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Análise multitemporal da cobertura do solo da Terra Indígena Ituna-Itatá através da classificação supervisionada de imagens de satélites
Multitemporal analysis of the land cover of the Ituna-Itatá Indigenous Land through supervised classification of satellite images
Análisis multitemporal de la cobertura del suelo de la Tierra Indígena Ituna-Itatá a través de la clasificación supervisada de imágenes satelitales
Revista Cerrados (Unimontes), vol. 20, núm. 02, pp. 261-282, 2022
Universidade Estadual de Montes Claros



Recepción: 19 Abril 2022

Aprobación: 30 Agosto 2022

Publicación: 28 Septiembre 2022

DOI: https://doi.org/10.46551/rc24482692202227

Resumo: Imagens de satélite com diferentes resoluções espaciais podem ser utilizadas para reconhecer a dinâmica do uso e cobertura da superfície terrestre. Este trabalho teve como objetivo analisar a cobertura do solo da Terra Indígena Ituna-Itatá, localizada no norte do Brasil, estado do Pará. Com a avaliação de cinco cenários (2015, 2016, 2017, 2018, 2019 e 2020) o estudo evidenciou as diversas alterações na cobertura da T.I nos últimos anos, considerando se tratar de uma área interditada, com restrição de uso. O trabalho foi elaborado em ambiente SIG, no software QGIS 3.10.9 “A Corunã”, utilizando imagens de satélite Landsat OLI-8 e Sentinel 2-A. Para a classificação das imagens foi adotado o método de classificação supervisionada com coleta e processamento de amostras pelo plugin Dzetsaka. Os resultados permitiram avaliar as alterações da paisagem em um lapso temporal de cinco anos, ratificando a intensificação do desmatamento, abertura ilegal de estradas e inserção significativa de pastagens. Ficou evidenciada a exploração ilegal e desenfreada em uma área protegida destinada aos povos tradicionais.

Palavras-chave: Sensoriamento Remoto, Cobertura do solo, Terra Indígena Ituna-Itatá, Geoprocessamento.

Abstract: Satellite images with different spatial resolutions can be used to recognize the dynamics of land surface use and coverage. This study aimed to analyze the land cover of the Indigenous Land Ituna-Itatá, located in northern Brazil, state of Pará. With the evaluation of five scenarios (2015, 2016, 2017, 2018, 2019, and 2020), the study showed several changes in IT coverage in recent years, considering that it is a restricted area, with restricted use. The work was carried out in a GIS environment, using QGIS 3.10.9 software “A Corunã”, using Landsat OLI-8 and Sentinel 2-A satellite images. For the classification of images, the supervised classification method with sample collection and processing by the Dzetsaka plugin was adopted. The results allowed us to assess changes in the landscape over five years, confirming the intensification of deforestation, the illegal opening of roads, and the significant insertion of pastures. Illegal and rampant exploitation was evidenced in a protected area destined for traditional peoples.

Keywords: Remote sensing, Land cover, Indigenous Land Ituna-Itatá, Geoprocessing.

Resumen: Las imágenes de satélite con diferentes resoluciones espaciales se pueden utilizar para reconocer la dinámica del uso y la cobertura de la superficie terrestre. Este estudio tuvo como objetivo analizar la cobertura del suelo de la Tierra Indígena Ituna-Itatá, ubicada en el norte de Brasil, estado de Pará. Con la evaluación de cinco escenarios (2015, 2016, 2017, 2018, 2019 y 2020), el estudio destacó los diversos cambios en la cobertura de TI en los últimos años, considerando que es un área prohibida, con uso restringido. El trabajo se realizó en ambiente GIS, utilizando el software QGIS 3.10.9 “A Corunã”, utilizando imágenes de satélite Landsat OLI-8 y Sentinel 2-A. Para la clasificación de imágenes se adoptó el método de clasificación supervisada con recolección y procesamiento de muestras por el plugin Dzetsaka. Los resultados permitieron evaluar los cambios en el paisaje en un lapso de tiempo de cinco años, confirmando la intensificación de la deforestación, apertura ilegal de caminos e inserción significativa de pastizales. Había evidencia de explotación ilegal y desenfrenada en un área protegida destinada a pueblos tradicionales.

Palabras clave: Detección remota, Cobertura del suelo, Tierra Indígena Ituna-Itatá, Geoprocesamiento.

Introdução

A avaliação da alteração da paisagem é indispensável para uma boa gestão territorial. Através da análise da cobertura da terra é possível compreender a dinâmica de alterações, especialmente aquelas em função de atividades antrópicas, sendo fundamental na tomada de decisões relacionadas ao uso e conservação de recursos naturais e ambientais. (LAMBIM et al., 2000).

O Sensoriamento Remoto (SR) permite a aquisição de imagens da superfície terrestre sem que exista contato físico entre o sensor e o objeto. A técnica é realizada por meio de detecção e mensuração da relação entre a radiação eletromagnética e os materiais terrestres (MENEZES et al., 2012:3). A utilização de imagens de satélites para produção de mapas é uma das grandes inovações do geoprocessamento, possibilitando estudos ambientais e entendimento dos processos de alterações espaciais, assim como o monitoramento das áreas de interesse (WATRIN et al., 2005).

O processamento digital de imagens identifica e realça informações a partir de uma enorme quantidade de dados que compõem a imagem. Para isso, softwares de computadores são utilizados em atividades interativas de análise e manipulação das imagens brutas (GONÇALVES, 1997). O software QGIS é um programa livre e gratuito que oferece todos esses serviços.

Barbosa (2009) definiu a classificação de imagens como um processo de extração de informações que visam o reconhecimento de padrões e elementos homogêneos utilizados para fazer o mapeamento de áreas da superfície terrestre. Essa classificação pode ser feita através de dois métodos: supervisionado e não-supervisionado.

No método de classificação supervisionada são utilizados algoritmos para nomear os pixels em uma imagem de forma a representar os tipos específicos de cobertura terrestre, ou seja, as classes (LILLESAND e KIEFER, 1994). Para Noguchi (2004) uma seleção homogênea das amostras é essencial para que o processo classificatório seja bem sucedido.

A disponibilidade de softwares livres e imagens de satélite gratuitas viabilizam o levantamento e monitoramento de grandes áreas, especialmente aquelas protegidas por lei, destinadas à conservação dos recursos naturais, que comumente são invadidas e exploradas por pessoas alheias.

Devido às grandes extensões de terras, ricas em minérios e diversidade em espécies florestais de valor comercial, as terras indígenas são alvos constantes de madeireiros, grileiros, garimpeiros e mineradoras. (DE SOUZA FILHO E ARBOS, 2009). Apesar dos vários direitos originários e adquiridos, estabelecidos pela Constituição Federal, os povos indígenas não têm segurança garantida, sendo comuns, casos de assassinatos das lideranças, extração ilegal de madeira e grilagem de terras.

Dados do PRODES (Projeto de Estimativa do Desflorestamento da Amazônia) e DETER (Projeto de Detecção de Áreas Desflorestadas em Tempo Real) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) confirmam que 06 (seis) Terras Indígenas, com registros de povos isolados respondem por 90% do desmatamento registrado no ano de 2019 nas T.I’s da Amazônia brasileira (ISA, 2020).

A Terra Indígena Ituna-Itatá, objeto deste estudo, é habitada por povos indígenas isolados que nunca tiveram contato com o homem branco. Por esse motivo, a área está em fase de estudos antropológicos, históricos, fundiários, cartográficos e ambientais, que fundamentarão a identificação e delimitação oficial da T.I. Desde o ano de 2011, a área federal está interditada, com restrição de uso por não indígenas (FUNAI, 2020).

Nos termos do Art. 231 da Constituição Federal, considerando a necessidade de reconhecimento dos direitos originários dos índios sobre as terras que tradicionalmente ocupam, ficaram estabelecidos, pelo prazo de dois anos, através da Portaria Nº 38 de 11 de janeiro de 2011, a restrição de ingresso, locomoção e permanência de pessoas estranhas, bem como, exploração de qualquer recurso natural existente na Ituna-Itatá. Expirado o prazo de dois anos, a decisão foi prorrogada por mais vezes por meio das portarias: Portaria nº 17 de 10 de janeiro de 2013, Portaria nº 50 de 21 de janeiro de 2016, Portaria Nº 17 de 09 de janeiro de 2019 e por último a Portaria nº 529 de 21 de junho de 2022.

Apesar das portarias de interdição e outras medidas protetivas, no início de 2020, inúmeras reportagens veiculadas pela imprensa trouxeram à tona a vulnerabilidade em que vivem os povos indígenas da Amazônia. Em 2019, por exemplo, a TI Ituna-Itatá, mesmo interditada, apresentou um aumento de 60% do desmatamento quando comparado ao ano de 2018 (GREENPEACE, 2020). A Fundação Nacional do Índio (FUNAI) declarou que acompanha a situação da terra indígena por meio do Centro de Monitoramento Remoto (CMR) da instituição e comunicou os órgãos ambientais e de segurança quanto à realidade da região. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA) e Polícia Federal, com uso de geotecnologias e sensoriamento remoto, localizaram as áreas ilegalmente exploradas e deram início à Operação Verde Brasil.

Nesse contexto, instrumentos que facilitam o monitoramento de uso destas áreas, são essenciais para subsidiar o levantamento de dados que corroborem para a análise e tomadas de decisão mais assertivas na construção de medidas preventivas e políticas públicas que controlem as explorações desenfreadas em áreas protegidas.

O objetivo deste trabalho foi avaliar as alterações da cobertura do solo da TI Ituna-Itatá, entre os anos de 2015 a 2020, por meio da técnica de classificação supervisionada de imagens de satélite, permitindo que o produto desta análise, forneça subsídios para instauração de políticas públicas que visem à proteção dos recursos naturais e povos isolados desta região.

Área de estudo

A Terra Indígena Ituna-Itatá está, atualmente, interditada pela Portaria nº 529 de 21 de junho de 2022 que prorrogou por mais três anos a restrição de ingresso, locomoção e permanência de pessoas estranhas aos quadros da FUNAI, objetivando dar prosseguimento aos serviços de monitoramento, proteção da área e do grupo indígena em isolamento. A T.I está localizada nos municípios de Senador José Porfírio e Altamira no Estado do Pará, com área total de 142.527,256 hectares, sendo que 90.424,26 hectares estão no município de Senador José Porfírio e 52.102,995 hectares no município de Altamira, na região sudoeste do Estado do Pará, no Bioma Amazônia. A cobertura vegetal da área é caracterizada como floresta ombrófila aberta. A T.I está inserida na bacia hidrográfica do Rio Xingu.


Figura 1
Mapa de Localização da Terra Indígena Ituna-Itatá
Autores, 2022.

Zona de entorno

A zona de entorno da TI Ituna-Itatá é composta pelo Projeto de Assentamento Federal Itatá, Gleba Pública Estadual Bacajaí e as Terras Indígenas Koatinemo e Trincheira Bacajá, conforme Figura 2.

O Projeto de Assentamento Itatá foi criado em 2014 pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e atualmente possui cerca de 400 famílias assentadas (INCRA, 2020). Já a Gleba Estadual Bacajaí está sob gestão do Instituto de Terras do Pará (ITERPA) onde a porção confrontante à TI Ituna-Itatá é destinada à regularização fundiária. A porção sul da Terra Indígena confronta as T.I Koatinemo e T.I Trincheira Bacajá, ambas reconhecidas e demarcadas pela FUNAI.


Figura 2
Zona de entorno da área de estudo
Autores, 2022.

Características das imagens de satélites utilizadas

Para análise da cobertura do solo para os anos 2015, 2016, 2017, 2019 e 2020, foram utilizadas imagens do Satélite Landsat-8 OLI, referentes à cena 225/063, bandas R(4) G(3) B(2). Para o ano de 2018, foram utilizadas as cenas 22MCA e 22MDA do satélite Sentinel–2, nível 1C. Todas as imagens foram adquiridas gratuitamente no site oficial da USGS (http://earthexplorer.usgs.gov). Os metadados das imagens podem ser visualizados na Tabela 1.

Tabela 1
Metadados das imagens de satélites utilizadas

USGS Earth Explorer

A correção geométrica não foi necessária, pois as imagens já estavam georreferenciadas. A Tabela 1 apresenta as principais informações quanto ao satélite, órbita, ponto, data de aquisição e resolução espacial de cada imagem de satélite utilizada neste trabalho. Devido à alta incidência de nuvens na cena 225/063 do satélite Landsat para o ano de 2018, optou-se por utilizar uma imagem do satélite Sentinel-2, com as cenas 22MCA e 22MDA, objetivando uma análise contínua dos anos. A data de aquisição das imagens foi escolhida em função da época de menor cobertura de nuvens na região da área de estudo, geralmente, entre os meses de junho a setembro.

Processamento e classificação digital das imagens

O trabalho foi elaborado no Datum Sirgas 2000 com projeção geográfica. O pré-processamento das imagens foi realizado no software QGis 3.10 e a classificação supervisionada por meio do complemento Dzetsaka Plugin, baseado no classificador de modelo de mistura Gaussiano, desenvolvido por Mathieu Fauve. Segue o fluxograma da Quadro 1, demonstrando as etapas do procedimento metodológico.


Quadro 1
Procedimentos realizados para elaboração do mapa de cobertura do solo através da classificação supervisionada
Autores, 2022.

Para avaliação do desempenho dos classificadores, adotou-se a metodologia chamada painel amostral que é a distribuição aleatória de pontos amostrais dentro do limite da área de estudo, objetivando o reconhecimento da classe de cada ponto. A determinação de a que classe pertencia cada ponto, foi realizada por inspeção visual. A partir da matriz de confusão (CONGALTON, 1991), foram calculados, o Índice Kappa e a Exatidão Global.

De acordo com Cohen (1960), o Índice Kappa é calculado com base em uma matriz de erros sendo utilizado como parâmetro de concordância entre o mapa e a referência adotada para a estimativa da exatidão, ou seja, fornece uma estimativa do quanto as observações se diferem daquelas esperadas e o quão verdadeiras são as interpretações realizadas. O cálculo do índice Kappa é expresso por:

[1]

Onde:

K: índice de exatidão Kappa

r: número de linhas na matriz

Xij: é o número de observações na linha (i) e coluna(j)

N: número total de observações.

A partir dos resultados, Landis e Koch (1977) associam valores do Índice Kappa à qualidade da classificação de acordo com a Tabela 2:

Tabela 2
Qualidade da classificação referente aos valores do Índice de Kappa

LANDIS e KOCH0, 1997.

A Exatidão Global é uma forma simples de verificação e relaciona os elementos da diagonal com os pontos de amostra da imagem classificada, através da fórmula:

EG=A/n*100

Onde:

EG: Exatidão Global

A: Número de pontos amostrais com acerto

N: número de pontos amostrais

Para Brites (1996), enquanto o índice global resultando em valores mais altos do que outros índices, o Índice Kappa, inclui os elementos da diagonal principal, fazendo com que esta concordância seja superestimada, reduzindo assim o valor do índice.

Após a fusão das bandas multiespectrais e recorte da área de estudo T.I Ituna-Itatá, foram definidas as três classes de cobertura a serem avaliadas, sendo elas, Solo Exposto, Agricultura/Pastagem e Florestas. Para as cores RGB foi adotado o modelo determinado pelo IBGE, onde as cores padrão, as classes de cobertura e a descrição das classes seguem representadas na Tabela 3:

Tabela 3
Cores padrão RGB e classes de cobertura

IBGE, 2013.

Para a técnica de classificação supervisionada, sobrepostas às rasters, foram extraídas regiões de interesse, em forma de polígonos, para cada uma das classes. Foram criados shapefiles do tipo polígono, convertidos em amostras, empregados como referência para o agrupamento de pixels em função de suas características espectrais. Após a coleta, as amostragens foram processadas através do complemento Dzetsaka Plugin e por fim foram elaborados os mapas temáticos de classificação da cobertura do solo dos anos de 2015 a 2020.

Resultados e discussão

Após processamento dos dados, foram identificados os percentuais de evolução das classes de cobertura do solo da T.I Ituna-Itatá durante cincos anos consecutivos: 2015, 2016, 2017, 2018, 2019 e 2020.

Uma análise temporal por meio de sensoriamento remoto, possibilitou observar que as primeiras alterações da cobertura do solo da T.I Ituna-Itatá ocorreram no ano de 2015. O INPE divulgou nesse mesmo ano, um aumento de 30% das derrubadas e queimadas na Amazônia quando comparado ao ano de 2014.

A partir da classificação supervisionada, foram identificados 443,887 hectares de Solo Exposto/Área degradada, o que corresponde a 0,31% desta, e ainda, 166,878 hectares de áreas de uso antrópico para a classe de Agricultura/Pastagens (correspondendo a 0,12% da área).

Tabela 4
Percentuais de alteração da cobertura do solo no decorrer dos anos

Autores, 2022.

Na Figura 3, as alterações na paisagem podem ser observadas na porção noroeste da área de estudo, limite com o Projeto de Assentamento Federal Itatá.


Figura 3
Mapa temático da classificação supervisionada de imagens da Terra Indígena Ituna-Itatá nos anos 2015 e 2016
Autores, 2022.

Percebe-se que os grileiros aproveitaram o fluxo migratório de pessoas no assentamento federal para avançar sobre a área protegida, iniciando a derrubada da floresta e consolidando a ocupação no interior da T.I. A antropização se intensifica também pelo nordeste da terra indígena, advinda da área de regularização fundiária da Gleba Estadual Bacajaí, sob jurisdição do ITERPA. De acordo com Silva e Pureza (2019), a implantação de assentamentos rurais no entorno das T. I’s, contribui para o avanço do desmatamento no interior destas.

Pesquisas mostram que, no Brasil, o desmatamento cresceu nos anos de 2015 e 2016. Viola e Franchini (2012), afirmam que na política de governo dessa época ocorreu um significativo retrocesso da proteção ambiental. Além disso, ações como o corte de verbas do orçamento da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, extinção de órgão ambientais importantes para o monitoramento florestal da Amazônia e o forte investimento em agronegócio através do Plano Safra 2015/2016, contribuíram para a exploração ilegal e grilagem em matas primárias.

Diante disso, pode-se notar que nos anos de 2017 (Tabela 4) e 2018 (Tabela 5), anos seguintes ao retrocesso da proteção ambiental, um total de 7.628,42 hectares da T.I Ituna-Itatá foram convertidos em áreas de Pastagem/Agricultura e 3.062,443 hectares foram desmatados, tornando-se Solo Exposto/Área Degradada.

Tabela 5
Percentuais de alteração da cobertura do solo no decorrer dos anos

Autores, 2022.

Na figura 4, observa-se que a expansão do desflorestamento sobre a T.I aumenta em direção ao centro da área. Estradas derivadas do Projeto de Assentamento Itatá e Gleba Estadual Bacajaí foram adentrando a área indígena e causando um aumento considerável na alteração da paisagem.

Segundo Prates (2008), na literatura, há o consenso de que a abertura de estradas não gera o desmatamento, mas facilita o acesso dos agentes responsáveis às áreas que até então permaneciam isoladas. A abertura de estradas direciona o desmatamento e a sua velocidade dependerá de como os agentes são estimulados a desempenhar atividades que exijam uso do solo. As principais atividades econômicas exercidas na Amazônia são a extração de madeira, minério, pecuária e agricultura. A agropecuária apresenta o maior impacto em relação ao desmatamento, devido sua necessidade por solo (PRATES, 2008). Outro fator importante que afeta diretamente a área de florestas é o valor para recuperar uma área de pastagem degradada que, por hectare, custa em torno de R$ 800,00, enquanto o custo para gerar novas áreas de pasto a partir do desmatamento é de R$350,00 por hectare (FEITOSA, 2003).


Figura 4
Mapa temático da classificação supervisionada de imagens da Terra Indígena Ituna-Itatá nos anos 2017 e 2018
Autores, 2022.

De acordo com a nota conjunta divulgada pelos ministérios do Meio Ambiente e Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações o desmatamento na Amazônia cresceu cerca de 10% entre agosto de 2017 e julho de 2018.

Em 2019, a taxa de desmatamento em toda a Amazônia extrapolou os cinco dígitos e chegou a 10.129 km² (dez mil e cento e vinte nove quilômetros quadrados). É a maior alta percentual do século, sendo a maior taxa desde 2008. No estado do Pará houve um aumento em 52% e o município mais desmatado foi Altamira (OBSERVATÓRIO DO CLIMA, 2020). Na Tabela 5, constatou-se que em 2019 foram alcançados 7.333,203 ha (sete mil hectares) de Agricultura/Pastagem e 8.206,384 hectares de Solo Exposto. Somados os percentuais, são 10,89% da área total da T.I desflorestados irregularmente. Considerando tratar-se de uma área interditada devido à presença de índios isolados, são números exorbitantes.

Na figura 5, as clareiras podem ser facilmente visualizadas em toda a extensão da área de estudo. A T.I Ituna-Itatá foi praticamente tomada por grileiros, violando os direitos e criando o risco iminente de genocídio dos povos indígenas isolados.


Figura 5
Mapa temático da classificação supervisionada de imagens da Terra Indígena Ituna-Itatá nos anos 2019 e 2020
Autores, 2022.

Fatores como o desmonte das políticas ambientais, fusão do Ministério do Meio ambiente com o Ministério da Agricultura, o ceticismo do próprio ministro do meio ambiente em relação ao aquecimento global, entre outros, acentuaram, no ano de 2019, a exploração dos recursos naturais e a violência contra ambientalistas, populações tradicionais e povos indígenas. (SCANTIMBURGO, 2019). De acordo com Viola e Franchini (2012), decisões como essas são tomadas sem considerar a importância ambiental, visando somente à perspectiva econômica imediatista, trocando recursos de milhares de anos pelo lucro de algumas décadas.

Ainda em 2019, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e Ministério Público Federal (MPF), tornaram públicas informações a respeito da situação do crescente desmatamento na T.I Ituna-Itatá. Inúmeras reportagens foram veiculadas pela imprensa. A FUNAI manifestou-se declarando que acompanha a situação da T.I por sensoriamento remoto e tem comunicado os órgãos ambientais e de segurança (FUNAI, 2020). Em maio de 2019, foi deflagrada a Operação Verde Brasil, onde militares e agentes ambientais fizeram inspeções navais e terrestres na tentativa de coibir o desmatamento nestas áreas (GREENPEACE, 2020). Foram realizados sobrevoos de fiscalização e apreensão de maquinários e combustíveis, além da fixação de uma base de fiscalização no município de Altamira-PA. Segundo o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Imazon (IMAZON, 2020), o desmatamento dentro da T.I, que em janeiro havia sido de 1000 hectares, praticamente zerou nos meses subsequentes.

A Tabela 4 mostrou que em 2020 apenas 0,39% da área total da T.I foi convertida em Solo Exposto/Área Degradada. Essa queda pode ter sido resultado das intensas fiscalizações na área de estudo, porém, comparando à 2019, pode-se observar que, em 2020, esta classe foi convertida para áreas de pastagem. Portanto, apesar da diminuição do desmatamento em 2020, as áreas desflorestadas anteriormente não deixaram de ser destinadas às pastagens, como foi observado na Figura 5. A seguir é apresentado um gráfico (Figura 6) dos resultados obtidos na classificação supervisionada de imagens da T.I Ituna-Itatá.


Figura 6
Índice de cobertura do solo da TI Ituna-Itatá entre os anos de 2015 a 2020.
Autores, 2022.

O gráfico apresenta os índices de cobertura do solo da T.I Ituna-Itatá entre os anos de 2015 e 2019 e a progressão das classes estudadas. De acordo com SANQUETTA (2020), o processo de supressão da floresta primária, resulta na conversão da cobertura do solo. Nota-se que nos períodos analisados houve um aumento progressivo das áreas antropizadas, principalmente na categoria da Agricultura/Pastagem. Na categoria Solo Exposto ocorreu crescimento contínuo ao passar dos anos, porém, em 2020 houve uma queda que pode ser atribuída à intensificação de fiscalização ambiental na região.

Em 2012, o Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente – SINIMA, criou o Cadastro Ambiental Rural – CAR, que é um registro público eletrônico, obrigatório para todos os imóveis rurais, tornando possível a integração de informações ambientais das propriedades e posses rurais, que serão utilizadas para monitoramento e combate ao desmatamento. Após pesquisas na plataforma do Sistema de Cadastro Ambiental Rural do Pará (SICAR/PA), concluiu-se que 94,82% do território da T.I Ituna-Itatá possui Cadastro Ambiental Rural (CAR) em nome de proprietários particulares. São 135.147,543 hectares de terras cadastrados, conforme figura 7.

Segundo Ney (2003), áreas produtivas maiores tendem a demandar mais recursos financeiros do que as menores. Na Figura 7, nota-se que a maior parte dos cadastros ambientais rurais, sobrepostos à T.I, possui uma área superior a 1000 ha (um mil hectares), configurando lotes de médio e grande porte. Esta informação sugere que a invasão da área não foi realizada por pequenos agricultores que, geralmente, possuem poucos recursos financeiros e ocupam pequenos lotes em busca de renda agrícola, mas sim, por invasores que podem estar objetivando a futura especulação imobiliária de áreas rurais.


Figura 7
Cadastros Ambientais Rurais registrados sobre a T.I Ituna-Itatá
SICAR/PA 2020.

Considerações finais

A área de estudo apresentou alterações significativas na classificação de cobertura do solo, sendo predominantes as práticas de grilagem e desmatamento para uso alternativo em toda sua extensão. Recomenda-se um monitoramento mais efetivo e até mesmo reintegração da área, pelos órgãos ambientais e de segurança, no intuito de assegurar os direitos dos povos isolados que nela habitam, cumprindo a lei de interdição estabelecida pelo governo. Além disso, é de grande importância que se dê celeridade nos estudos da T.I, a fim de realizar sua demarcação territorial. As áreas de entorno influenciam diretamente no acesso e exploração indevida no interior da terra indígena interditada. Recomenda-se a criação de zonas de amortecimento ao redor da área de estudo ou postos de fiscalização em seus limites.

Por fim, conclui-se que o uso de imagens de satélites e softwares de geoprocessamento, ambos gratuitos, pode facilitar na tomada de decisão para elaboração de políticas públicas da demanda ambiental, além de reduzir significativamente o custo dessas atividades.

Referências

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Notas

Bruna Taynara de Souza Balieiro É Graduada em Engenharia Agronômica pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Atualmente é Mestranda em Geografia pela Universidade Federal do Pará (UFPA).

Endereço: R. Cel. José Porfírio, nº 30, Bairro Recreio, Altamira – PA.

Gabriel Alves Veloso É Graduado em Geografia pela Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES); Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e Doutor em Geografia pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Atualmente é Professor da Faculdade de Geografia e do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Pará (UFPA).

Endereço: R. Cel. José Porfírio, nº 30, Bairro Recreio, Altamira – PA.



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