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EDUCAÇÃO SUPERIOR E DESENVOLVIMENTO NO BRASIL: EXPANSÃO E CONTENÇÃO (1961-1971)
Argumentos - Revista do Departamento de Ciências Sociais da Unimontes, vol.. 15, núm. 1, 2018
Universidade Estadual de Montes Claros

Artigos

Argumentos - Revista do Departamento de Ciências Sociais da Unimontes
Universidade Estadual de Montes Claros, Brasil
ISSN: 1806-5627
ISSN-e: 2527-2551
Periodicidade: Semestral
vol. 15, núm. 1, 2018

Resumo: Este artigo tem como objetivo analisar a relação entre educação superior e desenvolvimento no Brasil enfatizando o período compreendido entre o ano de 1961, quando entra em vigor a Lei de Diretrizes e Bases, e o de 1971, quando é aprovada a Lei 5692. A discussão destaca o período no qual se intensificaram as políticas (inter)nacionais de escolarização da população e, dentre elas, as de Educação superior para formação de profissionais de ensino e de pesquisa, caracterizando-se a importância fundamental da educação como estratégia de qualificação de mão de obra para o mercado de trabalho. Em linhas gerais, se identifica que houve uma política de contenção e ao mesmo tempo uma expansão de instituições mediante implantação de instituições privadas e no interior do país.

Palavras-chave: Ensino Superior, Desenvolvimento, Expansão, Contenção, Políticas Públicas.

Resumen: Este artículo analiza la relación entre educación superior y desarrollo en Brasil enfatizando el período comprendido entre el año 1961, cuando entra en vigor la Ley de Directrices y Bases, y el de 1971, cuando se aprueba la Ley 5692. En el periodo se intensificaron las políticas (inter)nacionales de escolarización de la población y, entre ellas, las de educación superior para formación de profesionales de enseñanza y de investigación, caracterizándose la importancia fundamental de la educación como estrategia de calificación de trabajadores para el mercado de trabajo. En líneas generales, se identifica que hubo una política de contención y al mismo tiempo una expansión de instituciones mediante la implantación de instituciones privadas y en el interior del país.

Palabras clave: Enseñanza superior, Desarrollo, Expansión, Contención, Políticas Educacionales.

Abstract: This article aims to analyze the relationship between higher education and development in Brazil, emphasizing the period between 1961, when the Law on Guidelines and Bases of education came into force, and that of 1971, when Law 5692 was approved. The discussion highlights the period in which the (inter)national policies for schooling of the population were intensified and, among them, higher education for the training of teaching and research professionals, characterizing the fundamental importance of education as a strategy for qualifying the workers for the labor market. In general, it is identified that there was a policy of containment and at the same time an expansion of institutions through the implementation of private institutions and it?s in the interior of the country.

Keywords: Higher education, Development, Expansion, Containment, Educational policies.

Introdução

Durante a década de 1960, mais especificamente durante o Governo Militar, a educação para o desenvolvimento foi o discurso mais acentuado e presente na área educacional. A educação seria a grande contribuinte para se conseguir um ?[...] crescimento de renda, produzir a modernização ou construir uma sociedade mais justa? (CUNHA, L. A., 1985, p.16). A influência norte americana nesse período materializa-se através da United States Agency for International Development(USAID) que em parceria com o Ministério da Educação propõe uma política educacional voltada para o desenvolvimento econômico

A partir do exposto, propõe-se, aqui, analisar a relação entre educação superior e desenvolvimento no Brasil enfatizando o período compreendido entre o ano de 1961, quando entra em vigor a Lei de Diretrizes e Bases, e o de 1971, quando é aprovada a Lei 5692. A discussão destaca o período no qual se intensificaram as políticas (inter)nacionais de escolarização da população e, dentre elas, as de formação superior de profissionais para atuarem em diferentes setores da sociedade, mas especificamente relacionadas ao ensino e à pesquisa.

Educação e desenvolvimento

Para Demo (1999), a educação é parceira do conhecimento e está diretamente envolvida nas mudanças da sociedade e da economia. Como o desenvolvimento, para esse autor, é o reflexo direto da capacidade de mudar, a educação cumpriria, para tanto, um papel central e um investimento fundamental. No entanto, ressalta-se que existe uma relação fantasiosa, ?[...] no sentido de que se depositam sobre ela expectativas excessivas, em particular quando vista setorialmente, ou se reduz a uma relação de mero manejo do conhecimento para fins de competitividade, ou se usa para fins eleitoreiros? (DEMO, 1999, p.2). L. A. Cunha (1985, p.16,19, 20) corrobora com essa ideia e indica os três principais sentidos da expressão educação para o desenvolvimento: Educação e crescimento da renda, educação e modernização e educação para a construção de uma sociedade justa.

No item educação e crescimento de renda, o autor em pauta evidencia que a participação dos recursos humanos e o aumento da escolarização dos trabalhadores influenciam no aumento do crescimento da renda. Essa foi uma justificativa para se investir mais no capital humano na década de 1960. A crítica que se fez a essa explicação refere-se à crença de que pode ser justamente o contrário, a escolarização dos trabalhadores aumenta porque a renda aumentou e não a renda aumenta porque a escolarização aumenta.

Quanto à educação e modernização, os países industrializados tentam inculcar nos países ainda não industrializados o espírito de empresa, induzindo-os a agir como eles. Enfatizaram muito a educação como agente de transformação social, só que na verdade os países centrais (industrializados) queriam mesmo era disfarçar seus reais objetivos de tornarem-se referência para os países periféricos, de ocultarem as diferenças significativas existentes entre as estruturas das sociedades não industrializadas e das sociedades tradicionais, e as relações internacionais impostas por esses países industrializados são determinantes nesse processo de industrialização, ou seja, a educação e a modernização não são algo simples de ser implantado.

Na educação para a construção de uma sociedade justa, a educação é tratada pelo Estado como uma luz que vai iluminar todos os espaços sombrios deixados de lado pelo desenvolvimento econômico. É como se esse desenvolvimento econômico não propiciasse as repercussões sociais esperadas na construção de uma sociedade mais justa. E, às vezes, não repercute mesmo, pois as desigualdades sociais são produto da ordem econômica do capitalismo e o Estado que formula as leis educacionais, que planeja e coordena a educação é o mesmo Estado que também orienta a ordem econômica. Visando atender essa política desenvolvimentista Romanelli (1983, p.197) relata que convênios conhecidos pelo nome de ?Acordos MEC-USAID (Ministério da Educação e Cultura/MEC e a Agency for International Development dos Estados Unidos), tiveram o efeito de situar o problema educacional na estrutura geral de dominação, reorientada desde 1964, e de dar um sentido objetivo e prático a essa estrutura?. A ideia seria que através de uma maior escolarização haveria a garantia de uma vaga imediata no mercado de trabalho.

Segundo Jacobs (2004, p. 83), a USAID:

[...] foi criada pela Foreign Assistance Act, para coordenar os recursos destinados pelo governo norte-americano à promoção do desenvolvimento internacional, em especial por meio da Aliança para o Progresso, voltado para os países da região mais próxima. Assim sendo, a USAID passou a centralizar os recursos para a assistência internacional à América Latina, mas não se restringiu a essa região.

Esses recursos variavam desde empréstimos financeiros, doação de equipamentos, concessões de bolsas de estudo e custeio da vinda de técnicos para prestar assessoria aos países periféricos (CUNHA, J. D., 2007). No período compreendido entre 1960 e 1964, a USAID destinou recursos significativos para a educação primária e a alfabetização de jovens e adultos, sendo Belo Horizonte a sede de um centro piloto desse programa de assistência técnica que abrangeu todo o país. A interferência norte-americana intensificou com o Golpe Militar de 1964 e novos acordos foram propostos e aceitos pelo governo brasileiro, acordos esses que tinham como objetivo aperfeiçoamento, melhoria, treinamento, modernização e reformulações do Ensino primário até o Ensino Superior. (ROMANELLI, 1983).

Paulino e Pereira (2006) relatam que, a partir desses acordos, houve uma intenção de legitimar uma transformação modernizadoraimposta à nacionalidade brasileira, no sentido de direcionar sua racionalidade pelo modo de produção capitalista. Sintetizando, podemos dizer que essa transformação modernizadora destacou-se nessa fase da história da teoria do desenvolvimento, em especial os Estados Unidos, que estavam no topo da sua hegemonia do pós-guerra.

Entre as publicações da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBPE), editada pelo INEP[5], consta um artigo publicado na Folha de São Paulo em 1965, onde o autor preconizava que a educação é condição indispensável ao desenvolvimento econômico. Segundo o autor:

Ainda que fosse possível apressar o desenvolvimento e alcançá-lo sem o recurso à educação, isto não seria conveniente para a humanidade. É absolutamente prioritária a necessidade de preparar o homem, oferecendo-lhe a mais completa oportunidade de educação integral, a fim de que esteja em condições de usufruir, no plano humano e espiritual, os benefícios que o progresso técnico e o desenvolvimento material acarretam em escala crescente. A prosperidade econômica e o bem-estar material são importantes para uma nação e desejável para o homem, mas nunca desvinculados do aprimoramento espiritual, do desenvolvimento cultural que se alicerça em valores autenticamente humanos. Tinha razão Levassur, quando sustentava que as somas despendidas com a educação, quando bem empregadas, constituem uma colocação vantajosa de dinheiro, já que a força produtiva que desenvolvem, o capital intelectual que criam dão com usura os juros dos capitais materiais que a educação custou (REIS, 1965, p. 471).

Segundo Ribeiro (2005), o discurso de aliar educação e desenvolvimento esteve presente desde o inicio da segunda metade do século XX e permanece ainda no século XXI. Cumpre uma função ideológica de livrar o sistema capitalista de grandes críticas e de atender as exigências do mercado. Em se tratando do Regime Militar, esse discurso foi fortemente valorizado. De acordo com Paulino e Pereira (2006, p. 45):

Pode-se afirmar que o Estado Militar procurou atender aos interesses dos capitalistas atuando concomitantemente no âmbito da escolarização direcionando-a para a tentativa de desenvolver uma mão-de-obra qualificada necessária à indústria nascente. Desta maneira, ocorreram as reformas - dentre elas a Reforma do Ensino Superior em 1968 e, posteriormente, em 1971 a Reforma do Ensino Primário ? com o intuito de evitar a participação da sociedade civil evitando possíveis mobilizações de outros setores que não o militar dominante, para modificar a estrutura de ensino até então vigente.

Ainda sobre Regime Militar e educação no Brasil, Germano (2011, p. 22) coloca que:

O elevado grau de analfabetismo e o baixo percentual de escolarização da população economicamente ativa permitem inferir que, nas condições do capitalismo brasileiro, a política educacional pós-64 contribuiu para a exclusão social das denominadas classes populares ou classes subalternas, ou seja, a política educacional, de fato, privilegiou o topo da pirâmide social.

Importante destacar que, durante o Regime Militar, o Estado buscava cumprir sua função com relação ao capital, preocupando-se com a qualificação[6] da mão de obra ativa para o mercado de trabalho. A educação como um todo estava direcionada cada vez mais para uma satisfação de interesses capitalistas e expansionistas, o que se intensificou a partir do Golpe Militar de 1964, atendendo aos interesses da política desenvolvimentista e da formação de mão de obra.

Schultz (1973) exerceu uma grande influência sobre a elaboração de diretrizes (inter)nacionais postulando a relação entre economia e educação ao afirmar que existia, nos Estados Unidos em 1960, sólidos comprovantes de que a instrução e a pesquisa universitária constituem as mais importantes fontes de crescimento. Ainda sobre esse assunto, esse autor esclarece que ?[...] a instrução e o progresso no conhecimento constituem importantes fontes de crescimento econômico. É óbvio que não são fontes naturais: são, essencialmente, produzidas pelo homem, o que significa que envolvem economias e investimento? (SCHULTZ, 1967, p. 63).

Uma das críticas de Schultz (1973) aos economistas é que estes quase sempre não reconheciam a importância do ser humano como capital de investimento [7] para o processo produtivo (lucro) e desenvolvimento do país. Toda essa movimentação indica que o debate e as proposições sobre o tema Economia e Educação eram muito acentuados nesse período e estavam presentes em vários países e tinham como objetivo discutir questões envolvendo a educação com ênfase nas relações com o desenvolvimento econômico.

O vínculo entre educação e desenvolvimento posto a partir de meados da década de 1950 foi alvo de críticas de autores como Kuenzer (1997), Frigotto (1993) e Saviani (2007), por exemplo, porque associava ou havia uma crença em um milagre econômico (inter)nacional e de que as pessoas com maior escolaridade iriam usufruir de melhor qualidade de vida, sempre associando um melhor desempenho no mercado de trabalho com um consequentemente aumento da renda. Esses autores acreditavam que tais argumentos disfarçavam as desigualdades e colocavam no indivíduo o peso, ou seja, a responsabilidade de seu êxito ou de seu fracasso. Entretanto, sabemos que a qualificação por si só não proporciona a ascensão social. O trabalhador vende a sua qualificação para o capitalista que detém os meios de produção, por isso a qualificação é um valor de troca, é um meio para garantir a sua sobrevivência.

Educação superior e desenvolvimento

Segundo Bonilla (1962), na década de 1960, aconteceu uma proliferação de escolas ou faculdades isoladas, especialmente Faculdades de Filosofia que preparavam professores da escola secundária, e que foram, em muitos casos, apenas pequenas extensões da escola secundária com estatutos legais de universidades. O panorama do Ensino Superior no início dessa década apresentava-se da seguinte forma:

Em 1960, havia 418 estabelecimentos de instrução universitária, com 93.202 alunos matriculados e um quadro de 21.064 professores no Brasil. Nesse conjunto, contavam-se 228 escolas isoladas, restando 190 que compreendiam agrupamentos de escolas com mais de um campo de especialização. Um total de 40% das matrículas nas universidades federais e 17% em estaduais. O 1% restante corresponde aos que se encontram num punhado de escolas superiores municipais. As matrículas nas escolas de direito abrangem ¼ do total, seguindo-se 22% das faculdades de filosofia, artes e ciências, quase outro tanto. Engenharia (12%), medicina (11%), comércio, odontologia e outras escolas profissionais constituem o restante (BONILLA, 1962, p. 54).

Verificamos o acentuado crescimento das matrículas nos cursos superiores das Faculdades de Filosofia. Conforme Jacobs (2004, p. 102), ?[...] o número de universidades públicas e privadas no Brasil até o ano de 1954 correspondia a 16 instituições e entre o período de 1955 e 1964 foram criadas mais 21?, cujo objetivo era formar professores para atuarem nos níveis elementares do ensino, nessa época (década de 1960), profissional escasso no mercado de trabalho.

Nessa época dois importantes órgãos do Ministério da Educação e Cultura (MEC) se encarregavam de delinear as políticas de ensino: o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) e o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB)[8]·.

Na década de 1950, a América Latina foi marcada pela gradual transformação de suas condições socioeconômicas e políticas. No bojo dessas transformações, parcela significativa de técnicos, burocratas, políticos, economistas e cientistas sociais mobilizaram-se em torno do tema da aceleração e consolidação do processo de desenvolvimento econômico e social de seus respectivos países ? uma mobilização conseguida pela elaboração do que se denominou de ?ideário desenvolvimentista? (MENDONÇA et al., 2006, p. 1).

Nesse mesmo período, a Comissão Econômica para a América Latina-CEPAL enfatizava que os países integrantes desta região necessitavam de técnicas de planejamento para implantação do desenvolvimento econômico (TOLEDO, 1986). O Brasil voltava-se principalmente para a política de industrialização pensada desde a década de 1930.

Assim, nos anos 1960, as questões relacionadas à educação eram pautadas e inseridas nos planos de desenvolvimento econômico, ou seja, a educação era pensada e planejada para atender aos interesses principalmente da indústria. Decretos, Leis, Portarias e Resoluções, da década de 1960, foram alguns dos atos oficiais que (re)produziram no Brasil o vínculo educação e desenvolvimento ou educação para o desenvolvimento, ratificando desta força a Teoria do Capital Humano. Para exemplificar:

· Decreto n. 51.470 de 22 de maio de 1962, instituiu no MEC, como serviço ou regime especial de financiamento para o desenvolvimento social e econômico, a Mobilização Nacional contra o Analfabetismo; desenvolveu-se uma ação alfabetizadora por todo o país tendo como arcabouço teórico as práticas pedagógicas de Paulo Freire.

· Decreto n. 1.230 de 22 de julho de 1962, criou a Comissão de Planejamento da Educação (COPLED) que tinha como objetivos reunir, coordenar ou realizar os estudos e levantamentos necessários ao planejamento plurianual da educação no país e era subordinada ao Ministério da Educação e Cultura.

· Portaria n. 46 de 31 de janeiro de 1964, especificou os objetivos do Programa Intensivo de Preparação de Mão de Obra Industrial (PIPMOI), segundo S. V. Santos (2006, p. 3), o PIPMOI nasceu em um ?[...] momento de incremento da produção nas indústrias automobilísticas, ?milagre? econômico proporcionado pela ditadura militar, euforia de emprego; nacional ? desenvolvimentismo orquestrado pela Ditadura Militar?. Apesar do seu início no Regime Militar, esse Programa foi idealizado pelo governo devidamente eleito de João Goulart.

· Decreto-Lei n. 55.551 de 12 de janeiro de 1965 que tratou do salário-educação, em seu art. 1º diz: o salário-educação, instituído pela Lei n. 4.440, de 27 de outubro de 1964, para suplementar os recursos públicos destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino, foi devido por todas as empresas vinculadas ao sistema geral da Previdência Social.

· Decreto-Lei n. 53 de 18 de novembro de 1966, fixou princípios e normas de organização para as universidades federais.

· Decreto-Lei n. 252 de 21 de fevereiro de 1967, estabeleceu normas complementares ao Decreto-Lei n. 53, de 18 de novembro de 1966, no auge do período militar tornando obrigatória a criação de departamentos como eixo central da organização universitária[9].

A relação entre educação e desenvolvimento foi sendo construída principalmente através do ensino superior, que passou a ter uma importância fundamental no sentido de qualificar a mão de obra, promover a pesquisa, e formar pesquisadores (conhecimentos científicos e tecnológicos) para atuarem na indústria brasileira. Sobre isso, Bernartt (2006, p. 146) nos diz que o período ?[...] significa o início das atividades de pesquisa na universidade, resultado de uma política estatal que visava à modernização do ensino superior dentro de um projeto de desenvolvimento?. Esse projeto de desenvolvimento foi direcionado, segundo esse autor, aos aspectos econômicos, voltado para a intenção do capitalismo, respondendo aos desejos do mercado produtivo.

A chegada do ensino superior através de uma instituição de ensino, sobretudo no interior do Brasil, na década de 1960, gerou alguns impactos importantes em diferentes cidades e/ou regiões. Para Hoff e San Martin (2011), o primeiro impacto estaria relacionado à ampliação ou criação de demandas através de investimentos, despesas de custeio, mão de obra, habitação para alunos e professores de outras cidades, a questão do transporte até a Faculdade/Universidade e até mesmo entre as cidades, serviços públicos para atender essas pessoas, a questão da alimentação, os serviços de conveniência como livrarias, fotocópias, papelarias e lanchonetes.

O segundo impacto é na formação cidadã, disseminando novas ideias, ideias essas vinculadas ao desenvolvimento através do ensino, pesquisa e extensão. Propicia contato com atividades culturais diversas, aproximando a comunidade na qual está inserida.

O terceiro impacto refere-se à qualificação dos recursos humanos, aumento da produtividade, visão estratégica e sistêmica sobre os recursos e condicionantes econômicos regionais para as empresas.

O quarto impacto é gerado pela criação de postos de trabalhos diretos e indiretos, gerando emprego e renda, ou seja, a oferta de bolsas de estudo e estágio remunerado aos acadêmicos, a implantação de empreendimentos próximos à Universidade, como lanchonetes, livrarias, papelarias e até mesmo imobiliárias que se instalam próximas às Instituições de Ensino Superior, tendo em vista o número de universitários e professores que migram das cidades vizinhas e até mesmo professores que se mudam para local próximo à universidade.

O quinto e último impacto está ligado à dinamização da economia regional, potencializando os seus recursos locais por meio do suporte científico e tecnológico, contribui para elaboração de políticas públicas e para ampliação do acesso aos recursos externos à região. O sexto impacto está ligado à ampliação da demanda que modificará as estruturas locais, ampliando os serviços públicos e privados, incluindo o transporte, serviços de manutenção, habitação, o comércio, lazer, dentre outros tipos de serviços.

No nível da legislação, a Constituição de 1967 apresentou algumas contribuições na área educacional. Contribuições essas expostas por Freitag (2005, p. 140-141), quando afirma que:

A constituição de 1967 antecipa alguns aspectos que nortearão a lei de reforma, tanto do ensino superior como o de 1º e 2º graus, de 1968 a 1971. Reforça a Constituição em seu Art. 168, § 2, o que a LDB, de 1961, havia estabelecido: fortalecer o ensino particular assegurando-lhe explicitamente ?ajuda técnica e financeira do governo, inclusive bolsas de estudo?. Ela estabelece ainda o prolongamento da obrigatoriedade do ensino primário de quatro para oito anos, que seria gratuito e ministrado integralmente pela rede oficial de ensino (Art. 168, § 3, III).

Esse fortalecimento do ensino particular acabou sendo tolhido devido à penetração do ensino primário gratuito. Como o ensino particular precisava de novas áreas de atuação, a alternativa encontrada foi:

Como veremos na análise empírica da realidade educacional gerada por essa lei, vamos constatar uma penetração e expansão da rede particular do ensino em três áreas: no ensino propedêutico para as universidades (os famosos cursinhos pré-vestibulares), no ensino supletivo (considerado educação de adultos) e no ensino superior de graduação e pós-graduação. Assim a gratuidade do ensino prometida pelo governo até o 8º ano primário não veio perturbar o setor privado, mas sim fazer que definitivamente abandonasse a área do secundário formal vindo a utilizar as novas brechas que lhe são abertas pela legislação atual (FREITAG, 2005, p. 142).

Dentro desse quadro e de um ambiente de repressão produzido pelo Regime Militar nasceu a Reforma Universitária de 1968.

A escalada repressiva desencadeada depois do golpe de 1964 atingiu duramente a educação. Os denominados movimentos de educação e cultura popular ? CPC (Centro Popular de Cultura/UNE), MCP (Movimento de Cultura Popular), MEB, Ceplar (Centro de Educação Popular), Pé no chão... ? foram todos fechados ou mutilados e muitos de seus participantes foram presos e cassados. Universidades foram objeto de intervenção militar. Foi o caso da Universidade de Brasília (UnB), por três vezes ocupada por tropas militares. (GERMANO, 2011, p. 106)

Essa escalada repressiva através das intervenções, principalmente nas universidades públicas, tinha como objetivo controlar politicamente e também preparar a mão de obra para o mercado de trabalho. Fiori (2013) ratifica essa ideia ao relatar que:

[...] a Lei n° 5540/68 (BRASIL, 1968) sobre normas do Ensino Superior, através de uma gestão autoritária com medidas restritivas às IES [...] resultaram em perseguições políticas a docentes e discentes, demissões de reitores e diretores, manipulações políticas diretas em algumas IES, intervenção direta do governo federal, impedimento de experiências mais liberais no ensino (FIORI, 2013, p. 70, grifo nosso).

Com a Reforma Universitária, os Governos militares obtiveram meios mais eficientes para um controle de qualquer manifestação contrária ao regime em execução, segundo a famosa frase de um Ministro da Educação do Regime Militar nas Universidades: ?Os estudantes tem que estudar e os professores ensinar (não fazer política)? (GERMANO, 2011, p. 108).

A Reforma Universitária tinha uma preocupação também de relacionar educação e mercado de trabalho, ou seja, preparar a mão de obra para o mercado de trabalho.

Em junho de 1968, em meio ao crescimento dos protestos de amplos setores sociais contra a ditadura (estudantes, profissionais liberais, operários), o governo organizou um grupo de trabalho para elaborar um anteprojeto de reforma universitária. Era a oportunidade para estender a todo o ensino superior o que já havia sido imposto às instituições federais. (GÓES, 1999, p. 86).

A missão desse grupo de trabalho, segundo o Decreto (62.937/1966) que o instituiu, era: ?Estudar a reforma da universidade brasileira, visando à sua eficiência, modernização, flexibilidade administrativa e formação de recursos humanos de alto nível para o desenvolvimento do País? (FÁVERO, 2006, p. 17).

A tarefa principal desse grupo de trabalho era bastante objetiva, teriam que propor soluções práticas no sentido de racionalizar a organização das atividades universitárias, no sentido de torná-las mais eficazes e produtivas. Segundo Freitag (2005, p. 145), a Lei deveria:

Propor medidas imediatas para a solução da crise universitária, que consistia no descontentamento dos alunos que pressionavam a universidade para dar-lhes ?um lugar ao sol? e que viam nos mecanismos altamente seletivos do vestibular uma forma de atuação dos grupos no poder com vistas a perpetuar a estrutura de desigualdade na sociedade brasileira. Um dos instrumentos propostos em lei para ampliar o número de vagas sem maiores investimentos novos foi a racionalização das estruturas acadêmicas e a otimização dos recursos.

O texto da Lei da Reforma Universitária (Lei 5.540/68) apresenta algumas incongruências. Primeiro prega a racionalização das estruturas e dos recursos e, em seguida, propõe a democratização do ensino. Se democratizar em outras palavras levaria a uma expansão, como aconteceria essa expansão racionalizando estruturas e recursos?

Autores como Freitag (2005) e Germano (2011) afirmam que a lei da reforma do ensino superior seguiu o modelo universitário norte-americano e apontam algumas características comuns, como por exemplo: adotar o sistema de créditos, dissolução da cátedra e departamentalização, implementação de cursos de curta duração, ensino com dois níveis de pós-graduação: mestrado e doutorado.

Merece destaque a atuação do convênio MEC/USAID, que desde 1965 trabalhava na questão da reforma universitária. Pode-se dizer que essa reforma universitária não contou com a participação da população, foi um assunto discutido e finalizado dentro dos gabinetes.

Primeiro do próprio Presidente, decretando o início dos trabalhos, depois de uma comissão mista (MEC/USAID), fazendo uma análise cujas recomendações não são conhecidas, e, finalmente, do grupo de trabalho de dez pessoas nomeado pelo presidente. Não houve discussões e debates em público, a imprensa e os meios de comunicação de massa só serviram para divulgar os resultados. Estudantes e professores praticamente não participaram (FREITAG, 2005, p. 148).

Surge então um ensino superior privado de cunho empresarial que, segundo Fávero (2006), tinha a intenção de aumentar a eficácia e a produtividade da universidade, com grande destaque para a pós-graduação.

Segundo L. A. Cunha (1985, p. 240), ?[...] de 1968 a 1971 uma série de atos oficiais expressaram a nova política educacional cujo objetivo é o de permitir que aquela função do Estado de concentrador de renda não mudasse de direção nem de intensidade?. Esses atos oficiais exprimiam a contenção do ensino superior, suspensão de estudantes, demissão de funcionários e professores envolvidos em atividades consideradas subversivas. Em 1969, o Decreto-Lei n. 869 incluiu a Educação Moral e Cívica como disciplina obrigatória nas escolas de todos os graus e modalidades dos sistemas de ensino no país. Dessa forma,

Foi instituído em todos os graus escolares, um ensino propagandístico da ?ideologia da Segurança nacional? e dos feitos da ?Revolução? de 1964, com vistas à obtenção de alguma forma de consenso e de legitimação. Isso ocorreu com a institucionalização da ?Educação Moral e Cívica? e seu prolongamento para o ensino superior (inclusive a pós-graduação), com a denominação de ?Estudos de Problemas Brasileiros?, que, segundo estabelece o Decreto-lei 869/69, assinado pela Junta Militar, tornaram-se disciplinas obrigatórias (GERMANO, 2011, p.34).

Na realidade, o Regime Militar tinha como objetivo uma educação, e sobretudo a escolar, de culto à pátria e à obediência, ressaltando a importância da educação na propaganda de um Brasil-potência que iria promover o desenvolvimento.

Em 1971 foi promulgada a Lei 5.692 que reformulou o ensino primário e médio ao fixar as diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º graus. Essa lei juntou o ensino primário com o ginásio e generalizou o ensino profissionalizante no nível médio ou 2º grau (GERMANO, 2011). O objetivo era tornar o aluno um trabalhador capacitado para trabalhar com as máquinas das indústrias a serviço do desenvolvimento do país? Essas perguntas nos remetem à relação da educação com a economia e a preparação para o trabalho, mas, de certa forma, a Lei n. 5.692/71 serviu de política de contenção do ensino superior ao introduzir o ensino profissionalizante.

Analisando a LDB/1971, percebemos implicitamente que teve como objetivo relacionar o sistema educacional ao sistema ocupacional e que questões importantes relacionadas à desigualdade social não foram contempladas, justamente porque a igualdade via escola não garantiu a ascensão social. Na preparação para o trabalho, a Lei 5.692/71 direcionou seus objetivos para institucionalização da profissionalização necessária para a indústria através da qualificação dos trabalhadores. Freitag (2005, p. 161) relata que as inovações introduzidas em relação à legislação anterior resumem-se em três tópicos:

1 Extensão definitiva do ensino primário obrigatório de 4 a 8 anos (Art. 18), gratuito em escolas públicas (Art. 20) e consequente redução do ensino médio de 7 para 3 a 4 anos (Art. 22). O 1º ciclo ginasial fica, portanto, absorvido pelo ensino primário, tornando-se obrigatório para todos.

2 Profissionalização do ensino médio (antigo 2º ciclo do ensino médio) (Art. 4, §§ 1 a 5, a Art. 10) garantindo ao mesmo tempo continuidade e terminalidade dos estudos.

3 Reestruturação do funcionamento do ensino no modelo da escola integrada, definindo-se um núcleo comum de matérias obrigatórias e uma multiplicidade de matérias optativas de escolha do aluno.

Percebemos que uma das inovações contidas nessa legislação, ou seja, a profissionalização do nível médio no fundo tinha como objetivo segurar a pressão sobre as vagas no ensino superior, aspecto que discutiremos em seguida neste artigo. Ainda segundo essa autora, essa profissionalização é explicitada através dos seguintes objetivos:

1º) Mudar o curso de uma das tendências da Educação brasileira, fazendo com que a qualificação para o trabalho se tornasse a meta não apenas de um ramo de escolaridade, como acontecia anteriormente, e sim de todo um grau de ensino que deveria adquirir nítido sentido de terminalidade.

2º) Beneficiar a economia nacional, dotando-a de um fluxo contínuo de profissionais qualificados, a fim de corrigir as distorções crônicas que há muito afetam o mercado de trabalho, preparando em número suficiente e em espécie necessária o quadro de recursos humanos de nível intermediário de que o país precisa (FREITAG, 2005, p. 162).

O ensino profissional, previsto na lei, juntamente com a ideia de terminalidade, expressa nesse primeiro objetivo que, ao finalizar o 2º Grau, o estudante poderá ingressar no mercado de trabalho, deixando o espaço das universidades para outros estudantes (FREITAG, 2005, p. 162-163). Outra característica da Lei 5.692/71 foi a questão do benefício à economia nacional, presente no 2º objetivo, ou seja, qualificar os estudantes para que estes, ao finalizarem os estudos, ingressassem no mercado de trabalho. Seria a mão de obra qualificada atuando e contribuindo para o crescimento do país.

Os interesses econômicos denunciados por alguns autores em relação à Lei n. 4.024 de 1961 e à Lei n. 5.692/71 vão muito além da formação docente e começaram muito antes da referida Lei, sendo somente um caminho que se seguiu e, nas palavras de Germano (2011, p. 195) ?os interesses privatistas conquistaram, sem dúvidas, importantes vitórias?. Esses interesses ganharam força com o Regime Militar, em que o Estado criou mecanismos legais como a Constituição de 1967 e a Emenda Constitucional n. 01 de 1969, exemplos de como o Estado visava diminuir os investimentos na educação e o consequente incentivo à privatização do ensino. A partir de 1964, com o Regime Militar, a educação é assumida a serviço da política desenvolvimentista de formação de mão de obra para a expansão do capital.

A Reforma Universitária trouxe à tona algumas insatisfações presentes nesse período, principalmente no que diz respeito ao aumento da demanda pelo ensino superior; a expansão de faculdades isoladas e privadas em todo o país foi uma das consequências desse período.

As reformas educacionais analisadas nesse recorte temporal, a Reforma Universitária de 1968 e a LDB 5.692/71 pautaram-se em discursos e ações defendidas pelo Regime Militar sempre no intuito de direcionar as políticas educacionais, colocando o ensino como controle ideológico, tendo como objetivo uma educação para o trabalho.

Diante das explicitações a respeito da educação superior e desenvolvimento, bem como todas as questões que envolvem essa discussão: desenvolvimento e a relação com o ensino superior, as implicações dos acordos MEC/USAID, as reformas educacionais, no capítulo seguinte será abordado o ensino superior no contexto nacional e regional, haja vista que a educação é um item importante no processo de desenvolvimento, porque não se restringe somente aos aspectos da economia, mas atinge a sociedade em geral.

Expansão e contenção da educação superior no Brasil

Segundo Sampaio (2011), a expansão do ensino superior no Brasil tem seu momento inicial marcado pela LDB de 1961, pois essa Lei foi pragmática ao reconhecer a organização do sistema em moldes não universitários. O caminho percorrido pelo ensino superior no Brasil mostra um acentuado crescimento a partir da década de 1960, sendo que em 1969 eram ofertadas 342.886 matrículas e em 1979 elas passaram a atingir 1.311.799 (BARROS, M. C., 2011). Segundo Sampaio (2011), as taxas de crescimento das matrículas foram mais significativas nos anos de 1968, 1970 e 1971.

A grande expansão do ensino superior no período ime­diatamente posterior ao golpe militar de 1964 resultou da subs­tituição do regime de cátedras pelo regime departamental nas universidades públicas, e do incentivo governamental à cria­ção de faculdades privadas. Tal expansão implicou a mudan­ça da composição social tanto do alunado quanto do professorado. Aumentou significativamente o contingente de alunos com idade mais elevada, de trabalhadores em tempo parcial ou integral. Entre os docentes, aumentou o número dos muito jovens (CUNHA, L.A., 2000, p. 42).

Ademais, foram criados os Centros Populares de Cultura e as Campanhas de alfabetização de adultos, o que contribuiu para o aumento da faixa etária dos estudantes.

Vale ressaltar que a busca pelo diploma superior nem sempre era alcançada, ou seja, essa demanda variava de acordo com as transformações da economia e das mudanças políticas. O elevado número de excedentes resultou em uma insatisfação das camadas médias em relação à política educacional implantada pelo Estado, gerando um descontentamento em todo o País. Por exemplo, o número de excedentes no vestibular de 1968 alcançou o número de 125 mil (CUNHA, 1985).

A expansão do ensino superior foi consequência da pressão exercida pela população, principalmente a classe média, para se ter o acesso ao ensino superior, movimento esse que transcorreu durante toda a década de 1960, cuja culminância foi a Reforma do Ensino Superior em 1968. A classe média pressionava para se ter mais vagas no ensino superior, pois para ela significava possibilidades de ascensão social. O ensino superior no Brasil, em 1964, início do Regime Militar, já contava com uma relação percentual de excedentes e inscritos em 41,2% (CARVALHO, 2002). As vagas ofertadas tanto no setor público quanto privado não acompanhavam a demanda efetiva, oriunda principalmente da classe média.

Quanto à questão do público ou privado no ensino superior identificamos que o número de matrículas tanto nas universidades como nos estabelecimentos isolados mantiveram-se estáveis desde o início da década de 1960, inclusive no início do Regime Militar (1964), com pequenas variações. O percentual de crescimento é representado nessa tabela através do índice (%), que, no período 1960/1971, totalizou um aumento de mais de 600%.

Tabela 1
Tabela 1 - Número e Índices de Matrículas no Ensino Superior no Brasi

FONTE: CARVALHO (2002), BARROS (2007), Org. SANTOS, D.P, 2014.

Os dados da Tabela 1 refletem o crescimento da demanda por um curso superior, originada principalmente da classe média. Segundo Carvalho (2002, p. 55), ?[...] a concentração de capital, renda e mercado propiciaram à classe média o deslocamento dos canais de ascensão tradicionais - por meio da poupança, do investimento, e da reprodução de capital - para as hierarquias ocupacionais, através da promoção de cargos e da diferenciação salarial?.

A partir da Reforma Universitária em 1968, percebemos que as matrículas em estabelecimentos isolados (privados) começam a crescer em detrimento das matrículas nas universidades públicas. Essa privatização principalmente do ensino superior está relacionada à expansão desse nível de ensino no Brasil, mas vale ressaltar que aconteceram também algumas federalizações, com a finalidade de equilibrar a expansão das instituições privadas.

Segundo Barros (2007), até 1963 existiam no Brasil 39 universidades brasileiras resultantes de federalizações de instituições (escolas e faculdades) estaduais, municipais e privadas, a saber: Universidade Federal do Rio de Janeiro (1920), Universidade Federal de Minas Gerais (1949), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1950), Universidade Federal do Paraná (1950), Universidade Federal do Ceará (1954), Universidade Federal Rural de Pernambuco (1955), Universidade Federal de Goiás (1960), Universidade Federal de Juiz de Fora (1960), Universidade Federal do Pará (1960), Universidade Federal da Paraíba (1960), Universidade Federal de Santa Maria (1960), Universidade Federal Fluminense (1960), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (1960), Universidade Federal de Santa Catarina (1960), Universidade Federal do Espírito Santo (1961), Universidade Federal de Alagoas (1961), Universidade de Brasília (1961), Universidade Federal do Amazonas (1962) e Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (1963).

Mantidas pelo Estado (federal ou estadual), existiam, no pré-1964, a Universidade de Recife (1946), que se tornou Universidade Federal de Pernambuco em 1965; a Universidade Rural de Minas Gerais (1948) que, em 1969, se transformaria em Universidade Federal de Viçosa; a Universidade de São Paulo - USP (1934); a Universidade Rural do Sul (1960) que, em 1969, se transformaria em Universidade Federal de Pelotas; a Universidade do Maranhão (1961); a Universidade Federal de São Paulo (1960) que, em 1968, se transformou na Universidade Federal de São Carlos; e a Universidade de Pelotas. As universidades católicas existentes no período pré-1964 eram: Universidades Católicas de Pernambuco, de Minas Gerais, de Salvador, de Petrópolis, de Campinas, do Paraná, de Pelotas, de Goiás, do Rio de Janeiro, de São Paulo e do Rio Grande do Sul, e a Presbiteriana Universidade de Mackenzie.

Barros (2011, p. 8) afirma que ?[...] foi durante a ditadura militar, particularmente após a Reforma universitária de 1968, que se verificou uma acelerada expansão das vagas, baseada principalmente em estabelecimentos isolados de ensino e no setor privado?. Essa expansão tinha como objetivo atender o movimento estudantil, que queria mais vagas e que compunha a classe média que, de certa forma, foram a base do Golpe de 1964. O Governo não conseguiu resolver a demanda por mais vagas.

Se houve uma relativa expansão da oferta de vagas no ensino superior, isso não foi resultado direto da política educacional estatal democratizante, mas justamente consequência da incapacidade do governo de resolver a crise universitária. Não foi possível conter a pressão sobre as universidades. Não foi possível ampliar suficientemente as vagas da rede oficial. Como o governo não pode deixar de dar uma solução ao impasse por ser este potencialmente conflituoso, permitiu que o setor privado participasse da sua solução. Passou a autorizar cursos superiores de faculdades isoladas, oferecido pelo setor privado [...] (FREITAG, 2005, p. 190).

Apesar dessa expansão via setor privado através de faculdades isoladas, a política educacional desse período também tinha uma preocupação com a contenção desse nível de ensino que pode ser resumida da seguinte forma:

A reforma do ensino superior, de 1968, e a do ensino médio, de 1971, têm a função de conter o crescente contingente de jovens das camadas médias que buscam, cada dia mais intensamente, o ensino superior como meio de obtenção de um requisito cada vez mais necessário, mas não suficiente, de ascensão nas burocracias ocupacionais (CUNHA, L.A., 1985, p. 285).

Como o Governo não conseguiu conter o avanço das matrículas no ensino superior, o diploma de Graduação perdeu aquele poder que lhe era inerente. A institucionalização da pós-graduação restabelece, como dissemos anteriormente, o valor econômico e simbólico do diploma, só que agora para uma pequena parte dos estudantes.

Diante das explicitações a respeito da expansão/contenção e privatização/interiorização do ensino superior no Brasil, chegamos à conclusão que os setores público e privado desempenharam funções importantes e até mesmo complementares, o que sempre caracterizou o sistema de ensino superior brasileiro.

Considerações finais

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961 foi a grande contribuinte para a expansão do ensino superior, pois, dentre outros fatores, incentivou a criação das faculdades particulares. Ao mesmo tempo em que acontecia a expansão, acontecia também a interiorização do ensino superior no Brasil, e também a criação/interiorização de diferentes cursos, e especialmente os de licenciatura.

O aumento das matrículas no ensino superior no Brasil de 1959 até 1969 foi significativo. No período posterior ao Golpe Militar houve um incentivo à criação das faculdades privadas, o que também corresponde ao início do funcionamento dos cursos superiores pagos. Confirma-se, no relato dos entrevistados, que o diploma de um curso superior na década de 1960 e início da década de 1970 representava ascensão social.

Sobre a contenção do ensino superior, percebemos que a profissionalização do ensino médio através da LDB 5.692/71 fez com que houvesse um deslocamento dos jovens aspirantes ao ensino superior, para um mercado de trabalho nas indústrias. No cenário desta pesquisa, percebe-se que a educação, mais precisamente a Educação Superior esteve vinculado à ideia de desenvolvimento, fica claro pelas leituras e pelas falas analisadas que a palavra desenvolvimento aparece associada a uma concepção econômica. Desenvolvimento como sinônimo de crescimento econômico, direcionado para o desenvolvimento do capital. Isso tudo fica evidente quando analisamos as políticas de educação na década de 1960. Os Acordos MEC/USAID intensificados depois do Regime Militar, voltados para todos os níveis educacionais da época, ratificam a ideia de que houve uma influência externa muito grande dos Estados Unidos nos aspectos educacionais no Brasil.

Todas essas ideias baseadas no tripé educação/desenvolvimento/investimento foram fortemente valorizadas no Regime Militar, para atender aos interesses capitalistas e expansionistas, da política desenvolvimentista e da formação da mão de obra.

Primeiro, que as demandas econômicas, políticas e sociais por ensino superior no início e em meados da década de 1960 eram evidentes. Segundo, havia uma carência muito grande de professores para atuarem na educação básica, naquela época denominada de ensino primário e secundário.

Gratidão

Este artigo faz parte de algumas discussões resultantes da pesquisa financiada pelo Fundo de Amparo a Pesquisa de Minas Gerais-FAPEMIG e do Projeto da tese intitulada Educação Superior e Desenvolvimento em Montes Claros/MG.: a contribuição do Curso de Geografia da FUNM (1964-1971), defendida em 2015, no Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Federal de Uberlândia.

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Notas

[2] Doutora em Geografia pela UFU/MG, professora da Universidade Estadual de Montes Claros. Universidade Estadual de Montes Claros ? UNIMONTES, Montes Claros, MG, Brasil. dulcipsantos@yahoo.com.br
[3] Professora do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Uberlândia. Universidade Federal de Uberlândia ? UFU, Uberlândia, MG, Brasil. adrianyavila@gmail.com.
[4] Doutora em Educação pela PUC/SP e Doutoranda em Sociologia pela Universidad de Barcelona, professora aposentada da Universidade Estadual de Montes Claros. Universidade Estadual de Montes Claros ? UNIMONTES, Montes Claros, MG, Brasil. sj-duraes@uol.com.br.
[5] O INEP foi criado, por lei, no dia 13 de janeiro de 1937, sendo chamado inicialmente de Instituto Nacional de Pedagogia. No ano seguinte, o órgão iniciou seus trabalhos de fato, com a publicação do Decreto-Lei n. 580, regulamentando a organização e a estrutura da instituição e modificando sua denominação para Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos. Foi nomeado para o cargo de diretor-geral do órgão o professor Lourenço Filho. Segundo o Decreto-Lei, cabia ao INEP "organizar a documentação relativa à história e ao estado atual das doutrinas e técnicas pedagógicas; manter intercâmbio com instituições do País e do estrangeiro; promover inquéritos e pesquisas; prestar assistência técnica aos serviços estaduais, municipais e particulares de educação, ministrando-lhes, mediante consulta ou independentemente dela, esclarecimentos e soluções sobre problemas pedagógicos; divulgar os seus trabalhos". O INEP configurou-se, então, no primeiro órgão nacional a se estabelecer de forma duradoura como "fonte primária de documentação e investigação, com atividades de intercâmbio e assistência técnica" (LOURENÇO FILHO, 1964, p.12).
[6] Nesse período existe uma tendência a considerar a qualificação como sinônimo exclusivo de escolaridade. O livro de SCHULTZ, Theodore W. O Valor Econômico da Educação. Rio de Janeiro: Zahar, 1967, foi um grande marco nesse sentido.
[7] A Teoria do Capital Humano foi explicitamente desenvolvida a partir da década de 1960 por economistas liberais (dentre eles, sobressaiu-se Theodore Schultz). Esses economistas preocuparam-se em encontrar fórmulas que compatibilizassem educação e desenvolvimento econômico à distribuição de renda, sem questionar as relações de produção capitalista. Schultz (1973) destaca que esse capital humano cresceu muito na década de 1960 e muito mais rápido nas sociedades ocidentais que o capital convencional. A crença era de que, quanto maior a escolaridade do indivíduo, maior o desenvolvimento econômico para ele e automaticamente para a nação.
[8] Órgão vinculado ao MEC, o ISEB foi institucionalizado em 1955-Decreto n. 37.608 de 14/07/1955 e extinto em 1964, foi constituído através de um grupo de intelectuais radicados no Rio de Janeiro que tinham por finalidade o estudo, o ensino e a divulgação dos saberes das ciências sociais. Caracterizou-se por aplicar os conhecimentos gerados por essas ciências sociais à análise e à compreensão crítica da realidade brasileira, tendo em vista uma ação de cunho político expresso na intervenção e no direcionamento de uma nova mentalidade da sociedade voltada à superação do subdesenvolvimento do país (OLIVEIRA, M.T.C., 2006, p. 1).
[9] Toda essa documentação encontra-se na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos em publicações da década de 1960. Volume XXXVIII, julho-setembro, 1962, n. 87.


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