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O SIGNIFICADO DO PROCESSO DE MODERNIZAÇÃO AGRÍCOLA E OS IMPACTOS AMBIENTAIS EM ÁREAS DE CERRADO
THE MEANING OF THE PROCESS OF AGRICULTURAL MODERNIZATION AND ENVIRONMENTAL IMPACTS IN CERRADO AREAS
EL SIGNIFICADO DEL PROCESO DE MODERNIZACIÓN AGRÍCOLA Y LOS IMPACTOS AMBIENTALES EN ÁREAS DE CERRADO
Revista Cerrados (Unimontes), vol. 16, núm. 1, pp. 40-58, 2018
Universidade Estadual de Montes Claros

https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/

Recepção: 29 Setembro 2016

Aprovação: 07 Setembro 2017

Publicado: 30 Junho 2018

DOI: https://doi.org/10.22238/rc24482692201816014058

Resumo: No presente artigo buscamos desenvolver uma análise crítica do processo de ocupação do Cerrado, baseando nas políticas econômicas desenvolvidas no Brasil a partir do século XX. Para efeitos de discussão, no primeiro momento tratamos dos principais programas desenvolvidos para ocupação do cerrado; no segundo os impactos ambientais ocorridos a partir da implantação do modelo capitalista de produção. Percebe-se que as ações governamentais privilegiaram os interesses do agronegócio, fator que tem resultado na destruição da fauna, flora e dos componentes bióticos que dela sobrevivem. Portanto, a ocupação do Cerrado mediada por políticas territoriais serviram como incentivo à exploração econômica do bioma para favorecer grandes empresas agrícolas, desprezando todos os componentes bióticos que garantem o equilíbrio natural do sistema vida e do trabalho do homem do campo.

Palavras-chave: Cerrado, Modernização agrícola, Impactos ambientais.

Abstract: In this article we seek to develop a critical analysis of the occupation process of the Cerrado, based on the economic policies developed in Brazil from the twentieth century. For the purposes of discussion, we first dealt with the main programs developed for occupation of the cerrado; In the second, the environmental impacts that occurred from the implantation of the capitalist model of production. It is noticed that the governmental actions privileged the interests of agribusiness; A factor that has resulted in the destruction of fauna and flora and the biotic components that survive. Therefore, the occupation of the Cerrado mediated by territorial policies served as an incentive to the economic exploitation of the biome to favor large agricultural enterprises, neglecting all the biotic components that guarantee the natural balance of the life system and the work of the man of the field.

Keywords: Cerrado, Agricultural modernization, Environmental impacts.

Resumen: En el presente artículo buscamos desarrollar un análisis crítico del proceso de ocupación del Cerrado, basándose en las políticas económicas desarrolladas en Brasil a partir del siglo XX. A efectos de discusión, en el primer momento tratamos de los principales programas desarrollados para ocupación del cerrado; En el segundo los impactos ambientales ocurridos a partir de la implantación del modelo capitalista de producción. Se percibe que las acciones gubernamentales privilegiaron los intereses del agronegocio; Factor que ha resultado en la destrucción de la fauna y la flora y de los componentes bióticos que de ella sobreviven. Por lo tanto, la ocupación del Cerrado mediada por políticas territoriales sirvió como incentivo a la explotación económica del bioma para favorecer a grandes empresas agrícolas, despreciando todos los componentes bióticos que garantizan el equilibrio natural del sistema de vida y del trabajo del hombre del campo.

Palabras clave: Cerrado, Modernización agrícola, Impactos ambientales.

INTRODUÇÃO

Dentre os biomas existentes no Brasil, o Cerrado ocupa o segundo lugar em extensão, superado apenas pela Amazônia, correspondendo a 22% do território nacional em uma área de 2.036.448 km² e incidindo sobre os estados Maranhão, Piauí, Tocantins, Bahia, Goiás, Distrito Federal, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, São Paulo e Paraná, conforme Ministério do Meio Ambiente. O mapa abaixo ilustra a localização do Cerrado abrangendo alguns dos Estados brasileiros.

O Cerrado alimenta três das maiores bacias hidrográficas da América do Sul: Amazônica/Tocantins, São Francisco e Prata, o que leva a ser considerado berço das águas, favorecendo a reprodução de demasiadas espécies de plantas e animais no seu ecossistema. Contudo, o Cerrado [1]tem sido palco das transformações impactantes no contexto de ocupação e exploração de suas áreas pelo agronegócio. Estima-se que mais da metade dos seus 2 milhões km² de suas áreas nativas cederam lugar ao plantio de monoculturas e pastagens de acordo com o Ministério do Meio Ambiente. Isso tem resultado numa excepcional perda de habitat entre as espécies de animais e plantas que dependem de seu ecossistema para sobreviverem.


Ilustração 01
Mapa de Localização do Bioma Cerrado
Ministério do Meio Ambiente (2015).

O Cerrado até pouco tempo apresentava condições desfavoráveis para a agricultura, em razão das propriedades químicas do solo, consideradas impróprias para plantação. Por outro lado, a topografia, o clima, a disponibilidade hídrica favorecia o modelo de produção agrícola que se pretendia alcançar. Graças às pesquisas realizadas com o Calcário, foi possível corrigir o solo do Cerrado. Isso possibilitou a exploração das áreas do bioma (FERNANDES; PESSÔA, 2011). É nesta perspectiva que este artigo pretende avançar, considerando o processo de modernização agrícola e suas implicações no Cerrado, bem como alguns impactos ambientais no bioma.

O PROCESSO DE OCUPAÇÃO E AS POLÍTICAS TERRITORIAIS

O contexto da ocupação do Cerrado se inicia com a atividade econômica de grande repercussão - a mineração, durante o período histórico brasileiro conhecido como ciclo do ouro. Após a exaustão das minas no final do século XVIII e início do século XIX, os mineiros que permaneceram passaram a se dedicar à agricultura de subsistência e a criação de gado. Ambas as atividades dependiam de mão-de-obra familiar e do uso extensivo da terra como principais fatores para a expansão produtiva (PIRES, 2009). Tais atividades serviram de base para discursos, que tiveram como argumento principal a impossibilidade de desenvolvimento econômico baseado numa estrutura agrária arcaica, num modelo de produção feudal (NETO,1997).

Como evento emblemático na década de 1960, a agricultura brasileira insere-se num processo de transformação no contexto de modernização do país, principalmente para atendimento da demanda por exportação (MARTINE, 1991). Dessa forma, têm-se nas décadas de 70 e 80 expressivas mudanças no campo, provenientes da evolução técnica e cientifica dirigida exclusivamente para o aumento da produtividade no setor. Os efeitos negativos da modernização acirraram violentamente sobre a biodiversidade do Cerrado, ameaçando a fauna/ flora e alterando os ciclos pedológicos e hidrológicos do bioma (BALSAN, 2006).

É imprescindível nesse momento expressar o sentido da modernização para estrutura agrária brasileira. Tal conceito se concentra nas contribuições de Moraes (2002, p.121) que afirma: “modernizar é, entre outras coisas, reorganizar e ocupar o território dotá-lo de novos equipamentos e sistemas de engenharia, conectar suas partes com estradas e sistemas de comunicação. Enfim, modernização implicou no caso brasileiro necessariamente valorização do espaço”.

Segundo o geógrafo, o impulso modernizador foi iniciado no período do Estado Novo em meados da década de 40, onde Vargas realiza uma porção de tarefas, tais como: criação de órgãos e programas para a ocupação produtiva das regiões “atrasadas” no interior do país. A “marcha para o oeste” como exemplo, surge como estratégia política ideológica de preencher o grande vazio, inspirada nas potencialidades que ainda se “desconheciam” no Cerrado. A intenção era abrir caminhos para uma reorganização produtiva pautada nas benesses do sistema de produção global (PERDIGÃO; BASSEGIO, 1992).

Para Oliveira (1991; 2005) a raiz histórica da “marcha para o oeste” está fundada nos projetos de colonização. Enquanto o Estado assumiu a tarefa de conter as tensões sociais por meio dos projetos de colonização que atenderia os interesses da política de desenvolvimento, o capital privado capturou mão-de-obra e ao mesmo tempo recursos naturais para o desenvolvimento dos projetos econômicos. Nesse contexto, a intervenção do Estado na agricultura brasileira foi fundamental para modernização do campo. Evento que se desenvolveu a partir dos programas de incentivo à ocupação e exploração de novas áreas no território brasileiro (MORAES, 2002).

Em relação aos programas nacionais, cabe destacar seu papel na reorganização produtiva do Cerrado. Vários foram os programas destinados ao setor agrícola, principalmente no Cerrado brasileiro. Nesta discussão destacamos alguns dos programas governamentais que foram fundamentais para as frentes de exploração econômica do bioma:

· Fundação Brasil Central: Criada em 1943, tinha como objetivo principal promover o povoamento, ocupação econômica e modernização das regiões Amazônica e do Brasil Central. Assim as ações pautadas neste programa viabilizaram a implantação de estradas de penetração rumo ao Brasil Central pela zonas dos altos rios Araguaia e Xingu ( MACIEL,2012).

· Plano de ação Econômica do Governo (PAEG): Criado durante o regime militar no Brasil em 1964, tinha como intuito retomar o crescimento econômico, urgindo no aumento da exportações e diminuição das importações agrícolas. Nesta política mobilizaram o aprimoramento de preços mínimos, expansão do crédito agrícola, bem como incentivou à utilização de insumos agrícolas.

· Superintendência de Desenvolvimento da Região Centro Oeste (Sudeco): Criada em 1967, teve como intuito promover o desenvolvimento da região Centro-Oeste, pela via de pesquisas visando áreas apropriadas para o implemento de novas formas de uso do solo conforme (ESTEVAM, 1998).

· Programa de Desenvolvimento dos Cerrados (Polocentro): Criado em meados da década de 70, teve como papel estimular a ocupação ordenada do Cerrado, baseando-se em algumas atividades básicas, pesquisa agropecuária e concessão de linhas de financiamento (ESTEVAM, 1998).

· Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados (Prodecer): Criado em 1980, teve como objetivo a colonização das áreas de cerrados para a produção de grãos, contou com a participação de empresários japoneses dirigido pelo CAMPO – empresa de capital misto conforme Shiki (1997). O programa atuou na concessão de crédito, selecionando áreas para a implantação de projetos agrícolas, bem como para organização de cooperativas, monitoramento e avaliação/desempenho da produção agrícola nas áreas de cerrado.

Tais ações viabilizadas nos programas mencionados atenderam primordialmente os interesses do Estado e dos agentes hegemonicamente situados no processo de produção. A iniciativa de abrir estradas para o escoamento da produção, estimular a utilização de crédito e a adoção de pacote tecnológico, bem como promover a entrada de capitais e agentes externos na produção reforçam essa tese. Essa questão pode ser comparada ao que Moraes (2002) chamou de missão civilizadora.

Ao interferir e mudar o uso da terra e dos recursos naturais do Cerrado para adequar aos princípios legitimados pela elite agrária, profundas transformações afetaram as bases humildes e descapitalizadas no campo. Na tabela 1 é possível notar uma das mudanças materializadas no campo, a distribuição desigual da terra.

Pela observação da referida tabela, constata-se que maior parte da terra pertence à agricultura não familiar, ou seja, ao agronegócio. Isso demonstra que os programas econômicos de incentivo governamental – crédito rural, pacote tecnológico, etc favoreceram a elite agrária que ampliaram as condições de produção e a propriedade da terra. A massa prejudicada foram os pequenos produtores que tiveram as possibilidades de se manterem na terra reduzidos.

Tabela 1
Organização da Estrutura Fundiária no Cerrado – Distribuição das terras conforme área, tipo de estabelecimentos (porcentagem)

IBGE, Censo Agropecuário de 2006.* Não familiar é uma designação adotada pelo IBGE conforme a Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006, que se refere a grandes propriedades que não se enquadram nos critérios de definição de agricultura familiar.

A indisponibilidade de capitais para investimento somado à capacidade de adequar as novas técnicas de produção agrícola foram os problemas que mais afetaram a permanência dos pequenos produtores no campo (Pires, 2009). Isto ocorre da seguinte forma:

Em primeiro lugar, pelo fato da propriedade da terra – e o valor dela em si mesma – ser condição necessária para acesso ás linhas do crédito subsidiado; nestes termos, a própria exigência burocrática do empréstimo induz a concentração fundiária. Em segundo lugar, os bancos tenderam a selecionar clientes em função do nível de risco, das garantias apresentadas e da situação de liquidez dos mesmos e, na busca de minimização da taxa de risco dos empréstimos a tendência natural foi a concentração do crédito em mãos de maiores produtores [...]o grande produtor foi aquele detentor de condições necessárias para exploração intensiva em maior escala, não somente em vista de tamanho de sua propriedade mas na sua predisposição e capacidade de incorporar técnicas e capitais no empreendimento( ESTEVAM, 1998, p.162).

Assim, no Cerrado brasileiro “as terras são repartidas de modo extremamente desigual, não só quanto à extensão, mas também quanto á qualidade das terras” (SHIKI, 1997, p.142). As comunidades rurais que não se adaptaram as novas exigências da agricultura moderna restaram renunciar a vida no campo, passando a viver em precárias condições na cidade. Nesse sentido, a agricultura no Cerrado implicou significativas intervenções na vida do homem no campo. A base desse processo de alteração se apresenta principalmente na estrutura fundiária, em que a propriedade da terra está concentrada nas mãos dos grandes proprietários, expulsando o pequeno agricultor. Martins (1983, p.144) argumenta que:

[...] a não-criação de condições para que o filho do agricultor se torne agricultor autônomo como o pai também contribui para a expulsão do trabalhador rural do campo. A sua tendência é tornar-se um assalariado na cidade. Para o agricultor, o colono, é cada vez mais difícil ganhar o suficiente para que o filho siga. [...] quando o agricultor percebe, ele está trabalhando para o banco, para o intermediário [...] para ceder terreno às grandes pastagens ou grandes plantações.

Por estas indicações, podemos perceber ao que se denominou de “modernização conservadora”, referindo-se as mudanças na forma/função da produção agrícola, uma vez que não modificou o processo de concentração fundiária[2] que se arrasta desde o início da colonização das terras.

As diversas medidas políticas, adotadas em relação ao setor agrícola, [...] visaram o sistema de propriedade da terra. A estratégia de “modernização conservadora”, adotada desde então, tem como diretrizes básicas a promoção e o fortalecimento da grande empresa agropecuária e a repressão das massas trabalhadoras rurais. O resultado dessa opção “modernizante conservadora” vem se fazendo sentir na extrema concentração de terras, na intensificação de desequilíbrios e desigualdades sociais e principalmente na crescente expropriação do pequeno produtor (TURCHI, 1979, p.166).

As ações desenvolvidas no setor da agricultura moderna tinham como objetivo atrelar o setor ao processo de desenvolvimento econômico. Cabe ressaltar que “desenvolvimento” significa aumento da produtividade e ampliação de capitais, o que não confere resultados satisfatórios nas comunidades rurais e na biodiversidade no Cerrado. Nessa perspectiva (SHIKI, 1997) ao utilizar o termo “desenvolvimento sustentável” critica as abordagens predominantes a esse conceito, cuja intenção está preservada nos interesses hegemônicos, prestando pouca atenção ás demais dimensões: sociedade e natureza pelo qual se prega a ideia de desenvolvimento.

A grande questão se concentra na ideia de uma agricultura que viabilize os interesses econômicos, vinculada à exportação e na ampliação de setores industriais privilegiando o que Neto (1997) denominou de circuito industrial da agricultura. Esse modelo se desenrola ao que Shiki (1997) chamou de sistema agroalimentar: internacionalização da produção agrícola, criação de novas necessidades no campo para ampliação do consumo. Segundo o economista, nesse complexo destacam-se importantes atividades do complexo de oleaginosas e cárneos consideradas de maior ponderação na ocupação das áreas do Cerrado.

Em relação à contribuição do Cerrado na produção agrícola nacional, destacam-se as principais culturas: soja, milho, algodão e feijão segundo dados fornecidos pela CONAB, em 2015. Estas estão concentradas respectivamente no Estado de Goiás, Tocantins, Minas Gerais, Piauí, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Maranhão e Bahia, conforme dados da tabela 2:

Tabela 02
Safras 2014/15 das principais culturas desenvolvidas no Cerrado

Dados organizados pela autora, conforme informações fornecidas pela CONAB, 2015.

Com base na tabela, no complexo das oleaginosas, a soja apresenta-se em maior escala no sul do Maranhão; o algodão no sudeste do Mato Grosso e oeste da Bahia. O milho tem se destacado no triângulo mineiro e no oeste da Bahia e o feijão no oeste da Bahia conforme relatório apresentado em agosto/2015 pelo Centro Nacional de Abastecimento Brasileiro (CONAB, 2015).

Em relação á pecuária é importante frisar que sua implantação antecedeu o impulso modernizador no Cerrado brasileiro. No período do Brasil colônia no século XVIII, já constituía grandes propriedades de pecuária extensiva conforme Shiki (1997). Segundo o estudioso, a pecuária primitiva consistia na criação de animais para auto subsistência com a utilização de técnicas tradicionais.

Em contrapartida, as mudanças na agricultura atingiram também a pecuária, introduzindo mudanças consideráveis desde a introdução de novas espécies de gado até o tipo de pastagem plantada, com intuito de atingir maior produtividade no complexo de cárneos. Assim, predominam nas regiões de Cerrado o sistema de gado de corte, enclausurado num período para engorda, dispondo de suprimentos básicos para a reprodução em larga escala. Atualmente o Cerrado responde por 55% da produção de carne do País, boa parte dos cerca de 53 milhões de hectares com pastagens cultivadas segundo a Embrapa (2015).

O avanço da produção da pecuária extensiva e da produção de grãos tem ocasionado sérios problemas à biodiversidade do Cerrado, em função da ocupação cada vez maior de áreas nativas para expansão das lavouras e criação de gado, a partir de agora iremos discutir alguns impactos decorrentes desse processo altamente dilapidador.

IMPACTOS AMBIENTAIS NAS ÁREAS DE CERRADO

A resolução nº 001 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) de 23/11/1986 define que impacto ambiental é “qualquer forma de matéria ou energia resultante das ações antrópicas”, afetando de maneira direta ou indireta áreas de saúde, segurança, bem estar e atividades econômicas da população, a biota (conjunto de animais e vegetais), além das condições estéticas e sanitárias do meio ambiente e a qualidade dos recursos naturais.

Bitar & Ortega (1998) apontam que os impactos ambientais ocorrem de forma: Direta e indireta; Temporária e permanente; Imediata e a médio e a longo prazo; Reversível e irreversível; Benéfica e adversa. Esses fatores dependem da maneira como as atividades são conduzidas, podendo causar ameaça ou perda dos seres vivos.

No cerrado, os impactos ambientais alcançaram níveis extremos. De acordo com a pesquisa realizada pelo WWF (2010) 80% das áreas de Cerrado estão relativamente impactadas. O modelo monocultor intensivo em quimificação e tecnologia, que desconsidera as características e propriedades do solo e não incorpora medidas de controle e proteção, tem provocado problemas como a destruição das florestas e da biodiversidade genética no bioma.

A tabela 3 revela a riqueza biológica no Cerrado que dependem do seu ecossistema para a reprodução da vida.

Tabela 03
Espécies de vertebrados e plantas que vivem no Cerrado

Dados organizados a partir das informações disponíveis pelo MMA (MINISTÉRIO DE MEIO AMBIENTE, 2010); (KLINK; MACHADO, 2005).

Infelizmente, partes consideráveis dessas espécies estão sujeitas a extinção, como consequência da perda de habitat provocada pelo desmatamento da cobertura vegetal. A cobertura vegetal vem sendo substituída por grandes áreas de monoculturas, bem como de pastagens para o desenvolvimento da pecuária e em outras circunstancias convertida em estradas e rodovias para o escoamento da produção. Segundo o Ministério do Meio Ambiente uma em cada cinco espécies exclusivas do Cerrado já não sobrevivem mais no bioma; das 137 espécies de animais existentes estão ameaçados de extinção.

O desmatamento não afeta apenas a cobertura vegetal, mas também o solo, uma vez que a ausência dele estimula o processo de erosão que dá origem á voçorocas[3]. Isto acontece em função da retirada da cobertura vegetal para a abertura de estradas, manejo agrícola e escoamento do gado. Com a ampliação de monoculturas no Cerrado houve uma perda significativa da camada superficial do solo alcançando média de 25ton/ha/ano (KlINK; MACHADO, 2005).

É relativamente preocupante o ritmo da devastação do bioma. Destarte, vem se formando um enorme deserto nas áreas de Cerrado, como resultado das tamanhas malservações provocadas pela ação antrópica, segundo o Ministério do Meio ambiente. Na ilustração 2 é possível perceber as mudanças na paisagem do Cerrado.


Ilustração 02
Mapa do desmatamento do Bioma Cerrado até 2010
Ministério do Meio Ambiente (2015)

De acordo com a ilustração 02 os maiores índices de desmatamento até o ano de 2010 foram diagnosticados nos Estados: Goiás; Minas Gerais e Mato Grosso do Sul. Já os Estados com mais remanescentes são Mato Grosso, Tocantins e Maranhão. Um estudo mais recente sobre o desmatamento do Cerrado foi realizado pela Terraclass em 2013[4]. A pesquisa apontou que os maiores índices de desmatamento estão concentrados nos Estados: Bahia; Distrito Federal; Goiás; Minas Gerais; Mato Grosso do Sul; Paraná e São Paulo (ver ilustração 3).


Ilustração 3
Desmatamento Acumulado no Cerrado até 2013
Elaborado pela autora, com base nos dados disponíveis pelo Terraclass2013 e Ministério do Meio Ambiente (2016)

Ao observar a ilustração 3, nota-se que os estados que mais perderam seus remanescentes são: São Paulo, Mato Grosso do Sul, Goiás, Distrito Federal e Paraná. A pesquisa divulgou ainda os municípios que mais desmataram até o ano de 2013, ver tabela 4.

Tabela 4
Municípios com maiores valores de desmatamento acumulado até 2013

Ministério do Meio Ambiente (2016).

A tabela 4 evidencia que os municípios com maiores índices de desmatamento estão localizados nos Estados do Mato Grosso do Sul; Mato Grosso; Goiás; Bahia e Minas Gerais. É importante ressaltar que as cidades com maiores taxas de desmatamento são justamente aquelas onde as atividades agrícolas são mais intensas.

As queimadas representam outra fonte de ameaça para a biodiversidade do Cerrado. O bioma é suscetível a ocorrência de queimadas o ano todo, isso em razão de vários fatores, entre eles: naturais em razão das altas temperaturas nos meses mais quentes e pela ação do próprio homem (KlINK; MACHADO, 2005).

Segundo França (2000) as regiões que mais registraram casos de queimadas são: Sul do Maranhão; Centro Leste de Tocantins; Centro-Oeste da Bahia; Centro Sul de Goiás; e Centro-Oeste e Centro-Leste de Mato Grosso. Nota-se que esses locais são justamente onde se desenvolve o plantio de monoculturas e atividades agropecuárias.

Outro fator emblemático é a grande demanda por recursos hídricos, em termos de quantidade e qualidade da água. No período chuvoso, que compreende entre os meses outubro e abril, substancias químicas são aplicadas no solo tais como: inseticidas e agrotóxicos para conter as pragas na agricultura. Com a chuva, as substâncias químicas são transportadas pela enxurrada para os rios e nascentes mais próximas, causando a morte de animais aquáticos e intoxicação do próprio homem.

Por outro lado a demanda de água pela irrigação leva à escassez de água, uma vez que grande parte dos recursos hídricos é utilizada na irrigação, registrando perda de até 50% conforme dados do WWF (2010). Segundo a pesquisa realizada por Lima (2011) a irrigação demanda grande quantidade de água, chegando a consumir de 3.000 a 15.000 m3.ha-1.ano-1, cerca de 300 a 1.500 mm.ha-1.ano-1, desse total, 0,2 e 1,5 kg.m-3” é voltada para a produção de grãos, isso tem gerado conflitos no Cerrado, principalmente nas disputas por áreas hídricas, bem como pela escassez de água e poluição. Nesse sentido, o tamanho do impacto ambiental ocorrido em áreas de Cerrado é alarmante, pois são inúmeros fatores que vem colaborando para a deteriorização de sua biodiversidade. Estes são apenas alguns dos problemas ambientais num ecossistema frágil como o Cerrado, Shiki (1997). Pesquisadores já alertam para o risco do Cerrado ser suprimido daqui alguns anos, se caso a degradação ambiental persistir.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A modernização agrícola se engendrou para favorecer os interesses econômicos da elite agrária. Tal afirmação é percebida na forma de organização da estrutura fundiária do Cerrado brasileiro. Esse processo tem gerado fatores relativamente emblemáticos como: a expropriação do trabalhador rural e diversos problemas ambientais. Assim, o processo de modernização que ocorreu nas áreas do Cerrado se enquadra no conceito de modernização conservadora, cunhado por Alberto Passos Guimarães.

‘estratégia de modernização conservadora’, assim chamada, porque, diferentemente da reforma agrária, tem por objetivo o crescimento da produção agropecuária mediante a renovação tecnológica, sem que seja tocada ou grandemente alterada a estrutura agrária (PIRES, 2009, p. 416).

O pacto conservador existente no centro de decisão política do Estado pela burguesia garantiu que a modernização da economia brasileira avançasse com a incorporação dos avanços tecnológicos, mantendo a estrutura fundiária sustentada pelas grandes propriedades rurais (PIRES, 2000).

Por outro lado, as transformações motivadas pela modernização da agricultura, agravaram os problemas ambientais, comprometendo a sustentabilidade do ecossistema; causando sérios problemas, tais como: degradação do sistema hídrico; extinção de várias espécies de animais e plantas; bem como o solo, fonte para a produção de alimento para o homem e demais seres vivos. Nesse contexto, a mudança na forma de produção agrícola serviu apenas para alimentar os ensejos dos grandes proprietários de terras, das indústrias agrícolas e ao Estado que se beneficiou com a política de concessão de créditos rurais.

REFERÊNCIAS

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