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Apresentação - Dossiê Conflitos ambientais
Argumentos - Revista do Departamento de Ciências Sociais da Unimontes, vol.. 17, núm. 1, 2020
Universidade Estadual de Montes Claros

Dossiê

Argumentos - Revista do Departamento de Ciências Sociais da Unimontes
Universidade Estadual de Montes Claros, Brasil
ISSN: 1806-5627
ISSN-e: 2527-2551
Periodicidade: Semestral
vol. 17, núm. 1, 2020

Apresentação

Os estudos sobre conflitos ambientais no Brasil consolidaram um campo de investigação científica (Fleury, Barbosa e Sant?Ana Jr., 2018). É possível apontar algumas balizas estruturantes desse campo, a saber: a) os conflitos ambientais não são decorrentes de uma ?crise ambiental?; b) são os agentes sociais com distintos e assimétricos projetos e processos de apropriação simbólica e material do mundo, que no seu decurso, irrompem os conflitos ambientais; c) os conflitos revelados ou latentes expressam as assimetrias estruturais, as relações sociais de poder e dominação.

Com o advento da sociedade urbana industrial, houve intensificação da exploração das fontes de matéria e energia do planeta. O modelo hegemônico de produção e consumo, fundado no uso intensivo de hidrocarbonetos e na deflorestação, consolidou no século XX a referência de bem-estar material medido pelo nível de acesso a bens de consumo.

O câmbio climático, decorrente principalmente dos gases de efeito estufa, tem sido o tema dominante no debate sobre o futuro do planeta ou da crise ambiental. Todavia, como alerta Acselrad (2004, p. 13-14) a noção de crise ambiental não pode ser fetichizada, descolando-a das ?dinâmicas da sociedade e da cultura?. Isto é, são os agentes sociais por meio das ?formas sociais de apropriação e as diversas práticas culturas de significação? que objetivam o ambiente. As consciências ambientais não podem ser vistas como únicas, homogêneas, desistoricizadas.

O lugar (ESCOBAR, 2005) é central para a compreensão das múltiplas e diversas formas de apropriação simbólica e material do ambiente. O ?retorno ao lugar? significa a imperatividade da diferença contra o ?frenezi da globalização?. Em outras palavras, trata-se de reconhecer na investigação científica a obrigatoriedade da historicidade dos processos sociais em análise. Revelar o lugar em oposição ao ímpeto da objetividade dedutiva globalizante que oblitera, aniquila a diferença.

Nesse diapasão, os conflitos ambientais expressam contextos em que ?grupos sociais com modos diferenciados de apropriação, uso e significação do território? (ACSELRAD, 2004, p.26) têm ameaça a continuidade das suas formas de apropriação pelas consequências indesejáveis decorrentes da implementação de outra(s) prática(s). Zhouri e Laschefski (2010) propuseram o exame dos conflitos ambientais a partir de três categorias, a saber: conflitos ambientais territoriais, conflitos ambientais distributivos e conflitos ambientais espaciais. Os conflitos ambientais, assim, revelam, além das diferenças de apropriação, estruturas sociais de desigualdade de poder sobre o ambiente. Isto é, demonstram as iniquidades no acesso e uso dos ambientes, sejam as florestas, os campos de produção agrícola, os subsolos, as cidades, etc.

Os grandes empreendimentos públicos e privados de infraestrutura (estradas, exploração de petróleo e gás, barragens, hidrelétricas, linhas de transmissão de energia elétrica), agropecuários, industriais, extrativistas minerais, têm composto o contexto principal dos conflitos ambientais em países como o Brasil, Argentina, Chile, Peru, Bolívia, Equador, Colômbia, dentre outros. Gudynas (2015) oferece um amplo panorama da dinâmica e consequências ambientais do que ele denomina ?extractivismos? em suas modalidades direta e mediada. Trata-se da exploração intensiva, em larga escala, de recursos naturais. Seja diretamente, como por exemplo a mega-mineração e a pesca, seja de forma mediada como a agricultura de commodities. Zhouri, Bolados e Castro (2016) organizaram uma obra com vários artigos que retratam as lutas territoriais em contexto de neoextrativismo minerário na América do Sul. Isso implica por em tela as especificidades e também as recorrências da reorganização contemporânea de setores extrativistas, especialmente a mega-mineração, a agricultura de commodities e a pecuária de exportação. Tal contexto, econômico e político-ideológico, foi denominado por Svampa (2013) de consenso de commodities, caracterizado pelo aumento expressivo da demanda e do preço internacional de produtos agrícolas, pecuários e minerais.

O campo científico (BOURDIEU, 1989) dos conflitos ambientais é complexo. A remissão aqui a alguns fundamentos e balizas analíticas que o constituem, de longe não esgota o seu espectro. Apenas objetiva instigar o leitor a embrenhar pelas temáticas e abordagens presentes nos artigos que compõem este dossiê.

O artigo assinado por Luciano Félix Florit e Ana Lúcia Bittencourt, intitulado ?Conflitos em torno d?água em Santa Catarina: uma reflexão sob perspectiva ética socioambiental?, aborda decisões judiciais proferias pelo tribunal estadual daquela unidade da federação, envolvendo hidrelétricas e grupos sociais ribeirinhos. Fernando Rios de Souza e Herbert Toledo Martins apresentam o artigo ?Governança dos comuns e conflitos na gestão da bacia do Rio Itanhém no extremo sul da Bahia? analisa as ações do Comitê de Bacias Hidrográficas dos rios Peruípe, Itanhém e Jucuruçu (CBHPIJ), localizado no extremo sul da Bahia, Brasil. O artigo ?Conflitos ambientais no Norte de Minas Gerais: o 7º encontro da articulação dos vazanteiros em movimento?, escrito por Queite Marrone Soares da Silva e Rumi Regina Kubo, examina ações da Articulação Vazanteiros em Movimento em luta pelos direitos territoriais contra os Parques Estaduais: Verde Grande, Lagoa do Cajueiro e Mata Seca. Já o artigo apresentado por Maria Suellen Timoteo Correa, denominado ?Dinâmicas Territoriais e Saber Local em Torno de Conflitos em um Bairro Atingido pelo Desastre de 2011 em Nova Friburgo (RJ), analisa a participação social e política de populações atingidas reconstrução por catástrofes de chuvas na reconstrução de seus espaços de vida. Por fim, Ana Carina Sabadin aborda a construção social do ?problema ambiental? das queimadas nos canaviais paulistas no artigo ?Do fogo à fumaça: A construção social do problema ambiental das queimadas nos canaviais paulistas?.

Desejamos uma excelente leitura!

Referências

ACSELRAD, H. (org.). Conflitos ambientais no Brasil. Rio de Janeiro: Relume Dumará; Fundação Heinrich Böll, (2004).

BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.

ESCOBAR, Arturo. O lugar da natureza e a natureza do lugar: globalização ou pós-desenvolvimento?. Buenos Aires: CLACSO, 2005.

FLEURY, L. C.; BARBOSA, R. S.; SANT?ANA JR, H. A. Sociologia dos conflitos ambientais: desafios epistemológicos, avanços e perspectivas. Revista Brasileira de Sociologia, v. 05, p. 219-253, 2017.

GUDYNAS, Eduardo. Extractivismos: ecologia, economia y política de um modo de entender el desarrollo y la naturaleza. Bolívia: CEDIB, 2015.

SVAMPA, M. Consenso de los commodities y linguajes de valoración em America Latina. Revista Nueva Sociedad. N. 244, marzo-abril de 2013.

ZHOURI, A.; BOLADOS, P.; CASTRO, E. Mineração na América do Sul: neoextrativismo e lutas territoriais. São Paulo: Annablume, 2016.

ZHOURI, A.; LASCHESFKI, K. (org.). Desenvolvimento e Conflitos Ambientais. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010.

Notas

[1] Doutor em Sociologia, Professor do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Social, Professor do Programa de Pós-Graduação em Sociedade, Ambiente e Território, Pesquisador do Núcleo Interdisciplinar em Investigação Socioambiental. Universidade Estadual de Montes Claros-MG, Brasil. E-mail: romulo.barbosa@unimontes.br. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9226-2312.
[2] Doutora em Sociologia, Professora do Departamento de Sociologia, do Programa de Pós-Graduação em Sociologia (PPGS/UFRGS) e do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural (PGDR/UFRGS) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: lorenafleury@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9659-8630.


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