho Cana Brava, al norte de Minas Gerais
Revista Cerrados (Unimontes), vol. 20, núm. 02, pp. 378-400, 2022
Universidade Estadual de Montes Claros



Recepción: 03 Octubre 2022

Aprobación: 28 Diciembre 2022

Publicación: 29 Diciembre 2022

DOI: https://doi.org/10.46551/rc24482692202232

Resumo: As transformações, em determinados espaços, são condicionadas, principalmente, aos fatores físicos ali existentes. As bacias hidrográficas, como unidades de análises, permitem uma maior compreensão dessas transformações. A análise do uso e ocupação do solo é utilizada para entender a dinâmica em que o espaço é transformado. Ao determinar a unidade de análise, a escala temporal e a metodologia possibilita-se a obtenção de informações acerca de toda temática ambiental. Destarte, o objetivo desse trabalho é a caracterização morfométrica de uma bacia hidrográfica e, concomitantemente, a análise temporal do uso e ocupação do solo referente aos anos de 1985 a 2020. Para tanto, utilizou-se de ferramentas de geoprocessamento aplicado para cartografação temática relativa à caracterização da área de estudo, a determinação dos coeficientes relativos à morfometria e dados relativos a usos e a ocupações dos solos na escala temporal proposta, disponíveis na plataforma MAP BIOMAS e Trabalho de Campo. Os resultados, obtidos na pesquisa, permitiram concluir que o uso e a ocupação do solo são determinados por fatores físicos e fatores morfométricos.

Palavras-chave: Bacia hidrográfica, Geoprocessamento, Morfometria, Uso do solo.

Abstract: The transformations, in certain spaces, are conditioned, mainly, to the physical factors that exist there. The hydrographic basins, as units of analysis, allow a greater understanding of these transformations. The analysis of land use and occupation is used to understand the dynamics in which the space is transformed. By determining the unit of analysis, the time scale and the methodology, it is possible to obtain information about all environmental issues. The objective of this work is the morphometric characterization of a watershed and, concomitantly, the temporal analysis of the use and occupation of the land referring to the years 1985 to 2020. of the study area, the determination of coefficients related to morphometry and data related to land uses and occupations in the proposed time scale, available on the MAP BIOMAS platform and Field Work. The results obtained in the research allow us to conclude that land use and occupation are determined by physical and morphometric factors.

Keywords: Hydrographic basin, Geoprocessing, Morphometry, Use of the soil.

Resumen: Las transformaciones, en determinados espacios, son condicionadas, principalmente, a los factores físicos allí existentes. Las cuencas hidrográficas, como unidades de análisis, permiten una mayor comprensión de esas transformaciones. El análisis del uso y ocupación del suelo es utilizada para entender la dinámica en que el espacio es transformado. Al determinar la unidad de análisis, la escala temporal y la metodologia es posible la obtención de informaciones acerca de toda temática ambiental. De este modo, el objetivo de este trabajo es la caracterización morfométrica de una cuenca hidrográfica y, concomitantemente, el análisis temporal del uso y ocupación del suelo referente a los años de 1985 a 2020. Para tanto, fueron utilizadas herramientas de geoprocesamiento aplicado para cartografia temática relativa a la caracterización del área de estudio, la determinación de los coeficientes relativos a la morfometria y datos relativos a usos y a ocupaciones de los suelos en la escala temporal propuesta, disponibles en la plataforma MAP BIOMAS y Trabajo de Campo. Los resultados, obtenidos en la investigación, permitieron concluir que el uso y la ocupación del suelo son determinados por factores físicos y factores morfométricos.

Palabras clave: Cuenca hidrográfica, Geoprocesamiento, Morfometria, Uso del suelo.

Introdução

As transformações ocorridas, em determinados espaços, decorrentes de determinadas práticas de manejo, ocasionam mudanças na morfologia e nas variáveis que compõem os sistemas hidrológicos. A realização de estudos de análise ambiental, considerando estas alterações ocorridas, fornecem indicadores possíveis para compreensão das mudanças ocorridas após as atividades humanas.

Segundo Guerra e Marçal (2014, P. 13-14), os problemas de cunho ambiental são “multifacetados” e, já estão postos há vários anos, não existindo uma determinada análise unitária para diagnóstico e enfrentamento de tal, mas “o que existe é uma combinação infinita e aleatória desses fatores que tornam a estrutura, o estudo e o encaminhamento de soluções tarefas para uma abordagem não mais multidisciplinar, mas sim, transdisciplinar”.

As bacias hidrográficas, como unidades básicas de análise, permitem um estudo integrado de seus elementos e problemas. Carvalho (2020, P. 141) coloca que tal unidade de estudo “são tidas no âmbito do planejamento territorial como a unidade básica de análise para o desenvolvimento de ações e medidas estruturais e não estruturais com a perspectiva de integração entre a gestão dos recursos hídricos e a gestão ambiental”. Consideradas como regiões naturais bem definidas e integradas, as bacias hidrográficas, com os seus diferentes usos, são de vital importância para a vida no planeta.

Antes de iniciar os estudos e análises sobre uma bacia hidrográfica, cabe elencar alguns conceitos, propriamente dito, muitos são eles, mas a maioria define a bacia hidrográfica, basicamente, como uma área drenada por um principal e seus contribuintes. Pires, Santos e Del Prette (2002, P. 17), conceituam a bacia hidrográfica como: “[...] terras drenadas por um corpo d’água principal e seus afluentes e representa a unidade mais apropriada para o estudo qualitativo e quantitativo do recurso água e dos fluxos de sedimentos e nutrientes”. Para Petersen (2014), as bacias hidrográficas são sistemas abertos, que envolvem entradas e saídas de água, sedimentos e energia.

Para o estudo dessas e outras unidades de estudo a utilização de Sistemas de Informações Geográficas (SIG) são cada vez mais utilizados. Sua aplicabilidade permite diversas análises em gabinete e a ida a campo somente para a validação de alguns dados. Ainda sobre a utilização de SIG para utilização e gerenciamento de dados, Ferreita et all. (2011, P. 1170), colocam que tais técnicas, “vêm se impondo como uma importante ferramenta para visualização, manipulação e análise de dados espaciais podendo fornecer subsídios no sentido de nortear metas, planos e ações para gestão e organização do espaço”.

No que concerne aos estudos morfométricos de diferentes sistemas hidrológicos, esse permite, de maneira científica, análises geomorfológicas, principalmente, às formas de relevo, evidenciando as forças endógenas e exógenas que moldam a superfície terrestre, implicando diversos fatores condicionantes à manutenção do equilíbrio ambiental. Segundo Leite e Rocha (2015, P. 6595) “as variadas formas pela qual o relevo terrestre passa desde a sua gênese à fisionomia atual descrevem etapas que cronologicamente descrevem seu ciclo evolutivo ou de desenvolvimento”. A análise integrada de vários elementos, a partir de dados morfométricos e diferentes dados físicos, possibilita a compreensão dos processos dominantes que variam de acordo com a grandeza dos sistemas hidrológicos e geomorfológicos.

Materiais e métodos:

Caracterização da área de estudo

Caracterização da área de estudo

A área em estudo trata-se da bacia hidrográfica do Riacho Cana Brava, localizada na Região Sudeste do Brasil e Norte do Estado de Minas Gerais (figura 1), nos municípios de São João da Lagoa, Coração de Jesus e Ibiaí. O rio principal da bacia do Riacho Cana Brava constitui tributário direto do Rio São Francisco à margem direita.

O relevo da área de estudo é bem diversificado, revelando diferentes formas, onde nota-se a ação dos corpos hídricos que o moldam, obtendo classes de declividade que prevalecem na maior parte do plano, ora suave, ora ondulado e em algumas áreas escarpado, essas, geralmente, associadas a ações erosivas e ao relevo cárstico.


Figura 1
Localização, Hipsometria e declividade da bacia do Riacho Cana Brava
Os autores.


Figura 2
Mapa geológico e pedológico da Bacia do Riacho Cana Brava
Os autores.

O Grupo Bambuí, composto por litologias sedimentares, compõe as formações Serra da Saudade, Lagoa do Jacaré e Serra de Santa Helena, conforme Chaves e Andrade (2013), localizadas na maior parte da bacia, no terço médio e no alto curso, evidenciando seu caráter sedimentar. Chama-se a atenção a Formação Lagoa do Jacaré que possui em sua composição rochas carbonáticas, que caracterizam o relevo cárstico, marcado por feições espeleológicas e, até drenagens criptorreicas, podendo ser ratificadas pelas cavernas, dolinas e demais feições cársticas presentes na área de estudo.

Outro fator de grande importância na análise geológica da bacia em questão, também referente ao relevo cárstico, são as escarpas rochosas ao longo da calha do rio principal, além de modelados de feições espeleológicas, que caracteriza não apenas um modelado de dissecação, mas também um modelado de dissolução, uma vez que o carste, presente na área, evidencia-se pela dissolução nos corpos rochosos.

Os solos da bacia caracterizam-se por Neossolos Quarzarenicos, nas partes mais elevadas e planas, Argissolo Vermelho ao longo da depressão do rio principal, Latosolos Vermelho e Latosolos Vermelho Amarelos nos extremos do alto e baixo curso da bacia, Neossolos litólicos no baixo curso e uma pequena parte na foz do rio principal, que é caracterizado por Neossolos Flúvicos, essa área é interferida pela sedimentação aparente do Rio São Francisco.

Já a Geomorfologia da área, (figura 3), é caracterizada por diferentes compartimentos e modelados. Para seu estudo, utilizou-se o mapeamento do IBGE (2009), na escala 1:250.000. Vale ressaltar que tal escala é imprecisa em algumas áreas, assim é necessária uma complementação de produtos cartográficos e confirmações em campo.

A compartimentação do relevo é marcada em sua maioria por patamares, que segundo o IBGE (2009, P. 30), se caracterizam por “relevos planos ou ondulados, elaborados em diferentes classes de rochas, constituindo superfícies intermediárias ou degraus entre áreas de relevos mais elevados e áreas topograficamente mais baixas”, as chapadas são caracterizadas, em sua maioria, por um relevo mais plano, confirmadas pelas classes de declividade.


Figura 3
Geomorfologia da bacia do Riacho Cana Brava
Os autores (2022).

A classe de Depressões encontra-se no baixo curso da bacia que, segundo o IBGE (2009, P. 30), “são conjuntos de relevos planos ou ondulados situados abaixo do nível das regiões vizinhas, elaborados em rochas de classes variadas”. E, por fim, na porção mais baixa da bacia é encontrada a classe de planície, a qual perfaz uma pequena área. Outro tema referente à geomorfologia contemplada nos estudos, sobre a bacia em questão, foram os modelados do relevo. Para tanto, utilizou-se mais uma vez o IBGE (2009).

Nota-se que em sua maior parte, a bacia é formada pelos modelados de dissecação, que por sua vez se subdividem em: “Topos Convexos” (Dc) e “Topos aguçados” (Da). Segundo Bertolini e Deodoro (2018, P. 183), “A dissecação é uma característica do relevo que reflete a energia que perpassa por determinado sistema geomorfológico ao longo de sua esculturação recente”.

Os modelados de dissecação de “Topos Convexos”, segundo IBGE (2009, P. 44), “São caracterizados por vales bem-definidos e vertentes de declividades variadas, entalhadas por sulcos e cabeceiras de drenagem de primeira ordem”. Já os modelados que dizem respeito aos topos aguçados, o IBGE (2009, P. 44) coloca que, “São conjuntos de formas de relevo de topos estreitos e alongados, esculpidos em rochas metamórficas e, eventualmente, em rochas ígneas e sedimentares, denotando controle estrutural, definidas por vales encaixados”.

Nota-se que tal modelado, é comprovado na bacia Cana Brava, onde está presente o relevo do grupo Areado e rochas cársticas do Grupo Bambuí (figura 02), sendo essas formações esculpidas por agentes erosivos que formam alguns dos modelados de relevo descritos anteriormente.

Para auxiliar os estudos referentes à geomorfologia da área, além do mapeamento feito pelo IBGE (2009), optou-se também pela elaboração de um mapa de dissecação do relevo, baseado na proposta por Ross (1994) e alterada por Guimarães, et. all. (2017), onde, através das medidas de entalhamento dos vales e comprimento dos interflúvios, é possível, através da manipulação e operações em ambiente SIG, obter a dissecação do relevo.

Segundo Ross (1994) a dissecação do relevo é um parâmetro fundamental para a compreensão da gênese das paisagens, além de auxiliar na gestão ambiental. Desta feita, tal parâmetro se torna uma grande ferramenta frente ao entendimento e à análise de questões ambientais.

Ainda conforme Bertolini e Deodoro (2018, P. 183), “a intensidade de dissecação ou, como também se costuma chamar, a intensidade de rugosidade topográfica é o primeiro grande indicador da fragilidade potencial que o ambiente natural apresenta”, podendo ainda denunciar diferentes modos, que determinados agentes atuam na esculturação morfológica e também em diferentes épocas.

Análise morfométrica

A análise morfométrica da bacia em estudo foi obtida através do processamento de imagens do tipo MDE de resolução 12,5 x 12,5m do satélite Alos, datadas do ano de 2011. A metodologia de análise é baseada em autores como Strahler (1952); Horton (1945); Christofoletti (1980); Lana, Alves e Castro (2001). As análises morfométricas, segundo Siqueira, et all (2012), são fundamentais na caracterização de suas potencialidades e limitações, quanto ao uso do solo, favorecendo o planejamento adequado das atividades a serem desenvolvidas.

De posse das imagens, foi utilizado o programa SIG “Q GIS 3.16.11” para processamento e tratamento das imagens. A princípio, foi feita a construção do mosaico das cenas utilizadas para a área de estudo e, posteriormente, o tratamento de células “no data”, células vazias ou pixels espúrios, com o intuito de obter o máximo de exatidão diante do material de processamento.

Para a análise morfométrica foram utilizados os seguintes parâmetros: área da bacia; perímetro; coeficiente de compacidade; fator de forma; índice de circularidade; densidade de drenagem; ordem dos cursos d'água além de demais dados relacionados à morfologia da bacia. Os fatores declividade e altimetria não foram calculados, pois, já formam contemplados na caracterização da área estudada.

Os coeficientes de área e perímetro da bacia foram extraídos de maneira automatizada no ambiente SIG supracitado. As análises referentes ao coeficiente de fator de forma (F), índice de circularidade (IC), densidade de drenagem (Dd) e compacidade (Kc) foram obtidas através de cálculos algébricos específicos, utilizando também o ambiente SIG. As equações utilizadas nos cálculos dos parâmetros de análise estão sintetizadas no Quadro 1.

Quadro 1
Equações para análise morfométrica

Os autores (2022)

O coeficiente de forma, ou fator de forma (F), expresso na equação acima, segundo Cardoso et all (2006), relaciona o formato da bacia ao formato de um retângulo. Tal parâmetro é influenciado por vários fatores, entre eles, a geologia. Visto que, quanto menor o fator de forma, menos a bacia é propensa a enchentes. Paralelamente, ao fator de forma (F), o Índice de circularidade (IC) permite uma correlação da forma da bacia a um círculo que, basicamente, “constitui a relação entre o perímetro da bacia e a circunferência de um círculo de área igual ao da bacia”, Cardoso et all (2006).

A densidade de drenagem, também obtida através da equação, no Quadro 1, é, basicamente, a relação existente entre o número de rios e a área da bacia, cuja finalidade é representar o comportamento hidrográfico, principalmente, o potencial de escoamento superficial.

Respectivamente ao índice de circularidade (IC), o coeficiente de compacidade (Kc) relaciona o formato da bacia a um círculo. Segundo Cardoso et all (2006, P. 243) “quanto mais irregular for a bacia, maior será o coeficiente de compacidade”.

A hierarquia fluvial de uma bacia pode ser obtida através da metodologia proposta por Horton (1945) e Strahler (1957). Na bacia em estudo fez-se opção pela metodologia proposta por Strahler (1957), onde os canais de primeira ordem são originados, basicamente, por nascentes, sendo os canais sucessores originados da confluência de canais de ordenamento anterior, ou seja, canais de ordem superior são originados somente pela junção de canais anteriores da mesma ordem. Caso determinado canal receba um canal de ordem inferior, não se altera a ordem seguinte.

Uso e Ocupação do Solo

O uso e ocupação do solo de um dado espaço reflete, principalmente, seu modo de produção e organização, ainda pode revelar diferentes problemas, especialmente, em se tratando de questões ambientais. Acerca do levantamento e tratamento de informações de uso e ocupação do solo, Sebusiani e Bettine, (2011, p. 258) coloca que, “o mapeamento das informações é um recurso muito utilizado para tornar mais evidentes os padrões de uso e ocupação dos espaços” e ainda elenca a importância de se situar quanto as possíveis questões a serem levantadas, “a visualização dos fatos no espaço melhora a compreensão das interações existentes e aponta as ações necessárias”.

Para o levantamento de informações, acerca do uso e ocupação do solo da bacia hidrográfica do Riacho Cana Brava, que é o objeto desse estudo, foram utilizados dados da plataforma do MAP BIOMAS, referentes aos anos de 1985, 1995, 2005, 2015 e, por fim, o ano de 2020, onde, através dessa escala temporal é possível traçar a dinâmica de uso e ocupação do solo da referida bacia.

Resultados e discussões

Os valores e índices relativos à morfometria encontram-se na tabela 1. A Bacia hidrográfica do Riacho Cana Brava possui uma área de 620,220 km², o perímetro é de 353,230 km, o curso principal 111, 235 km e o seu comprimento é de 112,883 km. As características de drenagem da bacia permitem avaliar diversos fatores, principalmente, o escoamento superficial, que permite a indicação do grau de desenvolvimento do seu sistema de drenagem. A classificação hierárquica dos canais de drenagem proposta por Strahler (1954) obteve a 5ª ordem. E os canais distribuídos através de 836,320 km, numa área de 620,20 km² possibilitaram chegar ao resultado da densidade de drenagem, que foi de 1,34km/km², considerada regular conforme Villela e Mattos (1975).

Quadro 2
Índices e valores morfométricos da bacia do Riacho Cana Brava

Os autores (2022).

Laszlo Manoel e Rocha (2014) cita a hierarquia fluvial, como um dos principais parâmetros de índices morfométricos e estabelece uma ordem e grau de diversos cursos d’água dentro de uma mesma bacia hidrográfica, sendo indispensável nos estudos relativos a geomorfologia hídrica. Através da hierarquia fluvial obtida na área de estudo, nota-se um padrão de domínio de canais de 3ª ordem, que é a drenagem principal das microbacias, que abastecem o curso principal.

Outro fato, que pode ser comprovado a partir da hierarquia fluvial dessa bacia, é que, ainda, no seu alto curso, já é obtido a 4ª ordem na hierarquia fluvial, que segue, até a parte central da bacia, recendo em maior parte canais de 3ª ordem, até onde se nota um alargamento em seu corpo, local onde o rio principal recebe um tributário também de 4ª ordem, formando, a partir daí, a 5ª ordem na hierarquia fluvial (figura 4).


Figura 4
Mapa de hierarquia fluvial da bacia do Riacho Cana Brava
Os autores (2022).

A densidade da drenagem, obtida de maneira automática através de algoritmos em ambiente SIG, foi de 1,345 km/km². Conforme, Villela e Mattos (1975), esse índice varia de 0,50 km/km² para bacias que possuem drenagem pobre a 3,5 km/km² ou mais, para áreas muito bem drenadas. Cabe ressaltar que o valor obtido leva em consideração canais efêmeros e intermitentes, pois foi estabelecido um limiar relativo ao Modelo Digital de Elevação (MDE) a quantidades de células, considerando a área de estudo, a fim de obter exatidão para os parâmetros em análise.

Os índices e valores morfométricos relativos à caracterização geométrica revelam uma bacia muito alongada em seu perfil longitudinal, comprovados pelos valores de coeficiente de compacidade (Kc) que foi de 3,97 e o fator de forma (F) que foi de 0,049, os quais se distanciam do valor 01, muito distante do formato circular, o que permite afirmar que tal bacia não é propensa a enchentes, perante condições normais de precipitação, Villela e Mattos (1975).

As características de relevo mostram uma amplitude altimétrica de 527 metros. A declividade da bacia é evidenciada através das poucas classes de terrenos abruptos ou escarpados, é registrada uma baixa declividade em quase toda bacia, a declividade média é de 9,45%, o que permite inferir um relevo suave ondulado a ondulado conforme Embrapa (1979). A análise morfométrica da bacia analisada é fundamental na tomada de decisões, quanto ao gerenciamento do uso e ocupação do solo, visto que tais usos e ocupações são também resultantes da morfologia e características pedogenéticas.


Figura 5
Mapa de Uso, ocupação do Solo, Bacia do Riacho Cana Brava, 1985 e 1995
Elaborado pelos autores a partir de Mapbiomas (2021).

O mapeamento do uso e ocupação do solo referente à escala temporal entre 1985 e 1995 (figura 5) revela, principalmente, o aumento da cobertura da pastagem, redução das formações florestais e cabe também destacar o aumento da formação savânica (que se deu pela regeneração de áreas degradadas), encolhimento da classe de agricultura e aumento das áreas de silvicultura. Para as demais classes, áreas degradadas e massas d’água ocorreram poucas mudanças para o período em análise (quadro 3).

A formação florestal, aqui tratada, é composta em sua maioria por mata ciliar e enclaves de mata, próxima ou ao longo de algumas nascentes. Chama-se a atenção pelo fato de sua supressão aumentar, consideravelmente, os níveis de assoreamento dos cursos d’água, isso que gera um grande problema ambiental.

Quadro 3
Uso e ocupação do solo e suas proporções em 1985 e 1995

Os autores (2022).

Na escala temporal, referente aos anos de 1995 a 2005 (quadro 4), a pastagem novamente alcançou os maiores percentuais de mudança no uso e ocupação do solo, houve um aumento de 6,24 %, correspondente a 3865,32 hectares em sua expansão. Esse aumento ocorreu, principalmente, na parte jusante da bacia.

Outro fato observado, na escala temporal analisada, diz respeito ao surgimento de pontos de mineração de argila e uma olaria artesanal no alto curso da bacia. O material extraído (de maneira legal, até os dias atuais) é utilizado, principalmente, na fabricação de cerâmica na sede do município de Coração de Jesus. Apesar de não ser classificado nos mapas de uso e ocupação do solo por questão de escala, tal fato se torna importante na análise da dinâmica de uso e ocupação do solo, pois, esses pontos são localizados, exatamente, às margens do curso d’água principal.

A silvicultura, assim como as áreas de agricultura e áreas degradadas diminuíram seu percentual, cedendo lugar às áreas de pastagem. Houve também, nesse período, aumento pouco significativo das massas d’água, que são compostas por lagoas e barragens ao longo da bacia, feitas, principalmente, para a dessedentação de animais.

Quadro 4
Uso e ocupação do solo e suas proporções em 1995 e 2005

Os autores (2022).

Já o uso e ocupação do solo referente ao período entre 2005 e 2015 (figura6), revela, principalmente, mudanças nas massas d’água, que diminuíram 9,59 hectares, tal número se revela importante, uma vez que se trata diretamente dos corpos d’água presentes. A maioria das massas d’água dispostas ao longo da bacia, até esse período, ocorreu, principalmente, em cursos tributários ao rio principal.

Outros números de importância no período de análise, diz respeito à redução das áreas de formação florestal, com declínio de 597 hectares e também à formação savânica, que decresceu cerca de 3797 hectares, cedendo lugar mais uma vez à pastagem que, por sua vez, registrou aumento de aproximadamente 3640 hectares e à agricultura, que cresceu cerca de 535 hectares (quadro5). Tais mudanças foram observadas, principalmente, no baixo e médio curso da bacia, não podendo também ignorar as mudanças significativas em seu alto curso.


Figura 6
Mapa: Uso e ocupação do Solo; Bacia do Riacho Cana Brava; 2005 e 2015
Elaborado pelos autores a partir de Mapbiomas (2021).

Quadro 5
Uso e ocupação do solo e suas proporções em 2005 e 2015

Os autores (2022).

Já o uso e ocupação do solo referente à escala temporal entre 2015 e 2020 (figura 7), evidenciam algumas mudanças na tendência observada nos períodos anteriores, cabendo ressaltar uma pequena queda referente à área de cobertura da pastagem, cerca de 845,5 hectares e aumento da área de agricultura em 1710 hectares. Outras taxas também registraram mudanças, como aumento das áreas degradadas, aumento da silvicultura, redução das massas d’água e a formação savânica (quadro 06).


Figura 7
Mapa de Uso e ocupação do Solo na Bacia do Riacho Cana Brava, 2020
Elaborado pelos autores a partir de Mapbiomas (2021).

As áreas de mineração, surgidas em meados dos anos 2000, também registraram uma pequena mudança. Foi observado através de imagens orbitais, por exemplo, o surgimento de novos pontos de extração ao longo do curso principal.

Outro fator significativo, quanto às áreas de mineração, notado através de imagens orbitais e confirmado em campo, são algumas áreas abandonadas. É possível observar que não há nenhum plano de manejo, ou de recuperação dessas áreas degradadas.

Quadro 6
Uso e ocupação do solo e suas proporções em 2015 e 2020

Os autores: (2022)

Conclusão

A bacia, em análise, possui coeficientes morfométricos, os quais permitem inferir que seu perfil é alongado no sentido longitudinal, por isso, não é propensa a grandes enchentes, em condiçoes pluviométricas normais. A hierarquia fluvial é determinada, quase que totalmente, pela própria forma em que a bacia se apresenta, é visível um domínio de microbacias caracterizadas por cursos de 3ª ordem. Os índices morfométricos revelam que, concomitantemente, ao padrão de uso e ocupação do solo, as maiores mudanças, em quantitativo de área e alterações de uso de solo, ocorreram após a transição para a 5ª ordem nos canais fluviais e, consequentemente, no baixo curso da bacia.

É notável que as áreas próximas ao curso principal, registram maior ação antrópica, isso se correlaciona aos fatores de umidade e aos solos propensos à agricultura. As áreas, onde ocorrem os solos do tipo Neossolo quartzarênico, são as que registram menores mudanças quanto ao uso e à ocupação, tal fato é explicado devido à baixa capacidade fértil e à baixa retenção de água.

O resultado da análise do uso e ocupação permite constatar que a bacia do Riacho Cana Brava é ocupada de acordo com a disposição dos solos mais propensos à agricultura na região, exemplo disso são os Latossolos Vermelhos e os Neossolos litólicos. Frente à morfologia da bacia, os modelados de dissecação foram as áreas que apresentaram maiores alterações, quanto ao uso do solo. A dissecação do relevo obtida, através da proposta de Rosso (1994), mostra que seus maiores índices estão em áreas de transição de litologias associadas a mudanças abruptas de declividade.

Sobre o quantitativo de áreas, de acordo com seu uso e ocupação, a vegetação natural (formação savânica) prevalece como maior classe na ocupação do solo. Quanto ao uso antrópico, a atividade, que maior se sobressai, é a pastagem, seguida pela agricultura e, pode ser aqui citado, a questão da mineração, que apesar de não ter um aumento considerável em área, sua localização geográfica é um fato preocupante. Sobre a classe referente à formação florestal, sua diminuição também preocupa, pois essa está cedendo lugar à agricultura e à pastagem. Quanto ao quantitativo de áreas degradadas, houve poucas mudanças. Cabe ressaltar que todas as alterações sofridas pelo meio natural, revelam prognóstico crítico frente à dinâmica de uso e de ocupação correlacionada aos dados morfométricos e à própria questão da disponibilidade da água.

Os parâmetros morfométricos e os dados relativos ao uso e à ocupação do solos são de grande importância para avaliar o quadro físico de uma unidade de estudo, especialmente, as bacias hidrográficas, pois revelam diagnósticos de grande importância para a temática ambiental.

Agradecimentos

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES pela concessão de bolsa de Estudos.

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Notas

Fredson Reis Nunes É Graduado em Geografia pela Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES). Atualmente cursa Mestrado pelo Programa de Pós Graduação em Geografia da Universidade Estadual de Montes Claros (PPGEO/UNIMONTES).

Endereço Campus Universitário Prof. Darcy Ribeiro, Av. Prof. Rui Braga, s/n - Vila Mauriceia, Montes Claros - MG, 39401-089.

Maria Ivete Soares de Almeida É Graduada em Geografia pela Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES), Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Goiás (UFG) e Doutora em Tratamento da Informação Espacial pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/Minas). Atualmente é Professora do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES).

Endereço Campus Universitário Prof. Darcy Ribeiro, Av. Prof. Rui Braga, s/n - Vila Mauriceia, Montes Claros - MG, 39401-089.



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