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CARACTERIZAÇÃO GEOLÓGICA/GEOMORFOLÓGICA DA ESCARPA EROSIVA DO SÍTIO ARQUEOLÓGICO CEMITÉRIO CAIXA D’ÁGUA, VALE DO SÃO FRANCISCO, BURITIZEIRO-MG/BR
GEOLOGICAL/GEOMORPHOLOGICAL CHARACTERIZATION OF THE EROSIVE CLIFF ARQUEOLOGIC SITE OF CAIXA D’ÁGUA CEMETERY, SÃO FRANCISCO VALLEY, BURITIZEIRO-MG/BR
CARACTERIZACIÓN GEOLÓGICA/GEOMORFOLÓGICA DEL ESCARPO EROSIVO DEL SITIO ARQUEOLÓGICO CEMENTERIO CAIXA D’ÁGUA, VALE DO SÃO FRANCISCO, BURITIZEIRO-MG/BR
Revista Cerrados (Unimontes), vol. 18, núm. 02, pp. 30-49, 2020
Universidade Estadual de Montes Claros


Recepção: 09 Abril 2020

Aprovação: 20 Junho 2020

Publicado: 01 Julho 2020

DOI: https://doi.org/10.46551/rc24482692202008

Resumo: O trabalho teve como meta, a caracterização geológica e geomorfológica da escarpa de linha de falha erosiva do sitio arqueológico Cemitério Caixa d’Água, localizado no Município de Buritizeiro – Norte do Estado de Minas Gerais, a partir da aplicação de parâmetros geomorfológicos, da análise regional litoestrutural, estratigráfica e sedimentar. Geologicamente, a área de estudo encontra-se localizada nos domínios do Grupo Bambuí – Neoproterozoico, as litofácies podem ser interpretadas como um sistema deposicional deltaico. O sítio encontra-se inserido dentro de uma feição morfoescultural denominada escarpa de linha falha erosiva, onde os elementos da escarpa encontram-se bem definidos. Através da caracterização do meio físico, pôde-se compreender melhor a morfoestrutura e morfodinâmica ocorrida na região, principalmente na escarpa de linha de falha erosiva.

Palavras-chave: Escarpa erosiva, Morfologia, Geologia, Geomorfologia.

Abstract: The aim of this work was the geological and geomorphological characterization of erosive fault-line escarp of the archaeological site Caixa d'Água Cemetery, in Buritizeiro town, on the North of Minas Gerais State (Brazil), from the application of geomorphological parameters, lithostructural, stratigraphic and sedimentary regional analysis. Geologically, the study area is located in the domains of the Bambuí Group - Neoproterozoic; the lithofacies can be interpreted as a delta depositional system. The site is inserted within a morphosculptural feature called erosive fault-line escarp, where escarpment elements are well defined. Through characterization of the physical environment, it was possible to better understand the morphostructure and morphodynamic occurring in the region, mainly in the scarp of erosive fault-line.

Keywords: Erosive escarp, Morphology, Geology, Geomorphology.

Resumen: El trabajo tuvo como objetivo, la caracterización geológica y geomorfológica de la escarpa de la línea de falla erosiva del sitio arqueológico Cemitério Caixa d'Água, ubicado en el Municipio de Buritizeiro, Norte del Estado de Minas Gerais (Brasil), a partir de la aplicación de parámetros geomorfológicos, análisis regional litostructural, estratigráfico y sedimentario. Geológicamente, el área de estudio se encuentra en los dominios del Grupo Bambuí - Neoproterozoico, las litofacies pueden interpretarse como un sistema deposicional deltaico, el sitio se inserta dentro de una característica morfo-escultórica llamada escarpa de la línea de falla erosiva, donde los elementos de la escarpa están bien definidos. A través de la caracterización del entorno físico, fue posible comprender mejor la morfoestructura, la morfodinámica que ocurrió en la región y, especialmente, en la escarpa de la línea de falla erosiva.

Palabras clave: Escarpe erosiva, Morfología, Geología, Geomorfología.

INTRODUÇÃO

Segundo o Ministério do Meio Ambiente - MMA (2016), o rio São Francisco é uma das principais drenagens do Brasil, com aproximadamente 2.830 km de extensão, sua bacia hidrográfica drena uma área de aproximadamente 641.000km², com uma vazão média estimada em 2.94 m³/s. Sua bacia hidrográfica drena os seguintes estados brasileiros: Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Sergipe e Alagoas, além do Distrito Federal.

A Bacia Hidrográfica do rio São Francisco atua como um grande e relevante corredor de dispersão das ocupações e migrações humanas, ocorridas no final do Pleistoceno e durante o Holoceno. De acordo com Ribeiro (2006), a ocupação pré-histórica na região norte de Minas Gerais deixou diversos registros, tais como: arte rupestre (pinturas e gravuras), estruturas de habitações, sepultamentos, instrumentos líticos, cerâmicas, dentre outros.

O sítio arqueológico Cemitério Caixa d’Água, é um sítio a “céu-aberto”, sendo um dos mais bem conservados e importantes do Estado de Minas Gerais e do país. No ano de 2005, iniciam-se os estudos abordando a temática arqueológica por uma iniciativa da Missão Arqueológica Francesa de Minas Gerais, da qual participa o Setor de Arqueologia Museu de História Natural e Jardim Botânico da UFMG – MHN-JB-UFMG. A partir daí, foram realizadas campanhas sistemáticas de escavações nos anos de 2006 e 2007, abrangendo uma área de aproximadamente 1.0 ha.

Durante a pesquisa, foram descobertas ossadas provenientes de sepultamentos pré-históricos, além de vários outros artefatos, tais como: materiais líticos lascados e/ou polidos, ponta de flechas, raspadores, machados, bigornas, batedores, ossos de animais, resíduos alimentares e objetos utilizados em rituais funerários. Estas evidências serviram como base para uma investigação geoarqueológica e geoquímica. Em 2005, a datação pelo método 14C apontou uma idade aproximada de 6.000 mil anos AP, abaixo dos sepultamentos, encontrou-se camadas arqueológicas mais profundas, com vestígios de pelo menos três momentos da presença humana. Estudos posteriores forneceram outras datações, indicando um período de ocupação entre 5.500 e 10.500 mil anos AP – cronologicamente posicionado no período Holoceno médio/tardio (PROUS; BAGGIO; RODET, 2007).

O sítio arqueológico Cemitério Caixa d’Água é relevante historicamente, devido a sua faixa cronológica, uma vez que no Brasil existem poucas ocorrências desta época, sobretudo, fora dos abrigos naturais. Trata-se do período durante o qual houve a substituição dos grupos pioneiros, aquele homem dito “de Lagoa Santa”, pelas populações indígenas de tipo moderno, ou mongoloides (PROUS et al., 2007).

Provavelmente, a população Pré-histórica que habitava a região aproveitava-se dos recursos naturais e ambientais que o rio São Francisco e a vegetação lhes proporcionavam. Assim sendo, é importante conhecer melhor seus hábitos e suas fontes de matéria prima, bem como as condições paleogeoambientais durante o Holoceno Médio/tardio, na tentativa de resgate da paisagem natural e dos hábitos dessa população.

LOCALIZAÇÃO E CARACTERÍSTICAS FISIOGRÁFICAS

Localizado na Rua Manuel Conceição de Melo s/n, área central da cidade de Buritizeiro - MG, o sítio arqueologico Cémiterio Caixa d’Água encontra-se inserido dentro das seguintes coordenadas UTM: 0504605E e 8081527N, ocupando uma área de aproximadamente 1.0 ha, na margem esquerda do rio São Francisco, como mostra a Figura. 1.


Figura 1
Mapa de localização geral da área da pesquisa, no contexto geográfico estadual e municipal. A imagem mostra os limites do sítio arqueológico e os locais dos sepultamentos pré-históricos
Baggio e Trindade, 2012.

A área de estudo está inserida no alto/médio curso do rio São Francisco, onde a estruturação da drenagem regional e a dinâmica hidrológica estão diretamente relacionadas à geomorfologia e estruturas geológicas, que caracterizam a região. O tipo climático estabelecido para o munícipio é tropical úmido ou subúmido, com invernos secos e verões chuvosos, com temperatura média mensal em janeiro em torno de 25ºC a 20ºC. A média pluviométrica gira em torno de 1195,9 mm, de acordo com a Agência Nacional de Águas (ANA, 2005). Geologicamente, o sítio encontra-se inserido nos domínios do Grupo Bambuí do Neoproterozóico, mais especificamente, sobre a Formação Três Marias - topo do Grupo Bambuí na região (CHIAVEGATTO, 1992).

A área da pesquisa encontra-se diretamente influenciada pelo contexto geológico-geomorfológico regional, marcada de forma geral, tanto por um plano ligeiramente ondulado, correspondendo à Superfície Sul-Americana I, cujo processo de arquitetação estendeu-se até o Plioceno Superior, como pela Superfície Sul-Americana II, cuja elaboração teve início a partir do soerguimento epirogenético, ocorrido no Plioceno Superior (VALADÃO, 1998).

A região é originalmente coberta pela vegetação do Bioma Cerrado e suas gradações fito fisionômicas (IEF, 2005). Dentro de um quadro litogeomórfico, definido para a área, desenvolveu-se uma cobertura pedológica diferenciada, devido às influências do material de origem e do relevo, prevalecendo: Neossolos, Neossolos flúvicos e Aluviais (BAGGIO, 2002). O sítio arqueológico encontra-se inserido dentro de uma feição morfoescultural denominada escarpa de linha falha erosiva, ou frente de falha dissecada, como mostra a Figura 2.


Figura 2
(a) Visada frontal do escarpamento, identificando os compartimentos que compõem essa feição morfoestrutural; (b) modelo digital do terreno representado a escarpa de linha de falha erosiva, onde se encontra inserido o sítio arqueológico
Baggio e Trindade, 2012.

METODOLOGIA

A compartimentação geomorfológica foi baseada na interpretação de imagens de satélite e de modelos digitais de elevação (MDE), definindo assim, padrões, feições morfológicas e lineamentos geológicos. Perfis topográficos foram elaborados com base nos dados SRTM em formato ASCII, com a proposta de delimitar a planície atual RSF e do escarpamento. Além desse material, foram utilizadas fotografias aéreas, escala 1: 60.000, resultantes do acordo Brasil/Estados Unidos – projeto USAF-AST-10 de 1964/66 e imagens orbitais de satélite, disponibilizadas pelo Google Earth, o que possibilitou uma análise conjunto/espacial da área de estudo. As informações cartográficas basearam-se nas seguintes cartas topográficas: SE-23-Y-B-III; SE-23-X-C; SE-23-V-D, escala 1:100.000 SGE, com o objetivo de analisar as condições topomorfológicas da área investigada.

Com objetivo de identificar as unidades geológicas/litológicas foram utilizados os seguintes mapas geológicos: Pirapora e Buritizeiro, escala 1:250.000 - elaborados pela Companhia Mineradora do Estado de Minas Gerais - COMIG e pelo Serviço Geológico do Brasil - CPRM – Projeto Espinhaço, na escala 1: 100.000 (2003), além de compilação bibliográfica sobre o tema. A base cartográfica dos mapas foi elaborada através da interpolação de curvas de imagens Geotiff, obtidas pela The Shuttle Radar Topography Mission - SRTM na escala 1: 250.000 – Datum WGS 84 e distribuídas pela National Aeronautics and Space Administration - NASA. Três campanhas de campo foram realizadas para verificação e validação das interpretações feitas, obtenção de dados de campo, amostragem e documentação fotográfica das formas deposicionais e erosivas reconhecidas nas imagens.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

CARACTERÍSTICAS GEOAMBIENTAIS DO SÍTIO CEMITÉRIO CAIXA D’ÁGUA

CONTEXTO GEOTECTÔNICO E GEOLOGIA

Segundo Baggio, (2008), a área encontra-se na porção sul do Cráton do São Francisco, definido por Almeida (1977, 1981) como uma das porções da Plataforma Sul-Americana individualizada em decorrência dos processos orogenéticos do Evento Brasiliano (±600 Ma). Geologicamente, o sítio arqueológico encontra-se inserido dentro do Grupo Bambuí do Neoproterozóico, mais especificamente, sobre a Formação Três Marias - topo do Grupo Bambuí na região. De acordo com Chiavegatto (1992), essas unidades são compostas por uma espessa sequência tempestítica, com relativa persistência lateral das litofácies: siltitos com interlaminações finas de argila-areia; siltitos com estrutura way/linsen; siltitos violáceos apresentando gretas de contração; arenitos com estratificações cruzadas sigmoidais; arenitos com estruturas cruzadas por ondas; arenitos com hummockys; arenitos com estratificação horizontal e arenitos arcoseanos e arcóseos. A deposição dessa unidade ocorreu em ambientes de plataforma siliciclástica e em ambientes transicionais a continentais, alimentados por sistemas fluviais, fácies de pró-delta e frente deltaica. Gerando na paisagem, uma morfologia de colinas e vales encaixados (CHIAVEGATTO, 1992).


Figura 3
(A, B e C): A foto (A) mostra afloramento da Formação Três Marias, apresentando estratificação horizontalizada em bancos distintos; a foto (B) mostra detalhe dos litotipos, siltitos com interlaminações finas argilas-areias, atestando o aporte clástico e detrítico esporádico na bacia; a foto (C) mostra vertentes convexas, esculpidas em rochas do Grupo Bambuí – Formação Três Marias
Baggio e Trindade, 2012.

FÁCIES E SISTEMAS DEPOSICIONAIS

As principais fácies do Grupo Bambuí, aflorantes na região entre Belo Horizonte, Três Marias e Pirapora são: arenito, calcário com estratificação cruzada acanalada e tabular, ritmito silto-argiloso, calcários com estratificações cruzadas por ondas (hummockys), arenitos lenticulares com hummockys, arenitos sigmodais e arenitos conglomeráticos. Na área da pesquisa, as litofácies mais representativas, são os arenitos lenticulares da Formação Três Marias. São arenitos finos/médios intercalados em siltitos amalgamados, em pacotes com vários metros de espessura, mostrando estratificação de baixo ângulo e laminação cruzada por ondas. Interpretados como o registro de depósitos formados sob a ação de ondas de tempestades, paleoimpressos na Formação Três Marias. Arenitos lenticulares, com estratificação cruzada sigmodais foram descritos por Uhlein (1991) e Chiavegatto (1992), interpretados como lobos de suspensão, depositados em um ambiente de frente deltaica. Os arenitos lenticulares associam-se a ritmitos arenosos que correspondem a arenitos com estratificação plano/paralela, como mostra a Figura 4.


Figura 4
da base para o topo, arenitos arcoseanos dispostos em bancos com estratificação plano/paralela, siltitos com estruturas way/linsen e siltitos com interlaminações finas de argila e areia branca
Baggio e Trindade, 2012.

ESTRATIGRAFIA DE SEQUÊNCIAS COSTEIRO/MARINHO

Sequência deposicional, é definida como uma unidade estratigráfica composta de uma sucessão relativa concordante de estratos geneticamente relacionados, limitada no topo e na base por discordâncias e conformidades correlatas, com duração de 1 a 1 Ma (MITCHUM Jr. et al.,1977). A bacia Sanfranciscana (área de estudo) é do tipo plataforma, cujos, sistemas costeiros, são alimentados perpendicularmente à linha de costa por rios (leques costeiros e deltas), por correntes de maré (planície de maré) ou por ambos (estuários), estes sistemas deposicionais são marinhos rasos e caracterizados em função do agente geológico dominante ondas/tempestades (BAGGIO, 2008). Tento como base os trabalhos de Chiavegatto, (1992), Vail, (1991) e Swift, (1976), definiu-se a sequência (base-topo) do escarpamento com trato de sistemas transgressivo.

SISTEMAS DEPOSICIONAIS

Apoiado nos trabalhos de Chiavegatto (1992), Uhlein et al. (2003), e em observação de campo (macroscópica), as litofácies do escarpamento podem ser interpretadas como um sistema deposicional deltaico, composto pelas seguintes litofácies: frente deltaica, composta por arcóseos, siltitos e arenitos finos Figura 5. Futuramente, o enfoque da pesquisa se dará na descrição de testemunhos de sondagens e na correlação através de seções estratigráficas.


Figura 5
a) litofácies de arcóseos, arenitos finos e, siltitos com interlaminações - Frente deltaica; b) detalhe das lentes de interlaminações de areia branca fina
Baggio e Trindade, 2012.

ARCABOUÇO GEOLÓGICO E ESTRUTURAL

As características estruturais e tectônicas do Grupo Bambuí em Minas Gerais estão intrinsecamente relacionadas ao desenvolvimento e estruturação das faixas móveis Brasília e Araçuaí, situadas respectivamente, nas bordas ocidental e oriental do Cráton do São Francisco (CSF). Considerando aspectos geotectônicos, o Grupo Bambuí ocorre como cobertura do CSF e apresenta deformação nas bordas da bacia em função da influência tectônica Brasiliana das Faixas Araçuaí, a leste, e Brasília, a oeste (ALMEIDA, 1977; ALKMIN et al., 1993). No que se refere ao Cretáceo, a Bacia Sanfranciscana foi palco de três ciclos tectono-sedimentares distintos, mostrando ainda uma grande contribuição magmática no Cretáceo Superior. Dois eventos que ocorreram no Cretáceo Inferior foram importantes para a implantação da sedimentação cretácea na Bacia do São Francisco: (a) os extravasamentos basálticos da Bacia do Paraná e (b) nova reativação tectônica (BAGGIO, 2008).

Os aspectos relacionados com geologia estrutural da área foram investigados com maior detalhe por Souza Filho et al. (1997), que divide a região da Serra do Cabral em macro-domínios de diferentes estilos tectônicos (macro-domínios Espinhaço e São Francisco), controlados pelas suas características reológicas. Além disso, subdivide o macro-domínio São Francisco em três domínios, com base no decréscimo de intensidade tectônica. Segundo o autor, a estruturação da região é constituída por amplas culminações antiformais e depressões sinformais, desenvolvidas nos dois Supergrupos, com formas abertas e cônicas, exibindo vergência para oeste. As charneiras das dobras apresentam duplo caimento em torno das direções N15E e S15W, com desvios para NNW e SSE.

Na região cratônica, a sul do paralelo 14°S, foram reconhecidas anomalias gravimétricas negativas de direção N35E, contíguas a altos gravimétricos alongados na direção NE-SW (LESQUER et al., 1981). A partir da modelagem da anomalia gravimétrica de Pirapora, Ussami (1981) propõe a existência de um corpo retangular de baixa susceptibilidade magnética em grande profundidade, alongado na direção NW-SE. Teixeira et al. (1993), sugere a existência de um depocentro sobre essa anomalia, controlado por uma falha normal de grande rejeito de direção E-W. A partir de dados gravimétricos, estima-se para o embasamento, profundidades variando de 2 km (a NW de São Romão) a 5 km (a SW de Santa Fé de Minas). Segundo o autor, o embasamento estaria a grandes profundidades na região de Pirapora. Os dados sísmicos indicam a existência de blocos escalonados limitados por falhas (grábens e horsts) na seção basal da bacia São Francisco (TEIXEIRA et al., 1993).

Os dados dos poços também corroboram essa interpretação, segundo Braun et al. (1993), na porção oriental da bacia, a maioria das falhas, originalmente normais, foi reativada por movimentos reversos para noroeste e norte que não atingem o Bambuí. Braun et al. (1993) e Teixeira et al. (1993), ao analisarem as seções sísmicas, entre a região do Remanso do Fogo e o rio Urucuia, propõem a existência de duas sequências deposicionais basais (Espinhaço e Macaúbas), instaladas em grábens e horsts, separadas de uma sequência superior (Bambuí) por um horizonte sísmico bem marcado, representativo de uma discordância regional. A área delimitada, segundo esses critérios, assemelha-se a uma protuberância dentro da zona de antepaís, denominado neste trabalho de “Saliência de Pirapora”. Esta saliência é coincidente, em parte, com o gráben do Espinhaço Meridional ou gráben de Pirapora (SOUZA FILHO, 1995) ou Aulacógeno de Pirapora (ALKMIM et al., 2006).

Em tais circunstâncias, a saliência define uma região onde houve a participação do embasamento na deformação da cobertura, favorecendo o alçamento do embasamento e a exumação de unidades mais antigas, relacionadas ao Supergrupo Espinhaço. A interação entre reativação de falhas normais com movimentos horizontais explicaria a geometria estrutural na zona de transição da Saliência de Pirapora para o restante do antepaís sem embasamento envolvido (SOUZA FILHO, 1995). Do ponto de vista estrutural, a feição geomorfológica escarpa de linha de falha, onde se encontra inserido o sítio arqueológico, pode estar correlacionada estruturalmente à geometria de hemigrábens, provavelmente sendo controlada pela geometria de falhas mestras (Figura 6).


Figura 6
(a) mapa geológico mostrando a inserção da escarpa, as fotos 1 e 2 mostram o modelado da escarpa e os litotipos; (b) modelo digital do terreno representado a escarpa de linha de falha erosiva, onde se encontra inserido o sítio arqueológico.
Baggio e Trindade, 2012.

ESCARPAMENTO DO SÍTIO ARQUEOLÓGICO CEMITÉRIO CAIXA D’ÁGUA – CARACTERIZAÇÃO

O sítio arqueológico encontra-se inserido dentro de uma feição morfoescultural denominada escarpa de linha falha erosiva ou frente de falha dissecada. O escarpamento (Fig. 7) encontra-se orientado no sentido NNO-SSE e pelos seguintes pontos subcolaterais NNO (305,5°) - SSE (202,5°), com aproximadamente 526 metros de extensão e um desnível médio de 15 m de altura, em relação ao nível de base regional o rio São Francisco. Apresenta-se como um escarpamento antigo e retrabalhado por processos erosivos que ocasionaram o dissecamento do espelho de falha, produzindo o recuo e um rebaixamento no degrau da falha. Do ponto de vista estrutural, a feição geomorfológica escarpa de linha de falha, pode estar correlacionada estruturalmente à geometria de hemigrábens, provavelmente, sendo controlada pela geometria de falhas mestras, salientados anteriormente por (SOUZA FILHO, 1995 & ALKMIM, 2006). Em gabinete e em campo, foi identificado um sistema de estruturas colunares do tipo (mullion structures), subparalelas, grosseiramente circulares, apresentando cantos arredondados, com dimensões de aproximadamente 1m de diâmetro e dimensão longitudinal de 2 metros, esculpidas em siltitos cristalizados/finos e cor violácea. Estas estruturas são resultantes, da subdivisão ou conformação de uma camada durante deformação ou metamorfismo (Figura 7).

A escarpa foi modelada em litotipos da Formação Três Marias – Grupo Bambuí – Neoproterozóico, descritos posteriormente. A superfície de topo - bloco superior - é delimitada a WN pelo córrego das Pedras, a SW pela Praça da ponte Marechal Hermes, a SE pelo rio São Francisco. A parte superior da superfície da escarpa é ocupada pelo sítio arqueológico Cemitério Caixa D’ Água. A declividade média do terreno varia entre 3° a 5°, e aponta forte correlação entre os compartimentos geomórficos, litologia, pedologia e uso e ocupação da terra. A cobertura vegetacional é representada por uma vegetação rala, tipo “capoeira”. A face da escarpa Free Face, é geometricamente retilínea e possui uma extensão total de aproximadamente 526 m, sendo que a porção de inserção do sítio arqueológico possui 171,00 m. A altura média do escarpamento gira em torno de 15m/alt, na porção limítrofe do sítio, variando entre 14 e 15m/alt (Figura 8).


Figura 7
(a) a seta mostra a estrutura colunar, vendo-se, de frente, a seção transversal de uma coluna com diâmetro de aproximadamente 1m Ø, (b) da base para o topo, arenitos arcoseanos dispostos em bancos com estratificação plano/paralela
Baggio, 2019.


Figura 8
visada frontal NO-SE do escarpamento, identificando os compartimentos que compõem a feição morfoescultural.
Baggio, 2019.

O piso da superfície inferior é originado do material desagregado do escarpamento, através, dos processos erosivos físicos, químicos e biológicos. Os processos erosivos atuam diretamente na face livre da escarpa, os tipos de processos erosivos mais representativos são: erosão diferencial, atmosférica, pluvial, térmica e biológica. O material transportado é depositado ao longo da base da escarpa, no contato da base da escarpa-planície aluvial, como mostra a Figura 9.


Figura 9
(a) processo erosivos desagregação cortical; (b) processos biológicos/mecânicos; (c) blocos de desmoronamento; (d) contato base da escarpa-planície aluvial (RSF)
Baggio, 2019.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As principais fácies do Grupo Bambuí, aflorantes na região são: arenito, calcário com estratificação cruzada acanalada e tabular, ritmito silto-argiloso, calcários com estratificações cruzadas por ondas (hummockys), arenitos lenticulares com hummockys, arenitos sigmodais e arenitos conglomeráticos. Na área da pesquisa, as litofácies mais representativas são os arenitos lenticulares da Formação Três Marias. São arenitos finos/médios, intercalados em siltitos amalgamados, em pacotes com vários metros de espessura, mostrando estratificação de baixo ângulo e laminação cruzada por ondas. O sítio arqueológico encontra-se inserido dentro de uma feição morfoescultural denominada escarpa de linha falha erosiva ou frente de falha dissecada. É um escarpamento antigo e retrabalhado por processos erosivos que ocasionaram o dissecamento do espelho de falha, do ponto de vista estrutural, a feição geomorfológica escarpa de linha de falha, pode estar correlacionada estruturalmente à geometria de hemigrábens. Identificaram-se estruturas colunares (mullion structures) subparalelas, grosseiramente circulares, apresentando cantos arredondados, com dimensões de aproximadamente 1 metro de diâmetro e dimensão longitudinal de 2 metros. Estas estruturas são resultantes da subdivisão ou conformação de uma camada durante deformação ou metamorfismo. As pesquisas devem prosseguir na área, com trabalhos que deverão focar na descrição de testemunhos de sondagens e na correlação através de seções estratigráficas e sísmicas.

AGRADECIMENTOS

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Grais-FAPEMIG pelo auxilio recebido. Agradecemos o apoio logístico das seguintes instituições: UFVJM/Laboratório de Geoquímica Ambiental-LGA, UFMG/IGC/CPMTC e, a todos que, de certa forma, contribuíram para a execução deste trabalho.

REFERÊNCIAS

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