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Antônio Inácio, mais as suas circunstâncias
Argumentos - Revista do Departamento de Ciências Sociais da Unimontes, vol. 20, núm. 1, pp. 237-256, 2023
Universidade Estadual de Montes Claros

Argumentos Plurais

Argumentos - Revista do Departamento de Ciências Sociais da Unimontes
Universidade Estadual de Montes Claros, Brasil
ISSN: 2527-2551
ISSN-e: 1806-5627
Periodicidade: Semestral
vol. 20, núm. 1, 2023

Recepção: 19 Julho 2022

Aprovação: 15 Abril 2023


Este trabalho está sob uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-Não Derivada 4.0 Internacional.

Antônio Inácio Corrêa- Rua B, nº 39, vila São João

Antônio Inácio Correia é do gerais. Para quem não conhece gerais, isso diz pouco; para quem o conhece diz quase tudo, pois faz menção aos nativos dos campos abertos do Brasil interior, partindo das barrancas do São Francisco, tomando como limite sul o rio Abaeté. O gerais cria, desde pelo menos o século XVIII, um povo aguerrido, enquistado em seus campos, curioso de seus recursos e cioso do ofício de fazer do lugar meio de vida. Carmo Bernardes, certamente um dos autores que mais conheceu o Brasil Central, nasceu no Alto Paranaíba mas passou a vida escrevendo sobre as lembranças de sua morada no gerais: a pletora de recursos, a gratidão pelo alimento abundante, os ares sadios dos campos e a sociabilidade alegre do “vão”, tudo vindo dado, como uma graça recebida a cada dia em grandes doses, muito maior que aquilo que, depois, ele encontraria ao longo da vida. Rosa - outro que entendia bem desses assuntos - moldou Miguilim, Miguel e Pedro Orósio pela saudade sem fim do gerais nativo, fez nhô Augusto e Manuelzão encontrarem sua razão de viver exatamente nesses campos altos – “de onde vêm as boiadas e as lembranças”.

Então: vindo de lugar tão reputado, Antônio Inácio carrega essa legenda. Nasceu em 1939 e cresceu na vereda do Borrachudo, aonde bebia o legendário boi Bonito, que veio a dar nome ao lugar; foi barbeiro, comerciante e tropeiro, para depois se assentar como lavrador e, numa passagem quase acidental da sua biografia, se encontrar nas causas do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Januária - na diretoria, na linha de frente do enfrentamento duro com “firmas” e grileiros - então quase sinônimos - que assolaram o gerais dos anos 1970 a 1990.

Na luta ele construiu sua história, junto com a história de milhares de lavradores desapeados das chapadas e dos bons hábitos de “recursar”, “fazer soltas” e “botar brejo” no “refrigério” das veredas. Esta, na verdade, é uma luta ainda sem desfecho, porque 50 anos depois os geralistas se movem buscando o sonho edênico de re-unir brejo e chapada para juntar também terra vida, sociedade e família, que foram cindidas de maneira muito bruta. As causas da segunda década do século XXI, agora sustentadas por povos e comunidades tradicionais, justiça e academia, têm suas raízes nesses enfrentamentos da gênese do sindicalismo dos trabalhadores rurais. Certo: mudaram os métodos, que se formalizaram mais e se tornaram, talvez, menos abrangentes e utópicos. Mas cá, como lá, a luta revela que, sob a fachada que anuncia um agro tech e pop, permanece bem vivo o grileiro furibundo, atrasado e, quase sempre, muito bem armado.

Antônio Inácio ocupa um lugar destacado no patrimônio imaterial dos mineiros. Pertence ao quadro seleto de membros da mais preciosa geração de sindicalistas rurais que Minas Gerais criou, forjada na dura labuta da lavoura e mudada, rapidinho e sem escalas, para o embate com o latifúndio, num tempo em que justiça, polícia e sociedade, esta em franca maioria, se opunham a qualquer projeto camponês. Peculiar, nessa geração, é o fato de ser dotada de um conhecimento minucioso do local, que vem de berço, da vida na produção, do saber-fazer dos mais velhos, do ensinamento que só o convívio de todo-dia com a natureza transmite às pessoas. Forçada a entrar no campo-raso da disputa com latifúndio, grileiro e a turva aliança entre Estado, Sociedade e Justiça que sustentou a ditadura, essa geração aprendeu política de um modo muito especial: como rotina diária, como missão, como resistência camponesa, como diferencial entre o que era o humano e o que era a barbárie. Essa combinação de circunstâncias moldou sindicalistas com um pé no passado rural e outro no futuro planetário, com uma visão peregrina do seu lugar no mundo, que era, porém, alargada pelo bem vindo complemento das, e a solidariedade às, causas urbanas, nacionais e planetárias. Juntavam, como poucos outros conseguiram, o “diário” da roça com o ardor das utopias que colhiam das melhores matrizes, já que antes e no meio da política colocavam uma religiosidade nova, curiosa e desassombrada produzida pelas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). Criaram, assim, uma perspectiva muito peculiar da história e da luta que compunha uma formação pessoal que passou longe ou antecedeu em muito ao ensino formal, ao Partido, à escola de quadros. Eram dotados com um forte sentimento corporativo do qual sabiam extrair o galeio necessário para a boa negociação. Foi assim que teve origem a melhor geração e os melhores resultados alcançados pelo sindicalismo dos trabalhadores rurais.

Antônio Inácio perfilha ao lado dos grandes nomes que o movimento sindical rural de Minas Gerais produziu: Joaquim de Poté, Elói de São Francisco, Eva de Medina, Olímpio de Chapada do Norte, Vicente Nica de Turmalina, Tereza de Santa Rosa, Neném de Araponga, Francina de Poté, Ivo de Pompéu, Sílvio de Teófilo Otoni. Todos foram forjados na luta e no conhecimento local, tatearam pelo caminho à medida que o construíam, e foram críticos argutos, corajosos e implacáveis dos pelegos que o sindicato herdou do getulismo e do velho Partidão. A obra maior desse grupo, certamente, foi desenvolver as bases para um projeto camponês autonomista, uma utopia, entre tantas outras, abandonada pelos sindicalistas que vieram a ser formados já na sua esteira, e que voltaram ao velho corporativismo getulista para compreender o sindicato como meio de vida, como ferramenta de reivindicação estrita de previdência e saúde.

Antônio Inácio é parte nobre desse grupo. No entanto, agregou valor próprio à sua trajetória. O maior desses valores, certamente, é o apego à palavra escrita. Curioso de leituras e redações, juntou à militância sindical e, depois, à aposentadoria, a produção da crônica diária que reúne seus gostos pelo universal e pela minúcia do gerais. Nessa labuta já publicou material distribuído em pelo menos três livros: “Um lavrador no reino do latifúndio” (Editora Vozes, 1985), “Pioneiros do MST” (Editora Record, 2008) e “História do gerais (Editora UFMG, 2009). É esta faceta de Antônio Inácio que o periódico Argumentos agora traz ao leitor, com uma amostra de seus artigos dos últimos anos. Vivendo nos tempos que correm sua aposentadoria em Januária, para a nossa felicidade nunca recusa apresentar seus textos, sua pessoa e sua palavra em seminários e eventos acadêmicos.

Nesses, sempre que nos encontramos, lembro de uma passagem do começo dos anos 1990, numa viagem que fizemos pelo gerais com Carlinhos Dayrell. Em Vila dos Gaúchos, hoje Chapada Gaúcha, meio-dia-com-o-sol-quente, um grileiro se chegou num rompante: “-Você é Antônio Inácio? Pois: se continuar escrevendo no jornal que sou grileiro, vou te dar um tiro, pode ter certeza!” Ele respondeu então que atirasse ali, naquela hora tinha muita gente para admirar o espetáculo e depois dar a notícia. Aí o grileiro falou que não, a hora não era própria.

Comento sempre, de brincadeira, que se o grileiro tivesse atirado ele teria se dado bem, virava um mito do tamanho de Chico Mendes: e isso não teria sido bom? Nããão, de jeito nenhum! Antônio Inácio sempre responde; melhor ter ficado vivo: para celebrar com os amigos, para empurrar para o passado os rompantes de grileiros, para ter condição de continuar semeando utopias, nesses tempos tão distópicos.

Umas e Outras 105

Queremos anunciar que as histórias do Grande Sertão Veredas vão agora prosseguir com mais vigor. Conforme fomos procurados pelo secretário de educação de Bonito de Minas, Pedro Eugênio Bernardino, professor de história, e outros, para fazer um estudo com pessoas mais idosas da região e os demais interessados que viveram aquela história, e assim dar continuidade. É sabido que esta grande região, abrangendo o norte de Minas, parte dos estados de Goiás e Bahia, viveu um auge das tropas de animais de carga e carros de boi, tendo Januária o porto do rio São Francisco mais desenvolvido para aquela época, e Bonito de Minas encravado na principal rota de passagem para o Grande Sertão Veredas. Muito importante, porque muitas histórias aconteceram e pouco foram divulgadas.

Fui um dos pioneiros no auge dos acontecimentos, e estarei presente ao convite do professor amigo, que já nos ajudou quando era coordenador dos trabalhos de orientação pastoral da Diocese de Januária. Viajamos muitas vezes a região mais longínqua do Grande Sertão Veredas, ele pela Diocese e eu pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais. Antes disso, eu já era, desde criança e morando em Bonito de Minas, conhecedor das saudosas tropas de animais de carga e carros de boi, bem como depois trabalhei como comerciário em Bonito de Minas e no município de Formoso, onde também exerci a profissão de tropeiro, sendo comerciário ao mesmo tempo. O destino destas viagens eram sempre o porto de Januária, onde se comprava e vendia produtos da região. Tempo difícil, mas o povo daquele tempo era guerreiro. Enfrentamos muitas dificuldades sem deixar a peteca cair. Hoje o porto de Januária desativou, com os desmates e destruição das nascentes muitas secaram, e o nosso grande rio São Francisco sofreu as consequências, lhe tirando as condições de navegação. Estas histórias precisam ser contadas, para serem revividas pela população, para conhecer sobre o Grande Sertão Veredas, suas histórias, sua gente e sua cultura.

Antônio Inácio Correa, Rua B, 39- Vila São João- Nesta.

Umas e Outras 104

Vamos continuar nossas histórias do Grande Sertão Veredas, que atinge os estados de Minas Gerais, Bahia e Goiás. Por que nos outros estados não tem histórias idênticas? Morei e viajei nesta região por vários anos, e fiquei encantado com sua cultura, me deixando deveras admirado com tantas histórias. Basta dizer que nossa Januária já foi o centro comercial daquela grande região, no tempo que o rio São Francisco era o único meio de transporte que servia ao nordeste brasileiro. Eram usados o transporte de carro de boi e as tropas de animais, que viajavam dias e dias para chegar ao porto de Januária. Daí, consequentemente, o transporte fluvial de vapores, balsas e outros meios de transporte, mas não o transporte rodoviário, hoje dominante. Foi onde a cultura e a economia mudaram profundamente.

Naquela época a saúde era dominada pelos curandeiros e videntes, e a maioria da população nunca conheceu um médico. Os mais abastados às vezes chegavam a Januária-MG ou a Anápolis-GO, onde eram tratados às vezes também por videntes, que também encontravam objetos perdidos, roubados e desaparecidos. Hoje ainda há procura pelos videntes, mas com o crescimento dos recursos na saúde ficaram mais escassos. Mas a população idosa ainda procura recursos com os videntes, que não são os curandeiros, ou são ambas partes, como também. alguns médicos Quem não se lembra do vidente Zé Arigó, que operava olhos como se fosse um oftalmologista, com uma simples faca de cozinha, e ficava curado na hora? Mas parecia um milagre, considerando que o mesmo era semianalfabeto. Hoje, com todos os recursos existentes, ainda os hospitais e clínicas vivem cheios de gente, e aparecendo outras doenças, como o Covid 19 e várias outras. Só parece um castigo que Deus tem colocado, como um desafio para a humanidade tão materialista.

Estamos apenas fazendo uma avaliação de como era antigamente e como está sendo hoje, onde os maiores desafios estão sendo a saúde da população, onde tem sido criados tantos recursos em laboratórios no mundo todo e a saúde continua um desafio como sempre. Nossas homenagens a todos aqueles que lutaram e ainda lutam por defenderem a vida, não apenas por dinheiro, mas por fazer os doentes livres de tantas enfermidades que este mundo cão desafia. Há esperança em que poderemos viver em um planeta onde as doenças não mais proliferarão, já que este planeta terra continua desafiando nossa gente. O importante é acreditar que temos um grande defensor que sabe de tudo e pode nos conduzir a um mundo livre de tantas enfermidades.

Falar nisto vamos ficar por aqui e voltar o ano que vem com mais força, fé e coragem. Abraços deste companheiro de vocês.

Antônio Inácio Corrêa. Rua B, 39- Vila são João-Nesta.

Umas e Outras 100

Vamos prosseguindo as histórias.

Januária já teve injustiça. Recordamos a época do golpe militar, quando os pequenos produtores, pescadores e outros eram sempre discriminados e perseguidos. Enquanto os carvoeiros e empresas de reflorestamentos desmatavam, quase sempre ilegalmente, os pequenos eram multados e até presos por qualquer infração.

Naquela época eu era diretor do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Januária-MG. Milhares de pequenos produtores rurais nos procuravam para entrar com recursos de isenção de multas, e quase sempre eram deferidos pelas aberrações praticadas. Era uma guerra constante entre movimento sindical e IBAMA, este controlado pelo desgoverno militar.

Tão logo caiu este regime, apareceu em Januária um gerente do IBAMA conhecido por Raimundo Marques. O mesmo nos procurou propondo uma reunião, onde a proposta seria um trabalho em conjunto, em vez de ficarmos discordando um do outro. Em troca o IBAMA passaria a fazer um trabalho de educação ambiental e passaria também a fiscalizar os infratores, antes protegidos durante a gestão militar. Foi um momento importante, onde o sindicato passaria a fazer parte das reuniões juntamente com o IBAMA, educando a população rural na proteção ambiental, e o Sr. Raimundo mostrou-se ser uma pessoa leal. Assim fui escolhido pelo sindicato a acompanhar as viagens do Ibama em reuniões e trabalhos por este sertão afora.

Naquela época quase não tinha TV, mas o rádio tinha em todas as casas, mesmo no meio rural e assim conseguimos com a rádio um horário semanal, que foi um sucesso, chamado “A voz da natureza”, onde orientava os ouvintes em geral sobre educação ambiental, proteção aos animais, à terra e à natureza. Foi um trabalho muito importante e proveitoso, apesar de ter acabado. Até hoje muita gente ainda pergunta: por que acabou este programa e projeto tão educativo e proveitoso? Ocorre que no sindicato mudou a diretoria, o Ibama trocou o gerente. Para construir tudo é mais difícil, mas para acabar é muito mais fácil. Quando sai do sindicato fui trabalhar na prefeitura, e o Sr. Raimundo do Ibama requisitava um funcionário para acompanhá-lo, de preferencia que fosse eu, que já era seu conhecido e amigo. Conseguimos também com o jornal “O Estado de Minas”, que publicava semanalmente um ótimo trabalho sobre a proteção a natureza, que nos ajudou em muito com material de publicação e estudo. Este material vinha gratuito até o porte de correio.

Na próxima semana falaremos mais sobre o nosso trabalho de divulgação e comunicação ambiental.

Antônio Inácio Correa. Rua B-39, vila São João, nesta.

Umas e Outras 103

Prosseguindo nossas histórias vamos falar hoje sobre nosso sertão gerais e mais preciso sobre o Rio São Francisco. O Velho Chico, como é conhecido no Brasil e no mundo, era um rio bastante caudaloso, onde sua travessia era bastante difícil, mais ainda na época de chuvas, de outubro a junho. A travessia era feita por canoas e balsas, pois não tinha pontes, onde só o gado forte poderia atravessar em épocas de chuvas, e olha lá.

O gado que sumia era procurado por todos os cantos, e não era possível encontrar. Até que foi descoberto o Sr. Miguel do Carrasco, que poderia dar notícias onde estaria qualquer objeto desaparecido. O sr. Miguel era um vidente muito falado na região. Assim um parelho de bois carreiro do sr. Modesto sumiu do pasto e disseram a ele quem poderia dar notícias dos bois sumidos. Então o sr. Miguel falou que os bois desaparecidos estavam numa fazenda do outro lado do rio, mas estavam prestes a serem abatidos. Logo em seguida os bois foram encontrados justamente onde o sr. Miguel indicou.

Muitos casos como este aconteceram, como também alguns criadores da região do lado esquerdo do rio tinham mais de uma fazenda que servia para a retirada do gado todo ano durante as épocas de chuvas. Estas retiradas, que eram feitas uma vez por ano, passaram a serem feitas constantemente, e por onde estas boiadas eram conduzidas o gado dos criadores sumia cada vez mais. Os criadores do gerais mantinham grande parte do gado era criado na solta, os vaqueiros vigiavam constantemente e uns ajudavam os outros, mas todas as vezes que eram conduzidas estas boiadas retiradas o sumiço do gado do lugar acontecia cada vez mais. Assim, fortaleceram a fiscalização e não foi difícil a descoberta do motivo do sumiço do gado. Na ponte do rio Pandeiros, onde eram conduzidas estas boiadas com destino ao Urucuia, um grupo de criadores tomou grande parte do gado que estava sendo roubado na região de Bonito de Minas. Já tinha sido roubado muito gado desta e de outras regiões por onde passavam estas boiadas, que passaram a serem constantes.

O povo tinha que agir por conta própria, pois a polícia não tinha como ser acionada, visto não existir meios de transportes e nem estradas para acudir a tempo. Assim todo este gado que ia não mais voltava.

Vamos continuar mostrando nossas histórias do passado, que muitas vezes ainda não foram contadas. Muitas outras ainda estão por serem contadas.

Antônio Inácio Corrêa, Rua B, 39- Vila São João, Nesta.

Umas e outras 40

São fatos que acontecem e passam com o tempo, mas ficam. Há 30 anos passados vinha eu de BH, onde fui despachar assuntos do Sindicato na FETAEMG e outros órgãos. Notei na viagem de volta que alguém me pesquisava, como quem me conhecia, mas não aproximava. Ao chegar no Sindicato, uma senhora de idade avançada me procurou solicitando a minha ida com ela na delegacia de polícia, onde foi intimada. Como o advogado do Sindicato só atendia uma vez por semana, só eu e o companheiro Noé Viana acompanhávamos os filiados onde fosse preciso. Chegando lá, veja quem estava esperando? O dito cujo que me observava durante a viagem, que tinha se apresentado como gerente da fazenda do Dr. Antônio Luciano, localizada no Cochá, entre centenas de outras por este estado de Minas a fora.

Foi no momento apresentado uma queixa: que a intimada tinha invadido a referida fazenda e não quisera desocupar. Em dado momento pedi a palavra, e esclareci que conhecia e sabia do fato, que a reclamada era pessoa idosa de mais de 80 anos, que nasceu e criou no local, em terras de herança dos avós. Portanto, a mesma não era invasora conforme foi denunciada. Assim o delegado de polícia determinou que o referido gerente da fazenda me procurasse no Sindicato, providenciasse o transporte para irmos juntos e fizesse um relatório, a fim de tomar as devidas providências.

Fiquei na diretoria do Sindicato por vários anos após, e o tal gerente nunca mais apareceu. Estes fatos eram constantes e foi numa época muito conflituosa, onde os trabalhadores só tinha o sindicato como defesa.

Outras. Tenho participado de várias palestras sobre os problemas de conflitos no campo, onde alunos de universidades tem debatido com muito interesse sobre a invasão de empresas no campo e o consequente êxodo rural. Mais preciso nas décadas de 70 e 80, onde houve os incentivos da Sudene, que não preocupou com a situação do homem do campo. Mais preciso sobre os pequenos produtores, onde a maioria foram expulsos da terra.

Antônio Inácio Corrêa-Rua B,39~Vila São João- Nesta

Umas e Outras 102

Voltamos a falar sobre nossas histórias e muitos fatos que aconteceram e as vezes estão ainda acontecendo. Naquele tempo não existiam postos de saúde, ambulâncias e muitos outros benefícios, apesar que ainda existem muitas carências em nossa região. Morei no Grande Sertão Veredas ainda no tempo do carro de boi, tropas de animais nos transportes e convivi com todas estas dificuldades, onde vi muita gente sofrendo por falta de recursos sobre a saúde.

Naquele tempo os recursos eram mesmo os curandeiros e videntes que apesar de serem a maioria analfabetos, vários deles tinham o privilégio de prever as coisas, encontrar perdidos e muito mais. Aqui tivemos o sr. Miguel do Carrasco muito falado na região, onde é ainda comentado por seus conhecimentos, apesar de ser analfabeto conforme diziam.

Um médico, dos primeiros que vieram atender em Januária, queixava que iria voltar pois não achava clientes. Mas falavam para ele que o povo do lugar estava sendo atendido com o sr Miguel do Carrasco. Sabedor que o mesmo não era formado em medicina, o médico procurou a polícia para prender seu Miguel por exercer a profissão sem a devida competência. A polícia ficou escondida próximo da casa de seu Miguel, e passada meia hora iria flagrar o fato esperado. Ocorre que o médico ao chegar chamou: Ô de casa! E seu Miguel respondeu: o sr. por aqui Doutor, é um milagre! Como sabe que sou doutor? Quando o senhor saiu de Januária para vir me prender eu já sabia. Cadê a polícia que o senhor deixou escondida? O médico deu meia volta e avisou a polícia que ficasse quieta, não mexesse com aquele homem.

Esta história é contada até hoje por pessoas mais idosas. Conheci o sr. Geminiano de Várzea Bonita, Abdias Ornelas de Formoso-MG. Este, além de preparar remédios caseiros, atendia numa farmácia com precisão, com receita de encaminhamentos cirúrgicos, e vários outros heróis do sertão. Entre estes existiam também os feiticeiros e e vigaristas que exploravam o povo de boa fé, que tinha de tudo e era perigoso comentar tais fatos. No livro do Sr. Joaquim Borges Carneiro, irmão de Dr. João Borges Carneiro, conta muitas histórias do Sr. Gercino Teixeira Muniz, que era vidente e conseguia prever muitos fatos que foram acontecidos naquela região, não na área da saúde, mas entre outros: pegar animais bravios e prendê-los em campo aberto sem nenhum cercado. Em nosso sertão tem muitas histórias a serem contadas e conhecidas, muitas delas não foram ainda historiadas, estão sem o conhecimento da população. Vamos continuar contando nossas histórias após serem justificadas, é claro.

Antônio Inácio Corrêa. Januária-Nesta

Umas & outras 26

Vamos dar continuidade as nossas histórias carecidas de resgates e hoje vamos falar sobre as lutas da fazenda Casa de Telhas, situada a margem esquerda do rio Peruaçú. Lá, 96 famílias de camponeses cultivavam e criavam seus animais, onde esta fazenda era considerada terras devolutas. Assim, estes que já ocupavam a área há muito tempo, procuraram legitimá-las pagando na Ruralminas as taxas de medição e legitimação. Ocorre que um grupo de grileiros, interessado na mata do Cerrado para fazer carvão, colocou vigias no local para impedir a continuidade da posse dos legítimos ocupantes, os posseiros.

Inconformados, estes arranjaram um caminhão e pegaram os pertences dos vigias para despejar na porta da delegacia de polícia de Januária. Não foi aceito, mas foi despejado em frente da casa do chefe dos vigias, que era aqui de Januária. A reação dos grileiros foi violenta, invadindo esta fazenda com 40 jagunços fortemente armados, cortando arames, atirando e matando os animais dos camponeses.

Diante da difícil situação, o Sindicato, que já vinha acompanhando os fatos, fez a urgente denúncia a nível municipal, estadual e nacional, pedindo urgentes providências. Como aqui ainda não tinha o batalhão de Polícia Militar, um contingente do batalhão de Montes Claros chegou junto e botou a turma de bandidos pra correr. Não satisfeitos, os grileiros adentraram na justiça requerendo reintegração de posse, mesmo os documentos exigidos serem de outra fazenda, que nem limitava com esta.

Enquanto isto fomos a BH, ver na Ruralminas como estava o processo de legitimação requerida pelos posseiros, onde apresentamos os comprovantes de requerimentos de legitimação feito anos passados. Prometeram solucionar o caso dentro de 15 dias, e já faz mais de 20 anos, nunca apareceram. Este processo terminou quando o IEF criou a APA (Area de Proteção Ambiental), e os posseiros continuam somente criando, mas vigiados.

Esta história é bastante longa, ela foi sintetizada para que fosse contido somente o máximo de objetivo.

OUTRAS-1ª De acordo com nossas pesquisas no blog PHA, a rede Globo, FHC e a FIFA juntos, praticaram crime contra o sistema financeiro nacional, envolvidos com a empresa do paraíso fiscal do Panamá, Panamá Paperis. Segundo a denúncia feita ao Procurador Geral da República Rodrigo Janot, há mais de um ano, assinada por mais de 30 deputados federais, é crime de lesa pátria. Duas cobranças de providências já foram feitas e sem respostas até então, tudo indica que estão cozinhando na panela do esquecimento e da impunidade, como sempre. 2ª O traíra que desgoverna o país está na calada da noite entregando mais um patrimônio ao capital estrangeiro, no focinho do P.G. que não vê nada. Desta vez foi a empresa de gás, que custou ao povo brasileiro bilhões de dólares, como foi feito com a Vale, avaliada por 98 bilhões e entregue por apenas 3 bilhões. Cadê a diferença, para onde foi? 3ª Segundo as denúncias sobre as matanças nos presídios ultimamente acontecidas, a maioria são de presos sem julgamento e por crimes comuns que já deveriam estarem livres, ou seja, presos além do prazo. Preto e pobres viram traficantes, e brancos e ricos traficantes viram empresários. Esta é a cara da justiça mais cara do mundo. Cadê os 500 kilos de cocaína no avião de Zezé Perrela? Quem é o dono? E onde está preso?

Antônio Inácio Corrêa e membro da comissão dos Direitos Humanos

Rua B, nº 39- Vila São João- Nesta.

Umas & outras 22

Dando continuação ao trabalho de divulgação de nossa história iniciada na semana próximo passada, vamos abordar sobre a fazenda Bois, nomeação local, localizada na fazenda geral Larga, umas das maiores fazendas do estado de Minas e onde houve vários conflitos pela terra.[1]

Lá tinha grupo de pistoleiros contratados por grileiros de terra, onde até festas escolares foram invadidas e impedidas, como também casas dos moradores invadidas e queimadas, onde os moradores dormiam no mato e alguns foram vitimados por tiroteios. A disputa pela terra era tão acirrada que chegou os mesmos grileiros a brigarem uns com os outros, disputando a mesma terra entre si, onde haviam requerimentos de usucapião da mesma área, e a maioria não tinha posse, mas insistiam, dizendo que os verdadeiros posseiros e pequenos proprietários eram os invasores. Aquele povo nasceu e criou por lá e conheceram seus avós que já moravam lá.

Muitos assinaram documentos enganados, até que a diretoria do Sindicato começou a andar por lá em trabalho de filiação social e averiguação dos fatos pois as queixas eram constantes. Assim começamos a orientar o povo a não assinar documentos sem o conhecimento do sindicato. Começamos a denunciar as violências e trapaças dos grileiros na imprensa local, na justiça, na FETAEMG, CONTAG, CUT e movimentos pastorais, como a CPT. Começamos também a levar grupos de trabalhadores(as) para as reuniões, congressos e seminários em Montes Claros, Belo Horizonte e Brasília, para os mesmos sentirem a força do movimento, denunciarem seus problemas e conhecerem a troca de experiência com outras regiões.

Abraçamos a luta dos trabalhadores do campo não só da fazenda Bois, como outras existentes na região, inclusive em convênio com municípios e sindicatos vizinhos, onde conseguimos vencer muitas batalhas consideradas perdidas. O que tinha muito também era o trabalho escravo, onde muitas empresas de reflorestamentos, carvoeiras e agropecuárias não registravam seus empregados e nem pagavam direitos trabalhistas e usavam de jornadas de trabalho extenuantes. Tudo isto à revelia dos órgãos públicos, que no tempo do golpe militar não fiscalizavam as empresas e fazendas, e o sindicato tinha um trabalho volumoso para encaminhar. O Ministério do Trabalho era utopia, nunca aparecia, os sindicatos naquela época eram mal vistos e mal recebidos, eram considerados grupos de comunistas, prejudiciais a sociedade burguesa.

Com todas estas denúncias, começamos a ser ouvidos quando a superintendência do INCRA-MG nos convocou para uma reunião com um grupo de trabalhadores das áreas de conflitos, que iria acontecer em BH na sede do INCRA com outros grupos de todo estado. Levamos 14 companheiros(as) da fazenda Bois e fazenda Picos, sendo que esta reunião começou as 8 horas e, segundo o número de participantes, fomos chamados na parte da tarde. Região de Januária está presente? Está sim! Onde apresentamos e ouvimos o seguinte relatório da inspeção antes requerida: fazenda Bois e fazenda Picos não vai haver assentamento porque não tem área compatível e nem pessoas na área. Protestamos na hora e apresentamos o cadastro de 186 famílias, mais de mil pessoas, posseiros na fazenda Bois e 68 famílias na fazenda Picos, igual a 300 pessoas, como também cópia da certidão da área, quase 200 mil hectares na fazenda Bois e 9 mil na fazenda Picos. Fazenda Bois localizada na fazenda geral Larga, considerada a maior fazenda geral do estado de Minas. Exigimos também no ato uma nova inspeção com a presença da diretoria do Sindicato e de posseiros interessados, o que não tinha ocorrido na outra inspeção anterior, se é que houve.

Esta é uma pequena parte da história. Vamos com a possibilidade de colocar ao conhecimento da sociedade muitas outras, que estão caindo no esquecimento ou nunca foram divulgadas.

Antônio Inácio Corrêa e membro da comissão dos Direitos Humanos.

Rua B, 39- Vila São João- Nesta.

Umas e Outras 94

Mais uma publicação de histórias Januária já teve. Desta vez, sobrou para o Sindicato dos Trabalhadores Rurais, fundado em 25/10/1971. Preso nas normas do golpe militar de 64, este sindicato foi criado pela mídia com propósito de tentar mostrar que a classe tinha representação legal, mas não podia desempenhar seu objetivo legal. E foi assim até a caída do golpe militar, onde os sindicatos do país todo puderam se organizar e defender os direitos dos respectivos trabalhadores.... Nesta época as grilagens de terra, o trabalho escravo e a consequente expulsão dos camponeses da terra gerou muitos conflitos e até mortes no campo. Também os direitos dos trabalhadores eram desrespeitados constantemente por empresas rurais, as empresas de reflorestamentos, carvoeiras e agropecuárias, que dominavam em todo país. Neste caso, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Januária tornou-se um dos mais atuantes da região, onde era constantemente convidado e convocado a participar de congressos, seminários e encontros por todo Brasil.

Nosso sindicato criou núcleos de base que eram conhecidos como Delegacias de Base, seus componentes eleitos em assembleias locais, devido aos constantes conflitos. Estes delegados de base eram levados a congressos, seminários e encontros em muitos pontos do país. Quando me lembro que no congresso da CUT no Rio de Janeiro levamos 20 deles para tomarem pé no movimento sindical nacional. Foram dezenas de vezes que participamos por este país a fora, onde eles tinham uma ajuda de custo de acordo a arrecadação dos filiados locais, já que participavam da filiação e arrecadação. As reuniões da diretoria nas comunidades eram programadas mensalmente, até em municípios vizinhos que ainda não tinham sindicato. Foi uma revolução no campo em resposta as ações do golpe militar que criou muitas injustiças neste Brasil a fora. Muitas histórias já foram publicadas na imprensa local e de fora, e tem muitas outras para serem publicadas.

A diretoria ficava às vezes quase um mês sem ir em casa, devido tantos compromissos agendados e os constantes problemas para serem atendidos na sede. Hoje tudo mudou, para não dizer acabou, pois centenas de compromissos foram deixados de comparecer, e encaminhar, ficando as soluções sem providências.

Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Januária, quem te viu e quem te vê. Lá nasceu os direitos humanos, o Partido dos Trabalhadores e várias associações rurais que recebiam apoio do Sindicato, da CPT, do CAA, da Fetaemg e de vários outros órgãos ligados ao movimento sindical e pastoral... Nascer de novo seria um milagre.

Antônio Inácio Corrêa. R, B,39-Vila São João, Nesta.

Umas & outras 21

Desta vez, vamos contar um pouco de nossa história que muitas vezes vai perdendo no tempo por falta de resgate e até interesse dos protagonistas. Não que vamos esquecer ou deixar de abordar os acontecimentos políticos esquecidos de propósito pelo PIG, pois temos um compromisso com a verdade e se não falarmos as pedras falam. Na minha longa caminhada, os que mais destacaram foram os tempos no movimento sindical e comunitário.

Em 1981, quando assumi com meus companheiros a diretoria do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Januária, em plena ditadura militar, a situação era considerada calamitosa, pois os conflitos pela terra eram constantes, perigosos e desiguais, quando eram implantados projetos de reflorestamentos, agropecuários, de carvoeiras e outros. Além da violência dos grileiros de terra através de pistoleiros contratados, vinha também as falcatruas no forjamento de documentação da terra, muitas vezes com o apoio dos poderes públicos, sem falar no trabalho escravo reinante. Grande parte da população das fazendas eram trabalhadores responsáveis pela produção de alimentos e a criação do gado. No imenso gerais, as terras públicas e particulares foram legitimadas para empresas de fora através da Ruralminas nos governos golpistas de Rondon Pacheco, Magalhães Pinto e Francelino Pereira, agentes do golpe militar que abandonaram e contribuiu com a expulsão do homem do campo.

Estas empresas, principalmente as de reflorestamentos, após aterrar as nascentes, destruir a fauna e a flora, logo depois abandonaram os projetos, e os habitantes que nelas moravam e produziam foram expulsos para as periferias das cidades criando problemas sociais gritantes. Enquanto isto os dirigentes sindicais eram muitas vezes ameaçados de morte como aconteceu com nosso companheiro Elói Ferreira da Silva em São Francisco e em muitas regiões do estado e do país. Se formos contar histórias e fatos acontecidos daria para escrever vários livros, onde passaremos a partir de então levar ao conhecimento do leitor. Nossa intenção é resgatar muitas histórias que estão caindo no esquecimento, onde hoje o movimento sindical tornou-se agente do poder público, que não mais acompanha as lutas e demandas do trabalhador, e acabou a ideologia e o compromisso.

OUTRAS.-1º Você sabia que o jogo Atlético mineiro X Grêmio que iria ser sorteado as 9 horas, e 4 horas antes a Globo já noticiou o resultado? Vazamentos é o forte para a Globo, ainda mais de quem, a CBF, parceiros de muitas falcatruas. 2º Segundo PHA, o mundo hoje acompanha o projeto PEC 241, e até o Papa pronunciou como pode faltar dinheiro para os projetos sociais e sobrar para os banqueiros especularem. 3º- O propinoduto do metrô de São Paulo contém 15 inquéritos concluídos e milhares de documentos queimados, sendo envolvidos 4 governos tucanos paulistas. Até agora os procuradores estaduais, nem o MPF fizeram nada, nem a lava jato ou STJ se manifestaram contra os corruptos e corruptores. 4º Segundo o blog de PHA, em vários estados onde os governos são tucanos, vários colégios estão atacados pela polícia estadual contra ocupações e até escolas particulares. Segundo o LULA e ainda efeitos do golpe que não respeita a constituição e nem o estado de direito. 5º-Segundo o blog PHA, em 1955 um golpe estava sendo planejado; Juscelino não podia ser eleito, se eleito não podia tomar posse e se tomasse não podia governar conforme ordens de fora. Assim o Mal. LOTT colocou o exército nas ruas e nada de golpe. Em 64 e nem agora não teve LOTT.

A história do gerais

Extraído do livro “A história do gerais” do professor Eduardo Ribeiro (UFMG), do qual sou parceiro, podemos conhecer as transformações políticas, sociais e econômicas que o nosso gerais sofreu. Sai da escola Caio Martins em Januária, e por falta de condições econômicas fui trabalhar em um armazém no município de Formoso-MG. Naquele tempo as mercadorias eram ainda transportadas em tropas de animais de cargas, onde conheci de perto a vida daquele povo do gerais, que apesar do abandono, produziam de tudo para vender no porto de Januária. As viagens eram mais intensas na época em que as chuvas diminuíam, pois tinha muitos córregos e aguadas que dificultavam o trânsito em épocas chuvosas.

A partir da década de 1970, em pleno golpe militar, apareceram os grileiros de terra, expulsando os posseiros, pequenos produtores e pequenos proprietário do campo, gerando o êxodo rural sem precedentes. As terras públicas e de ausentes foram tituladas para empresas de reflorestamentos e carvoeiras que destruíram o cerrado, aterraram as nascentes como também a fauna e a flora. Assim o povo do gerais mudou para as cidades gerando desemprego e uma migração e miséria. Com isto também os rios secaram, onde o resultado podemos notar com o rio São Francisco, sem poder manter a navegação porque não tem mais água suficiente. Foi um desastre econômico e social para a região.

Enquanto isto, as empresas que tomaram as terras do gerais, abandonaram tudo e hoje podemos ver cemitérios destas, abandonadas. Aquele monte de dinheiro financiado pelo IBDF deveria ter sido investido em políticas públicas para aquele povo sofrido do gerais, e os grandes prejuízos ambientais não teriam sido acontecidos. Hoje com os projetos sociais de Luz para Todos, Mais Médicos, Minha casa minha vida e muitos outros, o povo que não se adaptou na cidade está voltando para o gerais, mas as terras na maioria estão improdutivas e nas mãos das empresas que abandonaram os projetos. O pior que aqueles que apoiaram estes desastres ambientais estão querendo a todo custo voltar ao poder, apoiados pelos grandes meios de comunicação.

Antônio Inácio Corrêa- Membro da Comissão dos Direitos Humanos.

Rua B 39- Vila São João, nesta.

Uma história de bonança

Bonança é uma comunidade hoje no município de Ibiracatú-MG, que antes pertencia a comarca de Januária, MG. Lá existia um grupo de 80 famílias de posseiros, aproximadamente com 400 pessoas que viviam da lavoura e pequenas criações, até que grileiros entenderam de expulsá-los mediante despejo judicial, após várias ameaças. Ocorre que naquele tempo quem tinha um documento na fazenda geral se sentia no direito de tomar a terra de outros, inclusive os posseiros e terras devolutas e de desconhecidos.

Assim os posseiros da comunidade de Bonança foram intimados judicialmente a desocupar suas moradias e plantações, sem ter o cuidado de verificar se realmente as terras requeridas na mesma fazenda eram as mesmas onde moravam os posseiros. O despejo foi marcado para o dia tal, e 2 dias antes nós do Sindicato, através de aviso sigiloso, ficamos sabendo, onde o presidente do sindicato na época, Noé de Paula Viana acionou a FETAEMG com os dados necessários. Os posseiros não conseguiram as providencias a tempo, mas no momento do despejo, com o aparato militar presente, o oficial de justiça acabava de receber um despacho do tribunal impedindo o referido despejo.

Foi uma vitória importante para o movimento sindical, mas infelizmente muitos outros despejos fraudulentos já tinham ocorrido na região. Nesta época eu estava iniciando meus trabalhos na diretoria do Sindicato, onde me faz lembrar de um juiz de direito nesta comarca, chamado fulano de tal Fontenelli, que após fazer vários despejos em ocupações de terra, foi à estação de rádio local para gabar-se, dizendo que sem terra para ele não tinha vez. Este famigerado juiz merecia um mandado de segurança contra ele.

Antônio Inácio Corrêa,Ex sindicalista, Rua B, 39-Vila são João-Nesta.

Participamos do IX Festival de Convivência com o Semiárido do Norte de Minas, em São Francisco-MG no dia 3/9/2017, patrocinado pela Diocese de Januária, onde fizeram presentes várias comunidades da região. Houve apresentações folclóricas dos quilombolas, tribo Xacriabá e outros, como também oficina de debates sobre as lutas e sobrevivência do povo da região do Norte de Minas.

O que mais me marcou foi a resistência dos quilombolas, posseiros, geraizeiros e outros povos típicos da região, que ainda resistem além da seca, à expulsão do camponês de seu torrão. Quem viaja as margens do rio São Francisco, percebe que onde ainda existe água e as melhores terras estão debaixo da cerca do latifúndio improdutivo. Onde se vê os cancelões com cadeados e uma grande placa com os dizeres: Proibido a entrada. Será porquê? Estas terras estão totalmente documentadas, e cumprindo a função social? Claro que não, onde a maioria de seus pretensos donos moram em outras regiões, talvez na capital. E quando muito fazem grandes desmates para semear o capim, e destruindo a fauna e a flora. Nas décadas 70 e 80 houve uma grande invasão de empresas de reflorestamentos, carvoeiras e agropecuárias incentivadas e financiadas pela Sudene e Ruralminas. Até o gerais, que já era povoado e produzia muito, foi invadido e logo depois abandonado. Onde sua população foi na maioria expulsa da terra.... Hoje estamos importando até farinha de mandioca, que era a fartura da região, está sendo importada do Paraná. E muito mais. Nossa região de exportadora hoje importa de tudo, justamente por causa do latifúndio improdutivo que expulsou o homem do campo.

Antônio Inácio Corrêa- Rua B, nº 39, vila São João

Notas

[1] “Fazenda geral” é uma instituição costumeira e peculiar da sociedade agrária do município de Januária e de parte do gerais. Consiste numa grande delimitação espacial que abarca aguadas, áreas de solta, reservas comuns, pequenas unidades produtivas familiares e grandes unidades patronais. É uma vasta área bem delimitada que compreende um conjunto variado de instituições e direitos fundiários, como sítios, posses, fazendas, direitos de coleta, extração, “retirada” e solta de gado.

Autor notes

i Agricultor, foi presidente do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Januária. Autor do livro “Um lavrador no reino do latifúndio” e de capítulos dos livros: “Pioneiros do MST” e “História dos Gerais”.
ii Professor do Instituto de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil e do Programa de Pós-graduação Associado UFMG-Unimontes em Sociedade, Ambiente e Território (PPGSAT) Integrante do PPGSAT, Economista e Doutor. E-mail: eduardoribeiromacuni@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4330-2346

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