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AS AGLOMERAÇÕES INDUSTRIAIS RELEVANTES E OS CONDICIONANTES DA AGLOMERAÇÃO INDUSTRIAL NO BRASIL
The relevant industrial agglomerations and the conditions of industrial agglomeration in Brazil
Las aglomeraciones industriales relevantes y las condiciones de aglomeración industrial en Brasil
Revista Cerrados (Unimontes), vol. 19, núm. 1, 2021
Universidade Estadual de Montes Claros

Artigos


Recepção: 28 Outubro 2020

Aprovação: 11 Março 2021

Publicado: 01 Maio 2021

DOI: https://doi.org/10.46551/rc24482692202112

Resumo: O presente trabalho pretende dar continuidade a discussão sobre a dinâmica de formação das aglomerações industriais que são concentrações territoriais da indústria e do emprego industrial. Buscamos isso a partir do conceito de Aglomerações Industriais Relevantes AIRs, que neste trabalho é definido pela ocorrência em uma microrregião de pelo menos 100 unidades locais e de pelo menos 10.000 empregos na indústria. Também buscamos relacionar as AIRs com as condições gerais de produção, identificando a necessidade de políticas regionais e industriais voltadas não apenas para fomentar a desconcentração, mas também para viabilizar novas aglomerações industriais. Entre as contribuições do presente trabalho estão à constatação da grande concentração das AIRs no Sudeste e no Estado de São Paulo e de forma geral, em um polígono de concentração de AIRs que engloba os Estados de São Paulo, parte do Estado do Rio de Janeiro além dos estados da região Sul.

Palavras-chave: Aglomerações industriais, Produção, Concentração industrial, Desconcentração industrial, Emprego.

Abstract: The present work intends to continue the discussion on the dynamics of formation of industrial agglomerations that are territorial concentrations of industry and industrial employment. We seek this based on the concept of Relevant Industrial Agglomerations AIRs, which in this work is defined by the occurrence in a micro-region of at least 100 local units and at least 10,000 jobs in the industry. We also seek to relate the AIRs to the general conditions of production, identifying the need for regional and industrial policies geared not only to foster de-concentration but also to enable new industrial agglomerations. Among the contributions of the present work are the observation of the great concentration of AIRs in the Southeast and in the State of São Paulo and in general, in a polygon of concentration of AIRs that encompasses the States of São Paulo, part of the State of Rio de January beyond the states of the South region.

Keywords: Industrial agglomerations, Production, Industrial concentration, Industrial deconcentration, Job.

Resumen: El presente trabajo pretende continuar la discusión sobre la dinámica de formación de aglomeraciones industriales que son concentraciones territoriales de industria y empleo industrial. Buscamos esto con base en el concepto de AIRs Aglomerados Industriales Relevantes, que en este trabajo se define por la ocurrencia en una microrregión de al menos 100 unidades locales y al menos 10,000 empleos en la industria. También buscamos relacionar los AIR con las condiciones generales de producción, identificando la necesidad de políticas regionales e industriales orientadas no solo a fomentar la desconcentración sino también a posibilitar nuevas aglomeraciones industriales. Entre los aportes del presente trabajo se encuentra la observación de la gran concentración de AIRs en el Sureste y en el Estado de São Paulo y en general, en un polígono de concentración de AIRs que comprende los Estados de São Paulo, parte del Estado de Rio de Enero más allá de los estados de la región Sur.

Palabras clave: Aglomeraciones industriales, Producción, Concentración industrial, Desconcentración industrial, Trabajo.

Introdução

É uma realidade há muito constatado que a atividade industrial tende a se aglomerar em certos espaços que oferecem condições ideais para a reprodução do capital na indústria e de atividades relacionadas. Da discussão sobre a formação de grandes aglomerações industriais na Europa e nos EUA surge toda uma literatura que vai discutir os fatores da localização industrial. Assim o raciocínio se dá no sentido de se pensar uma relação de causalidade no qual a presença dos fatores de localização, como disponibilidade de mão de obra qualificada, fontes de energia, custos de transporte e matéria-prima condicionariam a instalação e a formação de aglomerações industriais. Esse tipo de raciocínio que está fortemente presente na geografia econômica tradicional é contestado por Lencioni, (2007, p. 9):

Essa perspectiva de análise que recupera o conceito de condições gerais de produção procura deixar claro o que é obscuro quando falamos de indústria e território. Esse obscurantismo, no entanto é percebido como claro. Quando a análise da relação entre indústria e território se centra na discussão dos fatores de localização industrial, tão presentes nas obras clássicas da Geografia, o pensamento está direcionado para a ideia de causa e consequência, onde um elemento determina o outro. Nosso entendimento é que a discussão sobre localização industrial tendo como referência as condições gerais de produção nos conduz a perceber que essas condições não determinam, em si, nada. Elas possibilitam a localização. O uso do conceito de condições gerais de produção não permite deixar oculto o que é significativo.

Portanto o problema de se trabalhar com o conceito de fatores industriais é que se obscurece a relação entre o território e a indústria dando vida aquilo que é morto e inviabilizando aquilo que é vivo. Quando se discute que os fatores de localização determinam a localização industrial estamos conferindo a um conjunto de infraestruturas e meios de produção o poder de definir o estabelecimento das atividades industriais. Ao se pensar dessa forma se ignoram os agentes concretos responsáveis pelas decisões que ao longo do tempo levam a formação de aglomerações industriais.

Ignora-se também a trama relacional que é o território sendo que suas características organizativas dão aos agentes condições melhores ou piores para a instalação das atividades econômicas. Dessa maneira não existem fatores que determinam a localização industrial, ou mesmo a formação de aglomerações industriais, mas tal fenômeno precisa ser compreendido na interação entre a ação dos agentes e as características relacionais do território. No que se refere especificamente a relação entre localização e território, uma forma de compreender essa relação está posta no conceito de condições gerais de produção. Ainda Segundo Lencioni, (2007, p. 4):

Contudo, é conveniente alertar, essa relação entre o consumo produtivo e o processo de produção e circulação do capital não se dá de forma direta, mas mediada por aquilo que Marx denominou de condições gerais de produção. São as condições gerais de produção, portanto, que articulam o consumo produtivo (consumo coletivo) ao processo de produção e circulação do capital. Dizendo de uma outra forma, a relação entre o processo imediato de produção (A) e o conjunto da produção e circulação do capital em geral (B) se dá por meio das condições gerais de produção. Essas condições articulam, portanto, A e B. As condições gerais de produção articulam, assim, o particular ao geral. Essas condições são denominadas de gerais porque dizem respeito a condições que viabilizam não apenas um capital em particular, mas um conjunto de capitais. E é isso faz com que o consumo delas seja coletivo.

As condições gerais de produção estabelecem a mediação entre o processo de produção e de consumo, entre o processo particular de produção de um capital individual e processo global de produção capitalista. Dito isto podemos afirmar que essas condições gerais são os elementos que representam as condições para a reprodução da sociedade e para a reprodução ampliada do capital. O seu caráter geral está em que não são produzidas para um único capital, mas que só podem ser produzidas e consumidas pelo conjunto da classe capitalista e mesmo pela sociedade em geral. Correspondem, portanto, aquele amplo conjunto de infraestruturas de transporte, telecomunicação, distribuição de energia, que tem de ser produzidas para consumo coletivo, mesmo que seu uso seja cobrado individualmente. Se pensarmos que as condições gerais de produção são todas aquelas condições que permitem a reprodução de conjunto dos capitais, obviamente temos que incluir nessa categoria também instituições responsáveis, por exemplo, pela reprodução da força de trabalho uma vez que este é um fator fundamental para a reprodução do capital. Assim escolas e universidades também poderiam ser pensadas como condições gerais de produção do ponto de vista do capital.

Por outro lado, como a produção não pode se dar de forma contínua se não estiver interligada ao consumo também temos que considerar como condições gerais de produção aqueles empreendimentos que permitem o consumo de massa que viabiliza a produção industrial em larga escala. Assim, poderíamos compreender as condições gerais de produção dentro de três grandes segmentos: condições gerais de produção ligadas à produção e circulação de mercadorias; condições gerais de produção ligadas à reprodução da força de trabalho e condições gerais de produção ligadas ao consumo.

Como o próprio nome já coloca as condições gerais de produção não determinam de forma alguma a localização industrial ou a formação de aglomerações industriais apenas criam condições gerais para a reprodução de múltiplos capitais que permitem que esses decidam se localizar em uma determinada área que conformará a aglomeração. Tanto a produção das condições gerais de produção quanto à conformação de aglomerações industriais a partir da constituição de condições gerais de produção adequada em um local específico depende de decisões específicas de agentes privados assim como de decisões do poder público.

No presente trabalho pretendemos discutir a formação de aglomerações industriais, na forma de Aglomerações Industriais Relevantes relacionando-as com a produção de condições gerais de produção. Com isso pretendemos demonstrar o aspecto territorial da indústria e quando analisamos a indústria a partir do território outros aspectos aparecem, de forma distinta, de quando analisamos a indústria a partir de outros pontos de vista. No primeiro tópico discutiremos o conceito de aglomerações industriais relevantes com base no trabalho de Diniz; Croco (1996) e trabalhos posteriores.

De forma geral, colocamos que ao trabalhar com microrregiões o artigo acima citado apresenta uma visão mais adequada da formação das aglomerações industriais do ponto de vista territorial ao adotar uma escala que não é tão pequena como os municípios nem tão grande como um estado, ou seja, dificilmente teremos uma aglomeração industrial em um único município ao passo que em um Estado da federação podemos ter diversas aglomerações industriais distintas. No segundo tópico apresentamos nossa própria leitura das Aglomerações Industriais Relevantes, em que acrescentamos ao número total de empregos industriais, o número de unidades locais. Assim apresentamos a evolução das Aglomerações Industriais Relevantes entre 2000 e 2018. Este período foi escolhido em primeiro lugar pela disponibilidade dos dados e em segundo lugar pelo fato de incluir momentos de crescimento e estagnação econômica. Seguem-se as considerações finais.

As aglomerações industriais relevantes: uma abordagem do desenvolvimento industrial brasileiro

O trabalho de Diniz; Croco (1996) traz uma abordagem original para a compreensão das formas de aglomeração da indústria. Entre outros motivos, a importância desse trabalho está na questão da escala, ou seja, a maioria dos trabalhos sobre a formação de aglomerações industriais trabalhou com a escala do município ou dos Estados da federação. O município é uma escala restrita para o estudo deste fenômeno, uma vez que a maioria das aglomerações industriais se organiza em mais de um município. Por outro lado a escala dos Estados da federação é também inadequada, pois dentro de um Estado podemos ter diversas aglomerações industriais com dinâmicas e padrões de desenvolvimento diferentes cuja compreensão será obscurecida pelo estudo das aglomerações industriais nesta escala. A metodologia do trabalho dos autores é discutida a seguir, Segundo Diniz; Croco (1996, p. 13):

O trabalho tomou como unidade básica de estudo as microrregiões homogêneas (MRH), defmidas pelo IBGE e constantes dos censos industriais brasileiros, as quais foram redenominadas segundo a cidade mais importante de cada microrregião, a fim de facilitar sua visualização. Isto permitiu agrupar mais de um município, abrindo a possibilidade de incorporar à análise o conjunto de cada aglomeração industrial e todas as possíveis relações industriais locais mas que ultrapassam as fronteiras de um município específico.

Dentre as MRH do país, foram selecionadas aquelas que, em 1970, 1980 e 1991, possuíam 10.000 ou mais pessoas ocupadas na indústria, as quais passam a ser denominadas neste trabalho de Aglomerações Industriais Relevantes (AIRs). Seguindo este critério, foram encontradas 33 AIRs em 1970, 76 AIRs em 1980 e 90 em 1991 (Mapas 1 e 2), que representam, respectivamente, 75, 84 e 86% do emprego industrial.

A microrregião homogênea é uma tipologia regional desenvolvida pelo IBGE sendo definida pela “estrutura da produção e a interação espacial” (IBGE, 1990). Portanto, a microrregião é definida por uma estrutura comum de produção presente em um conjunto de municípios próximos, que proporciona ampliação da interação espacial entre esses municípios. Dessa maneira a microrregião como nível escalar intermediário entre o município e o Estado, e ainda tendo sua delimitação ligada diretamente ao desenvolvimento articulado das atividades econômicas apresenta-se como uma escala bastante viável para a apreensão do fenômeno de formação e desenvolvimento de aglomerações industriais. A denominação homogênea, aposta a microrregião se dá justamente pelo fato de ser uma região formada por um conjunto de municípios que apresentam semelhanças em termos de paisagem e estrutura produtiva. De acordo com o trabalho acima citado, os autores consideram aquelas microrregiões homogêneas com mais de 10.000 empregos na indústria como Aglomerações Industriais Relevantes. Portanto, as Aglomerações Industriais Relevantes seriam aquelas que possuem pelo menos 10.000 empregos na indústria, sendo, portanto, aglomerações com forte concentração de emprego e produção industrial.

A análise dos dados revelou que a maioria das AIRs, especialmente aquelas de crescimento acelerado em termos de geração de empregos, estava concentrada no interior da região Sudeste e Sul (DINIZ; CROCO, 1996). Portanto percebe-se que apesar do processo de desconcentração industrial discutido pelos autores, as aglomerações industriais, entre as décadas de 1970 e 1990, permanecem localizadas principalmente na parte mais industrializada do país o que indica que o crescimento da produção industrial em outros estados deve-se dar principalmente no caráter de enclaves, sem a formação de aglomerações industriais. Por outro lado, Monteiro Neto; Silva; Severian (2019, p. 6) ao atualizar o trabalho dos autores acima citados com informações do período entre 1990 e 2015, concluem que o temos é um reforço do processo de “desconcentração concentrada” com a formação de novas aglomerações basicamente no interior das regiões Sudeste e Sul, embora tenhamos um crescimento do número de AIRs no Centro-Oeste.

A contribuição do presente trabalho está em primeiro lugar em acrescentar o número de unidades locais ao emprego como definidor das AIRs. Assim consideramos que as AIRs são aquelas microrregiões com pelo menos 10.000 empregos na indústria e pelo menos 100 unidades locais na indústria. O motivo para acrescentarmos essa variável à definição de AIRs é o seguinte: ao considerar apenas o volume de emprego poderíamos definir como AIR uma aglomeração cujo emprego industrial seja vinculado a apenas uma grande empresa ou algumas poucas empresas com grandes unidades industriais. Imaginemos uma microrregião com cinco empresas industriais, cada uma com uma unidade local, de setores distintos e que empregam no conjunto 10.000 trabalhadores, cada uma dessas empresas em um município distinto. Não se trata nesse caso de uma aglomeração industrial, mas seria considerado como tal devido a não utilização dos dados de unidade local juntamente com os dados de emprego.

Neste trabalho consideramos que uma aglomeração industrial corresponde a um arranjo urbano, em que um conjunto de localidades urbanas se articula para o desenvolvimento de uma ou mais atividades industriais. De forma geral a discussão sobre o caráter territorializado da indústria e da formação de aglomerações industriais tem como uma de suas origens o trabalho de Marshal (1996) sobre os distritos industriais. No entanto a discussão teórica sobre as aglomerações industriais fugiria ao escopo do presente trabalho e assim sendo nos conformamos com a noção de que uma aglomeração industrial é um arranjo urbano territorializado no qual se desenvolvem atividades industriais. As aglomerações industriais relevantes são aquelas que apresentam uma grande concentração de firmas industriais e de emprego industrial, o que nos permite deduzir que se trata de aglomerações com certo dinamismo e desenvolvimento próprio. Assim se consideramos que uma AIR consiste em uma concentração de unidades industriais e de empregos industriais, obviamente para identificar esse tipo de arranjo espacial precisamos dos dados de emprego e também de unidades locais.

A unidade local corresponde basicamente a um endereço em que se desenvolve uma determinada atividade produtiva e assim se diferencia da empresa (IBGE, 2015). Desse modo uma empresa que possua duas fábricas em uma mesma cidade contará na estatística como duas unidades locais. A outra contribuição do presente trabalho é relacionar as AIRs com as condições gerais de produção discutindo em que sentido a produção e difusão dessas condições que permite a estruturação das AIRs.

Acreditamos que é fundamental a análise das aglomerações industriais no contexto mais amplo desindustrialização brasileira e também considerando o contexto específico da crise que se prolonga desde 2015. O principal objetivo do artigo é demonstrar a dinâmica diferenciada da indústria do ponto de vista territorial mesmo em um contexto de crise e desindustrialização. Ou seja, o que buscamos demonstrar é que analisar a indústria do ponto de vista do território industrial gera análises distintas da que seriam obtidas a partir de outras perspectivas, como a partir da evolução do emprego ou do valor agregado industrial. No próximo tópico discutimos a configuração das AIRs no Brasil, no período entre 2000 e 2018.

As aglomerações industriais relevantes: incluindo a variável número de unidades locais

Neste tópico buscaremos apresentar a identificação e evolução das AIRs de acordo com o número de empregos e número de unidades locais na indústria. Consideramos como critério para delimitação das AIRs a presença no interior de uma microrregião de pelo menos 10.000 empregos industriais e pelo menos 100 unidades locais na indústria no ano de 2000. O limiar de 10.000 empregos foi adotado tanto no trabalho de Diniz; Croco (1996), quanto no trabalho de Monteiro Neto; Silva; Severian, (2019) sendo mantido também no presente trabalho. O limiar de 100 unidades locais foi estabelecido uma vez que isto representa um valor médio de 100 trabalhadores por unidade local, o que já significa um empreendimento de grande porte de acordo com a legislação. Nesse sentido a utilização conjunta desses dados permitirá identificar tanto aglomerações industriais formadas predominantemente por unidades locais de pequeno e médio porte quanto aglomerações industriais formadas predominantemente por unidades locais de grande porte, mas não concentrações de emprego industrial ligadas a um número pequeno de unidades locais e que, portanto, por definição, não conformariam uma aglomeração industrial. O período de estudo é entre 2000 e 2018 cobrindo, assim, um período de 18 anos, envolvendo momentos de forte crescimento econômico (2002 - 2014) e forte recessão (2015- 2018) permitindo, portanto analisar o caráter estrutural da formação das AIRs no Brasil.

Como não há uma variação anual significativa do número de AIRs no país optamos por mostrar os dados a cada 5 anos (2000, 2005, 2010, 2018: último dado disponível). A opção por disponibilizar os dados a cada 5 anos apenas também se dá para que tenhamos uma tabela mais limpa e de mais fácil leitura e interpretação. Os dados que constam nas tabelas do presente trabalho referem-se todos ao grande setor indústria do IBGE, que corresponde à indústria extrativa mineral juntamente com a indústria de transformação e todos os seus subsetores. Foram selecionados como AIRs as microrregiões de cada estado que tem pelo menos 10.000 empregos e 100 unidades locais na indústria. A tabela 1 apresenta os dados referentes à quantidade de AIRs por estado nos anos de 2000, 2005, 2010, 2015 e 2018.

Em primeiro lugar chama atenção a tendência de crescimento do número de AIRs no país ao longo do período, tendência interrompida apenas a partir da crise de 2015, sendo que o número de AIRs cai de 158 em 2015 para 146 em 2018. Ainda assim, em 2018 temos 40 AIRs a mais em todo o país em relação a 2000, um crescimento de mais de 37% ao longo do período. Portanto apesar de todo o debate sobre a desindustrialização do Brasil (IPEA, 2009), em termos territoriais e urbanos a industrialização continua progredindo com a formação de aglomerações com grande número de empregos industriais. Trata-se de uma informação relevante que mostra a importância do território para o desenvolvimento da atividade industrial, mesmo na completa ausência de uma política industrial desenvolvida a nível federal, por mais que a política de distribuição de renda tenha impactos na ampliação das aglomerações industriais.

Tabela 1
Número de AIRs por Estado, 2010-2018

Assim mesmo que consideremos que possivelmente não se trata, na maioria dos casos, de AIRs com alta capacidade de inovação tecnológica, algo que não será possível abordar neste artigo, ainda assim trata-se de aglomerações dinâmicas e com certa capacidade de resiliência uma vez que mesmo diante da prolongada crise que tivemos a partir de 2015 e que se estende até o presente não foi possível perceber, pelo menos a partir dos dados de 2018, uma tendência a redução significativa do número de AIRs embora tenha havido uma inversão da tendência de crescimento que se manifestou até 2015 sendo que houve uma redução de 12 AIRs entre 2015 e 2018.

Analisando os dados a partir das grandes regiões, chama a atenção a permanência da grande concentração na região Sudeste que responde, ao longo de todo período, por mais de 40% do total das AIRs do país. Além disso, temos um crescimento absoluto do número de AIRs nessa região que passam de 51 em 2000 para 69 em 2015. Em 2018, como decorrência da crise, temos 7 AIRs a menos nessa região, fato interessante se considerarmos que temos um total de 12 AIRs a menos no Brasil entre 2015 e 2018. Isto significa que esta região, epicentro da industrialização do Brasil, também concentrou as perdas de emprego nas AIRs. Por outro lado, temos ao longo do período um tímido processo de desconcentração das AIRs uma vez que a participação do Sudeste no total das AIRs do Brasil cai de 48% para 42%. Assim a desconcentração das AIRs se deu num ritmo muito menos intenso do que o ritmo de desconcentração do emprego industrial, analisado por Saboia (2001).

Tal situaçãoestáligadacertamenteaofato de que boa parte da desconcentração industrial estáligada a pratica de incentivos fiscais e comumente a grandes empreendimentos de exploração mineral que levam a desconcentração do emprego, mas não necessariamente a formação de aglomerações industriais relevantes. Isto pode indicar que não é suficiente uma política de incentivos a investimento e geração de empregos fora do eixo mais industrializado do país. É necessária também uma política que gere os condicionantes, principalmente as condições gerais de produção, que permitam a formação de novas aglomerações. Aglomerações estas que uma vez formadas tem uma grande capacidade de resiliência a situações adversas haja vista a relativamente pequena na redução do número de AIRs entre 2015 e 2018.

Dessamaneira é precisoreafirmarque as aglomeraçõessãoterritorializadas e talterritorializaçãoexplica boa parte de seudinamismo e resiliência. Segundo Coe; Towsend (1998, p. 5) isto se dá da seguinte forma: “firstly, entrepreneurs in a given industry will concentrate in geographical areas where the sector is already concentrated. Secondly, a cluster of firms in a certain sector will make the region especially suited to meeting the locational requirements of such firms”. Portanto, estamos falando basicamente de aspectos relacionadas àse conomias externas de escala ou de localização (Fochezatto, 2010), ouseja, economias externas a firma, mas internas a aglomeração. A formação de tais aglomerações se dá inicialmente porque as empresas de um setor tendem a se localizer onde já existem empresas daqueles setores uma vez que devido a essa proximidade é possível aproveitar condições gerais de produção já existentes no local como, por exemplo: disponibilidade de sistemas de transporte e telecomunicação ou existência de instituições de ensino com capacidade de formação de mão de obra com habilidades adequadas ao desenvolvimento daquele ramo econômico.

Num segundo momento à medida que há a concentração de empresas de um determinado ramo num espaço regional e que investimentos públicos e privados são realizados para aperfeiçoar as condições gerais de produção e ao passo que mais e mais empresas são atraídas para essa aglomeração, ela se torna, por conseguinte, cada vez mais ideal para o estabelecimento de empresas desse ramo. Importante apontar que como afirmam Coe; Towsend (1998) não se trata de desenvolvimento local, uma vez que a formação de aglomeração de empresas de um ramo qualquer da economia dificilmente se inscreve em um único local, mas engloba diversos locais, ou seja, uma região, em que os diferentes locais irão cumprir diferentes funções dentro de uma divisão do trabalho estabelecida no interior da aglomeração.

A tímida desconcentração do número de AIRs no Sudeste que caiu de 48,11% em 2000 para 42,47% em 2018, se deu principalmente em benefício da região Centro Oeste e Sul. A região Sul aumentou sua participação de 27,36% em 2000 para 30,82% em 2018 enquanto a região Centro-Oeste aumentou sua participação de 4,72% em 2000 para 8,22% em 2018. Em números absolutos temos na região Sul 29 AIRs em 2000 e 45 em 2018, ou seja, um acréscimo de 16 AIRs, enquanto na região Centro-Oeste temos 5AIRs em 2000 e 12 em 2018, acréscimo de 7 AIRs. Como não houve redução e sim crescimento do número absoluto de AIRs da Região Sudeste devemos concluir que este crescimento é resultado principalmente do dinamismo dessas regiões e não necessariamente da transferência de empresas industriais do Sudeste para essas regiões.

Por outro lado na região Norte, temos um decréscimo na participação e no número absoluto de AIRs entre 2000 e 2018, sendo que em 2000 haviam 4 AIRs que representavam 3,77% do total enquanto em 2018 temos 2 AIRs que representavam 1,37% do total. Na região Nordeste apesar do aumento do número absoluto de AIRs a participação no total permanece praticamente estável, o que indica que o ritmo de crescimento das AIRs nessa região foi menor que a média do país. O número de AIRs cresceu de 17 em 2000 para 25 em 2018, acréscimo de 8 novas AIRs embora a participação no total tenha crescido de 16,04% em 2000 para 17,12% em 2018. Assim a análise das AIRs reforça a ideia de uma desconcentração concentrada (Andrade; Serra, 1998) uma vez que temos uma desconcentração das AIRs relativamente pequena em termos percentuais e que ainda se dá basicamente em direção as regiões mais próximas fisicamente da região Sudeste e historicamente mais bem dotadas de infraestrutura, ou seja, as regiões Centro-Oeste e Sul.

Quando se analisa a evolução das AIRs por Estado temos o seguinte quadro. Em primeiro lugar chama à atenção a grande concentração de AIRs no estado de São Paulo, que responde por 30,19% das AIRs em 2000 e 26,71% das AIRs 2018. A leve tendência de desconcentração não se dá devido a uma redução do número de AIRs, pelo contrário temos 7AIRs a mais no Estado de São Paulo em 2018 na comparação com o ano 2000, mais porque o ritmo de crescimento do número de AIRs em outros locais se manteve acima do desse estado. Nenhum outro estado tem uma concentração tão elevada do número de AIRs do país, sendo que os segundos colocados referente à porcentagem de AIRs em relação ao total do país são os Estados de Paraná e Santa Catarina, que respondiam em 2018, por 11,64% do total de AIRs do país, número que é menos da metade do de São Paulo.

Assim podemos reafirmar que a desconcentração do emprego industrial se deu num ritmo mais lento que a das AIRs o que implica em que essas aglomerações têm certa estabilidade que depende de outros fatores que vão além das políticas tradicionais de incentivo a desconcentração. Como vimos discutindo a formação de uma AIR depende da produção das condições gerais de produção e dos mecanismos de feedback, em que novos investimentos públicos e privados vão continuamente criando e expandindo as condições de existência da aglomeração.

Outro aspecto que chama a atenção é a pequena participação do Estado do Rio de Janeiro no total de AIRs do país. Embora seja a segunda economia do país este estado responde apenas por 3,77% das AIRs do país em 2000 e 3,42% das AIRs do país em 2018. Portanto, não apenas tem uma participação pequena no total de AIRs do país, mas também não apresenta qualquer tendência de crescimento da participação. Em números absolutos o estado chega a ter no máximo 7 AIRs enquanto em 2018 temos apenas 5. Se compararmos estes números com os de São Paulo, que chega a ter 40 AIRs em 2015 e cai a 39 em 2018, podemos ter uma noção do enorme abismo que separa as duas maiores economias do país em termos de número de AIRs. Uma justificativa para essa diferença poderia ser dada pela grande desigualdade da extensão do território dos dois estados, uma vez que o Estado do Rio de Janeiro, 4. menos extenso do país tem apenas 43.692 km. de extensão enquanto o estado de São Paulo tem 248.222 km. de extensão, ou seja, quase seis vezes mais. No entanto esta diferença está também relacionada com o histórico da industrialização brasileira que a partir de 1930 passou a se concentrar em São Paulo em detrimento do Estado do Rio de Janeiro (CANO, 1975).

Chama ainda a atenção a pouca participação dos Estados da região Norte e Nordeste. No caso da região Norte nenhum dos estados chega a ter mais de cinco AIRs em qualquer dos anos da série e no caso do Nordeste apenas dois estados: Pernambuco e Bahia chegam a atingir esse patamar. Se considerarmos que estas duas regiões sempre foram alvos preferenciais das políticas de desconcentração industrial podemos concluir que uma política de desconcentração dos investimentos do emprego não leva necessariamente a formação de aglomerações industriais. Assim podemos supor que a desconcentração do emprego industrial, que apontamos anteriormente, se deu, em relação a essas duas regiões, principalmente com base na formação de enclaves constituídas de poucas empresas e que não conseguiram constituir aglomerações industriais de relevância. Prosseguindo a análise a próxima tabela 2 aponta o número médio de emprego nas AIRs de cada Estado, que foi obtido dividindo o total de empregos de todas as AIRs de cada estado pelo número total de AIRs de cada estado em cada ano.

Tabela 2
Número médio de empregos nas AIRs de cada Estado, 2010-2018

Rais/Ministério da Economia. Elaborado pelo autor

Um primeiro aspecto que chama a atenção é o crescimento da média de empregos em termos de Brasil, entre 2000 e 2018. É verdade que entre 2015 e 2018 a média de empregos nas AIRs de todo o país se reduz em pouco mais de 500.000 empregos. Isto significa que a crise foi sentida duramente mesmo pelas aglomerações industriais, que devido a sua maior concentração de condições gerais de produção, condições que incluem desde infraestrutura física até disponibilidade de mão de obra qualificada, têm uma maior resiliência as crises. No entanto considerando todo o período, ou seja, entre 2000 e 2018 temos ainda assim um aumento de mais de um milhão de trabalhadores em média nas AIRs em todo o país. Isto significa que o ritmo de crescimento do emprego no período em que o país crescia, entre 2002 e 2014, foi maior que o ritmo de perda de emprego quando adveio a crise, a partir de 2015.

Em relação às regiões chama a atenção o fato de que a média de empregos da região Sudeste é ainda bastante superior a das demais regiões. Em relação à região Sul que é a segunda região com as maiores médias de empregos pode-se constatar que em 2000 a média de empregos da região Sudeste é mais de quatro vezes superior a média de empregos da região Sul. Em 2018 a diferença entre as médias diminui, mas a região Sudeste ainda apresenta uma média cerca de três vezes superior a da região Sul.

Se compararmos com as regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste a diferença é ainda maior. Em 2000 em relação às regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste a média de empregos das AIRs do Sudeste era mais de 31 (Norte), 8 (Nordeste), 35 (Centro-Oeste) vezes superior a essas regiões respectivamente. Em 2018 em relação na mesma comparação temos que a média de empregos do Sudeste é superior mais de 27 (Norte), 7 (Nordeste), 12 (Centro-Oeste) vezes.

Isto significa que não temos apenas a maior concentração das AIRs na região Sudeste, mas também que as AIRs do Sudeste são maiores, mais dinâmicas e agregam um número muito maior de emprego. Assim embora tenha havido uma ligeira redução na distância das médias do Sudeste e as outras regiões tal distância permanece muito grande especialmente em relação às regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Não apenas isso, pois a desconcentração das AIRs se deu num ritmo muito mais intenso do que a da equiparação da média de empregos. Se compararmos o Sudeste com o Nordeste, por exemplo, temos que em 2000 tínhamos um total de 17 AIRs no Nordeste e 51 no Sudeste, ou seja, o número de AIRs do Sudeste era 3 vezes maior, enquanto em 2018 tínhamos um total de 25 AIRs no Nordeste e 62 no Sudeste, ou seja, era pouco mais de duas vezes maior. Enquanto isso a média de empregos do Sudeste era mais de 8 vezes maior em 2000 e 7 vezes maior em 2018.

Portanto, não temos apenas um número menor de AIRs no Nordeste, mas também que elas empregam bem menos trabalhadores do que no Sudeste o que indica menor dinamismo dessas AIRs. Também em relação à variação da média de empregos, o crescimento desta foi maior no Sudeste do que nas outras regiões sendo que a diferença em relação à variação na região Sul, segunda na média de empregos, foi de mais 146.000 empregos no período. Assim a região Sudeste além de concentrar um maior volume de empregos, teve uma dinâmica de crescimento mais acelerada que a das outras regiões o que fez com que a distância que a separa das demais regiões não fosse tão alterada.

Além disso, é importante apontar que em termos de média de empregos a distância entre a Região Sul e as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste é também elevada. Assim se a região Sudeste se encontra num patamar de concentração de emprego nas AIRs elevado, a região Sul encontra-se bem abaixo, mais muito distante das regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste, especialmente destas duas últimas. Apesar disso as regiões Nordeste e Centro-Oeste tiveram um forte crescimento na média de empregos, sendo que em relação ao Nordeste o crescimento do número médio de empregos entre 2000 e 2018 corresponde a 55% do número médio de empregos desta região em 2000, enquanto em relação ao Centro-Oeste o crescimento do número médio de empregos entre 2000 e 2018 corresponde a mais de duas vezes o número médio de empregos em 2000.

Em relação aos estados é preciso destacar também a elevada média de empregos das AIRs do Estado de São Paulo. Desse modo em relação ao Sudeste esse estado concentra o maior número de AIRs e apresenta as mais elevadas médias de emprego entre todos os estados da federação. Isto mais uma vez reforça a ideia de que se houve uma desconcentração do emprego industrial, a dinâmica das aglomerações industriais continua fortemente concentrada no Sudeste e no interior do Sudeste dentro de São Paulo. O que coloca novamente a ideia de que para a constituição de novas e dinâmicas aglomerações industriais fora do Sudeste e de São Paulo não bastam as tradicionais políticas regionais de incentivo a desconcentração e atração de investimentos as regiões menos industrializadas, como aquelas relacionadas a empréstimos subsidiados para investimentos no Nordeste no âmbito da Sudene (Oliveira, 1981). Mais que políticas de desconcentração industrial o necessário são políticas centradas no fornecimento das condições para a concentração industrial principalmente aquelas em torno da produção das condições gerais de produção, tanto aquelas relacionadas a produção da infraestrutura física, quanto aquelas relacionadas a qualificação da mão de obra.

A média de empregos nas AIRs do Estado de São Paulo era em 2000 quatro vezes superior a média do segundo estado com a maior média de empregos, ou seja, o Rio Grande do Sul. Em 2010 a média de empregos no estado de São Paulo era um pouco mais de três vezes superior a do segundo estado em média de empregos, dessa vez Santa Catarina. Apesar disso podemos notar que em 2000 a média de empregos das regiões Norte, Nordeste, Sul e Centro-Oeste somados correspondiam a cerca de 40% da média de empregos industriais do Estado de São Paulo, enquanto em 2010 a média de empregos das regiões Norte, Nordeste, Sul e Centro-Oeste correspondia a cerca de 91% da média de empregos industriais do Estado de São Paulo. Portanto, até mais intensamente do que o que se deu com o número de AIRs, nota-se um dinamismo na geração de empregos fora de São Paulo, mas com um grau de concentração ainda muito intenso nesse estado.

Em relação à variação da média de empregos cabe destacar, que apesar da grave crise de 2015 que se estende até 2018, tivemos o crescimento da média de empregos entre 2000 e 2018 em todos os estados com a exceção de um, mesmo considerando que entre 2015 e 2018 tivemos uma redução da média de empregos em todos os estados. Dados mais recentes, quando disponíveis, talvez apontem para a continuidade da perda de empregos e mesmo para a reversão completa do crescimento de empregos notado entre 2000 e 2015, mas o fato de que em quatro anos de crise não houve uma queda substancial da média de empregos leva-nos a reforçar o argumento de que uma aglomeração industrial dinâmica, consolidada e com boas condições gerais de produção disponíveis tem uma maior resiliência em enfrentar condições de crise buscando alternativas a essa situação.

Cabe ainda apontar novamente a baixa expressividade e crescimento da média de empregos industriais no Rio de Janeiro, o que ressalta que de fato não se trata de um estado de relevância industrial, por mais que seja uma economia importante dentro do país. Cabe apontar ainda que fora do Sudeste e do Sul apenas três estados conseguiram um incremento de empregos na indústria próximo ou superior ao patamar de 100.000 empregos, sendo eles os estados de Bahia, Pernambuco e Goiás. O que mais uma vez reforça a necessidade não apenas de políticas de incentivo a desconcentração, mas principalmente de políticas ativas de formação de novas aglomerações industriais a partir da produção de condições gerais de produção que permitam a formação e a consolidação de novas aglomerações produtivas, aproveitando os recursos e saberes das regiões. A tabela 3 mostra a média, para cada estado, do número de empregados para cada AIR presente nesse estado. Os valores foram obtidos, a cada ano, somando por um lado o volume total de empregos em todas as AIRs de um estado e do outro o volume total das unidades locais em todas as AIRs nesse mesmo estado. Em seguida o número total de empregos foi dividido pelo número total de unidades. Esse número indica o porte médio das unidades locais que compõem as AIRs de cada estado informando, portanto, se as AIRs são compostas principalmente por unidades locais de pequeno, médio ou grande porte. Importante colocar que a unidade local se refere ao endereço de uma unidade produtiva e não se confunde com a empresa sendo que uma empresa pode ter diversas unidades locais em uma mesma AIR.

Em relação ao Brasil um aspecto interessante é o fato de que o número médio de trabalhadores por unidade local se situa em um patamar baixo ao longo de todo o período, o que significa que a expansão do emprego nas AIRs que tivemos entre os anos 2000 e 2015 se deram basicamente com a constituição de novas unidades locais de pequeno porte e não pelo aumento do porte das unidades locais já existentes. Este é um dado importante a ser destacado do presente trabalho, o fato de que o dinamismo das AIRs brasileiras está concentrado em pequenas unidades locais geralmente com menos de 20 funcionários. Assim diferente da imagem que temos normalmente do processo de industrialização, que este estaria sempre ligado a grandes unidades de produção, podemos constatar que o centro do dinamismo da indústria brasileira está em pequenas unidades de produção e que mesmo em período de crescimento econômico a tendência é a de geração de novas unidades locais e não da concentração do emprego nas unidades locais já existentes.

Tabela 3
Número médio de empregos por unidade local,nas AIRs de cada Estado da federação, 2010-2018

Rais/Ministério da Economia. Elaborado pelo autor

Importante que o dado se refere a unidades locais e não a empresas e, portanto, poderia ser o caso de termos na verdade grandes empresas, funcionando em unidades locais de pequeno porte. Porém considerando as economias de escala envolvidas na produção em uma economia capitalista (FOCHEZATO, 2010) é difícil imaginar que as empresas industriais de grande porte optariam em dividir o seu capital em unidades locais de pequeno porte sendo que o custo de produção seria muito menor se a produção fosse concentrada em unidades de porte mais elevado. Assim é bem mais provável, que a média baixa de empregados por unidade local indique na verdade a existência de um grande número de pequenas empresas que funcionam com uma ou poucas unidades locais de pequeno porte. Como se trata de uma média, e como toda média comporta desvios obviamente podemos ter certamente, em nível de Brasil, unidades locais de grande porte com média de empregos muito superior a média do país. Porém essa média indica que a grande maioria das unidades locais na indústria é de pequeno porte, podendo ser classificadas, caso cada unidade local corresponda a uma empresa diferente como empresas de pequeno porte - EPP (SEBRAE, 2018).

Além disso, tivemos ao longo do período uma leve tendência de redução do número de empregados por unidade local nas AIRs brasileiras, ou seja, não apenas não há uma concentração de empregos em unidades de grande porte, mas também a tendência de desenvolvimento das AIRs aponta para a direção contrária, ou seja, a redução do número médio de empregados por unidade local. Interessante notar ainda que em relação às regiões brasileiras, diferente do que temos nas outras tabelas não aparece uma diferença notável nas regiões em relação ao número médio de empregados, ou seja, todas as regiões tem uma média de empregos por unidade local baixa, variando em torno de 15 empregados por unidade local como se dá no Centro-Oeste a pouco mais de 20 empregados no Sudeste ou no Sul.

Também em relação aos Estados constatamos as mesmas médias de número de empregos por unidade local na indústria, variando de cerca de 15 empregados por unidade local, para pouco mais de 20. Mesmo São Paulo, que apresenta o maior número de AIRs e a maior média de empregos nas AIRs, possui uma média de empregos por unidade local que oscila entre 31 em 2000 e 23 em 2018. Em outras palavras mesmo no epicentro da industrialização e das AIRs brasileiras temos que a maioria das unidades locais possui um número relativamente pequeno de trabalhadores. Existem alguns poucos estados com um número um pouco mais elevado de empregos por unidade local, mas ainda assim inferior ao patamar de 100 empregados por unidade local. São os casos dos estados de Amazonas, fato explicado diretamente pela presença da zona franca de Manaus, única AIR do estado e cuja média de empregos oscila entre 67 e 53 empregados por unidade local e o estado de Alagoas que oscila entre 85 e 33 empregados por unidade local.

Nota se ainda tanto em relação aos estados quanto em relação às regiões uma tendência de redução da média de empregos por unidade local, o que ressalta a afirmação anterior de não termos uma tendência de ampliação do porte das unidades locais, mesmo no período de crescimento econômico entre 2002 e 2014. Assim temos que em geral a dinâmica industrial está fortemente concentrada em unidades de produção de pequeno porte, constatação que com certeza exige uma investigação mais apurada da realidade no sentido de compreender as demandas das empresas do setor. Se for verdade que a maioria das empresas industriais presentes nas AIRs brasileiras são empresas de pequeno porte, então se faz necessário, mais do que nunca uma política industrial voltada ao apoio dessas empresas considerando a conhecida fragilidade financeira desse tipo de empresas. A seguir discutimos a espacialização das AIRs pelo país com o auxílio do mapa 1.

Mapa 1
Distribuição das AIRs, Brasil, 2018

IBGE/Rais. Elaborado pelo autor. Escala 1:25.000.000

Analisando o mapa chama atenção à concentração praticamente contínua de AIRs desde o Estado de São Paulo, parte do Estado do Rio de Janeiro, indo em direção aos Estados da região Sul: Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Esta área aparece, portanto como o lócus da concentração espacial das AIRs no país e também da concentração da dinâmica industrial brasileira. Por mais que não possamos afirmar que exista uma ligação direta ou algum tipo de sinergia entre as AIRs dessa parte do Brasil, a partir da discussão realizada anteriormente, podemos afirmar com certeza, que é dentro deste polígono que se encontram as condições gerais de produção ideais para o desenvolvimento da indústria, confirmando a noção de um desenvolvimento poligonal no Brasil (Diniz, 1993). Portanto a concentração espacial das AIRs que na análise das tabelas demonstra um elevado grau de concentração no Sudeste e especificamente no Estado de São Paulo aparece agora como na verdade um grande polígono, que engloba o Estado de São Paulo, outros estados do Sudeste e os Estados da Região Sul.

Fora desse polígono de concentração de AIRs, temos em geral AIRs dispersas, principalmente associadas às capitais dos Estados e geralmente em cidades do litoral. Esse é o padrão que encontramos, por exemplo, no Nordeste, onde a maior parte das AIRs se concentra no litoral, com pouca interiorização. De forma geral, fora do polígono de concentração das AIRs temos poucas AIRs fora das áreas litorâneas. Na região Norte, por outro lado, as únicas AIRs que aparecem correspondem as duas metrópoles regionais, Manaus e Belém. Também temos poucas e isoladas AIRs na região Centro-Oeste.

A análise do mapa remete, portanto a necessidade de um novo tipo de política regional. Como dissemos anteriormente, mais que pensar em políticas de desconcentração industrial é preciso focar em políticas de concentração industrial, ou seja, em políticas que forneçam as condições em termos de desenvolvimento de condições gerais de produção para que novas aglomerações surjam e se desenvolvam fora do polígono de concentração das AIRs que coincide com a parte mais desenvolvida social e economicamente do país. Somente com este tipo de políticas que vá para além das tradicionais políticas de incentivos fiscais podemos pensar em um desenvolvimento mais equilibrado do território brasileiro levando oportunidade mais dignas de emprego e de vida aos diferentes rincões do país.

Considerações finais

Nestas considerações finais pretendemos destacar alguns aspectos do presente trabalho que acreditamos serem contribuições para análise da realidade da indústria brasileira e para perspectivas de desenvolvimento de políticas regionais. Em primeiro lugar temos a consistente concentração das AIRs, no Sudeste, no Estado de São Paulo e de forma mais geral na área identificada neste trabalho como polígono de concentração das AIRs. Se retomarmos o trabalho de Diniz (1993) é forçoso constatar que quase trinta anos após a publicação do referido artigo, temos a continuidade da concentração da dinâmica industrial dentro de um polígono de concentração de AIRs que corresponde grosso modo ao polígono identificado naquele trabalho. Assim se tivemos uma desconcentração do emprego industrial, não houve nenhuma tendência marcante de desconcentração das AIRs no período do estudo.

Em segundo lugar há que se discutirem os motivos relacionados a essa tendência persistente de concentração. Nesse artigo, com base em um argumento teórico, afirmamos que essa concentração está diretamente ligada a quantidade e qualidade das condições gerais de produção presentes nesse polígono de concentração das AIRs que corresponde à parte mais rica e urbanizada do país. Tal argumentação necessitaria de um aprofundamento no sentido de um estudo empírico da relação entre as condições gerais de produção e a concentração das AIRs no Brasil. No entanto tal estudo fugiria completamente do esboço do presente artigo ficando, portanto, como uma sugestão para pesquisas posteriores.

Em terceiro lugar há a constatação de que a dinâmica das AIRs no país depende basicamente de unidades locais de pequeno porte que geralmente empregam menos de 20 pessoas e que o período de forte crescimento do emprego nas AIRs brasileiras, manteve esse patamar de número de empregados o que significa que o crescimento do número de empregos se deu basicamente com a constituição de novas unidades locais e não com o aumento do número de empregados das unidades locais existentes. Permanece também como sugestão de pesquisa posterior o aprofundamento da análise em relação a esse aspecto principalmente no sentido de compreender se se tratam de múltiplas unidades locais pertencentes a poucas empresas ou se temos múltiplas unidades locais que correspondem principalmente a empresas diferentes.

Por fim há que se ressaltar a constatação da resiliência das AIRs em um contexto de crise e da necessidade, levantada neste trabalho, de não apenas termos políticas de desconcentração industrial, mas também e principalmente políticas de concentração industrial. Existe hoje toda uma literatura que ressalta que as regiões que tem sucesso econômico são as regiões capazes de aprender, inovar e evoluir (Asheim, 1996;Florida, 1995). Mas obviamente tal aprendizado econômico só pode ocorrer a partir do fato de que as condições gerais de produção que permitem este aprendizado estejam dadas. Em países desenvolvidos muito comumente essas condições gerais de produção já estão dadas então é possível focar apenas nas condições do aprendizado econômico, no entanto, em países em desenvolvimento como o Brasil antes que se discuta sobre como as regiões podem aprender e evoluir economicamente é preciso que sejam construídas as condições desse aprendizado que correspondem às condições gerais de produção. Assim trata-se de uma nova geração de políticas regionais voltadas para a criação das condições para a aglomeração industrial fundamentais para reverter às imensas desigualdades do vasto território brasileiro.

Referências

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