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ANÁLISE MORFODINÂMICA DE AMBIENTES COSTEIRO E ESTUARINO DO MUNICÍPIO DE GOIANA, LITORAL NORTE DO ESTADO DE PERNAMBUCO
MORPHODYNAMIC ANALYSIS OF COASTAL AND ESTUARINE ENVIRONMENTS OF THE MUNICIPALITY OF GOIANA, NORTH COAST OF THE STATE OF PERNAMBUCO
ANÁLISIS MORFODINÁMICO DE AMBIENTES COSTEROS Y ESTUARINOS DEL MUNICIPIO DE GOIANA, COSTA NORTE DEL ESTADO DE PERNAMBUCO
Revista Cerrados (Unimontes), vol. 18, núm. 01, pp. 83-106, 2020
Universidade Estadual de Montes Claros

https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/

Recepção: 22 Março 2020

Aprovação: 14 Abril 2020

Publicado: 20 Abril 2020

DOI: https://doi.org/10.22238/rc244826922020180183106

Resumo: O município de Goiana, desde a década 2000, vem apresentando um considerável crescimento socioeconômico oriundo da implementação de empreendimentos que estão influenciando sobre o aumento da ocupação da zona costeira municipal. Para a pesquisa ora apresentada, utilizou-se de imagens de satélite do Google Earth Pro para a análise espaço-temporal da evolução das unidades geomorfológicas delimitadas e mapeamento. Através do ArcGis 10.3, vetorizou-se os modelos evolutivos finais do relevo, assim como produziu-se mapas de uso e ocupação da terra, além da obtenção de dados de campo através de uma check list que correlaciona processos e feições costeiras a elementos da paisagem natural e antrópica e seus respectivos estágios morfodinâmico. A área de estudo compreende as unidades de praia de Ponta de Pedras e Carne de Vaca, além do ambiente estuarino do rio Megaó. A partir dos resultados, constatou-se que a maior parte das áreas de estudo caracteriza-se como pertencente ao estágio morfodinâmico de meio Integrade, devido à identificação de geoindicadores de erosão quanto a de estabilidade do meio. Os processos morfodinâmicos encontrados nas unidades geomorfológicas encontram-se intrinsecamente relacionados com os processos de urbanização das zonas costeiras.

Palavras-chave: Processos morfodinâmicos, Ambiente costeiro, Goiana-PE.

Abstract: The municipality of Goiana, since the 2000s, has been showing considerable socioeconomic growth due to the implementation of projects that are influencing the increase in the occupation of the municipal coastal zone. For the research now presented, Google Earth Pro satellite images were used for the spatio-temporal analysis of the evolution of the delimited geomorphological units and mapping. Through the ArcGis 10.3, the final evolutionary models of the relief were vectored, as well as maps of land use and occupation were produced, in addition to obtaining field data through a check list that correlates coastal processes and features to landscape elements. natural and anthropic and their respective morphodynamic stages. The study area comprises the Ponta de Pedras and Carne de Vaca beach units, in addition to the estuary environment of the Megaó River. From the results, it was found that most of the study areas are characterized as belonging to the morphodynamic stage of Integrade medium, due to the identification of erosion geoindicators as to the stability of the medium. The morphodynamic processes found in the geomorphological units are intrinsically related to the urbanization processes of coastal areas.

Keywords: Morphodynamic processes, Coastal environment, Goiana-PE.

Resumen: El municipio de Goiana, desde la década de 2000, ha mostrado un considerable crecimiento socioeconómico debido a la implementación de proyectos que están influyendo en el aumento de la ocupación de la zona costera municipal. Para la investigación ahora presentada, las imágenes de satélite de Google Earth Pro se utilizaron para el análisis espacio-temporal de la evolución de las unidades geomorfológicas delimitadas y el mapeo. A través de ArcGis 10.3, se vectorizaron los modelos evolutivos finales del relieve, así como también se produjeron mapas de uso y ocupación del suelo, además de obtener datos de campo a través de una lista de verificación que correlaciona los procesos y características costeros con los elementos del paisaje. natural y antrópico y sus respectivas etapas morfodinámicas. El área de estudio comprende las unidades de playa Ponta de Pedras y Carne de Vaca, además del entorno del estuario del río Megaó. A partir de los resultados, se encontró que la mayoría de las áreas de estudio se caracterizan por pertenecer a la etapa morfodinámica del medio Integrade, debido a la identificación de geoindicadores de erosión en cuanto a la estabilidad del medio. Los procesos morfodinámicos encontrados en las unidades geomorfológicas están intrinsecamente relacionados con los procesos de urbanización de las zonas costeras.

Palabras clave: Procesos morfodinámicos, Ambiente costeiro, Goiana-PE.

INTRODUÇÃO

Os ambientes costeiros ocorrem na interface entre os três principais sistemas naturais da Terra: Atmosfera, Oceanos e Superfície Terrestre. Processos que operam nos três sistemas são responsáveis pela formação da zona costeira, e da interação entre os três conjuntos diferentes de processos que fazem desta uma região extremamente dinâmica (DAVIDSON-ARNOTT, 2010). No interior da zona costeira, temos a orla marítima, definida como unidade geográfica inclusa na zona costeira, delimitada pela faixa de interface entre a terra firme e do mar, sendo tal ambiente caracterizado pelo equilíbrio morfodinâmico, no qual interagem fenômenos terrestres e marinhos, sendo os processos geológicos e oceanográficos básicos para a gênese e evolução dos principais tipos de orla: costas rochosas (altas e baixas), falésias erodíveis, praias arenosas, praias de seixos, planícies lamosas, pântanos, manguezais e formações recifais (PROJETO ORLA, 2006).

De acordo com Muehe (2001) a orla marítima, ou costeira, constitui-se na estreita faixa de contato das terras continentais com o mar, na qual a ação dos processos costeiros se faz sentir de forma mais acentuada e, potencialmente, mais crítica, a partir de dinâmicas processuais derivados de efeitos erosivos/destrucionais ou deposicionais/construcionais, que podem alterar sensivelmente a configuração da linha de costa.

Ainda segundo Muehe (2001), a orla também se configura em uma faixa de degradação ambiental devido à erradicação da cobertura vegetal natural e construção de edificações, que modificam, negativamente, a estética da paisagem costeira e intervém no processo de transporte sedimentar, tanto eólico quanto marinho, provocando desequilíbrios no balanço sedimentar e na estabilidade da linha de costa (BIRD, 2011).

Quanto aos ambientes de estuários, estes são considerados como uma porção fluvial em direção ao mar em sistema de vale afogado que recebe sedimentos de fontes fluvial e marinha, sofrendo influências das ondas, marés e processos fluviais, sendo, também, um ambiente transicional entre o continente e o oceano (DALRYMPLE et al., 1992).

Segundo Pritchard (1952) existem quatro tipos de estuários, classificados a partir de suas características geomorfológicas: Planície costeira (vale inundado), fiorde (em altas latitudes), formado por barras e por outros processos. Esta classificação leva em consideração os eventos geológicos e geomorfológicos que ocorreram durante o processo de suas respectivas formações.

Contudo, uma classificação de estuários que leva em consideração a morfodinâmica (processos e morfologias) foi apresentada por Dalrymple em 1992, considerando as propriedades físicas, configurações do paleovale, condições de entrada e grau de preenchimento, chegando a classificação de dois tipos de estuários considerando o regime de energia e morfologia: Estuário dominados por ondas e Estuário dominados por marés (MASSELINK; HUGHES; KNIGHT, 2011).

Nas áreas estuarinas os manguezais constituem o principal ecossistema, sendo o desmatamento o principal problema impactante para os litorais em regiões tropicais, pois estes, tradicionalmente, têm sido utilizados como matéria-prima para queima e construções diversas, deixando os ambientes de estuários mais vulneráveis a eventos de enchentes e inundações, além de comprometer usos voltados para economia local, geralmente para o extrativismo e a aquicultura (HASLETT, 2009).

A crescente correlação com aspectos relacionados com o uso e ocupação das áreas costeiras, principalmente tomando por base a ocupação urbana consolidada ou não-consolidada, têm tornado a orla brasileira densamente povoada nas últimas décadas. Tais espaços, antes ocupados por comunidades tradicionais, outrora voltadas para a pesca e extrativismo de subsistência, foram, gradativamente, incorporados à economia de mercado, fazendo com que a especulação imobiliária se acentuasse, desencadeando processos de desequilíbrios a estabilidade da linha de costa (MUEHE, 2001; CABRAL; SILVA; GIRÃO, 2014).

Assim, as zonas costeiras e estuarinas são caracterizadas por serem sistemas dinâmicos e complexos, além de geomorfologicamente instáveis, por se tratarem de ambientes de transição entre áreas continentais e oceânicas. Tal instabilidade surge como um produto das alterações na dinâmica de processos costeiros naturais e aqueles impetrados pela ação antrópica, que se revelam através de modificações na disponibilidade de sedimentos, no clima de ondas, na altura do nível relativo do mar e nas formas de uso e ocupação da terra em áreas costeiras (MUEHE, 1998).

Do ponto de vista morfodinâmico, para Viles e Spencer (1995), pode-se inferir que costas são zonas dinâmicas de interface que marcam o encontro da atmosfera, do continente e do mar. É dentro destes ambientes que ocorrem as maiores mobilidades de sedimentos e nutrientes, seja pela ação energética de ondas, marés ou correntes marítimas e atmosféricas, resultando em modelagens no perfil de costa, produzindo feições costeiras erosivas e/ou deposicionais. As frequentes transformações que ocorrem em todas as zonas costeiras do mundo, são produto de um complexo sistema de agentes que interagem, exercendo troca de fluxo e matéria entre o oceano e o continente, o qual é designado de “dinâmica costeira”.

Considerando a área objeto do estudo, o expressivo crescimento econômico e populacional dos municípios do litoral norte de Pernambuco, acarretado pela implantação de empreendimentos voltados para o polo automotivo da Jeep FIAT/Chrysler e empresas subsidiárias, além de empresas estatais, a exemplo da Empresa Brasileira de Hemoderivados (HEMOBRAS), fez com que o uso e ocupação da planície costeira e fluvial, áreas de tabuleiros e encostas adjacentes, tenha se intensificado, e potencializando as alterações nas morfodinâmicas continental e costeira.

Dentre tais alterações, a intensificação da erosão costeira configura-se como um problema recorrente na costa brasileira. Os fatores que influenciam na ocorrência abarcam não só aspectos derivados da ocupação antrópica, mas outras variáveis relativas à dinâmica natural, como a morfologia da praia, estágio morfodinâmico, tipos de ondas e regimes de marés, além da ausência, ou presença, de formações rochosas e bancos de areia, relacionadas a escala de tempo e flutuações do nível do mar.

Quanto aos impactos ambientais, especificamente para o litoral pernambucano, Manso et al. (2006) relataram o histórico da problemática costeira no estado desde a construção do Porto do Recife iniciada em 1909, o qual modificou as correntes litorâneas, impactando diretamente sobre o litoral do município de Olinda, observando-se, ainda, o descompasso no balanço sedimentar entre as praias de Piedade, Candeias e Boa Viagem, as duas primeiras no município de Jaboatão dos Guararapes, e a última em Recife, afetadas por processo de erosão, enquanto na praia do Pina, também em Recife, há evidências do processo de progradação. Para Manso et al. (2006) tais consequências estão sendo retrabalhadas para áreas mais ao norte do litoral pernambucano, visto o sentido da corrente marítima de sudeste.

Desta forma, além dos condicionantes naturais, a serem considerados na análise morfodinâmica, como a dinâmica dos processos morfogenéticos atuais que abarcam a natureza, intensidade, distribuição e diversidade de tais processos em determinado espaço objeto de estudo, deve-se considerar as influências antrópicas derivadas de usos e ocupações, como fator de desequilíbrio ao meio natural (TRICART, 1977).

Entretanto, para uma análise das influências antrópicas sobre morfodinâmica, demanda-se, para tanto, uma abordagem interdisciplinar, ao considerar não apenas os processos morfogenéticos, mais também suas interações com os aspectos da cobertura vegetal, solos e condições hídricas (VITAL e GIRÃO, 2015), buscando os mecanismos de degradação e suas modalidades, considerando que a análise morfodinâmica pressupõe a definição de quatro etapas para sua realização prática, sendo elas:

1. Análise detalhada do sistema morfogenético e enumeração dos processos;

2. Estabelecimento do índice de cobertura vegetal e dos solos;

3. Análise do grau de degradação ambiental a partir da avaliação das consequências da ocupação antrópica;

4. Determinação do índice de estabilidade morfodinâmica a partir das relações morfogênese-pedogênese-reorganização do território.

Desta forma, o presente artigo teve como objetivo analisar os processos morfodinâmicos nas unidades geomorfológicas compreendidas na área de estudo, e os impactos ambientais que estão sendo impetrados ao litoral e a uma das zonas estuarinas do município de Goiana-PE, frente à expansiva ocupação do ambiente praial, para fins residenciais, comerciais e turísticos, considerando como tal ocupação está influenciando sobre formas e processos geomorfológicos, e seus reflexos sobre a morfodinâmica.

Tendo como base teórico-metodológica, ao se considerar a dinâmica processual dos ambientes costeiros, os estudos de morfodinâmica, estes originaram-se a partir da inserção da teoria sistêmica nos estudos geomorfológicos, dentre eles os de caráter costeiro, com a proposta de Chorley (1962) e Chorley e Kennedy (1971). A análise morfodinâmica depende da interação entre o clima, a topografia, o solo, material rochoso, a cobertura vegetal e o uso e ocupação antrópica. Dentre estes fatores, a cobertura vegetal possui um importante papel, pois minimiza a ação dos fenômenos erosivos, sobretudo em regiões onde a mesma se apresenta bem conservada (TRICART, 1977).

Segundo a proposta de Tricart (1977), existem três diferentes meios, considerando a análise morfodinâmica:

Meios estáveis: caracterizados pelo predomínio da pedogênese sobre os processos erosivos. Neste meio, a cobertura vegetal atua impedindo o desenvolvimento dos processos mecânicos capazes de gerar dissecação. Tricart denomina este fenômeno como fitoestabilidade, levando em consideração o importante papel da vegetação na morfodinâmica; Meios intergrades: caracteriza-se como um meio transicional, sendo referente ao estado de modificação do sistema fitoestável antes de ultrapassar o limiar de recuperação, proporcionando a possibilidade de restauração ou de transformar-se em um meio fortemente instável permanentemente; Meios fortemente instáveis: há o predomínio da morfogênese, podendo resultar de flutuações climáticas e efeitos tectônicos ao longo do tempo geológico, ou de intervenções humanas na escala de tempo histórica. Importar lista

Tomando por base os preceitos da análise morfodinâmica, a ocupação indevida de áreas costeiras e estuarinas, sobretudo para ocupações de caráter estrutural, residencial, comercial ou de lazer, aumenta o regime de transporte sedimentar costeiro e em calhas fluviais estuarinas, como consequência de processos erosivos.

As atividades pertinentes ao estudo ocorreram em uma primeira etapa pré-campo, durante os meses de julho de 2018 a janeiro de 2019, através de uma revisão de literatura relativa à caracterização dos aspectos físicos e da evolução das formas de uso e ocupação das terras costeiras, embasada em dados cartográficos obtidos através da Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de Pernambuco (CONDEPE/FIDEM), incluindo um mapa 3D do ano de 2015, correspondente a área de estudo, obtido no portal Pernambuco em Mapas, e textos temáticos de bancos de monografias, dissertações e teses de órgãos públicos, extraídos na plataforma do Google Acadêmico.

Os trabalhos de campo ocorreram durante o primeiro semestre de 2019, obedecendo à sazonalidade das estações verão/inverno. Na etapa de campo, além da validação dos mapas elaborados, foram realizados o reconhecimento de geoindicadores processuais do comportamento da linha de costa, com o intuito de reconhecer feições de erosão e/ou acumulação que ajudassem na reconstrução da paisagem e a compreender as forçantes envolvidas na evolução morfodinâmica das unidades geomorfológica, a partir da uma avaliação baseada em ficha de campo (Apêndice I).

Quanto aos softwares utilizados para o geoprocessamento de dados, para o mapeamento e vetorização das unidades geomorfológicas - planícies flúvio-marinha e costeira e áreas de encostas, tabuleiros e vales fluviais - e produção de modelos evolutivos do relevo, foram utilizados os softwares Google Earth Pro e ArcGis 10.3.

Após a elaboração dos mapas das unidades geomorfológicas (Figura 1), realizou-se a setorização das mesmas, delimitando-as pelas formas de uso e ocupação da terra e consequentes processos morfogenéticos presentes em cada uma.


Figura 1
Mapa das unidades geomorfológicas compreendidas na área de estudo
Autores, 2019.

LOCALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

A área de estudo localiza-se na planície costeira do município de Goiana-PE (Figura 2), abarcando duas unidades de praias: praia de Ponta de Pedras e praia de Carne de Vaca, sendo estas denominadas pelos núcleos urbanos presentes nas mesmas. Foram delimitadas as orlas costeiras, onde também está inserido o ambiente estuarino do rio Megaó, na praia de Carne de Vaca.

Este compartimento do litoral norte pernambucano corresponde a uma sequência estratigráfica, que compõem a Bacia Sedimentar Costeira Pernambuco-Paraíba, equivalendo as Formações Cretáceas (Beberibe e Gramame), e Terciárias (Barreiras e Maria Farinha), além de depósitos Quaternários. Ambos sobrepondo-se ao Embasamento Cristalino Pré-Cambriano (CPRH, 2003).

A zona costeira, e proximidades continentais (Figura 02), estão situadas em unidade geológica formada por terrenos quaternários e terciários inconsolidados (Formação Barreiras e Depósitos Flúvio-marinhos e Aluvionares), que sustentam as feições de planícies e tabuleiros ou baixos planaltos sedimentares, que fazem parte da Bacia Sedimentar Paraíba, que compreende uma faixa costeira limitada, estruturalmente, entre o Alto de Mamanguape ao norte, e o Lineamento Pernambuco, ao sul.


Figura 2
Localização da área de estudo no litoral do município de Goiana-PE – praia de Ponta de Pedras e praia de Carne de Vaca
Autores, 2019.

O clima predominante é o tropical chuvoso tipo As’ (tropical úmido com chuvas de inverno antecipadas no outono), de acordo com uma adaptação da classificação climática de Köppen-Geiger, sendo influenciado diretamente pelos sistemas atmosféricos que se desenvolvem no oceano Atlântico como os Distúrbios Ondulatórios de Leste, Frentes Frias, Vórtices Ciclônicos de Altos Níveis e a Zona de Convergência do Intertropical. A ação de variados sistemas ocasiona uma condição de instabilidade meteorológica que se manifesta em forma de chuvas, com máximas no outono-inverno (março a setembro). Este tipo climático apresenta temperaturas medias em torno de 26 °C e medias pluviométricas superiores a 1.800 mm/ano (CABRAL; SILVA; GIRÃO, 2014).

Quanto ao aspecto da cobertura vegetal, os principais tipos situam-se na área são: mangues e restinga nos ambientes de planícies flúvio-marinhas e praias, respectivamente. Já nas áreas de tabuleiros e cabeceiras de drenagem, destacam-se a presença de plantios de cana-de-açúcar e vegetação residual de Mata Atlântica (CPRH, 2003).

DESENVOLVIMENTO DA DISCUSSÃO

A validação de mapas e tabelas produzidas durante os trabalhos de gabinete e informações coletadas durante a revisão da bibliografia, ocorreu através da utilização de uma ficha de campo, nos respectivos pontos avaliados (Figura 3). As análises de campo foram efetuadas a partir de uma ficha modelo check list (Apêndice I), em que se identificou aspectos físicos e antrópicos de cada ponto, bem como aspectos próprios de áreas de praia, como tipologias de costas baseada no grau de exposição a ondas, e outros geoindicadores que revelaram a dinâmica processual da linha de costa.


Figura 3
Pontos de campo na área de estudo
Adaptado do Google Earth pelos autores, 2019.

Em termos geológicos a área tabular insere-se no domínio geológico da Formação Barreiras (25 M.a), cujos sedimentos são oriundos de um longo processo de intemperismo do embasamento cristalino de rochas do Planalto da Borborema, predominantemente granitos, gnaisses e xistos. Tal processo geológico se deu em detrimento de uma configuração paleoclimática distinta, resultando em uma significativa sedimentação durante o período Mioceno (ARAI, 2006).

Como predito, as unidades geomorfológicas subdividem-se em planície flúvio-marinha (Figura 4 - A), áreas de tabuleiros (Figura 04 - B), planície costeira (Figuras 04 - C e D), encostas e vales dissecados. Dentre estas, os geoindicadores de formas de uso e ocupação da terra degradantes atribuídas a estas unidades encontram-se concentrados na planície costeira, devido ao maior adensamento populacional.

No geral, constatou-se presença significativa de feições erosivas, na grande maioria dos pontos do campo, apesar do reconhecimento de modelados do relevo de acumulação. Os processos morfodinâmicos fizeram-se presente em diferentes formas nas áreas em questão. Em linhas gerais, a área de estudo revela pontos incidentes de erosão.


Figuras 4
Unidades Geomorfológicas encontradas nos pontos de campo: Planície flúvio-marinha/aluvial (A); Áreas de tabuleiro/encostas (B) e Planícies Costeiras/Terraços holocênicos (C e D).
Autores, 2019.

Na planície flúvio-marinha do rio Megaó (Ponto 1), que se caracteriza como área de acumulação de sedimentos aluviais e de materiais que descem do tabuleiro adjacente por escoamento superficial, tem-se como formas de uso e ocupação da terra a pesca e o extrativismo animal, a partir da pesca do aratu e coleta do sururu (caracterizando a área como uma plataforma de pesca), onde há um pequeno porto de pescadores artesanais, em área de apicum (zona de mangue desmatado) (Figuras 5 - A).

Quanto aos aspectos morfodinâmicos da área, o processo erosivo é revelado pela exposição de canais de maré e pela incidência de erosão linear ao longo do acesso; já quanto aos populacionais, a ocupação antrópica é incipiente, salvo pela moradia de pescadores (Figura 5 - B). As evidências dos usos da terra no local ficam a cargo da deposição de conchas derivadas do extrativismo na área de deposição natural (Figura 05 - C) e finalmente pela deposição de sambaquis (Figura 5 - D).


Figura 5
Caracterização e evidências das formas de uso e ocupação na planície flúvio-marinha do rio Megaó.
Autores, 2019.

A praia de Carne de Vaca (Ponto 2), caracteriza-se como uma área em retrogradação, devido ao processo erosivo sofrido a partir do efeito abrasivo da ação das ondas (Figura 6 - A). O clima de ondas, tal como a direção de corrente da costa litorânea brasileira (sul-norte), erode a sul e deposita a norte, o que promove distintos modelados do relevo e pontos de maior incidência de erosão (Figura 6 - B). A forte erosão nesta praia é corroborada pelos aspectos físicos inerentes a ela, pois seu estágio morfodinâmico é classificado como dissipativo, o qual possui uma larga zona de surf e um baixo gradiente topográfico (Figura 6 - C) que facilita uma maior incidência de ondas, intensificando o processo erosivo (CALLIARI, 2003). Ademais, a ausência de beachrocks e o baixo aporte sedimentar dos rios locais, revelado pela predominância de sedimentos carbonáticos oriundos na plataforma continental na praia, configuram aspectos que reforça a erosão marinha local.

Apesar da predominância erosiva, uma característica típica de um ambiente de acresção, e estabilidade, é a presença de vegetação de restinga, bem desenvolvida neste ponto. Ademais, a presença antrópica e o uso periurbano revelam-se por meio de espigões e estruturas de edificações danificadas pela ação abrasivas das ondas (Figura 6 - D).


Figura 6
Aspectos naturais e caraterísticas de uso e ocupação antrópica na praia de Carne de Vaca.
Autores, 2019.

Atestou-se no ponto seguinte, a praia de Tabatinga (Ponto 3), processos morfodinâmicos, que revelaram a presença de feições de dissecação no modelado do relevo. Apesar da praia ser privada (tendo seu uso restrito a um condomínio fechado), o processo erosivo por ação das forçantes naturais costeiras se faz notável na localidade.

A dinâmica processual se revela em processos erosivos e movimentos de massa, com feições de ravinas e voçorocas, ao logo de uma encosta de topo tabular da Formação Barreiras paralela à costa, que marca o limite superior do pós-praia (Figura 7 - A). Evidências de movimentos de massa são relacionadas à deposição de blocos rochosos de concreções, desprendidos da encosta por ação abrasiva das ondas (Figura 7 - B).

Ao norte do ponto foi possível identificar intervenções antrópicas na paisagem a partir de retilinização e alargamento de um canal de maré exposto, indicando um geoindicador de erosão severa, assim como uma influência antrópica (Figura 8 - A). O ambiente em questão demonstra feições erosivas tanto acarretadas pelos agentes inerentes a própria dinâmica costeira – ondas, marés e ventos – como impactos oriundos da influência antrópica na paisagem, a exemplo do alargamento de canal de maré exposto (Figura 8 - B).


Figura 7
Feições de dissecação na extensão da encosta (A) e blocos depositados nas adjacências, desprendidos pela ação abrasiva das ondas (B).
Autores, 2019.


Figura 8
Alargamento de canal de maré exposto, indicando influência antrópica na paisagem (A e B).
Autores, 2019.

Em relação à unidade de praia de Ponta de Pedras, localiza-se ao sul da área de estudo (Pontos 4), apesar de ser uma orla naturalmente abrigada por beachrocks, o adensamento populacional acarreta forte incidência erosiva. As evidências do intenso uso antrópico na área se revelam pelo avanço de estruturas/edificações sobre a variação da linha de costa, ultrapassando a zona de pós-praia, já alcança o estirâncio ou zona interdial, sendo esta uma área de influência da pré-mar (Figura 9 - A). A unidade em questão possui dois comportamentos morfodinâmicos, sendo uma área de deposição ao sul, a partir da contribuição dos arenitos de praia (beachrocks) para a fixação dos sedimentos carreados por correntes de deriva (Figura 9 - B), e a porção norte, na qual concentra-se os processos erosivos (Figura 9 - C). Constatou-se ainda a presença de uma pequena enseada ao sul, área de deposição formada por influência das referidas estruturas rochosas (Figura 9 - D). Por possui comportamentos morfodinâmicos diferentes, a área possui geoindicadores tanto de erosão, como também de acresção, a exemplo da presença da vegetação de restinga sobre o terraço pleistocênico na porção deposicional da área.


Figura 9
Aspectos naturais e caraterísticas de uso e ocupação antrópica na praia de Pontas de Pedras.
Autores, 2019.

O último ponto de campo (Ponto 6), situa-se em um trecho da praia de Ponta de Pedras onde a orla é semiabrigada, com presença de poucas casas de varaneio (Figura 10 - A) e com características que apontam para a prática de pesca. Como a influência antrópica se faz menor neste trecho, os impactos a ela relacionados também são incipientes; a faixa de praia é larga, com presença de pós-praia; há uma notável presença de vegetação de restinga (Figura 10 - B); a dinâmica é predominantemente deposicional, com presença de bancos de areia antecipados aos beachrocks (Figura 10 - C). A partir da diferença entre as colorações dos sedimentos, foi possível inferir unidades estruturais de dois tempos geológicos distintos: terraços pleistocênicos, de coloração mais escura e mais próximo ao mar, e terraços holocênicos, de coloração mais clara, indicando um tempo de formação mais recente em relação ao primeiro (Figura 10 - D).


Figura 10
Aspectos do meio físico natural da praia de Ponta de Pedras, num trecho de orla semi-abrigada.
Autores, 2019.

Quanto aos estágios morfodinâmico e a relação com a erosão costeira, conforme aponta Tricart (1977), a morfodinâmica é uma metodologia de estudo da geografia física que avalia o balanço entre pedogênese e morfogênese, onde a dinâmica é o ponto de partida para a caracterização de um meio físico natural e a distinção entre meios morfodinâmicos é determinado através da intensidade dos seus processos.

A morfodinâmica praial consiste em metodologia de estudo que busca elencar análises morfológicas e dinâmicas, numa avaliação mais precisa do ambiente de praia e da zona de arrebentação de ondas. A importância de compreender parâmetros físicos costeiros, tal como fluxos gerados por ondas e marés, reside no fato da correlação entre padrões hidrodinâmicos e seu trabalho na elaboração de morfologias costeiras; na medida em que é o trabalho exercido por estas forçantes que exercem atrito sobre sedimentos móveis na praia, implicando em diferentes configurações morfológicas de costa, e levando a elaboração de gradientes espaciais e temporais (CALLIARI, 2003).

Partindo destes pressupostos, classificar-se-á as unidades geomorfológicas analisadas neste estudo quantos aos estágios morfodinâmicos propostos por Tricart (1977) – Meios Estáveis, Meios Integrades e Meios Fortemente Instáveis – e as unidades de praia quanto a classificação de orla, proposta pelo Projeto Orla (2006) (Quadro 1), em que:

De acordo com o Projeto Orla (2006), é através da classificação de orlas, que se torna possível realizar a identificação do atual estágio de uma orla, bem como adotar medidas de mitigação aos impactos socioambientais nestes ambientes, especialmente amenizar impactos relacionados à erosão costeira.

Quadro 1
Classificações por classes de orlas a partir do Projeto ORLA (2006).

Autores, 2019.

Portanto, foi possível observar que, em linhas gerais, a maior parte da área de estudo caracteriza-se como pertencente ao meio Integrade, devido à identificação tanto de Geoindicadores de erosão quanto a de estabilidade do meio (Quadro 2). As observações de campo permitiram inferir que os processos morfodiâmicos encontrados nas referidas unidades geomorfológicas, encontram-se intrinsecamente relacionados com os processos de urbanização nas zonas costeiras, embora a erosão seja um processo natural.

Quadro 2
Caracterização do meio físico natural dos pontos de campo a partir de Tricart (1977) e Projeto Orla (2006).

Autores, 2019.

Segundo Muehe (2005), 80% das causas de erosão costeira estão relacionadas com a intervenção antrópica através da urbanização e interferência no balanço sedimentar em detrimento da construção de estruturas rígidas. Este fato coloca as causas naturais da erosão em segundo plano, visto que na escala de tempo humana, os processos antrópicos promovem modificações mais significativas a paisagem, enquanto que os naturais se fazem notável na escala temporal geológica, na maior parte dos casos MUEHE (2005).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O processo de urbanização exacerbado ao qual foi submetido o município de Goiana conferiu a zona costeira do município diversos problemas ambientais, sendo a erosão de praias o mais notável deles. Sem dúvidas implementação de indústrias no município, na última década, foi um processo decisivo no que tange a expansão urbana e conflitos socioambientais local.

O estudo dos atributos naturais da área de estudo, promoveu a identificação da predominância do processo de morfogênese sobre o de pedogênese, pois as transformações no modelado do relevo ocorrem tanto na linha de costa, onde os processos erosivos atuam nas praias, como também há pontos onde áreas de estabilidade ainda estão preservadas. A ocupação antrópica tem sido a propulsora da incidência erosiva, acarretando perdas econômicas e imobiliárias e comprometendo ecossistemas praiais.

A avaliação das diferentes formas de uso e ocupação da terra em cada uma das unidades geomorfológicas permitiu concluir que cada tipo de impacto encontra-se ligado ao tipo de uso que lhe é aplicado, sendo os efeitos mais significativos vinculados ao processo de urbanização, que avança sobre a linha de costa, invadindo o espaço destinado à ação da dinâmica de forçantes costeiras, como a das ondas, das marés e dos ventos.

Visto que o litoral norte de Pernambuco tem sua zona costeira densamente habitada, estudos sobre morfodinâmica costeira se fazem extremamente importantes para a elaboração de projetos de mitigação de impactos e zonas costeiras e estratégias que possam corroborar com a preservação do seu meio físico natural, uma vez que este vem sendo cada vez mais degradado pela ação do homem.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC/UFPE/CNPq – Edital 2018-2019) pelo apoio relativo à disponibilidade de bolsa-PIBIC para a primeira autora.

APÊNDICE I

Ficha de Campo

I
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Identificação de Geoindicadores processuais do comportamento da linha de costa.

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REFERÊNCIAS

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