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EDUCAÇÃO ALIMENTAR E SUPLEMENTAÇÃO DE MICRONUTRIENTES: uma análise do Programa Saúde na Escola e do Programa NUTRISUS sobre o combate às anemias carenciais
NUTRITION EDUCATION AND MICRONUTRIENTS SUPPLEMENTATION: an analysis of the School Health Program and NUTRISUS Program about the anemia deficiencies combat
EDUCACIÓN ALIMENTAR Y SUPLEMENTACIÓN DE MICRONUTRIENTES: un análisis del Programa de Salud en la Escuela y Programa NUTRISUS acerca del combate a las anemias por deficiencia
Revista Cerrados (Unimontes), vol. 16, núm. 2, pp. 69-88, 2018
Universidade Estadual de Montes Claros

https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/

Recepção: 26 Setembro 2016

Aprovação: 23 Maio 2017

Publicado: 12 Novembro 2018

DOI: https://doi.org/10.22238/rc24482692201816026988

Resumo: O ambiente escolar se constitui em um espaço propício para o desenvolvimento de atividades de prevenção e promoção da saúde, e pelo prisma do agrupamento social, podem ser francamente desenvolvidas ações de incentivo à alimentação saudável, conhecimento de paradigmas antropológicos e ainda há a possibilidade de suplementação de micronutrientes para prevenir desordens fisiológicas, provocadas por carências nutricionais. No presente estudo objetivou-se compreender a percepção das Enfermeiras das Equipes de Saúde da Família vinculadas ao Programa Saúde na Escola, acerca da importância da suplementação de micronutrientes na dieta dos Centros Municipais de Educação Infantil que participam do Programa NutriSUS, como forma de prevenir e combater as anemias carenciais, dentre elas a anemia ferropriva, no Município de Montes Claros, Minas Gerais. Para tal empreitada, usou-se de pesquisa descritiva, exploratória, com abordagem qualitativa e da técnica de Grupo Focal, uma vez que a mesma, por meio de sessões grupais facilita a expressão de características requeridas no objeto de estudo. Os dados obtidos foram observados a partir da Análise de Conteúdo. Evidenciam-se fragilidades nos processos de planejamento e execução do Programa, que podem ter interferido diretamente no desfecho do mesmo na prevenção das anemias. Ouviram-se relatos de dificuldades no processo de capacitação de profissionais da educação para implementação do NutriSUS e da pouca aceitação da suplementação pela criança, por questões inerentes ao hábitos alimentares e padrões socioeconômico-culturais presentes.

Palavras-chave: Antropologia, Deficiências Nutricionais, Saúde na Escola, Anemia Ferropriva.

Abstract: The school environment constitutes in a space to the development of activities of prevention and promotion of health and through the prism of social grouping can be downright developed actions to encourage healthy eating, knowledge of anthropological paradigms, and there is still the possibility of supplementation of micronutrient to prevent physiological disorders caused by nutritional needs. This present study aimed to understand the perception of the team of nurses of the Family Health linked to the School Health Program, about the importance of micronutrient supplementation in the diet of Child Education of Municipal Centers participating in the NutriSUS Program as a form of preventing and combat the anemia deficiencies, among them the iron deficiency anemia, in the county of Montes Claros, Minas Gerais. For the contract, it was used a descriptive and exploratory research with qualitative approach and of Focus Group technique, since that the one, through group sessions facilitates the expression of characteristics required in the object of study. Data were obtained and observed from Content Analysis. It can be seen weaknesses in the process of planning and performance of the program, which may have interfered directly in the outcome of the prevention of anemia. It was heard reports of difficulties in the training process of education professionals for the implementation of the NutriSUS and of the little acceptance of supplementation for the child, for inherent questions in eating habits and socioeconomic and cultural patterns of those kids.

Keywords: Anthropology, Nutritional deficiencies, Health at school, Iron deficiency anemia.

Resumen: El entorno escolar se constituye en un espacio propicio para el desarrollo de actividades de prevención y promoción de la salud, y por el prisma del agrupamiento social, pueden ser desarrolladas acciones para fomentar la alimentación sana, el conocimiento de los paradigmas antropológicos y todavía existe la posibilidad de que la suplementación de micronutrientes está ahí para prevenir trastornos fisiológicos causados por deficiencias nutricionales. El presente estudio tuvo como objetivo comprender la percepción de las enfermeras del Equipo de Salud de la familia vinculados al programa Salud en la Escuela, sobre la importancia de los suplementos de micronutrientes en la dieta de los Centros Municipales de Educación infantil que participan del Programa de NutriSUS, con el fin de prevenir y combatir la anemia nutricional, entre ellas la anemia por deficiencia de hierro, en el municipio de Montes Claros, Minas Gerais. Para esta empresa, fue utilizada una investigación descriptiva y exploratoria con enfoque cualitativo y de la técnica de Grupo Focal, ya que el mismo, a través de las sesiones de grupo facilita la expresión de las características requeridas en el objeto del estudio. Los datos obtenidos fueron observados desde el Análisis del Contenido. Es evidente la fragilidad en los procesos de planeamiento y ejecución del Programa, que puede haber interferido directamente en el resultado de lo dicho en la prevención de la anemia. Se oyeron relatos de dificultades en el proceso de formación de los profesionales de la Educación para implementación del NutriSUS y de la poca aceptación de los suplementos para los niños, para asuntos relacionados con los hábitos alimentarios y patrones socioeconómicos y culturales presentes.

Palabras clave: Antropología, Deficiencias nutricionales, Salud en la Escuela, Anemia por deficiencia de hierro.

INTRODUÇÃO

Uma das estratégias para promoção da saúde pode se dar por meio de hábitos alimentares saudáveis e acredita-se que os espaços escolares se constituem como bastante apropriados para se desenvolver essas ações, especialmente quando se trata de espaços de educação infantil. O presente artigo se propôs a realizar um estudo qualitativo com Enfermeiros (as) das Equipes de Saúde da Família vinculadas ao Programa Saúde na Escola (PSE) e aos Centros Municipais de Educação Infantil (CEMEI) que participam do Programa NutriSUS. Este programa é uma estratégia de fortificação da alimentação infantil por meio de micronutrientes em pó e foi implementada no Município de Montes Claros, MG, já que os mesmos adotam a suplementação na dieta oferecida às crianças pela Escola, como forma de prevenir e tratar anemias carenciais, dentre elas a anemia ferropriva. Sob a perspectiva da antropologia saúde e alimentação, buscou-se compreender a percepção destes profissionais de saúde acerca da importância da suplementação de micronutrientes na dieta dos CEMEI.

Historicamente, na década de 1970, no contexto brasileiro, a renda foi considerada como principal entrave ao acesso à alimentação adequada. À época, e por aproximadamente até a década de 1990, programas de saúde pública pouco privilegiavam a educação nutricional (BOOG, 1997). Surgiram posteriormente as ações em educação em saúde no âmbito alimentar. Porém, e, em nível nacional, a segurança alimentar e nutricional, apesar de sua relevância, demanda discussões que visem novas possibilidades e definição de limites desse campo de atuação (BRASIL, 2012).

Deminice et al. (2007) em seu estudo, enfatizam a inadequada publicização de experiências exitosas nesse campo, ademais, criticam a existência de certas fragilidades de planejamento, sendo que no âmbito escolar relatam ausência de referências teórico-metodológicas de educação em saúde alimentar.

Pacheco (2008) assinala que a formação dos hábitos alimentares está intimamente ligada a diversos fatores, dentre eles, os de ordem fisiológica, psicológica, socioculturais, e ainda, os econômicos. Tais influencias iniciam sua expressão nos hábitos alimentares ainda na infância. Este autor avalia que, nesse contexto, os hábitos alimentares iniciais vão se constituir em práticas alimentares que podem se perpetuar com o decorrer dos anos. O teórico, prossegue, frisando que também na primeira infância a criança migra do ambiente intrafamiliar e adentra em um novo contexto, o escolar, no qual a criança experimentará outros alimentos e outras preparações. Deste modo, isso trará a oportunidade de se promover alterações em seus padrões constituídos de alimentação, sejam pelas influências do grupo social ou por diversos outros estímulos no ambiente educacional. Nesse sentido, Pacheco (2008) frisa que os espaços escolares se constituirão em locais privilegiados para a aplicabilidade de programas de educação alimentar, e essa prerrogativa deve ser melhor explorada pelas políticas públicas em questão.

O Ministério da Saúde, no ano de 2007, criou o Programa Saúde na Escola (PSE), no intuito de desenvolver uma política intersetorial, contemplando a Saúde e a Educação. Assim, as políticas de saúde e educação voltadas às crianças, adolescentes, jovens e adultos da educação pública brasileira se unem para promover saúde e educação integral. Isso porque a articulação intersetorial das redes públicas de saúde e de educação e das demais redes sociais para o desenvolvimento das ações do PSE vai além da oferta de serviços em um mesmo território, pois deve propiciar a sustentabilidade das ações a partir da conformação de redes de corresponsabilidade (BRASIL, 2007).

Nesse contexto, em 2015, é criada a Estratégia de fortificação da alimentação infantil com micronutrientes em pó – Programa NutriSUS – política que consiste na adição direta de nutrientes à alimentação oferecida às crianças de seis meses a três anos e 11 meses de idade, que estejam matriculadas em creches. A iniciativa nasceu a partir da prioridade de cuidado integral à saúde das crianças de zero a seis anos, estabelecida pela Ação Brasil Carinhoso, componente do Plano Brasil Sem Miséria. O NutriSUS foi implantado inicialmente nas creches participantes do Programa Saúde na Escola, e a iniciativa tem o objetivo de potencializar o pleno desenvolvimento infantil, a prevenção e o controle da anemia, além de outras carências nutricionais específicas na infância (BRASIL, 2015).

Para o Ministério da Saúde (Brasil, 2004), deve ser dada a devida importância à anemia a partir do momento em que se observam as consequências danosas que acometem a vida de uma criança. A preocupação com a doença deve ser ainda mais presente nas discussões de Saúde Pública ao se deparar com a estatística de que, 4,8 milhões de pré-escolares são atingidos pela anemia.

O combate à extrema pobreza na primeira infância se constitui em política pública na perspectiva de atenção integral à saúde das crianças, envolvendo, além de transferência de renda, o reforço de políticas ligadas à educação e à saúde. Segundo o Ministério da Saúde (Brasil, 2015) na busca por potencializar o desenvolvimento infantil, a prevenção e o controle das deficiências nutricionais, foi iniciada a estratégia de fortificação da alimentação infantil com micronutrientes, composto por vitaminas e minerais se traduz no esforço em suplementar a dieta de crianças. Esta ação é feita por meio da adição de um sachê contendo a mistura de vitaminas e minerais em pó em uma das refeições oferecidas diariamente às crianças nas escolas infantis, já que a anemia é apontada como um dos determinantes que prejudicam o desenvolvimento das crianças.

A estratégia de suplementação de micronutrientes, via Programa NutriSUS, foi implantada em CEMEI participantes do Programa Saúde na Escola (PSE), abrangendo todas as crianças matriculadas nas respectivas Instituições, com foco na faixa etária entre 6 e 48 meses, não havendo contraindicações para crianças até os cinco anos (MONTES CLAROS, 2016).

Os municípios mineiros que têm a Estratégia de fortificação receberam ações de formação de profissionais da saúde e educação referentes à importância e uso da fortificação da alimentação infantil com micronutrientes nos CEMEI (MONTES CLAROS, 2016). O presente estudo se justifica pelo fato de que busca compreender as percepções de Enfermeiros (as) acerca de ações de implementação do Programa NutriSUS e o impacto positivo gerado em Saúde Pública para o desenvolvimento adequado de crianças menores de 05 anos de idade, com a prevenção carências nutricionais específicas na infância.

MATERIAIS E MÉTODOS

O estudo caracteriza-se como pesquisa fundamental de tipo socioantropológica, ancorado na antropologia da saúde e alimentação. O universo de pesquisa compreendeu as Equipes de Saúde da Família vinculadas ao PSE e aos CEMEI que participam do Programa NutriSUS, no município de Montes Claros. Os CEMEI selecionados para pesquisa foram aqueles que adotavam a suplementação da dieta com micronutrientes, vinculadas ao Programa NutriSUS.

Trata-se de pesquisa qualitativa, classificada como descritiva, pelo fato de descrever a percepção dos profissionais de saúde unidades de saúde selecionadas; e exploratória, em virtude de existirem poucos estudos relacionados à suplementação infantil à base de micronutrientes. Como técnica de pesquisa, escolheu-se para produção do Corpus documental a técnica de Grupo Focal, que é uma “[...] técnica de pesquisa que utiliza as sessões grupais como um dos foros facilitadores de expressão de características psicossociológicas e culturais” (WESTPHAL; BÓGUS; FARIA, 1996, p. 473).

O trabalho de Pesquisa compreendeu quatro etapas: revisão bibliográfica; levantamento das Unidades de Saúde que participam do Programa Saúde na Escola, no município de Montes Claros, MG; pesquisa de campo/grupo focal; e, análise dos dados, utilizando-se da técnica Análise de Conteúdo (BARDIN, 2009).

A cidade de Montes Claros foi contemplada pelo Ministério da Saúde para desenvolver o Programa NutriSUS em sete CEMEI sendo que, neste estudo, três profissionais enfermeiras, que são referências técnicas na implementação do Programa, aceitaram participar. A pesquisa seguiu os preceitos éticos da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, garantindo às participantes da pesquisa a preservação e toda confidencialidade a respeito das informações e dados coletados sendo estes, exclusivamente para fins científicos (BRASIL, 2012). Usou-se do recurso de gravador de áudio, sempre com aquiescência das entrevistadas. As participantes no estudo são identificadas no corpo do texto com codinomes, usando-se de nomes de flores, também como uma forma de homenagear as mulheres que colaboraram com este estudo.

DISCUSSÃO

Montes Claros é um município situado no norte de Minas Gerais. Pertencente à macrorregião norte de saúde, com população estimada de 394.350 habitantes (IBGE, 2015). A cidade conta com Centros Municipais de Educação Infantil (CEMEI) que são instituições educacionais para crianças de 0 a 5 anos. Dentre os existentes, o Programa NutriSUS foi implantado nos CEMEI dos bairros: Conjunto Cristo Rei, São Judas, Vila Anália, Vila Oliveira, Vilage do Lago, Tancredo Neves e Vila Telma. Tais bairros são de classe média/baixa e estão em áreas de vulnerabilidade social (SMS, 2015).

Os CEMEI que participaram no NutriSUS foram assistidos e instrumentalizados pelas respectivas Estratégias de Saúde da Família (ESF) nos territórios. As profissionais enfermeiras foram responsáveis pelo processo de capacitação de professores, diretores e auxiliares das Cantinas, realizando ainda o acompanhamento dos processos de suplementação alimentar em escolares contemplados no Programa.

Considerando que o Programa é intersetorial, evidenciou-se, pela técnica de grupo focal, que o conteúdo expresso nas falas das participantes no estudo possibilitou a construção das seguintes categorias: 1) O processo de capacitação de profissionais da educação para implementação do NutriSUS; 2) O uso de metodologias de ensino-aprendizagem nos processos de educação em saúde junto aos pais e responsáveis pelas crianças participantes da estratégia de suplementação de micronutrientes na dieta dos CEMEI; 3) Relatos de vivências práticas da implementação e desenvolvimento do Programa NutriSUS, sob o olhar das enfermeiras participantes.

Carências nutricionais, processos de educação em saúde e a implementação da estratégia de suplementação de micronutrientes no âmbito escolar

Com maior prevalência em crianças e mulheres, a anemia por deficiência de ferro é a mais comum das carências nutricionais. Observa-se que crianças entre seis e 24 meses apresentam maiores riscos para desenvolver a doença do que crianças maiores, jovens e adultos (JORDÃO; BERNARDI; BARROS FILHO, 2009). É importante compreender que a etiologia das anemias se caracteriza pela biossíntese anormal de hemoglobina, uma vez que as hemácias em desenvolvimento necessitam de ferro, protoporfirina e globina em quantidades suficientes para a produção de hemoglobina (LEE, 1998).

A anemia por deficiência de ferro é a mais comum das deficiências nutricionais do mundo e ocorre como consequência de perda sanguínea crônica, perdas urinárias e absorção deficiente e aumento do volume sanguíneo (CARVALHO; BARACAT; SGARBIERI, 2006).

A absorção de ferro é afetada, de forma significativa, pela mucosa intestinal, pela quantidade e natureza química do ferro ingerido nos alimentos, por alimentos presentes na dieta e uma variedade de outros fatores, como o estado nutricional de ferro do organismo e a taxa de produção de células vermelhas sanguíneas, que podem aumentar ou diminuir sua biodisponibilidade. Quando os níveis de ferro absorvidos pela dieta são adequados, a mucosa intestinal regulariza a sua absorção para manter constante o conteúdo de ferro do organismo. Desta forma, apenas valores entre 5 e 10% do ferro ingerido são absorvidos diariamente. Na deficiência de ferro, sua absorção pode aumentar de 10 a 20% ou até 30% e, se as reservas de ferro no organismo estiverem reduzidas ou caso a eritropoese seja acelerada, sua absorção pode variar de 25 a 50% (CARVALHO; BARACAT; SGARBIERI, 2006, p. 56).

Considerada um sério problema de Saúde Pública, a anemia pode prejudicar seriamente o desenvolvimento mental e psicomotor, além de causar aumento de morbimortalidade materna e infantil, queda no desempenho do indivíduo e redução da resistência às infecções (UNICEF, 1998). Esse problema de Saúde Pública está associado ao fato de o Brasil apresentar a proporção de anemia de 50% a 83,55 em crianças menores que dois anos (TORRES et al. 1995; OLIVEIRA et al. 2002). Os autores ressaltam que a prevalência de anemia ocorre principalmente em crianças menores de 05 anos, sendo a faixa etária de 6 a 23 meses a de maior risco para o desenvolvimento desta doença.

Devido ao elevado predomínio e as suas consequências, o combate à anemia ferropriva é uma das prioridades para os profissionais responsáveis pelo planejamento de Programas de Nutrição em Saúde Pública, encontrando respaldo político no compromisso social assumido pelo Brasil de reduzir a anemia por carência de ferro (JORDÃO; BERNARDI; BARROS FILHO, 2009, p. 94).

Vale salientar que o aumento da prevalência da anemia por carência de ferro em crianças pode ser decorrente dos hábitos alimentares. Oliveira et al. (2002) ressaltam que no Brasil, a tendência do aumento da anemia em pré-escolares foi evidenciada por dois estudos nos quais o prevalecimento da doença passou de 35,6% na década de 1980, para 46,9% na década de 1990 e esse número vem aumentando a cada década.

Segundo Leite et al. (2014), a educação em saúde é um processo, um pensar, um fazer pedagógico emancipatório que proporciona o processo de educação em saúde por meio da comunicação, a qual deve consistir em uma retroalimentação que possa favorecer a construção do conhecimento, habilidades para que o público-alvo realize escolhas a partir de uma consciência crítica, pautada em medidas que modifiquem o status e que leve os atores a participarem do processo. Para ‘Alfazema’, a questão

[...] da Educação em Saúde está voltada mesmo para a questão de fornecer conhecimento, de se considerar também o conhecimento prévio que os pais e os professores já tinham. Como o Programa [NutriSUS] é novo, então pouco se tem conhecimento sobre os objetivos, como funciona a suplementação e foi aí que a gente entrou para atuar neste sentido: fornecendo as informações, esclarecendo os objetivos e quais os critérios para participação, quais os possíveis eventos adversos [da suplementação], onde a saúde atuaria e onde a Escola atuaria.

Para a profissional Gardênia, a importância da educação em saúde, não está somente na abordagem individual para com o aluno, mas, principalmente na forma de envolver outros sujeitos no processo, como os pais, de forma a participar do processo de desenvolvimento da implantação do programa de suplementação no âmbito escolar. A respondente destacou que é necessário o envolvimento de todos os atores, principalmente os pais, para que possam modificar a realidade alimentar de toda a família e não somente de forma individual, mas também coletiva, verificando a realidade social para que o programa possa ter êxito. Para Gardênia, é importante compreender,

[...] que em todo processo de educação em saúde, o nome já fala! é um processo de educar, cujo objetivo é a saúde. Se a gente utiliza metodologias conservadoras o objeto ele acaba não sendo atingido. Mas no momento que você utiliza uma metodologia mais participativa, mais problematizadora, explicando quais as complicações que uma anemia causa na criança e como se dá o processo de maturação cerebral, por exemplo, eu já tive muita facilidade de conscientizar os pais.

A educação em saúde, enquanto processo, é um pensar e um fazer pedagógico emancipatório, ou seja, na possibilidade do desenvolvimento da autonomia intelectual dos sujeitos, individual e coletiva, envolve maior aproximação com o seu ator possibilitando assim as mudanças necessárias, visto que devem ser consideradas as particularidades de cada grupo. Além disso, é preciso considerar o entorno social onde estão inseridos. Quando esta autonomia individual e coletiva se manifesta, as mudanças acontecem, como no caso abaixo, no qual, para Gardênia:

O pai entendeu o benefício que a criança iria ter ao aderir ao programa. Os professores, no momento que nós estávamos fazendo a educação em saúde, explicando sobre a questão do benefício, da vantagem da criança que não tem a carência nutricional, a questão da anemia que não é só o ferro e sim as outras vitaminas contidas no sachê [de micronutrientes do NutriSUS], que vantagem teria o futuro dessa criança no aprendizado e no desenvolvimento neuropsicomotor, aí se tinha adesão.

O entendimento de que as práticas alimentares saudáveis são produtos da cultura, aponta para uma reflexão acerca da relação do homem com o comer ao longo da história da humanidade. Estes múltiplos discursos referentes ao comer, à alimentação e à nutrição precisam ser dialogados e as diversidades valorizadas (SANTOS, 2013). Podemos constatar o processo de importância do diálogo mediante a educação em Saúde, já que, segundo Begônia:

O caso do programa NutriSUS, por exemplo, foi realmente esta parte que a gente desenvolveu: entender o que é o programa, o que ele contempla, quais os objetivos que ele possui, como ele deve ser desenvolvido. Sentar realmente com as pessoas que vão estar envolvidas no processo. Capacitar, explicar, realmente como que é o passo a passo de todo o processo. O que as crianças podem alcançar ao receberem este nutriente ou se o mesmo tem alguma reação adversa. Realmente é o ato de explicar para as pessoas que estão envolvidas neste processo, tudo o que envolve o programa.

Conforme o Ministério da Saúde (BRASIL, 2015), é necessário considerarmos a realidade social de cada aluno na implantação de programas de inserção de micronutrientes no âmbito escolar. Na visão de Gardênia, esta percepção é sentida quando pode-se observar alunos oriundos de diferentes realidades sociais e bairros da cidade:

Talvez estou tendo uma visão superficial, mas nos bairros em que as famílias têm um poder aquisitivo menor, a Equipe teve uma facilidade muito grande na implementação do NutriSUS. Não teve dificuldade, as crianças aceitaram [o sachê de suplemento de micronutrientes]. Aí eu me pergunto: se a questão da alimentação no domicílio, o tipo de alimento que é oferecido interfere, porquê, se eu pensar no poder aquisitivo do Vila Anália, comparado ao Village e região, vou concluir que as crianças desta região vêm de áreas mais periféricas que a região onde atuei no Programa e são crianças de condição socioeconômica menor. Então essa criança mais desfavorecida tem muito mais facilidade em aceitar determinados alimentos, principalmente alimentos que contidos na merenda, como o feijão, arroz, macarrão... Diferente dos de melhor condição socioeconômica, que estão acostumados com produtos industrializados como achocolatados e biscoitos recheados... e por isso tem essa dificuldade de aceitar a dieta da CEMEI. (Gardênia)

A dificuldade desta transposição se pauta na permanência, ainda, do modelo hegemônico na prática profissional que, verticalmente, preconiza a adoção de novos comportamentos, como o parar de fumar, vacinar-se, ter uma higiene adequada, entre outros, e de estratégias geralmente ditas coletivas, como a comunicação de massa. Cabe às pessoas, quando informadas em relação aos riscos de adoecimento, agir com responsabilidade e adotar um novo estilo de vida mais saudável. Desta forma, portanto, desconsidera-se que no processo educativo lida-se com histórias de vida, um conjunto de crenças e valores, a própria subjetividade do sujeito que requer soluções sustentadas socioculturalmente. As soluções provenientes do exterior muitas vezes são incorporadas pelos “sujeitos” que passam a defender os interesses dominantes, como mais medicalização, convênios de saúde, construindo uma nova subordinação (GAZZINELLI et al., 2005).

Percepções de Enfermeiras sobre a suplementação de micronutrientes na dieta nos CEMEI, sob a ótica da antropologia da saúde e da alimentação

Concernente às observações e percepções de profissionais da saúde nos processos de educação em saúde junto aos pais de alunos e educadores, sob o prisma antropológico, a verbalização das participantes coaduna com a ideia de que a influência de padrões alimentares adquiridos culturalmente está direta e indiretamente imbricada com o processo de suplementação de micronutrientes, e neste impactam. Em se tratando de possibilitar oportunidade de capacitação para a temática, Santos et al. (2013), em estudo que focava verificar impactos de formação pedagógica de educadores acerca do tema da alimentação e nutrição, constataram que ao objetivar sensibilizar e orientar os coordenadores para a transversalização do tema no currículo escolar, foram promovidas trocas de experiências pelos participantes. Estes a consideraram como ‘dinâmica’, ‘produtiva’ e ‘interativa’, ainda que expressem fragilidades no processo de formação, com vistas a subsidiar suas práticas pedagógicas, e que estas fragilidades culminem por apresentar limitações no seu desdobramento no campo de trabalho, pois a sensibilização alcançada pode ser fragilizada na volta dos atores ao seu ambiente.

Para Gardênia, em se tratando do processo de capacitação dos educadores dos CEMEI aflora o seguinte:

Estamos resgando algumas questões e é importante resgatar que, todo processo de educação em saúde o nome já fala: é um processo de educar, cujo o objetivo é a saúde! Se a gente utiliza metodologias conservadoras o objeto ele acaba não sendo atingido. Mas no momento que você utiliza uma metodologia mais participativa mais problematizadora explicando quais as complicações que uma anemia causa na criança, o processo de formação cerebral, eu já tive muita facilidade de obter os pais. O pai entendeu o benefício que a criança ia ter ao aderir ao programa. Os professores no momento que nós estávamos fazendo a educação em saúde, sobre a questão do benefício da vantagem da criança que não tem a carência nutricional, a questão da anemia que não é só o ferro e sim as outras vitaminas contidas no sachê [de micronutrientes], que vantagem teria para essa criança no aprendizado futuro, no desenvolvimento neuropsicomotor, aí sim tinha adesão. Mas na hora que isso transcende para a prática, para os primeiros obstáculos, parece que as vantagens não superam as dificuldades do processo.

Fernandes, Fonseca e Silva (2014) constataram que o reconhecimento do papel de agente da educação em saúde ainda depende de uma série de transformações na estrutura, valores e concepções concernentes ao relevante trabalho que estes desenvolvem e as mais eficazes formas de sua inserção no ambiente escolar ocorrem.

Tal proposta pode vir a lograr êxito, no sentido de transpor barreiras de operacionalização prática, com mudanças de paradigmas na educação em saúde na escola. Begônia, por sua vez, no seu entendimento acerca dos processos de Educação em Saúde para conscientização de pais no Programa NutriSUS, afirma que:

Eu entendo que educação em saúde, no caso do programa NUTRISUS, por exemplo, foi realmente esta parte que a gente desenvolveu. Explicar o que é o programa, o que contempla, quais os objetivos que possui e como deve ser desenvolvido. Sentar realmente com as pessoas envolvidas no processo. Explicar, capacitar realmente como que é o passo a passo de todo o processo. O que pode ser conquistado com as crianças que recebem estes nutrientes ou se tem alguma reação adversa do nutriente.

Não é recente no Brasil o esforço antropológico de focalizar elementos culturais e ideológicos que envolvam as práticas de consumo alimentar (CANESQUI, 1988). Figueiredo (1964) ressalta que os estudos de comunidade realizados principalmente em 1950, compreendem as mais importantes contribuições empíricas e descritivas que recolheram um elenco de informações sobre alimentações. Até a década de 1950, folcloristas também descreveram a culinária, enquanto aspecto de cultura local indígena que se mesclava com a do colonizador português e dos escravos (FIGUEIREDO, 1964). Gardênia, na sua prática assistencial entende que:

Então a dificuldade foi realmente foi transformar conhecimento em ação e como tá fora de nossa governabilidade por que a gente não tá no dia a dia da Escola se a tivesse um tempo maior de tá lá todo dia na hora da merenda acompanhando um tempo maior, supervisionando e estimulando o resultado seria outro. Mas como nós temos outras atividades além da questão de saúde da escola, mesmo indo uma vez por semana não foi suficiente.

Esta participante da pesquisa considera que, dentre as dificuldades operacionais enfrentadas pelo NutriSUS, os mecanismos e relações de poder influenciaram e poderiam ter sido utilizados para entusiasmar positivamente na consecução de objetivos finais da suplementação de micronutrientes, já que, pelo poder do saber, os profissionais de saúde, os de nível superior, têm uma representação social de empoderamento no campo do cuidado em saúde. Esse poder do saber, portanto, se prestaria a imprimir no imaginário dos profissionais da educação a necessidade e possibilidade de que a execução do Programa NutriSUS tomasse firmes rumos para atingir o objetivo de reduzir a carência nutricional, sendo cumprido fielmente, conforme diretrizes operacionais do Programa.

Então não houve uma compreensão de que as dificuldades agora elas são muito menores em comparação com as dificuldades que esta criança vai ter no futuro, se ela tiver carências nutricionais. Eu acho que faltou essa transposição, e que se nós, que se eu tivesse mais tempo de ter ficado mais em cima, mais próximo, maior disponibilidade, o resultado poderia se o mesmo ou poderia ter sido maior e melhor. Aí o que aconteceu foi que eu esbarrei em todas as outras funções a exercer... assim, mandei o Agente de Saúde algumas vezes, mas só que o agente perante os professores não tem a mesma autoridade. A palavra é essa! Autoridade. Aí eu mandei o Técnico de Enfermagem, mas quando é você, Enfermeiro ou o Médico, você tem um poder... uma autoridade, vamos dizer assim. Não sei se a palavra seria autoridade, mas você tem um pouco de poder de barganha, de argumentação maior. A simples presença, o fato de você estar na Escola, você nem precisa falar nada, você estar ali já seria diferente a execução da suplementação.

Foucault (1996) discute o poder como uma prática social, sendo que o mesmo é tido como fruto das interações e relações estabelecidas. Para o autor, além do poder do Estado, o poder encontra-se em todos os lugares, exercendo certa molecularidade e molaridade. O poder é algo que se exerce, que se efetua. O poder-saber disciplinar é um dispositivo, um método de sujeição da sociedade capitalista e é expresso nas relações terapêuticas dos profissionais de saúde e os usuários dos serviços.

No Brasil, os estudos atinentes à antropologia da saúde e da doença se intensificaram nas últimas décadas, trazendo contribuições inimagináveis e novos olhares relacionados às representações e práticas em saúde/doença (SANTOS et al., 2012).

Alves e Rabelo (1998) coadunam com este raciocínio e ressaltam que houve uma ampliação do entendimento das matizes culturais sobre as quais erguem os significados e ações relativas à saúde e doença, característicos de grupos sociais específicos. Isso tem contribuído para o andamento de estudos epidemiológicos que tratam o tema doença e cultura em termos de uma relação externa, possível de formulação na linguagem de fatores condicionantes.

A compreensão da amplitude da antropologia da saúde envolve a articulação do sistema cultural como um sistema social de saúde. Atribui-se ao sistema social de saúde, como o envolvimento de instituições relacionadas à saúde, a organização de papéis dos profissionais de saúde, suas regras de interação, assim como as relações de poder a ele inerentes (LANGDON; WIIK, 2010). Entendamos, a parte do quesito aplicabilidade e responsabilização da execução do Programa NutriSUS no ambiente escolar, conforme Begônia,

Na questão da responsabilização, acho que um pouco falho às vezes atribuir a mesma metodologia para um ambiente que tem crianças em diversas situações. Então, eu achei até meio ariscado esta questão do Programa pela proposta, A proposta realmente é muito boa sob o olhar dos benefícios, que seriam indiscutíveis, só que as estratégias utilizadas não foram bem analisadas, pelo menos foi o que a gente percebeu em relação as Escolas. A sobrecarga na Unidade de Saúde em relação aos Enfermeiros é muito grande, só que para os professores também é [...] Então como estratégias talvez deveria se repensar e responsabilizar mais não só a Escola, mas também a família no processo, porque a criança que na Escola ela tem um padrão totalmente diferente em relação à alimentação em casa, em relação aos hábitos de comer e aos horários também. E isso nem sempre a Escola tem domínio.

Do excerto acima aflora a ideia de que, conforme a linha de raciocínio de Aquino, Pereira e Reis (2015), os hábitos e padrões alimentares se iniciam na infância e permanecem durante a vida adulta, sofrendo modificações com a inserção do comensal em outros ambientes. Dentre eles, está o ambiente escolar. Praticar a suplementação de micronutrientes da dieta ofertada à escolares se tornou dificultosa devido a possíveis expressões de hábitos alimentares e preferências individuais das crianças, já que, conforme preconiza o Ministério da Saúde (BRASIL, 2015), é recomendável que a criança, em processo de suplementação de minerais, faça a ingestão diária de um sachê de micronutriente, mas, na prática, tais preferências alimentares dos mesmos e ainda o turno escolar interfere na ingestão completa do sachê. A título de ilustração, pode ser considerada a realidade das crianças do turno vespertino, que, conforme padrão alimentar e cultural dominante, não fazem refeições nesse período, se alimentando de lanches diversos. Assim, suplementar micronutrientes associados a refeições no período vespertino culmina em baixa adesão por parte dos comensais.

Ainda sob a égide dos padrões alimentares do domicílio da criança, Begônia ainda afirma que o Programa pode ser operacionalizado de forma mais adequada com a responsabilização e participação de familiares da criança. Na expressão de Gardênia, resta explícita a questão de hábitos e padrões alimentares familiares, sobretudo do ponto de vista aquisitivo do núcleo familiar, conforme exposto no trecho a seguir:

Diferente dos de regiões de melhor poder aquisitivo..., talvez, o perfil dessas crianças alimentarem, interferiu no Programa. Outro fator seria a questão da família que também influenciou, já que as crianças que estavam economicamente melhor automaticamente tinham uma maior resistência. Não aceitavam a dieta, mas chegando em casa a mãe lhes dava outro alimento. Aí eu comecei a me questionar sobre estas questões [...].

A nutrição e a alimentação constituem requisitos básicos para a promoção e a proteção da saúde, proporcionando crescimento e desenvolvimento adequado ao ser humano, de modo que este possa viver com qualidade. Sabe-se que a criança, por se encontrar em fase de crescimento, é extremamente dependente da alimentação para atingir um desenvolvimento adequado. Por isso, é mais sensível às carências e desequilíbrios nutricionais. Na fase pré-escolar verifica-se um crescimento acentuado, sendo a qualidade da alimentação fator determinante para a maturação orgânica e para a saúde física e psicossocial (BRASIL, 2003).

De acordo com Souza (2010) e Martins et al. (2012), as condições socioeconômicas das famílias podem indicar contextos de vulnerabilidade social. Dessa forma, a alimentação não é uma questão somente de escolha individual, podendo ser influenciada por diversos fatores que frustram ou restringem a escolha de uma alimentação mais adequada, a exemplo, a exclusão social causada pela pobreza e a qualidade da informação que a população tem disponível acerca de alimentos e alimentação, além dos fatores relacionados ao conhecimento, atitude e práticas das famílias.

Nesse contexto, o Programa NutriSUS pode ter sido influenciado negativamente na consecução de seus objetivos ao ofertar um programa de forma genérica, sem considerar adequadamente o perfil socioeconômico do público-alvo e a interferência direta de fatores como preferência alimentar, padrões econômicos familiares e turno de estudo da criança nas escolas, já que a rotina escolar pode divergir da usualidade alimentar do domicílio.

RESULTADOS E CONCLUSÕES

Em se tratando de carências nutricionais específicas na infância, dentre elas a anemia ferropriva, frisa-se que crianças com essa patologia possuem maior probabilidade de baixo rendimento escolar, o que provavelmente contribui para a transmissão intergeracional da pobreza com implicações para o desenvolvimento dos países. A estratégia de suplementação de micronutrientes na dieta ofertada a escolares foi amplamente estudada por todo o mundo, e, implementada com sucesso em diferentes continentes, já acumula evidências de eficácia e efetividade, além do que, recentemente, teve essa importância reconhecida em guia específico da Organização Mundial da Saúde.

No âmbito da prática da suplementação de micronutrientes via Programa NutriSUS nos CEMEI em Montes Claros, depreende-se que com relação às carências nutricionais, anemias e processos socioeconômico-culturais envoltos no processo alimentar, deve o Programa NutriSUS e demais programas de suplementação alimentar, ancorar-se em processos de educação em saúde que se apropriem de ferramentas metodológicas ativas e que possibilitem a participação ativa dos sujeitos no processo educativo. Com isso, devem propor, na seara da implementação da estratégia de suplementação de micronutrientes no âmbito escolar, que a mesma se efetive prioritariamente no ambiente sóciofamiliar, ainda que a suplementação da dieta se dê também intramuros nos CEMEI, haja vista que as anemias carenciais representam alterações, ainda que inicialmente podem não representar doenças específicas, e a carência de elementos essenciais para a produção de hemácias (como o Folato, o Ferro ou a Vitamina B12) prejudica o processo de crescimento, principalmente das crianças. Outro viés importante, na perspectiva da implementação de programas de suplementação alimentar, seria a validade externa do modelo lógico do mesmo, uma vez que em um mesmo território-processo convivem distintas realidades socioeconômicas e diferentes singularidades de padrões alimentares, referendados culturalmente.

Analisando o fato de que a estratégia NutriSUS se configura em programa transdisciplinar e transversal, operacionalizá-lo com diferentes atores, sejam eles da área educacional, de saúde e/ou familiares da criança suplementada, verifica-se, conforme relatos dos sujeitos em estudo, que diversos entraves operacionais se deram em virtude de que em momentos distintos, e também por motivos distintos, múltiplos atores não assumiram adequadamente seu papel durante a realização da suplementação, o que interferiu diretamente nos resultados apresentados na luta pela prevenção e combate às anemias carenciais, dentre elas a anemia ferropriva.

Concernente a exercer um olhar voltado à antropologia da saúde e da alimentação, as percepções, interesses e preferências alimentares são diretamente relacionadas ao modo como o comensal se adaptou culturalmente. Nesse sentido, ofertar a suplementação de micronutrientes junto à dieta oferecida pelos CEMEI deveria vir ao encontro do perfil alimentar do núcleo familiar da criança suplementada, sob pena de baixa adesão, recusa alimentar ou não aceitação em participar do Programa. Isso poderia vir a culminar em baixo impacto na redução de carências nutricionais de menores de cinco anos de idade, e, pouca melhoria no aspecto da saúde pública, já que dentre as principais causas de carências alimentares está a ingestão deficiente de elementos ricos em ferro, principalmente os de origem animal.

Por fim, enfatiza-se que, ao buscar conhecer a visão de enfermeiras atuantes em programas transversais de saúde pública, por meio da realização deste estudo, pôde-se enriquecer o conhecimento acerca da temática, ainda que, pelas limitações desta empreitada preliminar, observa-se a necessidade de que novas pesquisas sejam realizadas para compreender de modo mais adequado esta problemática.

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