Secciones
Referencias
Resumen
Servicios
Descargas
HTML
ePub
PDF
Buscar
Fuente


Para uma introdução à tese do capitalismo dependente no pensamento de Florestan Fernandes
Argumentos - Revista do Departamento de Ciências Sociais da Unimontes, vol.. 16, núm. 2, 2019
Universidade Estadual de Montes Claros

Dossiê

Argumentos - Revista do Departamento de Ciências Sociais da Unimontes
Universidade Estadual de Montes Claros, Brasil
ISSN: 1806-5627
ISSN-e: 2527-2551
Periodicidade: Semestral
vol. 16, núm. 2, 2019

Recepção: 31 Julho 2019

Aprovação: 28 Agosto 2019

Resumo: Este artigo tem como objeto o debate teórico referente à condição de inserção dependente da América Latina na dinâmica de mundialização do modo de produção capitalista. Objetiva-se discutir a vertente interpretativa do capitalismo dependente na obra de Florestan Fernandes. Para tal, analisar-se-á a tese de Fernandes a partir da obra Capitalismo dependente e classes sociais na América Latina (1973), buscando compreender o contexto histórico das décadas de 1960 e 1970 no qual o autor desenvolveu sua leitura sobre o caráter da dependência latino-americana. Partiremos de uma abordagem metodológica que analisa as linhagens e trajetórias da construção do pensamento político brasileiro, considerando a relação entre história, teoria e prática política.

Palavras-chave: Capitalismo dependente, América Latina, Subdesenvolvimento, Pensamento Político Latino-Americano, Pensamento Político Brasileiro.

Resumen: Este artículo tiene como objeto el debate teórico sobre la condición de inserción dependiente de América Latina en la dinámica de mundialización del modo de producción capitalista. Se objetiva discutir el aspecto interpretativo del capitalismo dependiente en la obra de Florestan Fernandes. Con este fin, se va a analizar la tesis de Fernandes a partir de la obra Capitalismo dependiente y clases sociales en América Latina (1973), buscando comprender el contexto histórico de las décadas de 1960 y 1970 en el que el autor desarrolló su lectura sobre el carácter de dependencia latinoamericana. Partiremos de un abordaje metodológico que analiza los linajes y trayectorias de la construcción del pensamiento político brasileño, considerando la relación entre historia, teoría y práctica política.

Palabras clave: Capitalismo dependiente, América Latina, Subdesarrollo, Pensamiento político latinoamericano, Pensamiento político brasileño.

Abstract: This article focuses on the theoric debate about Latin America?s dependent insertion on the dynamics of mundialization of the capitalist mode of production. The aim is to discuss the interpretative strand of dependent capitalism on Florestan Fernandes? work. In this sense, the analysis will focus specifically on Fernandes? thesis developed on the work ?Dependent Capitalism and social classes in Latin America? (1973), aiming to understand the historical context of the 60s and 70s, when the author developed his interpretative strand about Latin America dependency. The focus will be on the metodology that analyses the interpretative strands and ways of the construction of the Brazilian Political Thinking, considering the relation between history, Theory and political praxis.

Keywords: Dependent Capitalism, Latin America, Underdevelopment, Latin American Political Thinking, Brasilian Political Thinking.

Introdução

A apreensão das particularidades do capitalismo dependente na América Latina é uma temática sobre a qual diversos estudiosos se debruçaram durante o século XX. Podemos destacar que esse objeto, entre outros temas, norteou grande parte do desenvolvimento do pensamento social e político latino-americano. Neste trabalho, partimos do recorte da contribuição de Florestan Fernandes para compreensão do capitalismo dependente, levando em consideração a ligação entre a produção do pensamento social e os condicionantes temporais e geográficos que os particularizam.

É importante considerar a singularidade da análise das relações de dependência a partir da perspectiva de estudiosos que vivenciaram as especificidades das sociedade de classes típica do capitalismo dependente latino-americano. A análise feita por pesquisadores latino-americanos sobre o capitalismo dependente ?envolve a adoção da perspectiva crítica oferecida pela própria sociedade subordinada; particularmente a perspectiva daqueles que são subordinados, na sociedade subordinada? (IANNI, 1974,

p. 171) e pode ser compreendida como o equivalente ao ?aprofundamento da análise do imperialismo, vista da perspectiva do país subordinado? (ibid., p. 176).

Atentando a esse recorte, no Brasil, o século XX configura um cenário marcado por diversas mudanças na dinâmica social, econômica e política: urbanização, industrialização, complexificação da dinâmica política e do aparelho burocrático de Estado, entre outros processos que norteiam o período no país. Essas transformações influenciaram a produção teórica dos principais intérpretes do Brasil e, por consequência, estiveram fortemente ligadas ao processo de institucionalização das ciências sociais brasileiras, principalmente a partir do final da década de 1930. De maneira genérica, se no final do século XIX visualizava-se uma forte influência de arcabouços teóricos positivistas e evolucionistas advindos da Europa na construção das primeiras interpretações sobre o Brasil, a partir de uma chave negativa, na década de 1930 há uma inflexão crítica a partir da qual alguns intelectuais passam a ler o Brasil considerando as especificidades de sua formação socio-histórica (LYNCH, 2013).

Assim, segundo Lynch (2013) entre 1930 e 1970 teria emergido um paradigma nacionalista periférico na produção do pensamento político-social brasileiro. Nesse momento teria ocorrido uma mudança no modo de conceber o lugar da produção intelectual dos países periféricos no mundo a partir da crítica às concepções evolucionistas unilineares que marcaram as interpretações anteriores sobre o Brasil. A emergência de um paradigma cultural nacionalista teria sido elemento central para explicar essa inflexão que colocava para as ciências sociais a tarefa de decifrar as particularidades da nossa formação socio-histórica. Era necessário pensar o que diferenciava a dinâmica do nosso capitalismo em relação ao capitalismo central. Esta problemática se conecta com a institucionalização das ciências sociais em curso nesse contexto, expressando-se na produção teórica de algumas instituições, como o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) e a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (FFCL-USP). Esse momento inicia uma produção do pensamento brasileiro que não possuía mais um caráter autodepreciativo.

Nesse ínterim, o processo de institucionalização das ciências sociais sofria forte influência das transformações em curso na realidade brasileira, trazendo para o cerne da pesquisa sociológica os dilemas específicos da dinâmica social, econômica e política dos países latino-americanos. Inserido nessa tradição, no âmbito da FFCL-USP, estava ? entre outros estudiosos - Florestan Fernandes, um dos teóricos que contribuiu com a consolidação do pensamento sociológico no Brasil. O autor possui uma vasta obra, desenvolvendo pesquisas com rigor metodológico que abrangem diferentes temáticas: desde a sociedade tupinambá, a participação do negro na formação da sociedade brasileira, explicação sobre o caráter do subdesenvolvimento latino-americano, entre outras. Segundo Cardoso (1996), Fernandes analisa essa última problemática, a partir da formulação rigorosa do conceito de capitalismo dependente.

É sobre esse núcleo do trabalho de Florestan Fernandes que nos debruçaremos neste artigo: sua análise sobre o caráter dependente do capitalismo latino-americano. Isso pressupõe compreender o contexto no qual o autor começa a refletir sobre as questões que envolvem mudança social, subdesenvolvimento e capitalismo, que vinham sendo debatidos por diferentes teóricos latino-americanos no do final da primeira metade do século XX. De maneira específica na trajetória teórica de Fernandes, sua produção insere-se no debate e crítica ao desenvolvimentismo a partir da década de 1960.

A partir desse período, as produções do autor passam a constituir uma contribuição para a compreensão do caráter dependente do modo de produção capitalista aqui constituído e, por consequência, a dinâmica particular da sociedade de classes. Diversos estudiosos também se debruçaram sobre essa questão no período analisado, constituindo um grande debate em torno das diferentes interpretações sobre o subdesenvolvimento, como os trabalhos produzidos no âmbito da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) e posteriores produções.

As décadas de 1950, 1960 e 1970 constituíram um período de ebulição no que diz respeito aos debates teóricos sobre os rumos do desenvolvimento latino-americano. No seio da esquerda do nosso país, isso implicava no debate do caráter da revolução brasileira. Caracterizar os elementos da nossa formação econômica, histórica e social é elemento central para construção da teoria revolucionária que guiaria as lutas naquele período. Esses grandes debates são uma marca desse momento histórico, diante dos desafios colocados para a esquerda brasileira que vivenciava uma Ditadura Civil e

Militar.

Posteriormente, esse debate perdeu espaço no seio da produção acadêmica no nosso país. Tornaram-se cada vez mais escassas pesquisas que se debrucem sobre o debate do capitalismo dependente, do subdesenvolvimento, do imperialismo e das relações centro-periferia. Daí a necessidade de retomar no âmbito acadêmico as reflexões sobre essas temáticas. Ainda mais, diante das ameaças à democracia e à soberania nacional que vivenciamos hodiernamente. Temos a tarefa de compreender o passado para lidar com os desafios que estão sendo enfrentados no atual período.

Reiteramos a importância da escolha de desvendar o lugar do capitalismo dependente na obra de Florestan Fernandes, contribuindo com as pontes e com os possíveis diálogos da tese do autor com outros intérpretes do tema. Isso porque há uma ausência de menção à tese de Florestan Fernandes na retomada contemporânea da Teoria Marxista da Dependência (TMD). Visualiza-se uma narrativa que não menciona as possíveis relações entre a tese de Fernandes e os demais autores da TMD que lhe foram contemporâneos (Ruy Mauro Marini, Vânia Bambirra, Theotonio dos Santos e outros). Além disso, o Florestan dependentista não é mencionado quando se trata da Escola Sociológica Paulista. Destarte, retomamos a tese de Florestan Fernandes sobre o capitalismo dependente na América Latina, tendo em vista sua contemporaneidade e relevância para compreensão dos dilemas hodiernos da sociedade brasileira.

Nesse sentido, neste artigo analisar-se-á a tese de Fernandes sobre capitalismo dependente a partir dos artigos Padrões de Dominação Externa na América Latina (1973 [1970]) e Classes Sociais na América Latina (1973 [1971])[3], publicados na obra Capitalismo dependente e classes sociais na América Latina (1973), buscando compreender o contexto histórico das décadas de 1960 e 1970 no qual o autor desenvolveu sua leitura sobre o caráter da dependência latino-americana[4]. Partimos de uma abordagem metodológica que analisa a trajetória da construção do pensamento político brasileiro, considerando a relação entre história, teoria e prática política. Para tal, o texto organiza-se em dois momentos, além da introdução e das considerações finais. No primeiro momento, objetivamos caracterizar brevemente o cenário no qual emerge o debate sobre o desenvolvimentismo no Brasil e a crítica a ele construída. No segundo momento, buscamos analisar o lugar do capitalismo dependente na obra de Florestan Fernandes. Por fim, nas considerações finais, retomaremos os principais apontamentos construídos ao longo do artigo, buscando construir as sínteses possíveis.

Um contexto efervescente: a produção do pensamento político brasileiro sobre o subdesenvolvimento e a dependência latino-americana

O que diferencia a dinâmica do capitalismo nos países da periferia em relação aos países do centro? Quais os determinantes da nossa formação social, econômica e histórica que particularizam as relações de classes aqui estabelecidas? Questões como essas estiveram no centro do debate sobre o desenvolvimento latino-americano no século XX. Diversas instituições acadêmicas, grupos de pesquisa e intelectuais se debruçaram sobre a análise da realidade latino-americana, e sobre a brasileira em particular, para compreender o que nos singularizava.

Compreender a tese de Florestan Fernandes sobre o capitalismo dependente pressupõe voltar ao contexto de efervescência do debate sobre o desenvolvimentismo, buscando analisar o conteúdo teórico e o contexto histórico no qual foi produzido. Dessa forma, o período ao qual nos referimos diz respeito à década de 1960. Nele iniciou-se a efervescência teórica da crítica às teses do desenvolvimentismo na América Latina.

Segundo Bresser-Pereira (2010, p. 17):

O final dos anos 1960 permanecerá na história intelectual da América Latina como o momento em que ocorreu uma importante transição na região: do nacionalismo, que via o desenvolvimento econômico como resultado de uma revolução nacional e capitalista e da adoção de uma estratégia nacional de desenvolvimento, para a interpretação da dependência associada, que rejeitava a possibilidade de uma burguesia nacional e, consequentemente, de países verdadeiramente independentes na região, sustentava que o desenvolvimento econômico estava de qualquer modo garantido em razão do caráter dinâmico do capitalismo e dos investimentos feitos pelas corporações multinacionais, e voltava a atenção para a justiça social e a democracia.

O momento caracterizado por Bresser-Pereira (2010) como transição na história intelectual da América Latina em torno das concepções de desenvolvimento (da revolução nacional e capitalista para a interpretação da dependência associada) é marcado por diferentes críticas às teses desenvolvimentistas anteriormente formuladas.

Essas teses correspondem ao surgimento de uma vasta literatura sobre desenvolvimento capitalista que ocorreu no final da primeira metade do século XX e início da segunda. Segundo Cardoso (1996), é um período no qual a ideologia do desenvolvimento é dominante no Brasil, apresentando-se de maneira plural ? desde as vertentes mais democráticas até as mais conservadoras (que seriam consolidadas com o golpe de 1964). Isso implicava um forte debate sobre o tema ?desenvolvimento? na sociedade e na produção intelectual. ?Especialmente na segunda metade da década de 50 o apelo ideológico [do desenvolvimento] é forte, em nome do progresso e da riqueza material. O desenvolvimentismo anuncia uma era de prosperidade, promovida pelo crescimento econômico acelerado? (Ibid., p. 101).

Nessa perspectiva, a Cepal constitui, em 1948, a primeira iniciativa institucionalizada que se dedicou ao estudo das particularidades da dinâmica do capitalismo latino-americano, ?a partir de economistas que se empenhavam na compreensão do que era específico às relações internacionais das economias exportadoras de produtos primários? (FURTADO, 1969, p. 222). O papel dos estudos cepalinos para a compreensão do subdesenvolvimento latino-americano é central na formação do pensamento social crítico da região. A Cepal parte da Teoria do Desenvolvimento e realiza uma crítica à teoria clássica do comércio internacional[5], a partir da tese da deterioração dos termos de troca desenvolvida por Prebisch, que estabelecia os mecanismos pelos quais a punção externa de recursos se conformava da periferia para o centro.

No cenário internacional, o debate ideológico entre modelo de desenvolvimento socialista e capitalista acelerava as iniciativas do imperialismo norte-americano para a criação de agências que legitimassem o capitalismo como modo de produção viável, mesmo que fosse necessário a construção de adaptações às demandas e particularidades regionais. Esse processo resultou, no campo da economia, no debate travado entre ortodoxos (neoclássicos) e economistas heterodoxos (com base em Keynes, que demandavam uma maior centralização no planejamento do desenvolvimento capitalista).

Na América Latina, esse processo se desenvolveu concomitante ao boom das experiências de governos desenvolvimentistas. Em meio a esse cenário, no âmbito do pensamento social latino-americano, a teorização sobre as táticas para fomento do desenvolvimento sob a particularidade da dependência ganha fôlego com a Cepal, com destaque para o corpo analítico estruturalista construído por Prebisch e Furtado (BIELCHOWSKY, 2011).

É importante ressaltar que, para além de análise teórica, a Cepal exerceu imediata e considerável influência na formulação de políticas econômicas na região (FURTADO, 1969). A formulação da teoria do intercambio desigual passa a ser um fundamento específico na orientação de políticas voltadas a impulsionar a industrialização por substituição de importações como a Tese do Desenvolvimento Autônomo da CEPAL. A tática de superação do subdesenvolvimento ocorreria por meio do desenvolvimentismo do setor público, a partir de uma política distributivista, que teria como centralidade a formação de um mercado interno (FURTADO, 1969; MARINI, 2010; BRICEÑO-RUIZ, 2012).

Além da Cepal, segundo Bresser-Pereira (2010), o ISEB também cumpriu um importante papel na reflexão sobre os rumos do desenvolvimento e da modernização da periferia. O autor afirma que: ?nos anos 1950, os intelectuais públicos do no Rio de Janeiro, refletindo sobre as revoluções industrial e nacional que estavam em curso desde 1930, elaboraram uma ?interpretação nacional-burguesa? do Brasil e da América Latina? (Ibid., p. 18).

Nesta seara, intelectuais inscritos em diferentes correntes teóricas passam a se debruçar sobre o estudo da dependência e o subdesenvolvimento da região. Essa ebulição gerou um frutífero debate acerca da condição periférica da América Latina e as possíveis táticas para superá-la no âmbito do pensamento social e político. Nesse processo, há pensadores que bebem no ?leito histórico? do Iseb; enquanto outras correntes teóricas ?bebem no leito histórico? da Cepal, como as vertentes da Teoria da Dependência, tendo como centralidade da análise as relações centro-periferia a partir das trocas desiguais. Entretanto, há discordâncias entre elas no que toca a análise da dinâmica do capitalismo dependente e as táticas para superação da condição de subdesenvolvimento.

Assim, inicia-se um ciclo de crítica e revisão do desenvolvimentismo. A crise da industrialização por substituição de importações começava a demonstrar que nossa inserção subordinada na divisão internacional do trabalho (DIT) é elemento constituinte da nossa formação sócio-histórica, inviabilizando a superação do subdesenvolvimento apenas por meio da industrialização com forte planejamento estatal.

Segundo Bresser-Pereira (2010), a crítica ao desenvolvimentismo teria sido desenvolvida por três correntes: a corrente da superexploração (Teoria Marxista da Dependência), a corrente da dependência associada e a corrente ?nacionaldependente?. Aqui nos interessa a primeira e a segunda correntes que fazem a crítica ao desenvolvimentismo. A ?corrente da superexploração? ou Teoria Marxista da Dependência, seria a qual vincula-se Gunder Frank, Ruy Mauro Marini, Theotonio dos Santos e Vania Bambirra. Essa corrente tece uma crítica ao desenvolvimentismo cepalino, com críticas contundentes à interpretação ?nacional-burguesa?.

Já a ?corrente da dependência associada? teria sua origem na Escola de Sociologia de São Paulo. Os seus principais representantes, Fernando Henrique Cardoso e Enzo Faletto, abandonariam o materialismo histórico dialético como abordagem teórico-metodológica de análise da realidade. Sua síntese é o livro Dependência e Desenvolvimento na América Latina (1970 [1967]). Influenciados pelas mudanças na conjuntura econômica e política em curso (Ditaduras, entrada de investimentos estrangeiros e multinacionais na América Latina, etc.), os autores caracterizavam que o novo modelo de desenvolvimento que vigorara a partir do final da década de 1960 seria ?modelo de desenvolvimento dependente e associado, autoritário no nível político e concentrador de renda no nível econômico? (Bresser-Pereira, 2010, p. 36).

É importante destacar um elemento diferenciador na corrente de crítica ao desenvolvimentismo: a posição de Florestan Fernandes nesse processo. O estudioso constitui-se como um dos principais líderes da Escola de Sociologia de São Paulo e, posteriormente, ao construir a tese do capitalismo dependente, realiza uma forte crítica ao desenvolvimentismo a partir do materialismo histórico dialético. Aqui podemos assinalar possíveis diálogos entre a tese do capitalismo dependente presente na obra de Fernandes (1973) e Marini (2005 [1969])[6]. Por fim, importa sinalizar a diferenciação entre mestre (Florestan Fernandes) e precursor (Fernando Henrique Cardoso) na análise da dependência.

A crítica ao desenvolvimentismo cepalino afirmava que a tática cepalina para superação do subdesenvolvimento centrada na industrialização por substituição de importações, na verdade, modifica as alianças de classe, mas não altera a condição estrutural de inserção subordinada das economias latino-americanas na DIT.

Nessa perspectiva, Miriam Limoeiro Cardoso (2009) sinaliza que Florestan Fernandes apresentou o trabalho Sociedade de Classes e Subdesenvolvimento[7] que constituiria seus primeiros esforços de reflexão sobre o capitalismo dependente. Na ocasião da apresentação, no Segundo Colóquio Científico Ultramarino das Universidades e Escolas Superiores da Alemanha Ocidental, em 1967, ao lado de Celso Furtado, Fernandes se opôs a toda perspectiva de desenvolvimentismo que estava sendo colocada naquele momento.

Nesse sentido, a revisão da tese desenvolvimentista e a construção de um arcabouço teórico sobre o capitalismo dependente na América Latina desenrolou-se em um contexto histórico de efervescentes debates no pensamento social e político latinoamericano.

Guardadas as diferenças e particularidades teóricas, chega-se à síntese de que o capitalismo dependente se tornou uma realidade estrutural, limitando a capacidade dessas economias se autodeterminarem. Dessa forma, em Florestan Fernandes (1973) veremos que o subdesenvolvimento é caracterizado como uma forma contemporânea de dinâmica do capitalismo dependente, na fase do capitalismo monopolista. Como observa Miriam Limoeiro Cardoso (2009), o trabalho de 1967 foi um importante marco nos seus estudos sobre a dependência na América Latina, os quais ganhariam formulação definitiva nos artigos escritos entre 1970 e 1971, que analisaremos a seguir (FERNANDES, 1973).

O lugar do capitalismo dependente na obra de Florestan Fernandes

Após a breve caracterização do contexto histórico e intelectual no qual emergiu o debate teórico sobre o subdesenvolvimento e o capitalismo dependente na América Latina, buscamos trazer as principais sínteses em torno da tese do capitalismo dependente na obra de Florestan Fernandes. Como apresentado na introdução deste trabalho, nosso esforço advém da necessidade de retomar a contribuição desse clássico do pensamento social e político brasileiro para compreensão dos dilemas que enfrentam as sociedades latino-americanas na contemporaneidade.

Segundo Cardoso (1996), existiria um amadurecimento na trajetória intelectual de Fernandes que, entre outros temas abordados, resultaria na análise do capitalismo dependente. Cardoso (1996, p. 91) aponta que ?seus textos de 1967 como que concluem a construção do que ele provavelmente chamaria de esquema teórico de referência para a explicação do Brasil e do subdesenvolvimento/ dependência/ heteronomia?.

O percurso do autor na caracterização do conceito de capitalismo dependente pode ser destacado em algumas obras centrais: a primeira seria Mudanças sociais no Brasil (1960); posteriormente Sociedade de classes e subdesenvolvimento (1967) com destaque para o primeiro capítulo 1 (intitulado com o mesmo nome do livro) que busca definir a explicação sociológica do subdesenvolvimento econômico. Já em um nível de maturidade e definição do recorte teórico-metodológico do materialismo histórico dialético o autor produz Capitalismo dependente e classes sociais na América Latina (1973) no qual estão presentes os artigos Padrões de Dominação Externa na América Latina e Classes Sociais na América Latina. O primeiro artigo advém de uma conferência na Universidade de Toronto, em 10 de março de 1970, publicada em 1971. Já o segundo foi uma comunicação apresentada no Seminário sobre os Problemas de Conceituação das Classes Sociais na América Latina, realizado na UNAM, em dezembro de 1971. Originalmente, o texto foi publicado no livro Clases Sociales en America Latina (1973) que também conta com o registro das comunicações de Nicos Poulantza e Alain Touraine. Outro artigo central nesse debate, pouco publicizado, chama-se Capitalismo dependente e imperialismo (1974)[8]. Por fim, a síntese de maturidade analítica do caráter dependente da nossa sociedade de classes seria apresentada em A Revolução Burguesa no Brasil (1975). Porém, Florestan toma parte nesse debate até sua maturidade.

Posteriormente, mais duas obras também são importantes: Circuito fechado (1976) e Democracia e desenvolvimento: a transformação da periferia e o capitalismo monopolista na era nacional (1994).

Assim, a partir de uma sequência de obras que versam desde a mudança social no Brasil até o amadurecimento de sua análise da sociedade de classes latino-americana e brasileira, Florestan Fernandes tem como tarefa compreender a dinâmica do capitalismo em uma determinada formação social. Essa tarefa o aproxima do conceito de desenvolvimento desigual e combinado[9] aplicado à análise do capitalismo dependente latino-americano, que pressupõe a compreensão de dinâmicas contraditórias e complementares da mundialização do modo de produção capitalista.

Substancialmente, Fernandes é influenciado pelo leito histórico do marxismo leninista. Desde os estudos do imperialismo até sua busca em compreender a particularidade do capitalismo russo[10]. Assim, Florestan afilia-se à tradição leninista do marxismo e, por isso, iremos articular alguns conceitos da Tese do Imperialismo desenvolvida por Lênin ao longo da recapitulação da obra de Fernandes (CARDOSO, 2009; FERREIRA, 2016).

Fernandes possuía a tarefa de entender o lugar que o Brasil e demais países latino-americanos têm no processo de expansão e mundialização do capitalismo (CARDOSO, 1997). Para tal, é necessário compreender os elementos da lógica geral do desenvolvimento capitalista e as especificidades sociais, históricas e econômicas da dinâmica do capitalismo dependente. Essa linha argumentativa nos remete à consideração metodológica muito presente em Florestan: trabalhar sempre com foco na tensão dialética entre o geral e o específico (DUARTE, 2016).

Essas mediações buscam responder algumas problemáticas em torno das particularidades da dinâmica social brasileira que suscitam em questões como: por que no Brasil a independência política não significou a independência concreta? Por que o nível de exploração do trabalho da população aqui é muito maior do que nos países chamados avançados? Por que a democracia que conhecemos aqui é tão restrita? Por que no Brasil a burguesia não fez ou não conseguiu fazer a Revolução Burguesa? (CARDOSO, s.d.). Para responder a problemática que se constitui em torno dessas questões, Fernandes busca articular dialeticamente os elementos das condições históricas universais (expansão internacional do modo de produção capitalista) e os condicionantes históricos particulares (circunstâncias que particularizam a dinâmica do capitalismo dependente) (DUARTE, 2016). Relacionando essas duas dimensões da realidade, em Sociedade de Classes e Subdesenvolvimento o autor aponta que:

[...] há uma diferença óbvia entre as economias centrais e hegemônicas e as economias periféricas e heteronômicas. Essa diferença consiste em que as segundas são caudatárias das primeiras e se organizam para beneficiar, de uma forma ou de outra, o seu desenvolvimento. Por isso, os vínculos colonial, neocolonial ou de dependência indireta traduzem-se, na prática, por uma inversão da realidade (como se a economia central se reproduzisse na economia periférica ao revés, para alimentar não o seu desenvolvimento, mas o desenvolvimento da economia dominante) (FERNANDES, 2008, p. 174, grifo nosso).

A partir dessa citação, podemos compreender que para explicar como o Brasil se insere no processo de formação, consolidação e expansão do modo de produção capitalista, o autor busca compreender como essa expansão articula o Brasil e como esse capitalismo em expansão é apropriado pelo Brasil (CARDOSO, 2009). A partir dessas considerações, buscaremos sistematizar as principais contribuições de Fernandes presentes nos artigos Padrões de Dominação Externa na América Latina (1970) e Classes Sociais na América Latina (1971).

Padrões de Dominação Externa na América Latina (1970)

A expansão capitalista (da acumulação originária à etapa da financeirização na fase monopolista do capitalismo) é demarcada por processos de readequação das economias latino-americanas às demandas do mercado mundial. Ajustando-se de forma periódica, essas economias respondem à lógica interna da dinâmica da acumulação, que a partir da fase imperialista, as incorpora e transfigura frequentemente suas relações sociais de produção e reprodução.

Nesse sentido, compreender a relação entre imperialismo, dominação externa e a constituição do capitalismo dependente como realidade histórica na América Latina pressupõe articular fundamentos da Teoria do Imperialismo desenvolvida por Lenin

(2012) e a concepção de padrões de dominação externa construída por Fernandes (1973b).

O subdesenvolvimento latino-americano se funda como parte constitutiva da dinâmica capitalista, conferindo um caráter particular ao capitalismo dependente. Essa particularidade se deve ao papel funcional que as economias da região exercem, ontem e hoje, ao processo de acumulação dos países centrais, desde a acumulação originária, que tem como consequência a adoção de um padrão exportador pelas economias nacionais, em conformidade com a dinâmica do capitalismo internacional.

Trata-se de uma inserção subordinada da América Latina na divisão internacional do trabalho que perpassa todas as fases da dependência e se materializa na transferência de parte do valor que é produzida na periferia para ser realizada no centro. Nas economias dos Estados latino-americanos, isso resulta em uma apropriação repartida do excedente econômico nacional, já que parte da riqueza produzida no território nacional passa a ser apropriada pelas economias centrais (FERNANDES, 1973b).

Desse modo, a dependência não possui um caráter residual nas sociedades latino-americanas. Ao contrário, sua dimensão inegavelmente estrutural consolida-se por meio das transformações, inerentes à dinâmica do capitalismo periférico, que consistem numa contínua adaptação das relações centro-periferia a novas condições históricas. Esse padrão de acumulação gera uma redefinição constante da materialização do subdesenvolvimento. Fernandes (1973b, p. 55) ressalta que, como consequência desse modelo, não existe possibilidade de alteração no padrão das transformações que leve da articulação dependente ao desenvolvimento autônomo dos países latino-americanos, sendo um constante processo de readaptação às evoluções externas.

Assim, do Antigo Sistema Colonial à contemporaneidade, a estrutura societária na América Latina organiza-se a partir da dominação externa (FERNANDES, 1973b), tendo em vista que nossa formação social é produto da expansão da civilização ocidental que constitui ?um tipo moderno de colonialismo organizado e sistemático? (FERNANDES, 1973b, p. 11). Nessa fase, a sociedade colonial, no que tange à sua estrutura de poder, é composta exclusivamente pelos colonizadores, no qual predominava os interesses das coroas ibéricas, a partir da exploração ilimitada das riquezas da região.

A colonização europeia forjou as bases da dominação externa que dá o tom das relações entre os territórios latino-americanos (colônias, semi-colônias e, posteriormente, Estados nacionais) e as nações hegemônicas (Europa e Estados Unidos). E o Antigo Sistema Colonial, como resultante, deixou como herança uma estrutura societária plutocrática com a marca da concentração de riqueza e do poder (FERNANDES, 1973b). Essa herança perdura até hoje e ganha traços diferentes ao longo da história.

Em síntese, as relações de dominação externa consistem em uma constante expansão do capitalismo e incorporação dependente dos países latino-americanos ao espaço político, social e econômico das sucessivas nações capitalistas hegemônicas (que ocupam esse patamar ao longo da história).

Com o processo de independência das colônias e da formação dos Estados nacionais, as relações de dependência se resignificam sobre a forma do neocolonialismo. A influência externa passa a se realizar por uma dominação indireta por meio do controle de mercado dos processos econômicos tendo, internamente, o apoio das classes exportadoras que se forjavam com a formação do mercado mundial. Sobre essa formação, o protagonismo inglês coloca Londres no centro das políticas de dominação externa de cunho neocolonial. ?A Inglaterra iniciou uma política colonial que propiciou rápido impulso à emergência dos mercados capitalistas modernos nos centros urbanos das ex-colônias?, aponta Fernandes (1973, p. 15).

A formação do mercado mundial e a reorganização da dinâmica da economia internacional após a Revolução Industrial consolida o capitalismo dependente como realidade concreta na América Latina[11]. Isso origina uma sociedade de classes, na qual as classes não se efetivam como agentes históricos pela marca da heteronomia permanente, tendo em vista que a revolução burguesa na América Latina não rompe com o arcaico, desembocando na consolidação de uma estrutura do modo de produção capitalista dependente. Resulta disso a marca da constante relação entre o arcaico e o moderno como modus operandi na sociedade de classes na América Latina. A estabilidade dessa sociedade de classes requer mecanismos de dominação que reforçam, a partir do arcaico, a concentração da renda, do prestígio social e do poder, exacerbando as mazelas sociais. A burguesia latino-americana possui, assim, um caráter débil em uma relação de complacência com o imperialismo, cedendo espaço às evoluções externas do capitalismo em uma constante acentuação do controle autoritário exercido pelas classes dominantes. Isso ocorre pela possibilidade de perpetuar a condição privilegiada através dos padrões dependentes de desenvolvimento. Nesse momento histórico, Fernandes narra que

a influência externa atingiu todas as esferas da economia, da sociedade e da cultura, não apenas através de mecanismos indiretos do mercado mundial, mas também através da incorporação maciça e direta de algumas fases dos processos básicos de crescimento econômico e de desenvolvimento sociocultural (FERNANDES, 1973b, p. 16).

A partir desses arranjos, a política imperialista passa a ser fundamental para a dominação externa exercida pelo imperialismo, agora tendo como objetivo principal a garantia dos lucros dos monopólios, a partir da transferência de excedente econômico das economias satélites para os países hegemônicos. São essas modificações que levam à essa política imperialista, como novo padrão de dominação externa, e suas consequências para a dependência latino-americana que nos interessa. Deter-nosemos, aqui, sobre as mudanças advindas da consolidação do capitalismo monopolista[12] e sobre as particularidades conferidas à dinâmica do capitalismo dependente nos países da América Latina nesse período histórico.

As bases da transição a esse estágio residem no esgotamento do capitalismo concorrencial, no final do século XIX[13]. Por meio das mudanças na dinâmica do capitalismo em torno do desenvolvimento das forças produtivas, do surgimento dos monopólios pela tendência à centralização e à concentração de capital e da modificação do papel dos bancos, o capital monopolista se torna a coluna vertebral da economia capitalista (BRAZ; NETTO, 2012). O monopólio passa a ser, portanto, a unidade básica de funcionamento da dinâmica capitalista. (SWEZY; BARAN, 1964).

Nessa nova fase o papel dos bancos é revolucionado, a partir do controle de massas monetárias gigantescas que se transformam em crédito disponibilizado na forma de empréstimo para o capitalista industrial. O papel dos bancos é converter capital-dinheiro inativo em capital ativo, ou seja, em capital que rende lucro. Segundo Lênin, há uma fusão entre capital bancário e capital industrial, que origina o capital financeiro. Em síntese, os bancos passam ?de intermediários de pagamentos a associados de capitalistas industriais? (2012, p. 192).

A consolidação da dinâmica da ?era dos monopólios? introduz novas necessidades para a continuidade da reprodução ampliada de capital nesse estágio. A tendência, cada vez maior, à centralização e à concentração das atividades econômicas leva à acumulação de capital em proporções gigantescas, ocorrendo a formação de uma grande massa de excedente de capital. Nos países centrais, esse excedente não é investido em políticas para a elevação do nível de vida dos trabalhadores, mas é convertido, por meio da exportação de capitais para os países da periferia, em expansão dos lucros capitalistas. Lenin (2012, p. 94) aponta, além disso, que ?a necessidade da exportação de capitais se deve ao fato de o capitalismo ter amadurecido excessivamente em alguns países, e o capital carecer de um campo para a sua colocação lucrativa?. Por conseguinte, a centralidade que adquire a exportação de capital no capitalismo monopolista traz consequências para a relação centro-periferia. A política imperialista se consolida como instrumento para viabilizar a expansão territorial com vistas ao investimento do excedente de capital.

Nesse processo, as relações próprias da dinâmica capitalista entre economias centrais e periféricas incorporam alterações que resignificam o papel central da periferia para o circuito da acumulação no centro. Há, dessa forma, uma refuncionalização das relações de dependência e, por consequência, do padrão de dominação externa que demarca a relação entre centro e periferia. ?A dominação externa, graças ao capitalismo monopolista e ao recente padrão de imperialismo total ramificou-se e intensificou-se a ponto de organizar-se a partir de dentro em bases quase simétricas às da antiga dominação colonial? (FERNANDES, 1973a, p. 97). Passa a vigorar o imperialismo total[14] como padrão de dominação externa típico do capitalismo monopolista que modifica os arranjos, mas continua a ter em seu cerne a marca da acumulação dual de capital e da apropriação repartida do excedente econômico nacional.

O imperialismo total ou novo imperialismo enquanto padrão de dominação externa é caracterizado por Fernandes (1973), a partir da expansão das grandes empresas corporativas típicas das economias centrais para os territórios latinoamericanos. Nesse momento, a dominação externa se concebe de forma mais complexa e profunda, já que há um controle interno das economias dependentes pelos interesses externos. Mecanismos típicos das empresas monopolistas passam a ser implementados na dinâmica econômica da periferia: com investimentos em marketing, mudança do quadro administrativo das empresas, propagandas em massa, etc. No âmbito econômico, a falta de instrumentos que pudessem regulamentar e supervisionar a atuação dos monopólios nos Estados latino-americanos resultou em um enraizamento ainda maior das estruturas de controles externos em território nacional.

Entretanto, Fernandes (1973b) alerta que os aspectos econômicos são apenas uma esfera das modernas tendências de dominação externa. A incorporação dependente da periferia ao que o autor denomina o ?espaço social e político das nações hegemônicas? resulta em uma gritante influência externa dos padrões sociais do Norte na sociabilidade dos países dependentes. Isso se dá por meio da empresa corporativa, mas também por outras instituições oficiais (públicas) e privadas[15] que têm a função de reconstruir as sociedades latino-americanas de acordo com interesses externos.

O imperialismo total se torna ainda mais ofensivo com o término da II Guerra Mundial. Acontecimentos desse período remetem ao i) estabelecimento da hegemonia norte-americana no Ocidente; ii) a criação de uma série de instituições internacionais instrumentalizadas pelo imperialismo[16]; iii) a mudança na ordem monetária internacional iv) a ?ameaça? da expansão do modelo socialista com a instauração da bipolaridade enquanto ordenamento do sistema internacional; v) a longa onda expansiva da economia internacional nos Anos Dourados que solidificam o imperialismo total enquanto padrão de dominação externa na América Latina.

A ?ameaça? à estabilidade do capitalismo enquanto sistema mundial que ocorre com a expansão do modelo socialista foi, segundo Fernandes (1973b), uma ?influência dinâmica decisiva? à defesa agressiva do capitalismo privado por parte das nações capitalistas avançadas. Nesse sentido, a ofensiva do imperialismo torna-se ainda mais feroz na fase monopolista do capitalismo, mas sempre a partir da articulação do arcaico e do moderno. Ou seja, ?a partir da coexistência de estruturas econômicas, socioculturais e políticas em diferentes épocas históricas, mas interdependentes e igualmente necessárias para a articulação e a expansão de toda a economia com base para a exploração externa e para a concentração interna da renda, do prestígio social e do poder? (Ibid., p. 15).

Nesse sentido, Fernandes conclui que a dominação externa impõe dois dilemas para os países latino-americanos. A primeira é a de que mesmo com a capacidade de absorção das transformações do capitalismo, as estruturas típicas do capitalismo dependente inibem estruturalmente a integração nacional e a possibilidade de desenvolvimento autônomo. A segunda conecta-se a primeira: a dominação externa estimula a absorção dessas transformações que podem levar ao crescimento e à modernização, mas estruturalmente impedem a construção de uma revolução de caráter nacional (FERNANDES, 1973b). Assim, a dependência e o subdesenvolvimento tornam-se necessários para a burguesia dependente e associada e para o imperialismo. Abaixo trataremos da configuração dessa burguesia que é interna, mas que pelos condicionantes supracitados, não é e nunca será nacional.

Classes Sociais na América Latina (1971)

No texto Classes Sociais na América Latina, Florestan Fernandes faz uma análise complexa de como o capitalismo dependente conformou-se enquanto realidade histórica nos Estados latino-americanos e, por consequência, como se desenrolou a constituição da ordem social competitiva nesses territórios. Destaca que o conceito de classes sociais é empregado em diferentes perspectivas teóricas. Mas delimita seu o uso teórico ao momento histórico no qual vigoram os arranjos sociais do sistema capitalista.

Assim, define que:

A classe social só aparece onde o capitalismo avançou suficientemente para associar, estrutural e dinamicamente, o modo de produção capitalista ao mercado como agência de classificação social e à ordem legal que ambos requerem, fundada na universalização da propriedade privada, na racionalização do direito e na formação de um Estado nacional formalmente representativo (FERNANDES, 1973a, p. 33, grifo nosso).

Na América Latina, a sociedade de classes absorveu relações, estruturas e funções de diferentes realidades anteriores à ?era das classes sociais?. Não há como negar elementos de estruturas sociais arcaicas no moderno sistema capitalista. Entretanto, tais estruturas foram refuncionalizadas.

As contradições na sociedade de classes na América Latina ainda são maiores, posto que ?o capitalismo e a sociedade de classes (aqui) não são produtos de uma evolução interna? (Ibid., p. 35) evoluindo sem contar com condições de crescimento auto-sustentado e desenvolvimento autônomo. Essa consideração de Florestan demonstra que a ausência da autonomia pode ser considerada um elemento-chave na compreensão da especificidade latino-americana, no que tange à dependência estrutural e à sociedade de classes que se funda em seu território.

Segundo Florestan: ?onde a sociedade de classes emerge, mas não consegue absorver e orientar as forças de transformação da ordem social, ela nasce condenada à crise permanente e ao colapso final? (Ibid., p. 36, grifo nosso). Esse é o caso da América Latina:

Se se toma as classes sociais tendo em vista a natureza, a duração e as debilidades da revolução burguesa e os ritmos históricos das ?transições inesperadas? (das revoluções dentro da ordem, que só se podem concretizar convertendo-se em revoluções contra a ordem), o que se patenteia é o reverso da medalha, e as sociedades latino-americanas aparecem como sociedades em convulsão que estão em busca do seu próprio patamar e tempos históricos? (p. 36).

Assim, o surgimento da sociedade de classes é marcado pela presença de estamentos. Nela, o arcaico e o moderno passam a conviver lado a lado. ?[...] A emergência de novas realidades econômicas, sociais e políticas, vinculadas a expropriação capitalista permitiram a revitalização de atividades, valores e comportamentos estamentais? (Ibid., p. 39).

O elemento central sobre a formação do capitalismo dependente na América Latina diz respeito à sua constituição estar umbilicalmente ligada ao atendimento de interesses externos. Essa dimensão particularizou a dinâmica das classes sociais que aqui se constituíram, inibindo o grau de eficácia dos dinamismos estabilizadores da ordem social competitiva. Florestan consegue, assim, caracterizar o locus que diferencia a dinâmica da nossa sociedade de classes em relação à sociedade de classes das economias centrais.

Se nos países centrais o capitalismo consolida-se como fruto de uma Revolução Burguesa contra um modo de produção antes vigente (feudalismo), nos países latinoamericanos isso não acontece. Nossas estruturas históricas voltadas para atendimento dos interesses externos continuam a cumprir essa função, readaptando-se à dinâmica de uma sociedade de classes.

O amadurecimento do capitalismo não destruiria as estruturas arcaicas que predominavam anteriormente. Essas estruturas pré-capitalistas - que se expressam na esfera do trabalho, nas relações sociais e estruturas de poder ? passam a constituir a dinâmica do capitalismo dependente. Ou seja, há a manutenção da dependência e de elementos arcaicos presentes no Antigo Sistema Colonial.

Para Florestan, as classes sociais não podem desempenhar suas funções sociais desintregadoras tanto quanto suas funções sociais construtivas sob essa modalidade predatória de capitalismo selvagem que vigora na América Latina.

Como dito, a Revolução Burguesa tal qual ocorreu na Europa e nos Estados Unidos funda o modelo ?clássico? do capitalismo, que leva à ruptura com o antigo regime e a conformação de uma sociedade de classes, nas quais as classes sociais cumprem suas funções enquanto agentes históricos de uma sociedade fundada na propriedade privada, na formalização do Estado e do direito. Nesses países, a consolidação da ?civilização burguesa?, com a hegemonia dos interesses dessa classe, instaura uma ordem social competitiva na qual as classes baixas utilizam os dispositivos sociais de protesto típicos da ?estrutura democrática?, mais formal que concreta, para pautar seus interesses de classe e efetivar-se enquanto agente histórico. Como conquista das lutas travadas pela classe trabalhadora, há uma universalização de níveis mínimos de sobrevivência, hábitos de consumo e direitos sociais (FERNANDES, 1973b).

Já o modelo de revolução burguesa que funda a ordem social competitiva no território latino-americano não rompe com estruturas típicas do Antigo Sistema Colonial e do Neocolonialismo, tendo como resultado a estruturação do capitalismo de caráter selvagem e dependente. Nesse modelo de capitalismo, as classes sociais não cumprem seu papel enquanto agente histórico como em sociedades de classes fundadas pela via clássica da Revolução Burguesa. A burguesia adquire um caráter débil para consolidar um projeto democrático e nacionalista, pois a sociedade de classes se funda sobre estamentos senhoriais típicos do Antigo Regime Colonial, sem conseguir superá-los (FERNANDES, 1973,1995). Nesse sentido, para consolidar sua hegemonia de classe a burguesia recorre à instrumentos antidemocráticos que perpetuam e acentuam a concentração dos mecanismos de poder e as disparidades sociais. Nesse sentido, diferente da situação supracitada, na sociedade de classes dos países dependentes essa ?revolução dentro da ordem? é bloqueada pelas classes possuidoras e privilegiadas. ?As classes sociais falharam, nas situações latino-americanas, porque operaram unilateralmente, no sentido de preservar e intensificar os privilégios de poucos e de excluir os demais? (Ibid., p. 42). Sobre a composição da burguesia na América Latina, para Florestan, ocorre a

Constituição de uma oligarquia, que se torna burguesa por imposição de sua posição econômica, papeis políticos e destino histórico, não por ideais de vida e impulso por uma revolução social contra estruturas que impedissem a oligarquia em questão de realizar-se enquanto classe? (Ibid., p. 91-2).

A conclusão de Florestan Fernandes é a de que a chegada do capitalismo moderno na América Latina estrutura uma sociedade de classes sem materializar concomitantemente e com efetividade concreta a descolonização. Nesse sentido, a permanência de elementos do arcaico em conexão com o moderno gera ao capitalismo que aqui se desenvolve um estado de heteronomia permanente. Essa situação impede que a dinâmica da sociedade de classes típica dos Estados do centro se instaure na América Latina. Sendo assim, o processo de transformação pelo qual passam as economias dependentes acaba por reproduzir a dependência estrutural e o subdesenvolvimento.

O modelo concreto de capitalismo que passa a vigorar lança suas raízes no Antigo Sistema Colonial e extrai seus dinamismos organizatórios e evolutivos, simultaneamente, da incorporação econômica, tecnológica e institucional a sucessivas nações capitalistas hegemônicas e do crescimento interno de uma economia de mercado capitalista. Conduz a formas de apropriação e de expropriação inerentes ao capitalismo moderno (FERNANDES, 1973a).

Entretanto, é importante destacar que o processo de acumulação de capital aqui constituído se dá por dois canais: pela burguesia associada e dependente e pelo imperialismo. Dessa forma, segundo Florestan, não haveria a monopolização do excedente econômico nacional pelos próprios agentes privilegiados nas economias nacionais (ou seja, pela burguesia que aqui se constituía). Vigoraria o padrão dual de acumulação originária de capital, com o correspondente modelo de apropriação repartida do excedente econômico. Para o autor: ?As razões que conferem uma vantagem relativa aos interesses e motivações externos relacionam-se com as insuficiências e as debilidades, ao mesmo tempo estruturais e dinâmicos dos padrões dependentes de crescimento e de desenvolvimento? (Ibid., p. 78).

Sob a vigência de tais debilidades e insuficiências, os setores privilegiados não conseguem implementar um modelo de desenvolvimento autônomo. Isso corresponderia ao ?dilema da dependência?: quando os setores da burguesia associada tentam implantar um novo modelo de desenvolvimento se vêem reféns dos centros de decisão externos. Isso resulta em uma constante i) crescimento por associação dependente e por incorporação e ii) desnacionalização do crescimento e desenvolvimento econômico.

Essa ausência de monopolização do excedente nacional constitui a substância do caráter dependente da economia latino-americana. A estrutura na qual funda-se o dinamismo do capitalismo dependente sempre constitui vantagens para o polo econômico hegemônico externo (o imperialismo). Segundo Fernandes: ?o capitalismo dependente está sempre se transformando, seguindo as evoluções das sociedades centrais hegemônicas sem, no entanto, conseguir mudar o padrão de transformações, passando da articulação dependente para o desenvolvimento relativamente autônomo? (Ibid., p. 55, grifo nosso). Nossas economias passam por processos históricos de modernização, mas que não rompem com os padrões de dominação externa, sempre predomina a articulação dependente.

É importante compreender, nesse sentido, que a dominação externa não ocorre de maneira mecânica em uma relação unilateral do centro para a periferia. É central o vetor da força social dominante/hegemônica internamente: a burguesia dependente e associada que visualiza no imperialismo uma força necessária à manutenção das suas vantagens e interesses internos e que, por isso, aceita a permanente vantagem estratégica do imperialismo. Acerca desse processo, Florestan (1973b, p. 75) aponta que a dominação externa corresponde à articulação estrutural de dinamismos econômicos externos e internos [...] e não, como muitas vezes se supõe, de uma imposição inflexível, pura e simples, das sociedades nacionais hegemônicas?.

A dependência consolida seu caráter estrutural nas sociedades latinoamericanas, tendo em vista que as transformações inerentes à dinâmica do capitalismo periférico configuram uma contínua adaptação das relações subordinadas para assegurar a perpetuação da dependência à novas condições históricas. Assim, o padrão de acumulação de capital intrínseca à associação dependente gera o enraizamento da dependência e a redefinição constante da materialização do subdesenvolvimento. Neste sentido, dirigindo-se na supracitada definição de Marini sobre a dependência, Florestan sintetiza que (1973b, p. 55): ?o capitalismo dependente está sempre se transformando, seguindo as evoluções das sociedades centrais hegemônicas sem, no entanto, conseguir mudar o padrão de transformações, passando da articulação dependente para o desenvolvimento relativamente autônomo?.

Nesse sentido, o padrão de acumulação de capital inerente às economias dependentes resulta em um ciclo repetitivo que promoverá a i) intensificação da dependência e ii) Redefinição constante das manifestações de subdesenvolvimento. Esse processo resulta em uma transformação da representação da classe dominante das sociedades dependentes, que no capitalismo dependente assumem o caráter de uma burguesia compósita como sistematizado no quadro abaixo.

Quadro 1
Representação da classe dominante na América Latina

Elaboração própria a partir de Florestan (1973a).

Assim, a burguesia no capitalismo dependente é débil e não consegue cumprir o seu papel enquanto agente histórico se nos remetermos ao papel cumprido pela burguesia na via clássica da Revolução Burguesa. Segundo Florestan Fernandes, a debilidade dessa burguesia para promover o ?salto histórico em direção ao modelo clássico? de ?capitalismo maduro? foi ?a maneira pela qual pretenderam fortalecer-se, excluindo ou enfraquecendo outros protagonistas sociais? (Ibid., p. 57). Dessa forma, os instrumentos utilizados para manutenção da sua situação de privilégio resultam na limitação da participação política e econômica da classe trabalhadora, também liquidando o papel dessa enquanto agente histórico.

Dessa forma, Florestan afirma que no capitalismo dependente, diferente dos países que passaram pela via clássica de Revolução Burguesa, ?a burguesia só pode realizar-se como classe e impor sua hegemonia de outra maneira pelo uso do Estado que adquire um teor antinacional contra a integração nacional e a própria revolução nacional? (Ibid., p. 60). As burguesias na América Latina fortalecem o capitalismo dependente como alternativa a uma revolução nacional dentro da ordem que ameaçaria iniquidades coloniais.

A partir da impossibilidade da classe dominante latino-americana realizar uma revolução de caráter democrático e nacional, a única saída colocada seria a revolução contra a ordem. Só essa apresentaria uma alternativa real ao padrão dependente de desenvolvimento capitalista. Nesse momento, Florestan realiza uma crítica às teses desenvolvimentistas. Aponta que ?as ideologias e utopias desenvolvimentistas? (Ibid., p. 88-89) teriam um papel de iludir as reais saídas para a condição dependente na qual encontram-se as economias latino-americanas.

Considerações Finais

Este artigo propôs-se a retomar o debate sobre o subdesenvolvimento e o capitalismo dependente na América Latina a partir da produção do pensamento social e político brasileiro, com foco na contribuição de Florestan Fernandes. Reiteramos a importância de resgatar a contribuição de estudiosos latino-americanos para compreensão das particularidades do capitalismo dependente, levando em consideração a ligação entre a produção do pensamento social e as contingências históricas. Nesse sentido, reitera-se que buscamos contribuir com a socialização de leituras pouco tratadas nos principais círculos acadêmicos no último período, com o objetivo de alcançar a diversidade da análise das relações de dependência, a partir do olhar de estudiosos que vivenciaram a especificidades da sociedade de classes típica do capitalismo dependente latino-americano.

Nesse sentido, compreendemos que o caráter estrutural da dependência latinoamericana se expressa na sua inserção subordinada na divisão internacional do trabalho, que reverbera na estruturação da sociedade de classes também dependente. Esse processo traz consequências para as classes pauperizadas no que tange à relação capital x trabalho, por meio da negação de direitos sociais e participação política, que torna ainda mais complexa a situação de subdesenvolvimento dos Estados latinoamericanos. Historicamente, visualizamos como na etapa do capitalismo monopolista ocorre um aprofundamento da dependência com a complexificação dos mecanismos de dominação externa típicos do imperialismo.

Diante do que nos propomos a debater, defendemos a atualidade analítica da obra de Fernandes para análise dos atuais dilemas político-sociais da região latinoamericana. Entendendo a produção do conhecimento como instrumento para compreender a realidade e nela intervir, algo já presente na produção acadêmica de Florestan Fernandes, acreditamos que os pressupostos teóricos aqui retomados podem contribuir para o entendimento do cenário nebuloso vivenciado na atual conjuntura pelos povos latino-americanos.

Bibliografia

BARAN, Paul; SWEEZY, Paul. Capitalismo Monopolista: Ensaio sobre a ordem econômica e social americana. Rio de Janeiro: Zahar, 2ª ed., 1974.

BIELSCHOWSKY, Ricardo. Prefácio. Prebisch e Furtado. In: PREBISCH, Raúl. O Manifesto Latino-Americano e Outros Ensaios. Rio de Janeiro: Centro Internacional Celso Furtado, 2011.

BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Três interpretações da dependência. Perspectivas, São Paulo, v. 38, p. 17-48, jul./dez. 2010. Acesso em: 01 out. 2017.

BRICEÑO RUIZ, J.; GRACEA, A. M. C.; PUNTIGLIANO, A. R. (Org.). Integración Latinoamericana y Caribeña. Política y Economia. Madrid: FCE, 2012, p. 27-59.

CARDOSO, Fernando Henrique e FALETTO, Enzo. Dependência e Desenvolvimento na América Latina: Ensaio de Interpretação Sociológica. Rio de Janeiro: Zahar, 1970.

CARDOSO, Míriam Limoeiro. Capitalismo dependente, autocracia burguesa e revolução social em Florestan Fernandes. ?Coleção Documentos?, Instituto de Estudos Avançados ? USP, São Paulo, jul./1997. Disponível em: < http://www.iea.usp.br/publicacoes/textos/limoeirocardosoflorestan1.pdf>. Acesso em 30 out. 2017.

______. Florestan Fernandes: capitalismo dependente e classes sociais no Brasil. In: Ciclo de conferências - O que somos e para onde vamos: clássicos e contemporâneos do pensamento crítico-social brasileiro. Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, 2009. Disponível em: < https://youtu.be/NjGVnOZrlfc>. Acesso em 02 nov. 2017.

CASTELO, Rodrigo. Subdesenvolvimento, Capitalismo dependente e revolução: Florestan Fernandes e a crítica da economia política desenvolvimentista. s/d. Disponível em: < https://marxismo21.org/wp-content/uploads/2012/11/R-C-Branco-FF.pdf>. Acesso em 20 out. 2017.

DUARTE, F. A. O legado teórico de Florestan Fernandes - Dependência e Subdesenvolvimento na periferia capitalista. In: XV SEMANA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS DA UNESP ARARAQUARA, 2016, Araraquara. Anais da XV Semana de Pós-graduação em Ciências Sociais, 2016. v. 1. p. 395-402.

FERNANDES, Florestan. A Revolução Burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica. 5ª ed. São Paulo: Globo, 2005.

______. Classes sociais na América Latina. In: FERNANDES, Florestan. Capitalismo Dependente e Classes Sociais na América Latina. Rio de Janeiro: Zahar Editora, 1973a.

______. Em busca do socialismo: últimos escritos e outros textos. São Paulo: Xamã, 1995.

______. Padrões de Dominação Externa na América Latina. In: FERNANDES, Florestan. Capitalismo Dependente e Classes Sociais na América Latina. Rio de Janeiro: Zahar Editora, 1973b.

______. Sociedade de classes e subdesenvolvimento. 5. ed. São Paulo: Global, 2008.

FERREIRA, Mariana Davi. A política externa venezuelana para a integração regional (2004 ? 2012): entre a dependência estrutural e a unidade latino-americana. 2016. 228p. Dissertação (Mestrado em Relações Internacionais) ? Centro SócioEconômico, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2016.

FURTADO, Celso. Formação Econômica da América Latina. Rio de Janeiro: Lia, Editor S.A., 1969.

IANNI, Octavio. Imperialismo na América Latina. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1974.

LENIN, V. I. Imperialismo, estágio superior do capitalismo. São Paulo: Expressão Popular, 2012.

LYNCH, Christian Edward Cyril. Por que pensamento e não teoria?: a imaginação político-social brasileira e o fantasma da condição periférica (1880-1970). Dados, Rio de Janeiro, v. 56, n. 4, p. 727-767, dez. 2013. Disponível em: . Acesso em 10 ago. 2017.

MARINI, Ruy Mauro. A crise do desenvolvimentismo. In: CASTELO, Rodrigo. Encruzilhadas da América Latina no Século XXI. Rio de Janeiro: Editora Pães e Rosas, 2010.

______. Dialética da Dependência. In: STEDILE, João Pedro; TRASPADINI, Roberta (Org.). Ruy Mauro Marini: Vida e Obra. São Paulo: Editora Expressão Popular, 2005.

NETTO, José Paulo; BRAZ, Marcelo. Economia política: uma introdução crítica. 8ª ed. São Paulo: Cortez Editora, 2012.

TROTSKY, L. A história da revolução russa. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.

Notas

[1] Agradeço ao professor José Henrique Artigas de Godoy pelos debates em torno do objeto aqui tratado. Essas discussões foram fundamentais para as sínteses apresentadas neste artigo.
[2] Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política (PPGCP) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Brasil. E-mail: marianadaviferreira@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/00000001-5349-3919. Argumentos, vol. 16, n. 2, jul./dez. 2019 Departamento de Ciências Sociais, Unimontes-MG
[3] Os artigos foram apresentados entre 1970 e 1971 e publicados, no ano seguinte, em Capitalismo Dependente e Classes Sociais na América Latina (1973 [1972]).
[4] É importante fazer o adendo de que a caracterização da tese do capitalismo dependente será retomada em seu caráter teórico, mas que para qualquer estudioso a elaboração de um quadro síntese sobre a América Latina e as particularidades decorrentes de sua formação sócio-histórica demanda cautela, tendo em vista a dificuldade de realizar uma discussão macro diante das complexidades das formações sociais de cada Estado. Entretanto, uma aproximação com tal síntese torna-se possível pelos elementos comuns que marcaram a colonização deste subcontinente e a consolidação do capitalismo dependente, que se desdobram até o tempo hodierno pela posição que esta região ocupa na divisão internacional do trabalho.
[5] Princípio das vantagens comparativas.
[6] Essa possibilidade dialógica entre as teses de Fernandes e de Marini sobre o capitalismo dependente é brevemente explorada na dissertação da autora (FERREIRA, 2016).
[7] Posteriormente viria a ser editado como primeiro capítulo do livro Sociedade de Classes e Subdesenvolvimento (1968).
[8] Esse artigo foi publicado na revista Économie et Humanisme com o título "Lesbourgeoisies périphériques au service du capitalisme internacional" e posteriormente em uma coletânea de artigos de Florestan, publicado após a sua morte e intitulado Em busca do socialismo (1995)
[9] O conceito de desenvolvimento desigual e combinado desenvolvido por Trotsky pressupõe a análise de dinâmicas contraditórias e complementares no seio da mundialização do modo de produção capitalista. Isso pressupõe considerar que diferentes formações sociais se inserem na dinâmica do capitalismo a partir de diferentes ritmos de desenvolvimento.
[10] Lênin buscou compreender a especificidade da dinâmica do capitalismo na Rússia na obra O desenvolvimento do capitalismo na Rússia (1898). Segundo Castelo (20xx, p. 11) ?neste título, o líder bolchevique escreveu a respeito do desenvolvimento capitalista numa formação econômico-social periférica, averiguando como um mesmo país comportava diferentes níveis de desenvolvimento das forças produtivas entre setores como indústria e agricultura?.
[11] Florestan aponta duas fases de dominação imperialista na América Latina. O imperialismo restrito que se inicia na segunda metade do século XIX e o imperialismo total ou novo imperialismo com a consolidação do capitalismo monopolista.
[12] A análise de Lenin (2012), que utilizaremos como principal fonte deste ensaio, destaca seis núcleos centrais para o entendimento do capitalismo monopolista, quais sejam: os monopólios, o capital financeiro, a oligarquia financeira, a exportação do capital, a partilha do mundo entre as nações e empresas e a formação da aristocracia operária.
[13] O momento a qual nos referimos diz respeito à passagem do capitalismo concorrencial a sua fase monopolista, na qual a reestruturação da natureza do capitalismo se destaca na Europa e, com particular expressão, nos Estados Unidos. As economias da América Latina absorvem tais alterações ocorridas no modo de produção desses países, a partir de uma incorporação dependente ao espaço político, social e econômico das nações capitalistas hegemônicas.
[14] No caso de países dependentes da América Latina que não atingiram níveis mais altos de desenvolvimento das forças produtivas há variações na configuração da dominação externa, podendo ainda vigorar relações do tipo imperialismo restrito. Cf. Fernandes, 1973b.
[15] Segundo Fernandes (1973, p. 24), essas instituições são encarregadas de ?conduzir a política de controle global das finanças, da educação, da pesquisa científica, da inovação tecnológica, dos meios de comunicação em massa, do emprego extranacional das políticas, das forças armadas e mesmo dos governos?.
[16] Formação de instituições internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU) no campo político, o General Agreement on Tariffs and Trades (GATT), no campo comercial, o Fundo Monetário Internacional (FMI), para ajustamento de desequilíbrios das balanças de pagamentos e o Banco Mundial (BM), para financiamento do desenvolvimento. No cenário internacional, há a instrumentalização dessas agências e instituições internacionais para implementação de estratégias que lhes são adequadas. Segundo Braz e Netto (2012, p. 237) ?O poder de pressão dessas instituições sobre os Estados capitalistas mais débeis é enorme e lhes permite impor desde a orientação macroeconômica, frequentemente direcionada aos chamados ?ajustes estruturais?, até as providências e medidas de menos abrangência?.


Buscar:
Ir a la Página
IR
Modelo de publicação sem fins lucrativos para preservar a natureza acadêmica e aberta da comunicação científica
Visor de artigos científicos gerado a partir de XML JATS4R