Estimadas(os) leitoras(es),

Eis a primeira edição de 2023. Iniciamos o ano com esperanças, após um período de desinteresse e falta de investimento governamental em tantas áreas no Brasil, tais como: meio ambiente, saúde, educação, cultura... Na produção de arte e de cultura, enquanto possibilidades de emancipação humana, o que tivemos foi uma tentativa triste de alinhá-las a um nacionalismo conservador, incapaz de produção de experiências e expectativas plurais e democráticas na sociedade. Ao mesmo tempo, a arte e a cultura passaram por um abandono em tempos de avanço de um neoliberalismo autocrático, que alimentou o saudosismo da Ditadura, enquanto sucateou as condições de vida da população. E, como se não bastasse, casos de censura se multiplicaram no cenário cultural brasileiro: cinema e música, por exemplo, sofreram tentativas de impedimento de manifestações políticas de seus artistas ou de retirada de obras de circulação por parte do governo federal e de algumas prefeituras. Isto tudo sem ainda mencionarmos um “pequeno detalhe”: a extinção do Ministério da Cultura, o qual teve suas atribuições rebaixadas a uma Secretaria Especial de Cultura dentro do Ministério da Cidadania, bastante controverso.

Como se não bastasse esse “projeto político”, como não acrescentar a este panorama a pandemia, que gerou uma catástrofe na indústria cultural brasileira, com artistas passando fome em meio à falta de políticas públicas do Governo, além de cortes orçamentários, tais como, por exemplo, o esvaziamento da Lei Rouanet – Lei Federal de Incentivo à Cultura, responsável pelo suporte a mais de 70% das produções culturais do Brasil. Mesmo sob ataque e crise, o setor cultural seguiu defendendo seu impacto na economia, a partir da significativa quantidade (e qualidade) de empregos que gera, formais e informais, o que representa quase 6% de toda a mão de obra do país.

Diante de tal cenário, apresentamos nesta edição um espaço para apreciação e estudo de um dos universos de maior expressão dentro do cenário cultural: a Música. Em especial, a música no cerne das Ciências Humanas, conjuntamente a História, ao tratarmos de diferentes perspectivas de interlocuções interdisciplinares entre os campos. Mais propriamente, tendo como ponto de partida a música como linguagem artística que apresenta uma inserção sociocultural, essencial e própria de seu contorno de expressão estética, a Caminhos da História brinda o dossiê “Consonâncias entre História e Música”, com a ambição do debate acerca de ações e movimentos da música na sociedade e como esta manifestação artístico-cultural pode consistir em uma fonte significativa para a compreensão junto à ciência histórica.

Estruturado e organizado por Raiana Alves Maciel Leal do Carmo, professora do curso de Licenciatura em Música e do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), e por Priscila Gomes Correa, professora do curso de Licenciatura em História e do Programa de Pós-Graduação em História Regional e Local (PPGHIS) da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), o dossiê, que será exposto com maior rigor em seu artigo de apresentação, reúne sete textos que, na íntegra, contribuem com evidências de perspectivas da música em análises históricas, no entendimento e pesquisa de fenômenos históricos e processos sociais. A incumbência competiu a um pujante grupo composto pelas(os) pesquisadoras(es) Tiago de Oliveira Pinto, Maurício de Carvalho Teixeira, Rachel de Ulhôa, Edite Rocha, Luiz Filipe da Silva Correia, Michael Iyanaga, Sonia Teller e Alessandro de Almeida.

Nesta edição apresentamos, também, a seção com temáticas livres e condizentes com a História. O primeiro artigo da seção é intitulado “Elementos da Cultura e do trabalho dos Povos Originários em Óbidos-PA, 1698 a 1763: um estudo com base nos registros literários da Amazônia colonial”, de autoria de Délio Reis de Aquino e Lúcia Alfaia. O artigo trata sobre o “Forte Pauxis”, mais tarde vila de Óbidos, utilizando crônicas, cartas, diários, documentos estatais, debatendo aspectos peculiares sobre o trabalho, as tecnologias, usos florísticos e faunísticos para medicina e alimento dos povos originários no período em debate. O segundo artigo, intitulado “Formação da malha eclesiástica do território da Comarca do Serro do Frio, Minas Gerais, 1702-1821”, de autoria de Danilo Briskievicz, trata sobre a relação entre a colonização portuguesa do território brasileiro a partir das minas do Serro do Frio [atual Serro/MG] no período entre 1702 e 1821, e a criação da malha eclesiástica em constante disputa entre três arcebispados: da Bahia, do Rio de Janeiro e de Mariana. O terceiro artigo é de autoria de José de Arimatéa Aguiar Júnior e Pedro Fontineles Filho, e se intitula “Prescrições patrióticas e os mecanismos de controle no governo Vargas: as festas cívico-militares, nacionalismo e as contravenções no Piauí (1930 - 1945)”. O texto debate sobre como as comemorações cívico-militares foram utilizadas para conclamar a juventude masculina piauiense ao serviço militar no Piauí no período de 1930 a 1945.

Já na seção Resenhas, a qual finaliza esta publicação, damos início ao resultado da “Seleção de resenhistas 2023”, a partir da realização de uma chamada da revista Caminhos da História em parceria com a Hucitec Editora, que fomenta, há 50 anos, a publicação de livros no Brasil. Nesta primeira edição de 2023, apresentamos a resenha de Marcelo Lunardi do Carmo (FFLCH-USP), possuindo, como alicerce, o livro do Professor João Antonio de Paula, Capítulos de História do Pensamento Econômico do Brasil, publicado em 2021 pela Hucitec e gentilmente cedido pela editora para esta chamada. Se junta a tal seção a resenha sobre o livro O uso dos conceitos (2021) de José D’ Assunção Barros, produzida pelo pesquisador Rodrigo dos Santos, discutindo a articulação dos conceitos, a relevância da interdisciplinaridade e suas articulações com as áreas da História e da Música.

Boa leitura! E que possamos seguir na vigília por um país que defenda a sua cultura nacional e que entenda que a mesma possui uma dimensão política e emancipatória na vida de todas(os)...Afinal, apesar de você – felizmente – amanhã há de ser outro dia...!

Editora-chefe, Ester Liberato Pereira, Editor Adjunto, Rafael Dias de Castro, e Comissão Editorial.

Autor notes

Ligação alternative

https://www.periodicos.unimontes.br/index.php/caminhosdahistoria/article/view/6129/6138 (pdf)